Luís Filipe Maçarico

Alentejo


Alentejo terra de vento e silêncio
onde o Homem semeia a Palavra
Alentejo terra de sonho e sofrimento
onde o poema tem sede de flores
e rios. Como quem faz um pão,
escrevo à sombra das tuas oliveiras.

E canto o vôo altivo das cegonhas.
Esta leveza de viver em ruas brancas...

(Mértola, 1994)

REQUIEM POR UM CHOUPO


Era uma cidade com aromas de viagem,
Aquela onde um dia fui criança,
Esta noite estrangularam outra árvore habituada
A ver-me passar, e ninguém se importou com o assunto.
E eu que varri muitas folhas derramadas dessa farta
cabeleira num Outono já distante estremeci
com o ruído seco do velho choupo a morrer.
Aconselharam-me a ficar calado: Não há tempo para escutar
canções de melros entre ramagens.
Mas sou teimoso! Ridículo é aceitar que o alcatrão
vença e os anestesiados se dirijam cada vez mais velozes
para a sua verdade infeliz!
Então peguei no meu caderno de emoções
e escrevi com uma lágrima de raiva:
Quando a cidade não ama
As suas árvores, que medalha
deverá um Poeta pôr no peito
dos que a governam?

No Cripto-pórtico de Mértola


I
Quantos ditosos
trazendo flor de oliva
em seus cabelos
provaram do teu pão,
ó prodigioso celeiro?

II
Quantas bocas
sarracenas se
dessedentaram
em tua água silvestre,
ó rumorosa cisterna?

III
Quanta fatal decisão
em nome da Santa Cruz
no teu ventre vazou
proscritos,
ó sombria prisão?

(Mértola, 1994)