Raquel Mesquita

Raquel Mesquita

1985-03-21 Matosinhos
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Alguns Poemas

Insistentemente.

O carteiro tocou insistentemente à campainha até que fosse à porta.
Depois de meses em que também eu, insistentemente, esperei que ele passasse na rua para lhe perguntar:
- E hoje, não tem nada para mim?
Todos os dias, todos os malditos dias…
Pensou que, finalmente, me trazia o que tanto esperava, o que desesperadamente procurava na caixa por entre as contas para pagar e os folhetos publicitários do supermercado.
E nem reparou que há muitos dias que deixei de lho perguntar, que nunca mais esperei que ele passasse. E que cheguei mesmo a evitar que ele me visse, para que não me lançasse aquele encolher de ombros ou pregasse os olhos no chão para que não tivesse que me dizer que não trazia nada.
Rasgou um sorriso e disse:
- Menina, trago-lhe uma carta registada. Correio internacional. Demorou mas cá chegou, está a ver! O que tem que vir, sempre vem algum dia!
Vi-me encostada à porta com aquele envelope na mão. Aquela letra que conhecia tão bem a espelhar o teu nome no envelope que de tão imaculado, ninguém diria ter vindo do outro lado do mundo. A cada segundo, sentia o coração bater como se fosse explodir.
Todos os dias, todos os malditos dias…
Esperei anos, caramba, anos!
Mas agora que me habituei ao silêncio da tua ausência. Agora que a cama já não me sabe a vazio. Agora não me apetece ler-te.
O que virias dizer, que te lembraste de mim?
Quando bateste a porta o que te pedi não foi que te lembrasses de mim um dia, pedi-te que não me esquecesses em nenhum!
 Rasguei aquela carta com a mesma fúria com que sempre te amei.
E desde esse dia, todos os dias, todos os malditos dias…
O carteiro toca, insistentemente, para me entregar um daqueles envelopes imaculados, bem escritos, um daqueles com o teu nome, um daqueles que junto aos folhetos publicitários do supermercado e deito no lixo.
Todos os dias, todos os malditos dias…

Insistentemente.

Carta aberta à baixeza de espírito

Oh baixeza, se é que me ouves, ouve com atenção!
Eu posso descer à lama, posso rastejar nela.
Mas nunca, ouve bem baixeza, nunca vou lamber botas!
Porque na vida há quem beije pés, e eu beijo tantos.
Mas lamber botas, nunca! Antes morta!
Perder-me em esquemas de importâncias vãs e sujas, nunca!
Sabes baixeza, na vida há quem se dê demasiada importância.
Importância que só existe nas suas cabeças.
Cabeças pequenas que alimentam o ego em compras e vendas de um poder que não têm, um poder poucochinho como o seu espírito minúsculo.
E a culpa é tua baixeza, a culpa é mesmo tua, sua parva!
Ouve baixeza, na memória ficam só os grandes, os que não se rebaixam ou se vergam com medo.
Na memória ficam os que lutam pela verdade, os que mesmo na lama mantêm a verticalidade.
Sabias baixeza?
Só que tu baixeza, reduzes as pessoas a uma espécie de plasticina tão maleável quanto os desejos pérfidos das mãos em que caem.
Pois, eu sei que não sabias…
E sabes baixeza, eu posso dançar na lama porque eu, mesmo na lama, tenho coluna vertebral, mantenho a palavra.
Minha cara baixeza, na vida há os que importam e os que se julgam importantes.
Porque, lembra-te baixeza, as pessoas mais vazias são as que vivem cheias de si.
E na vida, há quem arrote a si de tão cheio.
E tu baixeza, vives nestas pessoas.
Haja misericórdia às suas almas!
Oh baixeza, diz-me tu, estas pessoas têm sangue?!
Eu não sei… juro que não!

Mas, retém esta baixeza, quando não há laços, respeito, honra, dignidade e outras tantas qualidades que desconheces ou que matas…quando não as há, o sangue não basta!

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