Esconde a feiura franksteiniana, ciclópica, por trás da barba, do bigode, dos cílios e das largas sombrancelhas, sobretudo, pelo que leva em silêncio na bolsa.
Escondes tua fartura de que modo, com quais artifícios, manhas e artimanhas: com um extrato forjado mostrando saldo devedor ? Blimunda, Portugal é onde ? Longe ?*
Respondes à leitura dos aparelhos com qual tipo de ação ou de reação: contrito como uma beata, irado como um burro diante do mata-burro, resignado feito apóstolo
pelo sonho-avidez ejetado por ter sido esquecido no testamento, tornando-te outro abintestado, ou simplesmente andando e urinando, assobiando e chupando cana ?
Iscariotes, quanto é que a tua marca deve aos cobradores gratuitos, sem nexo, sem base para que pulem no teu cangote os de ontem e os de hoje ? Israel é onde ?
Atento esteja-se aos miúdos do dia e aos esboços feitos à noite, mas a vigília cansa e até mesmo deturpa as pessoas, que já não copulam, não almejam, não riem e
não condensam água nenhuma, já sem referência que não a de vigia-curral, carcereiro sem bodas, ele também um preso, dizendo \"diante dessa dor curvam-se os montes [...] Há dezessete meses eu grito.\" [...]*
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*: Blimunda é uma personagem do romance Memorial do Convento, de José Saramago (Portugal, 1922-2010)
*: Ana Akhmátova (Rússia,1889-1966), no poema Dedicatória, e poema 5, do livro Réquiem