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A Valdomiro Silveira Cisma o cabloco à porta da cabana. Declina o sol, mas, rúbido, espadana Ondas fulvas de luz. No terreiro, entre espigas debulhadas, Arrulham, perseguindo-se a bicadas, Dois casais de pombinhos parirús. A criação de penas se empoleira; Come a ração no cocho da mangueira Um velho pangaré. E uma vaca leiteira e bois de carro Pastam junto à casinha, que é de barro, Coberta de sapé. Longe, uma tropa trota pela estrada. E a viração das matas, impregnada De perfumes sutis, Traz dos grotões, que a sombra, lenta, invade O soturno queixume de saudade Das pombas juritis. Cisma o cabloco. Pensa na morena Que vira numa noite de novena Orando ao pé do altar. Que vira... e que, por mal de seus pecados, Tinha os olhos profundos e rasgados E um riso de matar. Branco, de fofos, era o seu vestido. E ele, ao vê-la, sentindo-se ferido Em pleno coração, Baixinho suspirou: 'Nossa Senhora! Ai, meu São Bom Jesus de Pirapora Da minha devoção!' Depois não se conteve e, num fandango Furtou-lhe um beijo aos lábios de morango O diabo do rapaz. E ela volveu zangada: 'Malcriado! Seu vigário já disse que é pecado. Aquilo não se faz!...' E o caboclo medita. O sol em chama Como agora há pouquinho não derrama Ondas fulvas de luz. O corrego soluça, a noite desce, E vem dos capoeirões onde anoitece O trilo vesperal dos inambús. In: GONÇALVES, Ricardo. Ipês: versos. Pref. Monteiro Lobato. São Paulo: Monteiro Lobato, 1922
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Ricardo Gonçalves
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