Soares de Passos

Soares de Passos

António Augusto Soares de Passos foi um poeta, expoente máximo do Ultra-Romantismo em Portugal. Nascido no seio da média burguesia comerciante portuense, viveu largas temporadas da infância com o ...

1826-11-27 Porto
1860-02-08 Porto
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Prémios e Movimentos

Romantismo

Alguns Poemas

Amor e Eternidade

Repara, doce amiga, olha esta lousa,
E junto aquella que lhe fica unida:
Aqui d'um terno amor, aqui repousa
O despojo mortal, sem luz, sem vida.
Esgotando talvez o fel da sorte,
Poderam ambos descançar tranquillos;
Amaram-se na vida, e inda na morte
Não pôde a fria tumba desunil-os.
Oh! quão saudosa a viração murmura
         No cypreste virente
Que lhes protege as urnas funerárias!
E o sol, ao descahir lá no occidente,
         Quão bello lhes fulgura
         Nas campas solitárias!
Assim, anjo adorado, assim um dia
De nossas vidas murcharão flores...
Assim ao menos sob a campa fria
Se reunam também nossos amores!
Mas que vejo! estremeces, e teu rosto,
Teu bello rosto no meu seio inclinas,
Pallido como o lírio que ao sol posto
         Desmaia nas campinas?
Oh? vem, não perturbemos a ventura
Do coração, que jubiloso anceia...
Vem, gosemos da vida em quanto dura;
Desterremos da morte a negra ideia!
Longe, longe de nós essa lembrança!
Mas não receies o funesto corte...
         Doce amiga, descança:
Quem ama como nós, sorri à morte.
         Vês estas sepulturas?
         Aqui cinzas escuras,
Sem vida, sem vigor, jazem agora;   
Mas esse ardor que as animou outr'ora,
Voou nas azas d'immortal aurora
         A regiões mais puras.
Não, a chamma que o peito ao peito envia
Não morre extincta no funéreo gelo.
O coração é immenso: a campa fria
É pequena de mais para contê-lo.
Nada receies, pois: a tumba encerra
Um breve espaço e uma breve idade:
É o amor tem por pátria o céo e a terra,
         Por vida a eternidade!

O Noivado do Sepulcro

Vai alta a lua! na mansão da morte
Já meia-noite com vagar soou;
Que paz tranquila; dos vaivéns da sorte
Só tem descanso quem ali baixou.

Que paz tranquila!... mas eis longe, ao longe
Funérea campa com fragor rangeu;
Branco fantasma semelhante a um monge,
D'entre os sepulcros a cabeça ergueu.

Ergueu-se, ergueu-se!... na amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.

Ergueu-se, ergueu-se!... com sombrio espanto
Olhou em roda... não achou ninguém...
Por entre as campas, arrastando o manto,
Com lentos passos caminhou além.

Chegando perto duma cruz alçada,
Que entre ciprestes alvejava ao fim,
Parou, sentou-se e com a voz magoada
Os ecos tristes acordou assim:

"Mulher formosa, que adorei na vida,
"E que na tumba não cessei d'amar,
"Por que atraiçoas, desleal, mentida,
"O amor eterno que te ouvi jurar?

"Amor! engano que na campa finda,
"Que a morte despe da ilusão falaz:
"Quem d'entre os vivos se lembrara ainda
"Do pobre morto que na terra jaz?

"Abandonado neste chão repousa
"Há já três dias, e não vens aqui...
"Ai, quão pesada me tem sido a lousa
"Sobre este peito que bateu por ti!

"Ai, quão pesada me tem sido!" e em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na mão,
E entre soluços arrancou do seio
Fundo suspiro de cruel paixão.

"Talvez que rindo dos protestos nossos,
"Gozes com outro d'infernal prazer;
"E o olvido cobrirá meus ossos
"Na fria terra sem vingança ter!

- "Oh nunca, nunca!" de saudade infinda,
Responde um eco suspirando além...
- "Oh nunca, nunca!" repetiu ainda
Formosa virgem que em seus braços tem.

Cobrem-lhe as formas divinas, airosas,
Longas roupagens de nevada cor;
Singela c'roa de virgínias rosas
Lhe cerca a fronte dum mortal palor.

"Não, não perdeste meu amor jurado:
"Vês este peito? reina a morte aqui...
"É já sem forças, ai de mim, gelado,
"Mas inda pulsa com amor por ti.

"Feliz que pude acompanhar-te ao fundo
"Da sepultura, sucumbindo à dor:
"Deixei a vida... que importava o mundo,
"O mundo em trevas sem a luz do amor?

