

Gabi Luna
Autora multimídia. Carioca do asfalto, radicada no mundão. Pesquisadora de arte, tecnologia & publicações independentes. Cria literatura experimental com diálogos entre linguagens e tecnologias. @amazonahightech
América Latina
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sala de transmissões troncais
um cheiro quente e amargo inundava as mãos, enlaçando fitas ao redor dos tornozelos. o mordisco nos lábios. invasão sem chave nem arrombamento. em algum lugar entre a sétima cervical e a primeira torácica. um calafrio na medula. delírio à flor das paredes da sala de audições. consolidação do bulbo.
no lotado do vazio, três bocas molengas acordam e fitam os rabiscos em suas pranchetas, não dão conta. as imagens nas câmeras não dão conta, a memória imaginada não dá conta. não dá conta. a vegetação já havia sido devastada e só restava um emaranhado na barra do espelho. correndo por dentro do escapamento de mais um desses ônibus pra casa, recapitulava cada movimento. os fios de sua matéria já destensos. a casa-mundo-corpo se expande e contrai, materializando um bom milheiro de tijolos calafetados com lama e musgo. ascendeu; mais um daqueles incensos de mirra. vibra kemet inteira para fora da narina esquerda, a direita está entupida. de mirada na raiz das penas crescendo sem parar. movimento. o corpo em gargalos calibrando potências. Pliè, chase, jetè — eu não caibo dentro dela. o espaço do vazio no tempo deixou a sala de audição sem olhar pra trás, entrou na sala de transmissões troncais. eu era gases puro, vim a ser pódjehuty. parou quando viu brotar do couro, outrora cabeludo, a penugem do ovo comido. inspirar, esvaziar, perceber o vazio. interregno do invisível. re spir ação. gesto presente. escolher estar no mudo. acolher o ar do mundo. em contratempo, perceber a atenção da consciência. ser tudo, sentir total. abrir espaço no não ser. de cara pro espelho, o arfar refunda rios. risos enterrados em outras percepções.
*****
Sala de transmissões troncais é uma das historias curtas escritas pela autora. Publicada originalmente no livro Acolher o ar do mundo, lançado pela Garupa Edições, em 2019.
no lotado do vazio, três bocas molengas acordam e fitam os rabiscos em suas pranchetas, não dão conta. as imagens nas câmeras não dão conta, a memória imaginada não dá conta. não dá conta. a vegetação já havia sido devastada e só restava um emaranhado na barra do espelho. correndo por dentro do escapamento de mais um desses ônibus pra casa, recapitulava cada movimento. os fios de sua matéria já destensos. a casa-mundo-corpo se expande e contrai, materializando um bom milheiro de tijolos calafetados com lama e musgo. ascendeu; mais um daqueles incensos de mirra. vibra kemet inteira para fora da narina esquerda, a direita está entupida. de mirada na raiz das penas crescendo sem parar. movimento. o corpo em gargalos calibrando potências. Pliè, chase, jetè — eu não caibo dentro dela. o espaço do vazio no tempo deixou a sala de audição sem olhar pra trás, entrou na sala de transmissões troncais. eu era gases puro, vim a ser pódjehuty. parou quando viu brotar do couro, outrora cabeludo, a penugem do ovo comido. inspirar, esvaziar, perceber o vazio. interregno do invisível. re spir ação. gesto presente. escolher estar no mudo. acolher o ar do mundo. em contratempo, perceber a atenção da consciência. ser tudo, sentir total. abrir espaço no não ser. de cara pro espelho, o arfar refunda rios. risos enterrados em outras percepções.
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Sala de transmissões troncais é uma das historias curtas escritas pela autora. Publicada originalmente no livro Acolher o ar do mundo, lançado pela Garupa Edições, em 2019.
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