Marília Garcia

Marília Garcia

Rio de Janeiro
1616
0
0


Prémios e Movimentos

Oceanos 2018

Alguns Poemas

UMA EQUAÇÃO NO HYDE PARK

está chovendo no
hyde park hoje
e estou do outro
lado do hemisfério
sentada ao sol
com um gato
entre meus pés
que estão descalços
e levemente
avermelhados.

está chovendo no
hyde park hoje
e lembro de ter
andado num parque
de ângulos quadrados
com o menino da caixa
preta que tinha uma foto
de uma floresta nórdica
virada de ponta-cabeça na
parede do seu quarto
e que gostava de contar
até 24 depois de cruzar
o gradil.

a gente andava
no meio-fio e sentava
no parque e depois deitava e o
roupão preto felpudo
já na casa dele
e o roommate chamado
steve que amava
uma japonesa.

está chovendo no
hyde park hoje e não sei
o que dizer a ele
que agora está sentado
algumas mesas à frente
e que dentro de um filme
seria alguém que diz sim
mas não estou dentro de um
filme — ouço a voz em eco
no buraco do real —
e me refaço pensando
que podia contar
que o gps funcionou
e indicou o ponto de encontro
mas a mensagem
só chegou depois.

está chovendo no
hyde park hoje
e podia contar que meu
coração tinha sido arrancado
pela boca e que estava
esquecido sobre uma pedra
com o sangue
ainda quente.

sim, está chovendo
no hyde park
e ao inferno
já desceram
um ou dois
ou
três
mas ele
há de subir
atravessando as curvas,
o belvedere, os espaços dirigíveis
“ogni speranza lasciate
voi che entrate”
— há mundo por vir?
ele pergunta antes de passar
e leva na mão
um gravador
e nós cruzamos o olhar
— só por um segundo —
e não lembro mais
desse dia
mas depois o
mesmo olhar
volta à memória
como a interferência
de uma voz saindo
do carro em movimento
pela ladeira.

está chovendo no
hyde park e aquele par
de olhos encontra os meus,
e esse cruzamento
de olhares me distrai
por um momento
da equação.

antes do encontro

procurar uma escada de madeira
dando para o abismo
é uma ação que só pode acontecer nesta língua
estranha e numa cidade cortada por um rio
que fique no meio dos dois
(quando um precisa ir embora
para sempre)

mas um dia ela chega
com a pergunta:
— o que vem à sua cabeça
quando digo a palavra
amor?

um dia desce no meio do dia
e vê. e um dia vê a peça lilás sobre a quina da mesa
quando volta. ele diz saltar. saltar para fora.
e atravessa na esquina
procurando a escada. depois diz que quer saltar
para fora desta canção.

mas um dia chega com
a pergunta:
— o que vem à sua cabeça quando
digo a palavra amor?
e ela responde
que amor em japonês
se diz /ai/.

e, de repente, um branco.
as linhas se tornam cada vez mais
quebradiças. um banco parado no meio da cena,
um quadrado iluminado e a frase mais longa
que ele me disse nos últimos
seis meses.

o que significa um cachecol vermelho
pinicando sozinho?
uma abelha, pensa, mas o cachecol pinicando,
voando como uma abelha, talvez um inseto
estridente, incidente para ouvir quando ele
chegar e vir.

agora sobrou apenas a estática
tremendo e você a leva de volta até o barco:
— a estática?, pergunta, você lembra
daquela vez? e ela fica parada na chuva
com o colete salva-vidas esperando
alguma coisa acontecer.

[aqui o telefone
vibra na bolsa e um parêntese
para dizer que não sabe onde está mas é longe
não sabe onde está mas é frio
não sabe onde está mas é quase.
ao ouvir a voz,
parece de verdade,
e então ele levanta e me diz algo
sobre o fim
ou sobre o sim
e toca na tela uma imagem
do filme]