"Saudosa ao longe vês no céu a lua?
- "Oh vejo sim... recordação fatal!
- "Foi à luz dela que jurei ser tua
"Durante a vida, e na mansão final.

"Oh vem! se nunca te cingi ao peito,
"Hoje o sepulcro nos reúne enfim...
"Quero o repouso de teu frio leito,
"Quero-te unido para sempre a mim!"

E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério
Foi celebrado, d'infeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,
Já desse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada a lousa por ignota mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro unido,
Foram achados num sepulcro só.

A Camões

Ai do que a sorte assinalou no berço
Inspirado cantor, rei da harmonia!
Ai do que Deus às gerações envia
Dizendo – vai, padece, é teu fadário;
Como um astro brilhante o mundo o admira,
Mas não vê que essa chama abrasadora
Que o cerca d'esplendor, também devora
Seu peito solitário.

Pairar nos céus em alteroso adejo,
Buscando amor, e vida, e luz, e glórias;
E ver passar, quais sombras ilusórias,
Essas imagens de fulgor divino:
Tais s o vossos destinos, ó poetas,
Almas de fogo, que um vil mundo encerra;
Tal foi, grande Camões, tal foi na terra
Teu mísero destino.

A cruz levaste desde o berço à campa:
Esgotaste a amargura ate às fezes:
Parece que a fortuna em seus revezes
Te mediu pelo génio a desventura.
Combateste com ela como o cedro
Que provoca o rancor da tempestade,
Mas cuja inabalável majestade
Lhe resiste segura.

Foste grande na dor como na lira!
Quem soube mais sofrer, quem sofreu tanto?
Um anjo viste de celeste encanto,
E aos pés caíste da visão querida...
Engano! foi um astro passageiro,
Foi uma flor de perfumado alento
Que ao longe te sorriu, mas que sedento
Jamais colheste em vida.

Sob a couraça que cingiste ao peito
Do peito ansioso sufocaste a chama,
E foste ao longe procurar a fama,
Talvez, quem sabe? procurar a morte.
Mas, qual onda que o náufrago arremessa
Sobre inóspita praia sem guarida,
A morte crua te arrojou a vida,
E as injúrias da sorte.

De praia em praia divagando incerto
Tuas desditas ensinaste ao mundo:
A terra, os homens, 'té o mar profundo
Conspirados achavas em teu dano.
Ave canora em solidão gemendo,
Tiveste o génio por algoz ferino:
Teu alento imortal era divino,
Perdeste em ser humano:

Índicos vales, solidões do Ganges,
E tu, ó gruta de Macau, sombria,
Vós lhe ouvistes as queixas, e a harmonia
Desses hinos que o tempo não consome.
Foi lá, nessa rocha solitária,
Que o vate desterrado e perseguido,
À pátria, ingrata, que lhe dera o olvido,
Deu eterno renome.

"Cantemos!" disse, e triunfou da sorte.
"Cantemos!" disse, e recordando glórias,
Sobre o mesmo teatro das vitórias,
Bardo guerreiro, levantou seus hinos.
Os desastres da pátria, a sua queda,
Temendo já no meditar profundo,
Quis dar-lhe a voz do cisne moribundo
Em seus cantos divinos.

E que sentidos cantos! d'Inês triste
Se ouve mais triste o derradeiro alento,
Ensinando o que pode o sentimento
Quando um seio que amou d'amores canta:
No brado heróico da guerreira tuba
O valor português soa tremendo,
E o fero Adamastor com gesto horrendo
Inda hoje o mundo espanta!

Mas ai! a pátria não lhe ouvia o canto!
Da pátria e do cantor findava a sorte:
Aos dois juraram perdição e morte,
E os dois juntaram na mansão funérea...
Ingratos! ao que, alçando a voz do génio
Além dos astros nos erguera um sólio,
Decretaram por louro e capitólio
O leito da miséria!

Ninguém o pranto lhe enxugou piedoso...
Valeu-lhe o seu escravo, o seu amigo:
"Dai esmola a Camões, dai-lhe um abrigo!"
Dizia o triste a mendigar confuso!
Homero, Ovídio, Tasso, estranhos cisnes,
Vós, que sorvestes do infortúnio a taça,
Vinde depor as c'roas da desgraça
Aos pés do cisne luso!

Mas não tardava o derradeiro instante...
O raio ardente, que fulmina a rocha,
Também a flor que nela desabrocha,
Cresta, passando, coas etéreas lavas!
Que cena! enquanto ao longe a pátria exangue
Aos alfanges mouriscos dava o peito,
De mísero hospital num pobre leito,
Camões, tu expiravas!

