Amada,
Escrevo-te porque ainda existo — e existir, sem poder dizer-te estas palavras, seria um vazio à própria condição de estar vivo. Escrevo-te porque te amo, e porque esse amor, longe de ter-me elevado, consumiu-me até os ossos — e mesmo assim, ao final de tudo, bendigo cada fagulha da adrenalina que teu nome me trouxe.
Se amar fosse simples, eu te amaria tranquilamente, com flores, com visitas aos sábados, missas aos domingos e com retratos emoldurados na estante. Mas o que sinto por ti não cabe em molduras, nem em hábitos, nem em civilidade, nem em verbos. Nada poderá arrancar de mim essa verdade: tu foste, és e serás meu gesto mais sincero diante do mundo. É insuportável a ideia de existir num mundo em que não estou ao alcance dos teus abraços.
Amar-te não é uma escolha. É uma necessidade. Vivo com a urgência de te pertencer e quero que me tragas à vida todos os dias, mesmo que para isso precises me refazer com tuas mãos. Quero a vida contigo — e não qualquer vida: quero a vida ferida, viva, ardendo, latejando como uma ferida aberta no lado esquerdo do peito, a vida sem mistificação, como ela de fato é. Quero acordar ao teu lado com medo de te perder. Quero sofrer tuas ausências, teus silêncios, tuas contradições — e mesmo assim escolher ficar.
Não há linguagem que dê conta. Palavras estão em falta. Só sei que, se me fosse tirada a possibilidade de viver contigo, eu não morreria — viveria, sim, mas viveria como um homem amputado de si mesmo. Como um exilado do próprio significado. Se escrevo hoje, não é porque não possa seguir sem ti, querida. Posso. Tenho vivido, pensado, lido, suportado os dias ou qualquer outra coisa sem gosto que possa dar-se nome.
És, numa parte, minha maneira de estar no mundo. Se algum dia não mais nos encontrarmos neste tempo, saberei ainda assim que amei como se ama a vida: não para possuí-la, mas para merecê-la. Saberei que amei até o fim e fui o mesmo desde o começo. Há um ponto dentro de mim que é teu desde sempre.
No centro do que sou, estás.
Se amanhã o mundo acabar, que acabe.
Terei amado.
E por ter amado, nada será vão,
com ternura e verdade,
Teu.