uma mulher que se afoga

coloco a mão sobre o seu joelho
e você me olha de frente
                                   mas depois vira de lado ajeitando o
retrovisor por causa da chuva e eu quero dizer que aquela
frase era de uma canção, a mesma que você tinha usado
em outro lugar, então de novo você me olha
de frente
            e sorri interrogando
minha expressão sempre confusa
e eu queria dizer que na viagem fraquejei
que tenho medo de enlouquecer
que tenho medo do que está
por vir mas acabo contando a história
do homem que perguntava
você me ama?
                        depois de anos casado com a mesma mulher
e ela dizia
                  não
e ele com aquela música repetindo na cabeça
aquela música sem parar tocando
ao fundo ecoando
e ela
            não
e ele perguntava
                                   será que eu sou louco?
perguntava depois que o barco na enseada
ela indo embora, fugindo
eu sou louco?
perguntava depois do acidente, do barco apagando
bajo la lluvia, 24 vezes a mesma carta enviada com o nome dela
e o telefone chamando
na bolsa
            hoje ela me viu na rua e veio contar
o que tinha acontecido: vontade de gritar
vai embora daqui
                                   não quero mais ouvir essa voz
e ela falando sem parar e eu
coloco a mão sobre seu joelho e você
me olha na hora e ela dizendo na rua que
não tinha me reconhecido
antes
            por que então veio falar comigo?
mas não digo só penso e aquele silêncio
e ela dizendo que foi
por acaso
            tudo bem
                        de agora em diante
e eu pensando não me lembro o que dizer
nessas horas, não suporto, será que um dia?,
e você coloca a mão sobre o meu joelho e eu
olho para você de frente, ainda ouvindo canção
pergunta gritos de
afogamento
                        será que eu sou louco?
e digo que você é uma das poucas
pessoas que quero que fiquem aqui
e você me responde
nunca sonhei em conhecer alguém
como você
e eu olho de volta e digo
                                   você sabe que ninguém nunca
segurou minha mão assim?
você vira de lado ajeitando
o retrovisor e se projeta pra ultrapassar
o carro da frente.
Infraordinário, com Marília Garcia
MARÍLIA GARCIA | #Arte1Comtexto ENCONTROS LITERÁRIOS
CÂMERA LENTA, por Marília Garcia (entrevista) | LiteraTamy
Marília Garcia: Poetisa, editora e exploradora de palavras | Entrelinhas
Trecho: Marília Garcia declama "hola, spleen", de "Câmera lenta"
Viva voz: Festival de poesia - Ana Martins Marques conversa com Marília Garcia
Escreva Em Casa #1: Poesia com Marília Garcia
Segundas Intenções com Marília Garcia
Marília Garcia lê poema inédito na “mesa 14: alguém telegrafa para o mundo pedindo atenção”
"A poesia é uma forma de resistores?"
"É agora como nunca": Marilia Garcia
Encontro Marcado com Marília Garcia
LIVRO "EXPEDIÇÃO: NEBULOSA"
Marília Garcia, entrevista ao grupo Poesia Brasileira Contemporânea
Sesc Instrumental Poesia - Marília Garcia & Coletivo Capim Novo
Bondelê #15: Resenha de Câmera lenta mais entrevista com a autora
Marília Garcia, entrevista ao grupo Poesia Brasileira Contemporânea
Escuta: Marília Garcia lê hola, spleen, do livro Câmera lenta
Conversa com Marília Garcia
parque das ruínas (versão ao vivo "tem país na paisagem?")
Poemingo #9 🦋 Marília Garcia
Paiol Literário com Marília Garcia, 12 de Julho de 2021
"Hola, Spleen" (2019), canção - Eduardo Frigattti / Poesia: Marília Garcia
#Penguin10Anos: Conversa sobre Charles Baudelaire (com Júlio Castañon & Marília Garcia)
Lendo um poema de Marília Garcia. #poesia brasileira #lendoumpoemalitbr
Marília Garcia - "é uma lovestory e é sobre um acidente" (Berlim, dezembro de 2011)
Marília Garcia
Marília Garcia (leitura no MAM)
Wasafiri Brazil Launch – Marília Garcia and Lucy Greaves
Wasafiri Brazil Launch – Lucy Greaves and Marília Garcia
Marília Garcia no Poëziecentrum (Gent, Bélgica)
Marília Garcia | Pais no mapa
Presentación del libro parque de las ruinas de Marília Garcia
[Poema] Você chorou em Bruxelas? - Marília Garcia
Marília Garcia: Então descemos para o centro da terra
Ricardo Domeneck - "Quadrilha irritada", vídeo de Marília Garcia (Bruxelas, dezembro de 2011)
Marília Garcia na Librairie Quartiers Latins - Bruxelas
Palavra de Poeta I Marília Garcia
Marília Garcia recita "parque de las ruinas"
Hermosos Momentos💞 |Marilia Garcia ♡
Ruleta De La Calma "APRENDO EN CASA " | Marilia Garcia♡
Podcast Desvairada - Ep. 1 - Inventário (girafas, objetos e aquário), com Marília Garcia
27/4 Marília Garcia (curso Um plano piloto)
Definición - Marília Garcia
É uma lovestory e é sobre um acidente -- Marília Garcia
Lectures Marília Garcia
VACACIONES CON MI NOVIO 2019 | Marilia Garcia ♡
"você sabe o que se diz"...
Flip 2016 - “A teus pés”, com Annita Costa Malufe, Laura Liuzzi e Marília Garcia
Importância da Saúde Intestinal para o Desenvolvimento da Criança | Marilia Garcia em Nestlé Baby&Me

Quem Gosta

Seguidores