Cravos Flamejantes
Gostava de poder imprimir
Os sonhos que se evadem
Ao ritmo da chuva
E das pedras seculares
Cultivo a dissidência da vida
Com a força de um poema
Na boca trago os cravos flamejantes
De uma aventura com o teu nome,
Por mote
Epílogo
Sou uma manhã que se arrepende
Sempre que a aurora toma a forma do medo
E da janela do meu tempo se escondam
dois olhos em súplica
Como se fossem o epílogo anunciado
De uma alma que não lhes pertence
Murmúrio incerto
Sente o vento
Que gela a sombra na palavra
Deixa que o olhar se demore
para além do instante
Há muito que me deixei partir
Sobra a leve memória
E o murmúrio incerto das arribas
E dos dias gastos
Que deram à costa
Luas
Há tantas luas
Que não me sorrias
Que as rugas te tornaram bela e eterna
Nestes meus
teus olhos idosos
Que não te perderam a idade
Nem a forma
Nem o gosto
Nem a chuva que nos calava
Nem a chama que nos perdurava
Amarras
Não me falta o anoitecer
Porque o amanhecer já não me espera
Deixei de acontecer
Porque as manhãs me pesam
Restam-me as escarpas por promessa
E a cobardia das amarras
Que não desatam
Já não sei quem sou
Nem de que poema me faço
Morri no tempo
Porque o tempo também me morreu
Estou cansado de estar cansado
Nem sei se grite ou se rasgue a página
Se declamo ou se parto
Porque este poema
Se um dia for lido
É porque estarei fora do tempo,
Esquecido
Deixado aos livros
Formas em sonhos
No teu deserto
Habitam formas em sonhos
Olhares nocturnos
O antes e o depois
Como se a expectativa
Nos fosse um afago maior
Palavras soltas
Um beijo que sabe a tudo
Dito pelas nossas bocas
Falado pelo olhar
Sentido nas palavras soltas
O teu corpo é prosa
Escrevo-o na sede do momento
Rimas em silêncio ditas ao acaso
Num respirar cego
Poetamos naquele bocejo de alvorada
Como se o mundo fosses tu
E não houvesse mais nada
Degelo
Bebi-te num rio numa manhã de degelo
Tacteavas a pedra polida
Como se tivesses lábios de desejo
Percorrias as entranhas nos fiordes
Num frenesim sensual
Derretias os prados fumegantes
Mitigavas-me o anseio ardente
Nos teus lábios quentes
Mordias o verde até ser rio
Morrias-me na foz até ser gente
Dedos Trémulos
Por entre dedos trémulos
Que te olham
Só um poema te deixa na boca,
o que sinto
Axiomas do Tempo
Perco a voz em cada esquina
Levo nos passos os axiomas do tempo
E, nos olhos,
todos os mares por chorar
Ruas Ausentes
O teu amor tem a finitude
De um beijo
E das ruas sem nome
A tua ausência é um cais que parte
Nas primeiras chuvas de outono
O que me consome não é a saudade
Mas, sim,
os poemas que te procuram
Memória Distante
Quando a minha existência
for apenas uma memória distante
verás que, para além do poema,
nada mais subsiste
que a dor imensa de o ter escrito
Coração empedernido
Quando a lágrima
se substitui ao verbo
e o verbo jaz
em coração empedernido
não há intento onírico
que afague a montanha
nem nuvem
que beije a encosta
Outono
Que sabes tu, Outono
Dos rios que choram
E da chuva que dói?
Que sabes tu, Outono
Do choupo desnudo
Quando o vento acontece?
Que sabes tu, Outono
Da folha que tomba
E da morte que nos enternece?
