RicardoMariaLouro

Teu Seio




Toma-me ó vida
em teu regaço extenso,
em teu seio sagrado e oculto
num gesto longo e profundo!

Deus!
Vida implantada no meu rio,
espiral de brilho e memória
onde a Morte desvanece!

És sopro,
Tempo,
Alento,
Vento ...

De um Triste Solitário - soneto




E há poesias nos meus lábios
excessivamente fechados
há tristezas nos meus olhos
paradoxalmente cerrados ...

Como se d'um morto se tratasse
meu corpo está cansado
e meu coração talvez parasse
se não batesse descompassado.

Há tantas estrelas invertidas
tantas mágoas concebidas
no meu Céu em solidão ...

E o que faço a tantas horas
de tristezas e demoras
enterradas neste chão?! ...

Palavras Inquietas




Há palavras inquietas
A bailar na minha mente
é o sangue dos Poetas,
Minha terra, minha gente ...

Bailam versos nos meus dedos
Tempestade que me acalma
O que sinto é meu segredo
Bailam rimas na minh'Alma.

Eu não sei o que me prende
Ao desejo de te amar
A minh'Alma não entende
Se há-de rir, se há-de chorar.

E como baila a solidão
Há palavras inquietas!
Porque bailam sem razão
Nas Almas dos Poetas?!...


Íntima Partilha




Senhor,

aceita-me como sou!
Com esta sede de amor
que me consome o viver
que me tira o fulgor
e antecipa o morrer ...

Aceita o vidro partido
de que é feito o meu coração
a Alma entornada
sem casa nem chão
cheia de noite, vazio e nada ...

Aceita os versos que canto
e que no caminho te dou
os que ponho no pranto
por não ver o Eterno
no Transitório que sou ...

Páginas




Há páginas em branco
No meu peito, por escrever,
Mas é triste sou-vos franco,
Porque afinal ninguém quer ler.

É pesado o meu destino
Num silêncio a doer
Eu tão só pelo caminho
Sem saber o que dizer.

Há no livro do meu ser
Tantas linhas por traçar
E da saudade de te ver
Tantos versos por acabar.

Hora Triste - dois Sonetos de despedida




I

Quando eu partir, e sei que em breve partirei,
não deixem de me lembrar como sempre fui
e acreditem que para sempre viverei
nos campos e na água que dos Rios aflui ...

Quando eu morrer, e acreditem, não demora,
não deixem de pousar nos meus olhos uma flor!
E embora seja triste, a languidez da hora
será prova de de que entre nós havia amor ...

A viagem traz outro sítio a alcançar,
espaço onde haverá em mim lugar p'ra todos Vós,
e farei a travessia, sem medo, embora só!

Mas levarei comigo os momentos que vos dei
na certeza de que afinal, aonde vou, não sei,
só sei que digo adeus com pena d'ir e não voltar!


II

Mas este adeus não será um adeus p'ra sempre,
na verdade, viverei nos vossos corações,
não chorem, pois quem chora alto, mente,
chorem para dentro, é lá que estão as ilusões ...

E é lá que estão os sonhos, e os versos,
e tudo o que se almeja um dia encontrar,
é lá que estarei eu, no fundo do desejo
de em qualquer parte, nos podermos abraçar!

Eu não sei se voltarei! Ninguém jamais voltou!
E na verdade quem parte nunca leva
a tristeza dos olhos de quem ficou ...

Mas quem fica, não sabe a tristeza que levou
quem morreu, e não há Poeta que descreva
o que sentiu, quem com a Morte se encontrou!

... adeus ... adeus ...


Amor sem Esperança - fado




Canto este fado para ti
da força que vem de mim
por não ver o teu olhar;
ai que tortura o Passado
ai que desejo magoado
não poder e querer voltar.

E que silêncio me arrasta
nesta hora que não passa
já não sou de ninguém;
vou-me embora ao de leve
e que a vida seja breve
por não ter o amor d'Alguém.

E por onde me levas
ó Destino, por que Trevas,
se não chego a lugar nenhum;
adeus quem me viu nascer
vou-me embora p'ra esquecer
que nunca tive amor algum.