Judas Isgorogota

Judas Isgorogota

Judas Isgorogota é o pseudônimo do poeta e jornalista brasileiro Agnelo Rodrigues de Melo. Estreou nas letras em 1922, com Caretas de Maceió. Transferindo-se para São Paulo, publica Divina Mentira e Recompensa, menção honrosa da Academia Brasileira de Letras. Outras obras: Desencanto, Fascinação, Pela Mão das Estrelas, Os que vêm de Longe, Abkar e João Camacho. Publicou 15 livros de poesias, 1 novela e 5 livros de poesias infantis.

1901-09-15 Lagoa da Canoa
1979-01-10
17070
0
26


Alguns Poemas

Mercador de Escravas

Sonhei que eu era um mercador de escravas
Com tenda armada em Bombaim
E mil peças à vista: — umas eslavas,
Outras, filhas do Nilo e de Pekim;
Umas ebúrneas, de madeixas flavas,
Outras, de ébano vivo de Benin...

E eram de ver-se os cem tapetes raros
Vindos da Pérsia, e as peles de Astrakan,
Por sobre os quais os marajás preclaros
Vinham sentar-se no incontido afã
De, na nudez daqueles corpos claros,
Seus olhos embebedar de glória vã...

Vinham depois os néscios traficantes,
Uns do Mediterrâneo, outros do Sul,
A conduzir, de regiões distantes,
Tudo o que havia sob o céu azul:
Ricas peças de Espanha, delirantes,
E rapinas de Argel e de Estambul...

Enquanto, em meio àquele oceano ardente,
— Seios trementes, colos de cetim,
Ancas de róseos tons, inteiramente,
Cinzeladas espáduas de marfim,
O ouro, quando em mancheia reluzente,
Era mais do que tudo para mim...

Mas, um dia te vi: — eras morena,
Trêmula a voz, angustioso o olhar,
E no róseo da boca, mui pequena,
Feito de dentes lindos, um colar...
E os dois seios tão puros, que era pena
Que lábio humano fosse ali pousar...

E ao fim, voltando a mim, naquele sonho,
Eu, mercador, vi que era tarde já...
E tu te foste, como um sol risonho,
Para o estranho país de um marajá...
E desde então, onde os meus olhos ponho,
Luz que os faça felizes já não há...
E foi assim que, alucinado, um dia
Passei a ser escravo da ilusão
E a minha tenda e o mais que possuía
Abandonei, ao léu, lá no Industão...
É que ao vender-te, mercador, havia
Mercadejado o próprio coração!

As Luvas de N Senhora

Éramos três, os retirantes do sertão inóspito:
Eu, meu pai, minha mãe, alguns sonhos, e só.
Eles, moços; eu tinha alguns meses apenas.
E nós fomos morar no alto do Jacutinga,
Bairro de gente humilde de Maceió.

A vontade materna estava assim cumprida.
— "Filho meu não se cria no sertão!
Não terei filho para vê-lo às garras
Do cangaço e do crime,
Da ignorância, da miséria, do ódio,
Que precise matar para ganhar o pão."

Fomos viver os três num casebre de taipa.
A pobreza era tanta
Que meu pai disse assim: "Não sei se vale a pena...
Não foi para isto que você nasceu..."
Respondeu minha mãe, com sertanejo entono:
— "Se pretende voltar para o sertão, que volte;
Morreremos aqui, o nosso filho e eu!"

Sorte de retirante é assim: dias passados,
A maleita bateu impiedosa nos três...
Todos tremendo como varas verdes,
Assim ficamos quase um mês...
E cadê água para as bocas ressequidas
Pela febre? E onde o alimento, a ajuda
De alguém para fechar ao menos nossos olhos
Pela última vez?

Foi nesse instante cruel de nossa vida
Que nos surgiu Mãe Inês...
Uma manhã cheia de sol, duas mãos negras e humildes,
Ansiosas e aflitas,
Achegaram-se a mim. — "Pobre inocente...
Quase a morrer de fome..."
E no quarto se ouviu o seu fundo suspiro,
Angustiado e longo...
E me deu a beber daquele leite
Que era todo humildade e era humana ternura
E que tinha o calor de uma noite do Congo...

Ao pensar em Mãe Inês, tenho uma idéia estranha:
— Quando visita um pobre lar,
Nossa Senhora, femininamente,
Calça umas luvas de veludo negro
Para nos amparar...

Os que Vêm de Longe

Vocês não queiram mal aos que vêm de longe,
aos que vêm sem rumo certo, como eu vim;
as tempestades é que nos atiram
para as praias sem fim...

Os que vêm de longe, os que vêm famintos,
os que vêm rasgados de dar compaixão,
os olhos parados, os pés doloridos,
pisando saudades calcadas no chão...

Vocês nunca souberam o que é tempestade
na vida de um homem... e nem saberão!
É a seca na mata... é o mato rangendo,
é a terra tostando, virando zarcão...