A noite
Tudo passa,
O amor,
O poema
O futuro,
A noite,
E a paixão de uma vida escassa
Tudo passa em sombras
Quando o tempo se esquece
Até o céu
E a lua
E as minhas lágrimas no teu rosto
O beijo à meia luz
Sem ti,
Tantas vezes morri
No meu desgosto
Poema maior
Há um poema que me deixa a meio
O de sentir que a palavra me foge
Para as noites da nossa pele
Poema que sente
Prefiro o voo das aves
À indiferença da palavra
Prefiro a insanidade
À distância que dói
Prefiro a cicatriz que lembra
À memória que fere
Prefiro o abraço que demora
Ao beijo que foge
Prefiro o poema que sente
Ao verso sem voz
Prefiro o suicídio no poema
Ao sonho que acorda
Na Intimidade de um Poema
Na intimidade de um poema
Desnudo-te a voz e os
Abraços inconfessáveis
Na intimidade de um poema
Cabem todas as palavras mudas,
Os olhares cegos
E as madrugadas de uma vida
Na intimidade de um poema
Escreve-se a noite
E o beijo demorado,
O olhar nu
E o verso involuntário
Dos amantes que rimam
Orgulho
Estás perdoada
Se é o não que temes
Sempre aqui estive
Desde que a Primavera era flôr
Não sei quantos mais Invernos irei estar
Talvez enquanto o teu abraço ainda tiver cheiro
Do teu pedestal feneces calada
Afogaste o amor e osculaste o orgulho
De olhos vendados
Abraças-me em sonhos
De olhos calados
Sonegas-me o corpo
E tudo para seres forte
Aos olhos de muita gente
Quando tens carne e sangue que sente
Na dor maior
Quando ao coração se mente
Grito Profuso
À força do nome
Ergue-se o grito profuso
Da dor já morta
Um corpo em chamas
Clama pela chuva que não chega
Enquanto a talha corrói os dias lentos
E na carne se soltam os opróbrios
De uma vida que já não ouve
Nereidas
Lembro-me do tempo
em que eras mais bela que as Nereidas
Tocava-te a medo
Tal como a gloce beija a pétala
E nesse olhar fugidio
Cabiam todos os sonhos
E os passeios à chuva
Sempre as madrugadas
Começavam pelo teu nome
O Beijo
Osculo-te devagar
no acabar do tempo
Deixa que o olhar te demore
sem que desfaça o silêncio
Fala-me do céu e dos rios que correm
das manhãs floridas
e da pele que vicia
das mãos que sobram
ao degelo da vida
Sente a penumbra que seduz
e a boca que anoitece
o perfume curvo
e os corpos que amanhecem
Aforismo
Somos todos iguais na diferença.
Mas é isso que nos separa no preconceito
e nos une na mortalidadeMeia Lua
Meia lua incompleta
A noite ergue-se, profusa
Deambulo uma candeia
O corpo suporta-me
na tua ausência, meia maré
Sonho-te sem rosto
desde que és,
Arrasto o passo, beijo-te a sombra
Abandono-me ao ermitério
E aos dias gastosErmitério
Há um poema
Que me lembra
O vento das vozes cansadas
E das noites a fio
à espera das madrugadas
Na reclusão das eras
E no ermitério das idades
Aguaceiro
Não fosse o tempo
Abrigar-se
Em aguaceiro destemido
Nunca a prosa
Me choveria nos tristes
Dedos,
Nem o céu teria
A cor
Do que sinto
Causas incertas
Deixo-te nas mãos as causas incertas
E no olhar o apedrejar dos tempos gastos
és morfina inglória,
Beijo-te ao acaso,
Enquanto um véu semântico
Tombado na tua fonte
Sacia a minha sede
Até ao infinito das eras
Asas do teu sorriso
Se o teu nome ainda se escreve poema
é porque o sonho acorda tarde
e o beijo se demora em ti
e as asas do teu sorriso
são os anjos dos dias
por te escrever
Poente
Adoro a música em ti
que as nuvens fazem ao entardecer
