Um dia passarão pelos meus versos Como eu agora passo por diante destas esculturas que não merecem mais que um apressado olhar Mas na tua presença eu tenho de parar dama desconhecida com certeza viva mais aqui que no segundo século em Roma onde viveste Moldaram-te esse rosto abriram-te esse olhar decerto impressionante para que uns dezoito séculos mais tarde te pudesse encontrar quem mais que tu morreu mas te ama ó mulher perdidamente Não mais te esquecerei hei-de sonhar contigo sei que te conquistei e libertei de qualquer compromisso que tivesses Ninguém sabe quem eras nem eu próprio não tens sequer um nome uns apelidos nada se sabe acerca do teu estado civil Sei mais que tudo isso porque sei que atravessaste séculos na forma de escultura só para um dia nós nos encontrarmos Tenho mulher e filhos sou de longe a lei é rígida e severa a sociedade Não te importes mulher deixa-te estar não penses não te mexas podes estar certa de que me deste mais do que tudo o demais que me pudesses dar pois para ser diferente de quem era bastou-me ver teu rosto e mais que ver olhar
Ruy Belo | "Obra Poética de Ruy Belo" - Vol. 2, págs. 34 e 35 | Editorial Presença Lda., 1981