Vasko Popa

Vasko Popa
Vasko Popa, cirílico sérvio: Васко Попа,, foi um dos mais representativos poetas da Iugoslávia, muito reconhecido na Europa, e admirado por poetas e teóricos como Sophia de Mello Breyner e Octavio Paz. Segundo Haroldo de Campos, é “um dos maiores poetas da Iugoslávia e figura marcante no cenário poético internacional".
Nasceu a 29 Junho 1922 (Grebenac, Kingdom of Yugoslavia)
Morreu em 05 Janeiro 1991 (Belgrado)
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Vasko Popa foi um poeta sérvio, nascido na vila de Grebenac em 1922, no território que àquela altura era conhecido como Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos, rebatizado em 1929 como Reino da Iugoslávia sob o reinado de Alexandre I. O poeta estudou psicologia na Universidade de Belgrado e mais tarde na Universidade de Bucareste e na Universidade de Viena. Durante a Segunda Guerra Mundial uniu-se a um grupo departisans (guerrilheiros) lutando contra a ocupação nazista e, ao ser capturado, foi enviado a um campo de concentração em Zrenjanin. Após a guerra, estudou filosofia e passou a editar revistas literárias em Belgrado. Estreou em livro com o volumeCasca (Kora, 1953), ao qual se seguiramO Campo do Desassossego (Nepocin-Polje, de 1956),Paracéu (Sporedno Nebo, 1968),A Terra Ereta (Uspravna Zemlja, 1972),Sal Lupino (Vucja Só, 1975),Carne Viva (Zivo Mesó, 1975),A Casa no Meio do Caminho (Kuca nasred druma, 1975) eCorte (Rez, 1981).
 
No Brasil, seu trabalho foi traduzido por Aleksandar Jovanovic, um dos maiores tradutores da literatura do Leste Europeu no País. O linguista e professor da Universidade de São Paulo organizou para a editora Perspectiva a antologiaOsso a Osso (São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1989), da qual retiramos os poemas abaixo. Jovanovic foi responsável ainda por outras importantes antologias de poesia europeia, comoCéu vazio: 63 poetas eslavos (São Paulo: Hucitec, 1996) eCaracol estrelado: poesia sérvia contemporânea da segunda metade do século XX (Poesia Sempre. 15. ed. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2008). Também traduziu Velimir Khlébnikov, Milorad Pávitch, Zbigniew Herbert e  Darinka Iêvritch, entre outros.
 
Vasko Popa foi um dos poetas europeus mais populares do pós-guerra. Contemporâneo de autores como o romeno germânico Paul Celan (1920 - 1970), o brasileiro João Cabral de Melo Neto (1920 - 1999), o italiano Pier Paolo Pasolini (1922 - 1975) ou o americano Robert Creeley (1926 - 2005), apontando para a grande diversidade poética do pós-guerra, sua poesia apresenta uma característica marcante, que Haroldo de Campos (1929 - 2003), amigo do poeta sérvio, chamaria na orelha da antologiaOsso a Osso de "materialismo ôntico", após alinhar a obra de Vasko Popa ao que ele chamou decoisismo, reconhecendo-o na poesia de William Carlos Williams, Francis Ponge e João Cabral.
 
Talvez por via do expressionismo alemão e do surrealismo francês, este materialismo ôntico poderia ser visto como herdeiro da relação poética dos Românticos com a natureza. Na poesia moderna, talvez possamos encontrar grandes exemplos nosNovos Poemas de Rilke, com sua capacidade de transportar-nos à manifestação ontológica de suas panteras e torsos de estátuas. Mas, como Haroldo de Campos nota, isto se manifesta em Vasko Popa unido a um minimalismo em que até mesmo oepos submete-se à elipse. Tal minimalismo é ligado pelo paulistano ao construtivismo plástico, mas temo que nosso poeta tenha talvez naturalmente lido com certo exagero suas próprias obsessões na obra do servo-croata. Tendo vivenciado os horrores da Segunda Guerra, seu minimalismo parece ser mais uma operação em silêncio, mais próximo da concreção minguante de um Giacometti que das abstrações puras de um Mondrian, a não ser que o liguemos ao construtivismo de caráter místico de um Kandinsky.
 
É que Popa parece operar mais em nome de umapobreza de recursos que uma pureza de expressão. Pessoalmente, eu ligaria talmíngua a um impulso mais est-É-tico que formal, tal qual no que já ousei chamar debiominimalismo em artistas brasileiros como Arthur Bispo do Rosário (1909 - 1989), Lygia Clark (1920 - 1988) e José Leonilson (1957 — 1993). Eu adoraria aqui e agora mencionar que são artistas brasileiros que, por questões como cor da pele, gênero, sexualidade ou parâmetros como "saúde mental", estiveram de maneiras diversas à margem da sociedade brasileira e, desta margem, desconstruíram muitos dos dogmas do construtivismo que se estabeleceu como hegemônico na percepção crítica da arte e poesia brasileiras da segunda metade do século XX... mas ainda é muito difícil discutir tais questões sem despertar certas fobias críticas no País, que acabariam apenas desviando a atenção do cerne do debate.
 
No entanto, parece-me ainda importante notar que este objetivismo de Popa, se seguirmos as palavras de Haroldo de Campos, está distante do objetivismo que guiou a poesia brasileira do final do século XX, muito marcada pelas obras de João Cabral de Melo Neto e Robert Creeley, por exemplo. Pois faltava a este objetivismo (e não se trata aqui de acusação crítica, sendo uma escolha est-É-tica com implicações precisas) justamente este materialismo ôntico, de caráter romântico talvez – algo visto como negativo naquele momento, e que deixou mais uma vez à margem o trabalho de poetas que se distanciaram do construtivismo reinante do momento, determinando a recepção tardia das obras de poetas como Hilda Hilst (1930 - 2004) e Roberto Piva (1937 - 2010), ou, ainda hoje, a pouca atenção à obra de poetas mortos há muitos anos, como Henriqueta Lisboa (1901 - 1985), ou a daqueles que ainda estão felizmente entre nós, como Leonardo Fróes. Na poesia contemporânea, produzida nos últimos anos, eu ousaria reconhecer este materialismo ôntico em poetas como a argentina Lucía Bianco (n. 1979) e o brasileiro Wladimir Cazé (n. 1976), entre alguns outros.
 
Deixamos vocês com a série "Osso a osso", que dá nome à antologia organizada por Aleksandar Jovanovic, e alguns outros poemas. Talvez algumas destas questões fiquem mais claras à luz dos poemas de Vasko Popa. É difícil ler a série "Osso a osso" sem pensar na poesia elegíaca em que autores do pós-guerra tentaram dar voz aos mortos daquela Catástrofe que ainda nos acusa, como no caso da poesia de Nelly Sachs ou Paul Celan. A imagética dos poemas nos leva dos campos de Bergen-Belsen ou Treblinka às ruínas de Stalingrado e tantas outras cidades e campos devastados pela Segunda Guerra.
 
--- Ricardo Domeneck