Oh! quem me dera desse leito à beira
Sondar teu grande espírito nessa hora,
Por saber, quando a mágoa nos devora,
Que dor pode conter um peito humano;
Palpar teu seio, e nesse estreito espaço
Sentir a imensidade do tormento,
Combatendo-te n'alma, como o vento,
Nas ondas do Oceano!


O amor da pátria, a ingratidão dos homens,
Natércia, a glória, as ilusões passadas,
Entre as sombras da morte debuxadas,
Em teu pálido rosto já pendido;
E a pátria, oh! e a pátria que exaltaras
Nessas canções d'inspiração profunda,
Exalando contigo moribunda
Seu último gemido!

Expirou! como o nauta destemido,
Vendo a procela que o navio alaga,
E ouvindo em roda no bramir da vaga
D'horrenda morte o funeral presságio,
Aos entes corre que adorou na vida,
Em seguro baixel os põe a nado,
E esquecido de si morre abraçado
Aos restos do naufrágio:

Assim, da pátria que baixava à tumba,
Em cantos imortais salvando a pátria,
E entregando-a dos tempos à memória,
Como em gigante pedestal segura:
"Pátria querida, morreremos juntos!"
Murmurou em acento funerário,
E envolvido da pátria no sudário
Baixou à sepultura.

Quebrando a lousa do feral jazigo,
Portugal ressurgiu, vingando a afronta,
E inda hoje ao mundo sua glória aponta
Dos cantos de Camões no eterno brado;
Mas do vate imortal as frias cinzas
Esquecidas deixou na sepultura,
E o estrangeiro que passa, em vão procura
Seu túmulo ignorado.

Nenhuma pedra ou inscrição ligeira
Recorda o grã cantor... porém calemos!
Silêncio! do imortal não profanemos
Com tributos mortais a alta memória.
Camões, grande Camões; foste poeta!
Eu sei que tua sombra nos perdoa:
Que valem mausoléus antes a coroa
De tua eterna glória?
Poeta português, natural do Porto. Oriundo da burguesia liberal, formou-se em Direito na Universidade de Coimbra, em 1854, datando dessa época a sua colaboração na revista Novo Trovador, ligada ao romantismo do período político da Regeneração. Colaborou ainda em outras publicações, como O Bardo e A Grinalda. Autor de poemas de exaltação cívica, confiante na vitória do homem, na conquista do progresso e da liberdade, dedicou-se simultaneamente a uma poesia delicada, reflexo da dor pessoal, do sentimento amoroso ou trágico (por vezes rematado de forma optimista, numa compensação metafísica do sofrimento humano) e marcada pelo espectro real da morte (Soares de Passos sofria, desde jovem, de tuberculose). Foi autor de um célebre poema do ultra-romantismo português, «O Noivado do Sepulcro», recitado e até cantado em reuniões familiares e sociais. Embora revelando uma certa autenticidade, por vezes majestosa, o facto de se prender a preceitos de escola literária, recorrendo a banalidades e estereótipos, veio a fazer com que fosse caricaturado pelos realistas como o protótipo do poeta ultra-romântico. Em 1856, publicou o seu único livro, Poesias.
O Noivado do Sepulcro Soares de Passos 1826- 1860
"Infância e morte" de Soares de Passos, o poeta ultrarromântico
Soares de Passos
SOARES DE PASSOS - Num álbum (poema recitado)
O NOIVADO DO SEPULCRO | Soares de Passos (Dose Literária) # 298 #poesia
SOARES de PASSOS o noivado do sepulcro
MARTA ROML | Poemando #66: Soares de Passos e o Ultra-Romantismo
Chega Chegando: "A Ti", de Soares de Passos
JOSÉ MARIA ALVES - SOARES DE PASSOS - ACASO ÉS TU
O NOIVADO DO SEPÙLCRO Soares de Passos 1826 a 1860
O noivado do sepulcro - Soares de Passos
JOSÉ MARIA ALVES - SOARES DE PASSOS - AMOR E ETERNIDADE
O noivado do sepulcro de"Soares de passos" declamado por: Scotney Alves Lima
Noivado no Sepulcro - Soares de Passos / Epitáfio - Titãs.
O Canto do Livre
Soares dos Passos: " Noivado do Sepulcro". Lido comentado por Pedro Teixeira da Mota. Imagem fixa.
Soares Passos - O Noivado do Sepulcro
O Noivado do Sepulcro
Podcast adaptada(o) obra: “O Noivado do Sepulcro” escrita por Soares de Passos.
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