Escrevem paisagens de lume
Nos teus cabelos a poente
Enquanto o olhar anoitece
Deixas-me um sorriso por promessa
E o sentir que os dias gastos
escrevem a tua idade
quando já nem no tempo
te pertenço
Azul
O mar fica-te tão bem
quando vestes de azul
Não sei ao certo de que estrela
nasceu o teu encanto
se do teu sorriso
se das manhãs de Orfeu
Floresta
é na floresta
que habito o mundo
onde o sonho se agiganta
e o trevo se adensaSombras sem vida
Choro‑te,
sem que percebas
que definhei naquela sombra lânguida
que morreu para lá dos ciprestes,
oca,
sem o teu sussurro ter
Sem Rosto
Era uma vez um sorriso sem rosto
De olhar assustado
Atrás de uma máscara
Triste e calado
São os tempos do contratempo
Que nos tiraram o tempo
Num mundo desumanizado
Estranho,
Preso no seu tempo
Ausente no pensamento
Desconfiado,
Que olha para dentro,
Deixando o abraço em confinamento
Os dias ao acaso,
E a morte sem lamento
Abraços
Há poemas que nos escrevem a vida
E palavras que nos rasgam os poemas
Há dor que não cabe no poema
Quando as lágrimas nos escorrem dentro
Há desilusões que nos beijam
Quando o amor nos foge
Há abraços que desatam
Quando no sonho
Não atam
Mãos que te beijam
Deixa que a lágrima te seja breve
Inocente olhar,
Candura que perdura
nas mãos que te beijam
A chuva caída
Idade do beijo
Abraça as tuas primaveras
Escuta a idade do beijo
E das borboletas que nos habitavam
Existo no poema
Para que te olhe os anos
E em cada aniversário
Te sinta
As manhãs de Dezembro
E a aurora de uma vida inteiraPoesia
A poesia é o que se dá à vida
Antes da palavra
É seiva inconformada
Substância que adoça o palato
Cala os dias
Inspira as madrugadas
É a doce forma
Que insana a voz
É tornar a arte de esculpir o homem
A mais nobre da sua essência
Claridade
Já a noite cai madura,
Do alto daquela estrela
Trovam os poetas
No mar da liberdade
A claridade soa perto
Solta as aves do paraíso
Nas guitarras da Mouraria
Fundem-se abraços
Entre amantes improváveis
Meu cravinho vermelho
teu rosto no mar
Estes são os artistas,
Os homens
E os amigos,
No palco da vida
(Poema dedicado à memória de Mário Piçarra 1947-2019, músico e poeta, inspirado
no seu último CD - Claridade)
Amor dos teus olhos
Não te apaixones pelos olhos das bocas que falam
Porque as manhãs são impuras
e o acordar
o fim de uma promessa
Apaixona-te pelo amor dos teus olhos
E pelo sorriso da criança que passa
Apaixona-te pelos dias que se dão à vida
E pela incerteza do momento
Ama a dúvida e o sonho
Jamais a noite das bocas que beijam
e
dos lábios que aos teus olhos te falamMar e Tempo
Não sei que céu ou lua me habita
Ou de que estrofe sou feito
Se fui escrito no ocaso
Ou no barlavento
Quiçá mar e tempo
Entre antítese e aforismo
Sou vento
Se grito ou lamento
Somente no poema
Encontro alento Procuro-te...
Por onde andas, amor
Que te perdi a voz
Polímnia do meu encanto
Traço breve,
Mão que te debrua o rosto
Depois dos 50
Depois dos cinquenta
Os dias ficam tímidos
Agigantam-se as noites
E a ilusão
Do tamanho do crepúsculo
Depois dos cinquenta
Pesa-nos o passado
Vivem-se pretéritos
Nem sempre perfeitos
Somam-se capítulos
À vida
De alguns parágrafos
Desfeitos
Depois dos cinquenta
Escuta-se a voz
Começa a contagem
Vira-se a folha
Bebem-se os anos
E os instantes
dessa viagem
Sem o saberes...
