Clóvis Moura

O Rio Parnaíba


Gargarejo de mortes de afogados
e brilho de luar sobre o silêncio
ruídos sem barulho de asas brancas
invisíveis na esteira do mistério.

Embarcações fantasmas com seus remos
violando o espelho da corrente
e a história dos antigos moradores
que perlustraram a estrada do degredo.

Nas margens as perguntas os inquéritos
o tiro a interjeição e a morte cinza:
gargalhada de álcool nas bodegas.

A indiferença escorre como gosma
e o rio na derrota da incerteza
leva faunas estranhas no seu ventre.

Rio Seco


Cemitério de peixes enterrados
no areal ardente e transparente,
pedras que furam os pés dos caminhantes
marcaram a transferência dos sedentos.

Pedaços de memórias marulhantes
ainda chegam à noite nos seus ecos
e roteiros de barcos são fantasmas
na memória de luas macilentas.

Há no sol que caustica as suas curvas
um sádico desdém por suas margens
que hoje se fundem ao leito que era líquido.

As carcaças de tíbias e caveiras
de bois marcam a distância do mistério
e o suor é sua linfa derradeira.