

Kantaris
Um cientista se descobrindo na literatura. Escrevo contos, poesias e artigos.
Le vulptuosa Drinks
No ardor da tarde ensolarada, sob o mormaço que faz tremer as vistas dos transeuntes daquelas ruas, sigo os ventos que me trazem os aromas prazerosos.
Os aromas são como fotografias antigas familiares, trazendo lembranças nostálgicas que inundam nossos corpos como uma onda de prazer. De prazer e aromas, ela entende.
Daquele quarto exalam aromas e imagens que se confundem em minha mente, como uma só imagem: a dela.
O resto de café na xícara, os livros espalhados e as cinzas pelo chão lembram que ali nos entendemos como humanos. A mescla de cheiros aguça minha memória; o sabor do café e de seu corpo, ainda impregnados em minha boca, não me deixam dissipar os pensamentos da noite passada.
As roupas largadas, as embalagens abertas e os lençóis bagunçados ecoam em minha mente como uma de suas telas: ora realista, ora abstrata. Seu corpo desnudo, como as árvores das caatingas em meados de novembro, me faz pensar na delicadeza e na exuberância dessas paisagens, sobretudo na resiliência e no afinco que ambas compartilham.
O estardalhaço dos pardais na vizinhança soa como um despertador, lembrando-me de que a partir daquele momento a porta daquele quarto é o último entreposto entre nós e a realidade. Recolho as peças de roupas soltas pelo chão, sinto seu cheiro uma última vez e o guardo, junto de sua imagem desnuda, na mesma caixa das memórias de onde ela nunca saiu.
Kantaris
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