É a gente morrendo na estrada vermelha
vendo trapos humanos lutando com o pó...
E as levas se arrastam penosas na estrada,
enchendo as estradas de angústia e de dó...

É a gente, sentindo tonturas na alma,
piedade divina dos céus implorar,
e ver que somente uma gota nos brota
dos olhos cansados de tanto chorar...

É o gado morrendo de fome e de sede,
morrendo e mugindo num doido clamor,
e a gente morrendo de sede, e sonhando...
— a gente tem mesmo de ser sonhador... —
sonhando com água, que ao menos o gado
liberte da angústia da sede e da dor...

E os trapos humanos se arrastam rezando,
caindo, chorando,
sofrendo e clamando por Nosso Senhor...

É a gente ter nalma esperanças e sonhos,
viver da ventura dos olhos de alguém,
um dia encontrar a palhoça deserta
e saber que, faminta, arrastando-se além,
aquela que amamos a leva maldita
levou-a também...

É a gente sofrendo de ver a desdita
sorrindo dos homens... Olhar para o céu,
fechar a palhoça e sair pela estrada,
sem rumo, sem nada, dos ventos ao léu...

E o céu lá em cima piscando de quente...
Lá longe a palhoça ficou, triste e só...
Um fiapo de nuvem vem vindo... vem vindo...
e a gente vai indo com os olhos na nuvem,
os pés escaldando na areia e no pó...

Depois, já se sabe... Depois é isso mesmo ...
a gente vem vindo, tal qual como eu vim,
sem Deus, sem destino, sem sorte, sem nada,
até dar à costa num mundo sem fim...

Vocês não queiram mal aos que vêm de longe,
rasgados, famintos de dar compaixão...
os olhos na terra ... os pés doloridos...
pisando saudades calcadas no chão ...

Recompensa | Poema de Judas Isgorogota com narração de Mundo Dos Poemas
170 - Divina mentira - Judas Isgorogota
Judas Isgorogota - Um dia eu chegarei [Poema]
Judas Isgorogota - Suave Lembrança
Judas Isgorogota - A visita das sombras #Poema
Os que vêm de longe - Judas Isgorogota
Eu errei muitas vezes - Judas Isgorogota
Judas Isgorogota - A escalada #Poema
O herói ‒ Poema de Judas Isgorogota
Francesco Cavallini, Alma Brasileira (Cover) by Fernando Magalhaes & Judas Isgorogota (Rare Version
Judas Isgorogota - Cantiga de Cangaceiro [Poema}
Historiador Edberto Ticianeli fala sobre o aplaudido escritor Judas Isgorogota.
O que são versos e estrofes? | poema: O Herói- Judas Isgorogota
Poema Atitude de Judas Isgorogota
Traição e o engano de Judas - Raul Teixeira
Vídeo Poema | Queima do Judas Vila do Conde 2021
Poetas Oskhuros Judas Funerario
Judas
ALMA BRASILEIRA - Jake Sanders & Dennis Lichtman
Poema HERÓI DE TI MESMO, de Merlanio Maia
Francisco Mignone - A sombra (Maria de Lourdes da Cruz Lopes, soprano; Francisco Mignone)
Projeto: Vultos da Literatura Alagoana
Judas
Déo Rian | Alma brasileira | 2012
Testamento do Judas 2022 - Quem subornou judas?
ALMA BRASILEIRA de Fernando Magalhães eJudas Isgarogotas
Poesia: Heróis
AMARGA SERENATA - Jorge Amaral
Gislene Ramos canta Octavio Maul com Evan Megaro, piano
Judas
23 de Abril - Papagaio Sabido
CANOENSES (LAGOA DA CANOA)
Confusões do meu pai
Poema HERÓI de Merlanio Maia
VALSA DO BEIJO...... (The kiss waltz)....... FRANCISCO ALVES
"O Olimpo das páginas do Expresso", madalena castro campos
Alma Brasileira
🛩️ LAGOA DA CANOA - ALAGOAS, cidade encantadora e de muito ilustres (Hermeto Pascal, DIDA e outros📌
Sofrer e brilhar (poema 286 - Mário Frigéri)
Veja a amizade de enferrujado (gato)e taiobinha (cachorrinho ).
Errei muitas vezes
Alma Brasileira
Violino No Choro | Oficina e Masterclass
Poesia no Clube Olimpo (6)
Alma Brasileira
Ainda suja - Nei Duclós
Trip to Broadford / Flying Home
Alma brasileira. (Radamés Gnattali) Arr. Nicolás Gagliani
Ao Leitor | Poema de Lasana Lukata com narração de Mundo Dos Poemas
Alma Brasileira (Zeca Freitas)
Igor Almeida
Convencido que ainda há muito o que descobrir sobre a Literatura Brasileira e Alagoana.
23/maio/2023

Quem Gosta

Seguidores