fotografia de guerra
o menino de camisa vermelha e sapatinhos
marrons estirado na areia do mar gélido da
Turquia migrou para a palavra e se afogou
no meu poema
a menina de moletom rosa-choque
desenhado com delicadas e surradas
borboletas tapando os olhos da boneca
esfarrapada impedindo a visão do tapete de
mortos no chão da Síria impregnou de medo
a palavra e se escondeu no meu poema
as crianças sem cabelo de pupilas
esbugalhadas e nuas estendendo as mãos
sem cor para os visitantes da Somália me
deram a mais difícil aula de anatomia e
ofertaram a palavra fome para o meu poemaDIFERENÇA
meu amor ouve fado
não rodopia
apenas baila e espreita.
eu gosto de tango.
minha mãe sempre diz:
seus olhos são trágicos.diáspora
abro os olhos
e a quarta-feira é cinza
as taras da noite me perseguem
neste quarto de hotel
é bom acordar sem deus
descer a rua
e ver o mesmo flanelinha no ofício
diáspora
palavra que me segue
sem pedir perdão
sou retalho carne dilacerada
fragmento escuridão
abro as pernas no sinal
os carros passam
e o vento leva pó para o meu rosto
a noite chega
a quarta-feira é cinza
e faz tanto tempo que me perdi de mimCÉU DE CONFEITEIRO
uma fatia de céu
é dada
nesta noite de maio
quinhão que cabe ao homem
que da janela espera
a urbe apita
e o calor
se faz bruma e precipício
uma fatia de céu
é dada
aos amantes da varanda
quinhão que cabe ao amor
em tempos de luas magrasa mulher virou homem
: a mulher virou homem o trabalho
e a desigualdade por baixo da saia: trouxa
na cabeça camisa cáqui de mangas compridas
chapéu de palha quartinha de cabaça e só
calça comprida por baixo da saia
calça comprida por baixo da saia
calça comprida por baixo da saia