Alguns Poemas

Red Fuji

Toda aquela tinta ordenada entre molduras
Linhas retas e curvas
Azul ministrado com calma, falhando para branco quando necessário
Pequenos círculos a imitarem gotas d'água
Todo esse conjunto de rabiscos
Uma maneira falha de embelezar o que é real
Imitando suas cores
E imaginando seus aromas
Pois a natureza não faz o seu trabalho por completo.
Nós coletamos, depois de alegrias e dores
As memórias de nossas vidas
O cair da água da cachoeira
O balançar dos galhos das árvores à moléstia do vento
O êxodo das águas de um limite do mundo ao outro
Todos esses contos
-Como não podemos leva-los conosco-
Os imitamos à nossa maneira e limite.
Aproveitamos o desgarro consentido do concreto sob a tela
Para colocarmos nossos ângulos e maneirismos.
Assim o azul é mais profundo
O vermelho é mais imperador
Tudo é mais tudo, e o nada também é tudo, onde tudo há de ter propósito.
Mas a natureza não é assim.
As ondas que se debruçam na areia da praia não a fazem por querer
O canto dos pássaros não é belo sem acaso
O vento não rebola os fios da donzela pois assim ela é mais bela ainda.
Toda a natureza, da sua gênese ao ômega, é improvisada e sem roteiro,
E por um belo acaso, foi um belo monólogo.
E o dia em que o vento chorar
O sol derramar
O negro brilhar
As estrelas criarem olhos,e por eles gritarem
E se tudo o mais perder a sanidade?
Então nós a perdemos.
E ai? O que há de se fazer?
Nada.
O sentido e a razão é um grande favor imaginário do universo a nós.
Toda a arte é por acaso
E pelo acaso, fazemos arte.
E realmente
Como são imperfeitos os traços
O quão finita é a tinta do quadro
Comparado ao real Fuji-san?
Mas realmente
Como são menos alegres e tristes suas sombras
O quão menos humana é a montanha
Comparado ao real quadro de Hokusai?
O que há de ganhar?
Dentro da moldura ou fora dela?

O Vento

Sentado no pé da escadaria
Escuto o vento passar
Assobiar em meus ouvidos
Contos que não consigo entender

A vida da lavandeira
Estendendo sua roupa na varanda
Escarnando suas últiams dores do outro dia
Como se o vento fosse seu doutor

A vida do amante
Sonhando com a noite anterior
Dos beijos macios que deu nos seios da amada
Mas ela é de outro homem....
Ele não disse nada,
Só tragou o cigarro e expeliu a fumaça
E na fumaça,diziam todos os seus belos sonhos
-Todos com o nome dela

A vida do rapaz
Que acabara de perder a mãe
Berra igual sua estreia
Quando dormia nos colos dela.
Não se aguenta de pé um único momento,
E irancudo, condena o ar
Derrubando em suas costas
Todos os palavrões do mundo.
Mais tarde,ele volta chorar,
Mas chora fino
-Nem mesmo o vento consegue ouvir.

A vida da dançarina
Na cama do bordel
Do lado do cliente
Suspirando amores d'outras vidas
Vidas que não aconteceram.
Olha para o teto escuro e sujo
E não exerga teto algum
Só um amanhã brihante e glorioso
Como se o brodel não estivesse ali.
Como se nunca tivesse chorado no parapeito da janela
Por um raio de sol mais bonito do que aquilo.

A vida do pobre cão
Que late de fome
Na frente da padaria
Todo fraco e raquítico
-Se tivesse crença, teria rezado a noite inteira
Por um calor em sua barriga
E por um chão mais confortável.

E o vento me conta tudo.....
Mas eu não entendo nada.
Só imagino vidas deitadas no ar
Só escuto sons sem palavras
-As palavras coloco eu.
Se ele quiser mais histórias, procure outrem
Que eu mesmo nunca tive vida
Só sentado aqui
No pé da escada.

Quando ele se vai, vejo que somos tão parecidos
Vivemos vidas alheias
Sem sentir
Ou ver
Ou ouvir
Mas todos passam por nós
E nunca nos veem.
Mas eu nunca serei imortal como você
Sou apenas mais um conto incompleto.

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