A sereia não se divorcia
do azul, nem seus seios
de búzio esgotam leites
diluídos em nácares.
A sereia lança louca-
mente o gesto como rede;
e se enovela em sargaços
pesados de bichos vivos
como línguas brancas: ostras.
Sua cauda crispa-se em desejo
de tanto à áspera pedra estar ligada,
como ao tronco robusto, ao férreo, ao musculoso
marítimo afogado.
A sereia não se deixa
desprender da triste onda, embora ilhada,
embalsamada,
suspensa,
como quadro de um impossível
tornado ao alcance da mão,
radiosa e salina.
Não se desveste da metade de peixe que a metade
sua informa;
nas tesouras extremas de cauda se estreleja,
astromulhersubmarino
azul de água,
azul de mar,
azul de nada.
Publicado no livro O Edifício e o Verbo (1961). Poema integrante da série Sirenusas.
In: AYALA, Walmir. Poesia revisada. Rio de Janeiro: Olímpica; Brasília: INL, 1972. p.69-7