Já passa da meia noite
E ainda não te amei
Talvez por ser domingo
De uma vida inteira
Já é noite, faz tempo
A lua desceu sobre nós
Esta dor que não me larga
A solidão dos ossos
E o cruel silêncio das sombras
Não ando,
Arrasto-me nos dias,
Mato-me em pequenas doses diárias
Para que amanheça à noite
e te veja dormir
Já passa da meia noite
E ainda não te amei
Porque sem o saberes
Já te amava
Muito antes de te saber
Forma alada
Morro na lenta agonia
que me sobra
Até o sono não ter voz
O amor é o que me resta
Depois do poema
Ergo-me na forma alada
O corpo incinerado já não dói
Apenas o choro de preto
Daqueles que abalam
E o olhar queimado
Das cinzas que ficam
Confinamento
Confina o medo
Depura as estrelas
Deixa que a viagem te ausente
E sintas o cheiro da vida
Pinta hoje o teu dia
Dá-lhe a cor do amor
Faz das sombras um poema
E em cada nascer do sol
Abraça-o
E sê tu
Uma vez mais
Prados
Sempre que te vejo
há uma pedra em lava
que me trilha incandescente
a memória doce do teu sorriso
e de um beijo por te dar
sempre que te vejo
ardem prados verdejantes
que as saudades não querem apagar
Rosas
Não tinhas nome
quando as rosas nasceram
rosa, já tu eras
quando no céu pus a tua estrela
e te segurei a mãoPoema sem nome
O meu corpo jaz no teu passado
é desse frio que me alimento
e por ter morrido nas pérfidas
juras de amor
é que eu me lamento
São roxos,
os lábios que te escrevem,
agora mudos,
porque não te merecem
gritam dálias
numa palavra oca,
porque à cova,
descem surdos, os poemas
na tua boca
Anoitecer
A história de um homem
Faz-se ao anoitecer
Quando as sombras quedam
E a cegueira se faz ao caminho
Sorriso tímido
Não nos osculámos
Mas em sonhos
Tanto que te beijei
Esse sorriso tímido
De olhar penetrante
Fui esquecendo as tardes
E a prosa que nos escrevia
Sobrevivo às noites
E aos dias vazios de ti
Porque do teu abraço
Me ficou um sonho
A promessa de uma vida
Com um castelo dentro
Noite ao céu
Cala-se ao noite ao céu
o frio debrua o rosto
a cada passo
o lento avançar da idade
e a certeza que o chão
me sabe firme
Marés
Diz-me, quantas luas te habitam,
Sem que a noite se dê conta?
Que margens te sobram depois das fragas?
Entre marés e rugas desenhadas pelo tempo
Deixaste partir a idade ao vento
Na maresia de ontem
Morta, ao degelo
Sem alento
Naquela janela
Vejo-me naquela janela
Que se olha por dentro
Sentado no tempo
Voei para longe
Empurrado pelo vento
E quanto mais vejo
Mais longe me leva o vento
Para lá da memória
Ao sabor do barlavento
Humanidade nua
Saudades de te oscular o nome
e perder-me na lenta curva do teu rosto
Há muito que o sorriso nos perdeu
e os olhos se olham,
sem se verem
como se estes fossem a verdade
assustada e crua
de toda a humanidade nua
Idade do tempo
Se me demoro em mim
Para além da idade
É porque os anos já não esperam
E as noites ficaram maiores do que os dias
Lua por inteiro
Deixa que te tome o corpo
E a lua por inteiro
A noite súbita
De um qualquer Janeiro
Envelhecer
Há cada vez menos lugares para envelhecer
Sem passado
Ou memória
Que nos fazem esquecer
Nem no poema queremos ficar
Com medo de o acabar
Estranho significado este
Que a vida tem
Onde não nos demoramos para não envelhecer
Como se a velhice fosse o começar
De um lugar
Onde não queremos chegar
Filosofia do amor
Não sei se o amor será a espiritualização
Da sensualidade em Nietzsche
ou uma ave a tremer nas mãos de uma criança
para Eugénio de Andrade
Amor pode ser um acto involuntário de poesia
Resgatado de uma emoção
Amor poderá ainda ser quando a paz se instala
