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Eu tenho uns amores — quem é que os não tinha Nos tempos antigos! — Amar não faz mal; As almas que sentem paixão como a minha Que digam, que falem em regra geral. — A flor dos meus sonhos é moça e bonita Qual flor entreaberta do dia ao raiar, Mas onde ela mora, que casa ela habita, Não quero, não posso, não devo contar! Seu rosto é formoso, seu talhe elegante, Seus lábios de rosa, a fala é de mel, As tranças compridas, qual livre bacante, O pé de criança, cintura de anel; — Os olhos rasgados são cor das safiras, Serenos e puros, azuis como o mar; Se falam sinceros, se pregam mentiras, Não quero, não posso, não devo contar! Oh! ontem no baile com ela valsando Senti as delícias dos anjos do céu! Na dança ligeira qual silfo voando Caiu-lhe do rosto seu cândido véu! — Que noite e que baile! — Seu hálito virgem Queimava-me as faces no louco valsar, As falas sentidas que os olhos falavam Não posso, não quero, não devo contar! Depois indolente firmou-se em meu braço, Fugimos das salas, do mundo talvez! Inda era mais bela rendida ao cansaço, Morrendo de amores em tal languidez! — Que noite e que festa! e que lânguido rosto Banhado ao reflexo do branco luar! A neve do colo e as ondas dos seios Não quero, não posso, não devo contar! A noite é sublime! — Tem longos queixumes, Mistérios profundos que eu mesmo não sei: Do mar os gemidos, do prado os perfumes, De amor me mataram, de amor suspirei! — Agora eu vos juro... Palavra! — não minto! Ouvi-a formosa também suspirar; Os doces suspiros que os ecos ouviram Não quero, não posso, não devo contar! Então nesse instante nas águas do rio Passava uma barca, e o bom remador Cantava na flauta: — 'Nas noites d'estio O céu tem estrelas, o mar tem amor!' — — E a voz maviosa do bom gondoleiro Repete cantando: — 'viver é amar!' — Se os peitos respondem à voz do barqueiro... Não quero, não posso, não devo contar! Trememos de medo... a boca emudece Mas sentem-se os pulos do meu coração! Seu seio nevado de amor se entumece... E os lábios se tocam no ardor da paixão! — Depois... mas já vejo que vós, meus senhores, Com fina malícia quereis me enganar. Aqui faço ponto; — segredos de amores Não quero, não posso, não devo contar! Rio, 1857 Imagem - 00300001 Publicado no livro As primaveras (1859). Poema integrante da série Livro II. In: GRANDES poetas românticos do Brasil. Pref. e notas biogr. Antônio Soares Amora. Introd. Frederico José da Silva Ramos. São Paulo: LEP, 1959. v.
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Casimiro de Abreu
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