Maldito frio que vadio, vais vadiando nos meus sapatos
Arrefecendo os dedos rotos nas meias andanças
Atrasas-me a mensagem, que trago envolta nos trapos
Que finos um dia, são agora rasgões expostos às lembranças
Maldito frio que vadio, no beco mostras a minha pobreza
Sei que a garrafa que envergo, meia cheia de esquecimento
É também meia cheia de céu cinzento que recordo,
bebendo na certeza de esquecer gentes que amei
quando sem trapos nem rasgões, no sentimento
Maldito frio que vadio, me lembraste de partir
Para pedir moeda quente que te faça fugir
Pois pobreza, meu corpo e alma estás a cobrir
E o bendito sol hoje tarda, por muito dormir
Todos os dias tem sido nublados e opacos
Mas frio assim só hoje que aqui desisti
Das andanças que não eram meias de dedos rotos esfriados
Cativamos num olhar
Noutro libertamos o nosso amar
Depois de libertado nunca quer regressar...
Prende-se no tempo, mergulhado nas ilusões
De nosso cativo que cativou o nosso gostar
Cativamos numa fala
Noutra falamos sem nos calar
Atropelando peões na passadeira
Na língua atrasada do pensamento a brotar
Ser cativo não é mera brincadeira por falar
Cativamos o tempo
Mas ele não nos liga, foge sem parar
Anda sessenta léguas rodadas num minuto
Para em segundos, anos de nós separar
Quando escrevi isto era um mero “puto”
Desde que deixei o relógio a embolorar
O tempo parece estagnar, o sol e lua ignorar
Mas vivo atrasado de tudo… quem sabe se a morte
Não me deixa por ela passar… sem ter de a cativar
Quando me procuro inspirar
Oiço o distante marejar
Sob o por do sol a chegar
Preso numa flor a despontar
E perco-me no teu olhar
São estas coisas; as forças da natureza
De que gosto realmente de falar.
Ô Mãe mui amada, quanto do teu chorar
são lágrimas do meu olhar.
Por tanto gostares, quanto de ti abdicaste
Quantos sonhos, em teu rosto secaste
Quantos sorrisos feitos de Sal, envergaste
Para que no mundo fosse Pessoa, ô Mãe
Valeu o esforço? Sempre vale o esforço
Quando se é a alma de outra alma
Se luta contra um mundo Adamastor
nos cabos de Tormentas dobradas em dor
Que Deus te dê mais anos que a eternidade
Pois eterna já és, presa na minha felicidade
Parabéns, Mãe
Estejas onde estiveres,
no meu coração sempre morarás
J. P: Madeira
As coisas patéticas são as mais embaraçosas
As coisas poéticas são as mais dolorosas
A poesia por vezes torna-se patética
Na dor de um quase silêncio embaraçoso
Uma multidão não são muitos
Apenas alguns “multi” que tudo de si “dão”
Mas são esses “Multi” facetados que a cor “dão”
O melhor que há em nós, tornando-nos numa multidão
Se a humanidade fosse compreendida
O desemprego era psicólogo
Mas se a vida fosse entendida
Nunca nasciam filósofos
Porém,
se o desemprego fosse psicólogo
E nunca nascessem filósofos
A humanidade estaria da vida perdida
Não quero ser tambor desconhecido na banda da vida
Rufando sem nunca ser mais que um ruido devasso
Cruzando compassos em monótona avenida
Num eterno e circunflexo marcar do passo
...
Não quero ser grito nem desespero ecoado
Saltando esquinas de bocas sem me calar
Em frases agredindo o coração pesado
De quem nada mais tem para falar
Não quero ser vilão nem herói em contramão
Salvando dias das noites amarguradas
Que os tentam secar com escuridão
Em palhas de camas enciumadas
Quero apenas ser a cor da alma,
rasgando céus em ósculos de estrelas
Cavalgando sonhos à desfilada,
Levando a juventude em mim enfiada
E se o mundo um dia me vir no meu todo
Saberá que todo eu serei um mundo nesse dia
Pois a viagem foi terminada com sincera alegria
Que neste comboio de anos, apita ventos de simpatia
Mas quando me vejo na banda a tocar
Preso num grito do meu olhar
Que chama o vilão para o herói ajudar
Sei que o final é agora e vem veludo para me buscar
Só que eu não quero abalar, sem o meu mundo
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Oxalá fosse mar para nas areias brancas finas me [entranhar e acordar] (acabar)
Oxalá fosse homem para uma família e preocupações parentais arranjar
Tomara ser humano para os extra terrestres caírem na Janela do meu sótão
Tomara ser maior para poder os remédios adoentar nas minhas mãos de anão
Mas nem o oxalá nem o tomara fazem por ser o que fosse
Nem no mar se fez o homem que apenas humano sonha maior
Mas uma paixão transforma uma nação, como chuva na monção
Um pequeno homem move mundos sem de força precisar
Basta esperança numa mão de amor para o coração animar
O mar também poderiaajudar…
Oxalá consiga um sótão comprar que a Janela é fácil de arranjar,
Pois sou anão no arriscar e consigo nela escapar
Vou mais coisas destas ansiar no meu livro de imaginar
Onde as estações são dimensões de uma quarta meia da semana
Onde eu tomara ser sempre Primavera num oxalá nunca nevar
Vou onde a família que me fez homem deixar
Rasgando o Universo, entre portas de um lar
Onde filhos são irmãos, gato e rato a brincar
Mas não os deixo ir ao sótão…isso, nem pensar
Porque tentamos o mundo dos outros mudar
Se por vezes nem o nosso conseguimos rodar
Porque nos atrevemos a criticar apontando dedos
Que se refletem em espelhos cheios de nossos segredos
Porque sorrimos com máscaras feitas de conveniência
Quando de caras não sorrimos com tanta frequência
Porque invejamos os outros que são nossos ideais
Se todos somos iguais, apenas frágeis e complicados mortais
Apenas porque somos meros humanos,
neste mundo (re)nascidos como crianças
Mas o criador até nos deu os seus planos
Só que vivemos tão atreitos das mudanças
Que nem tememos o abismo intransigente
Onde nos lançamos por uma birra incontinente
Se por um erro num dia
Cada humano se ajoelhar
Teremos plantações de joelhos
Que durarão eternidades para regar
Só que a eternidade é algo que criámos para justificar aquilo que não conseguimos contornar
Que eternamente seremos humanos, com defeitos e qualidades tão admiráveis
onde até o mal conseguimos fazer tão bem, tão perfeito
que até num milagre conseguimos encontrar um defeito
mas num trovão de emoções, corremos para nos abrigar
apertando o coração contra os outros para nos confortar
e o nosso olhar torna-se criança e até conseguimos fazer…
o nosso pequeno mundo rodar.
J. P. Madeira