A PASSAGEIRA
Entrou no carro e, por um breve momento, senti um longo arrepio perpassar-me o corpo inteiro. Estranhei aquela frieza mórbida, brusca e repentina, porquanto a noite estivesse quente e abafadiça.
Em silêncio, sentou-se no banco do carona e calada permanecera durante toda a viagem. Dúvida atroz, meu Deus! Era a Doninha? Podia jurar que sim! Mas agora, olhando de pertinho para aquela figura decrépita, velha, enrugada, muda e silenciosamente fria, sentada bem ali do meu lado, no banco do carona, a dúvida tomou-me de sobressalto.
Eu desço ali – aquela voz oca e fúnebre retiniu nos meus ouvidos como um raio disparado de densa nuvem em noite de tempestade.
No céu carregado, os trovões ribombavam anunciando o início de um aguaceiro que não tardou muito para desabar, acompanhado por um temporal violento e assustador, obrigando-me a fechar as janelas do corcel que, impetuosa e furiosamente, galopava na estrada prateira cheia de lombadas e de estrias e foi, então, que senti um cheiro acre e nauseabundo de flores que fedem a defunto misturado com a catinga azinhavrada de carniça podre.
- Eu moro ali – disse-me, apontando com o dedo longo e magricelo para um lugar deserto, solitário e descampado de onde mal se avistava alguma coisa.
Naquele mesmo instante, deu para ver um raio saindo de uma nuvem escura numa violência tão grande que rasgou o chão, fazendo levantar um redemoinho de água, poeira e pó. Nas palmas dos coqueirais, o vento rugia feito lobos-guarás e o grito do rasga-mortalha estrondava que nem estampido de canhão na guerra e o tempo se encerrou numa manta negra, pintando um cenário de medo e horror.
No dia seguinte, fui à visita de sétimo dia, levando os familiares de dona Di, uma velha macrobiótica que bateu as botas na cidade de Altos, mas que fora enterrada no cemitério do distrito da Prata.
Chegando ao local, alguns aspectos me pareceram bastante familiares. Lembrei-me da noite passada e, por um momento, como num insight, surgiu bem nítida à minha cabeça a imagem daquela mulher de cabelos baços, sujos, quebradiços e desgrenhados, de olhos fundos, com faces ocas e de rosto escaveirado que havia descido ali.
Arrepiei-me todo quando, de repente, entre as sepulturas, vi encravada na lápide de uma delas, a imagem de uma jovem vigorosa, forte e saudável, mas que, em muito, me lembrava à passageira da noite anterior.
Um tremor espasmódico tomou conta do meu corpo e um frio de morte, correu-me pela espinha dorsal, quando fui informado, por moradores da região, que a jovem da lápide era a noiva lá das Porteiras Velhas que, numa noite de maio, enquanto os pais estavam ausentes, se vestira de noiva, untara o corpo com óleo e ateara fogo ao próprio corpo, tamanho o desgosto por não desposar o noivo amado.
Em silêncio, sentou-se no banco do carona e calada permanecera durante toda a viagem. Dúvida atroz, meu Deus! Era a Doninha? Podia jurar que sim! Mas agora, olhando de pertinho para aquela figura decrépita, velha, enrugada, muda e silenciosamente fria, sentada bem ali do meu lado, no banco do carona, a dúvida tomou-me de sobressalto.
Eu desço ali – aquela voz oca e fúnebre retiniu nos meus ouvidos como um raio disparado de densa nuvem em noite de tempestade.
No céu carregado, os trovões ribombavam anunciando o início de um aguaceiro que não tardou muito para desabar, acompanhado por um temporal violento e assustador, obrigando-me a fechar as janelas do corcel que, impetuosa e furiosamente, galopava na estrada prateira cheia de lombadas e de estrias e foi, então, que senti um cheiro acre e nauseabundo de flores que fedem a defunto misturado com a catinga azinhavrada de carniça podre.
- Eu moro ali – disse-me, apontando com o dedo longo e magricelo para um lugar deserto, solitário e descampado de onde mal se avistava alguma coisa.
Naquele mesmo instante, deu para ver um raio saindo de uma nuvem escura numa violência tão grande que rasgou o chão, fazendo levantar um redemoinho de água, poeira e pó. Nas palmas dos coqueirais, o vento rugia feito lobos-guarás e o grito do rasga-mortalha estrondava que nem estampido de canhão na guerra e o tempo se encerrou numa manta negra, pintando um cenário de medo e horror.
No dia seguinte, fui à visita de sétimo dia, levando os familiares de dona Di, uma velha macrobiótica que bateu as botas na cidade de Altos, mas que fora enterrada no cemitério do distrito da Prata.
Chegando ao local, alguns aspectos me pareceram bastante familiares. Lembrei-me da noite passada e, por um momento, como num insight, surgiu bem nítida à minha cabeça a imagem daquela mulher de cabelos baços, sujos, quebradiços e desgrenhados, de olhos fundos, com faces ocas e de rosto escaveirado que havia descido ali.
Arrepiei-me todo quando, de repente, entre as sepulturas, vi encravada na lápide de uma delas, a imagem de uma jovem vigorosa, forte e saudável, mas que, em muito, me lembrava à passageira da noite anterior.
Um tremor espasmódico tomou conta do meu corpo e um frio de morte, correu-me pela espinha dorsal, quando fui informado, por moradores da região, que a jovem da lápide era a noiva lá das Porteiras Velhas que, numa noite de maio, enquanto os pais estavam ausentes, se vestira de noiva, untara o corpo com óleo e ateara fogo ao próprio corpo, tamanho o desgosto por não desposar o noivo amado.
3301
1
Mais como isto
Ver também
Maria Deusimar Sousa Carvalho
Belíssimo ??????????????????????????????????????????????????????
14/fevereiro/2019
Escritas.org
