Berghain

A cidade desliza lá fora com o luar.
Dentro, vai-se enchendo o silo de cimento.
Sobe-se por esta realidade arborescente
até à sala parlamentar onde,
sob uma vagina de Wolfgang Tillmans,
os olhos falam com o medo
a constelar as faces de desejo.

O desespero busca exprimir-se
no movimento acelerado dos braços,
no puro dinamismo dos ossos,    
a telegrafia sem fios:                 
a ela se entregam os funâmbulos
sobre altos cubos negros;
para ninguém ensaiam as suas acrobacias
e sortes de prestidigitação.

O ideograma das luzes banha-os
como num palco.
Desatrelados, soltos,
os corpos secos e nervosos             
deixam ver o íncubo,
o duplo espectral:
aqui acedem a um breve estatuto icónico,
emaciados cristos de tronco nu
e leather pants.

O WC é logo ali ao lado
e nas guaritas ao fundo do salão
perde-se em manobras de bastidores
quem não arrisca ir mais longe,
descer às fundas minas de estanho,
avançar às apalpadelas por território desconhecido,
o labirinto onde o Minotauro se alimenta
da carne de sete rapazes —
há que habituar os olhos à penumbra,
ao movimento dos corpos a tremeluzir
numa silente inquirição.

A música é um moscardo que zumbe ao longe
e o mundo apenas esse estrondo residual.   
 
No triclínio, sobre um colchão sujo,
ou contra os pilares —
o stalker vigia a solidão
que aqui abriu a sua cerca.
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Prémios e Movimentos

PEN Clube 1992

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