Sem que os dias acabem
Amor é, por certo, onde precisamos chegar
Num qualquer canto da vida
Para que o encanto dela
Se possa alcançar
Rio
Sei de um rio alado
Para lá do tempo
Que se escreve de longe
Como se fosse vento
É nele que amanheço
A vida inteira
E
Nas suas margens cansadas
Me abrigo
Sonho
E envelheço
Farol solitário
Quanto melhor conheço a humanidade
Mais me apraz habitar um farol
Não um farol qualquer
Mas daqueles que emergem do mar
Habitam as vagas
e
No silêncio
Escrevem o marulhar das ondas
Solitude
Não sei se eleve ou releve
A sórdida condição de alienação humana
Estar só é olhar-se
Ser-se na solitude
É caminhar o infinito
Desfazer montanhas imaginárias
Calcorrear bermas adormecidas
E num só gesto
Expiar o sentimento ímpio
Tornando mais alto
O nome dos homens
Em ti
Do teu rosto
Sobra-me um momento a sós
E nesse instante
Percorro-te uma vida
Tacteando o passado
Decalcado no teu corpo
Em ti,
Jamais esquecerei onde se abrigam os tesouros
E para onde confluem as marés
Do teu rosto
Cai-me uma pedra de sal
Da qual
Bebo sôfrego o teu mar
Os dias esquecidos
Se um beijo te der a mão
Caminha com ele
Dá-lhe os dias esquecidos
E o presente demorado
Regresso
Foi ao meu corpo que regressei
quando fragmentos do meu sentir prescreveram
sem que a primavera tivesse acontecido
Outono
Tenho no Outono
Primaveras
que desconheço
Terra molhada
Saudade da terra molhada
E dos dedos em flor
Das madrugas insones
E do nosso amor
Ao cair da folha
Sempre que a folha cai
Sorri uma flor
O sono das árvores
Devolve aos dias
O que sobra às noites
Como se faz a lua
Se souberes como se faz a lua
Deixa-a brilhar sobre o rio
Ouve a música dos peixes
E das estrelas adormecidas
Tardes de ouro
Lá dentro,
Do vento
Tinhas a cor do desbulho
E das tardes de ouro
O cabelo adivinhava-te,
Corpo desnudo
A queimar o raiar
Sem saberes
Fazias arte
Numa primavera
Qualquer
Bátega
Deixa que o céu te acorde
ou adormeça
quando o estio se finda
e a bátega começa
Deixa que o vento uive no beiral
enquanto os rios se soltam
na ira sazonal
Deixa que o tempo desfaça
tudo aquilo que não passa
e as memórias te sejam nuvens
como a chuva numa vidraça
Abrigo
Se soubesses como o tempo nos fenece
E a chuva nos demora
Seríamos abrigo num canto qualquer
Da aurora ao crepúsculo
Toda uma vida
Numa só pele
Choro-te
Choro-te
Sem que percebas que definhei
Naquela sombra lânguida
Que morreu para lá dos ciprestes,
Oca,
Sem o teu sussurro terMar Revolto
Como só tu soubesses
Como as naus nómadas te aportam
Não há mar revolto que temas
Que não te caiba
Numa tela qualquer
Neblina
Há palavras que desiludem
e olhares que seduzem
tal como a neblina
calada
esconde na voz
o que sobra à noite
Sino que chove
Dissolvo-me na noite
E na bruma perene
Choram almas e rostos ausentes
Como um sino que chove
A morte é logo ali
Por detrás da lágrima errante
E do grito submerso
Sinto-me estranho
Nesta forma ausente
De querer estar
Onde não há gente
Só o branco da tua boca
Me afaga o rosto
Quando de negro a minha alma
Se veste
Do rio que passa,
Uma flecha de sangue
Trespassa a solidão
E o olhar insone
De um torso que dorme,
Não de sono,
Mas porque ter escrito
A própria morteTimidez
Quero habitar o teu olhar
Para que o sono me seja leve
Quero a timidez
Para que os olhos se beijem
Quero a tua mão
Para que o poema se escreva
Quero o teu coração
Para que a vida nos sonhe
Acosto sem nome
Arpoa em mar revolto
Segue convicto
Batelão destemido
Deixa no arrasto
Prosa vencida
Fragas disformes
E acosto sem nome