Jorge Henrique

Al(mas) Gêm(e)as



Que estranho amar é este
Que desconhece a Lei da gravidade?
Tamanha a insustentabilidade!
Teu olhar que não me encontra...

Que estranho amar é este
Que deturpa minha ingenuidade?
Uma mentira que acordou verdade!
Teu alarde. Minha cabeça tonta...

Que estranho amar é este
Que agride as grades da razão?
A quem mais carece de perdão
Já não aprendo a perdoar...

Que estranho amar é este
Que estrangula o próprio coração
Do ser que ama? Mas que não
Sacia sua fome de amar...

HENRIQUE, Jorge. Mutante in Sanidade. Cadernos Cultart de Cultura. Aracaju: UFS-PROEX-CULTART. Novembro, 2001. p. 62

Enquanto a mão tece o poema


Enquanto a mão tece o poema
outra cena acontece,
obscena.

Mas não
é obscena
a prece que se tece
entre os dedos do poema.

Entretanto,
entretece
o olho e a pena.

A cena,
que acontece
obscena,
ao mesmo olho acena,

mas não move
esse poema.

HENRIQUE, Jorge. 3º Lugar no II PRÊMIO BANESE DE LITERATURA. Aracaju, 2006.

Alçando voo na voz


Asa reclusa, mas plena,
No papel, paira a poesia.
Resiste ao tempo, à pena,
Ao criador e a quem lê.
Existe aos olhos apenas
De quem a fez ou a vê.
Asa latente, pré-voo,
Pulsa, silente, a poesia.

Silente, fala aos ouvidos,
Aos mais íntimos ouvidos,
Cinge à ideia o objeto,
Cinge ao passado o presente,
Cinge o universo à pessoa,
Une no verso o que é
Ao que, não-verso, não é.

Mas na voz alça seu voo,
Asa aberta, asa-som,
Vibrando tímpanos, plena,
Imprimindo-se ao vento,
Ao pensamento, que, voo,
Torna-se novo silêncio.

HENRIQUE, Jorge. (In) II Antologia dos Poetas Lusófonos. Leiria (Portugal): Folheto Edições e Design. abril, 2009. p. 212.