Adroaldo

Adroaldo

Ex-vocalista da banda de Rock underground dos anos 90, Queima de Arquivo, é Autor de 5 livros publicados. Sua produção literária abrange todo o território nacional e está sendo vendido em mais de 100 países.

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Alguns Poemas

MINHA TERRA DESOLADA (trecho)

"O que nasce dessa terra?

Nada nasce,

Nada cresce

Nessa desolada terra.

EU quero acordar a vizinhança

Para ouvir meus berros pela madrugada

Mas, eles não escutam nada,

Não escutam nada que acontece na madrugada.

Eu jogo nas ruas minha música,

Toda minha poesia e frases feitas

Mas eles não entendem nada,

Ninguém entende o que acontece na madrugada.

Eu ando pelas ruas vendo vitrines,

Crianças sujas em seus trapos podres

E choro junto pelos que têm fome,

Não sei por quem choro nem bem quem amo.

Eu abraço os pobres de espírito

E escuto todas suas pobres histórias,

Esses pobres e patéticos de alma pobre

É meu encontro certo nessa madrugada.

Eu passo por ruas e vielas úmidas e escuras

E escuto um choro de criança,

Um repetitivo e desgraçado choro de criança

Que é o pior de todos os refrãos.

Eu vejo as pessoas e seus passos apressados

Em todos os cantos, todos os lugares,

E temo que sigam meus rastros

E apresso meus passos por essa cidade.

Eu ouço as sirenes berrando nas avenidas

Se misturando ao som das discotecas lotadas

E o barulho do metal retorcido

Criando um novo contraste, outro tipo de grito.

Eu canto com você quase todas as noites

E, algumas vezes, me pergunto: cadê você

Que partiu tão cedo e me deixou aqui...

E agora acordo sozinho!

Deus, eu tento e não consigo entender

Razão que justifique esse viver.

Sou peão em jogo que não se vê

Toda a madrugada até o amanhecer.

Algo comove todo o meu ser,

Algo que não compreendo e nem tento entender,

Algo que surge todos os dias quando acordo

E me persegue até o anoitecer.

Algo acontece,

Algo comove,

Algo incompreensível,

Um novo amigo?

Dizem que estar é quase que viver

E viver é o limite do que se pode querer.

De fato, algo acontece que se queira aqui estar,

Porém, nem de todo esse desejo almejo.

Nada mais é suficiente

Quando não se sente mais o aroma das flores,

Quando as cores já não mais emocionam

E não podem ser vendidas ao olhar.

Destes-me tão raros momentos

Que alimentam o futuro ainda que no Presente,

Mas, a vigília que fazes em todos os meus passos

Tira-me o sabor das coisas mesmo em pensamento.

Na minha nobre e pobre terra eu vago

E me alimento das lembranças dos mentirosos,

Embebedo-me com alegria e gozo

E caminho insistente na terra dos leprosos.

Na minha humilde terra vago,

Hora sou soberbo, hora ignorante.

A fome que me cerca é desmedida,

A carne é fraca e a alma idem.

Peco tanto quanto o pior dos pecadores,

Desperdiço um tempo que não mais tenho,

Não diferencio o certo do errado,

Compartilho a ceia com meus detratores.

Não sinto mais o gosto do vinho,

Não reconheço um sorriso,

Não me recordo dos abraços,

Finalmente estou só!

Peso minha consciência na balança de um açougue

E o açougueiro me fita com olhos de rapina,

Não há acordo algum sobre o preço dessa carne,

Nem se é de primeiro ou de segunda.

Deus, tu que és dono das idades,

Conceda-me das horas o seu minuto final

E faça com que o mundo inteiro saiba

Que o miserável partiu, afinal.

Conceda logo esse desejo

E termine de vez com essa obra,

Livre das cidades esse infeliz

Que insiste em saber o que ninguém sabe.

Quando há febre, não faz mais diferença,

Há tempos o sangue é veneno.

O vermelho é a cor da cólera e do pecado:

O poeta sabe quando está condenado.

Se há mesmo poesia nessas avenidas

Tão iguais em diferentes cidades,

Que seja reconhecida

Em prol dos que perseguem a vida.

Enterro na memória mais profunda

As gigantescas torres de concreto,

As grotescas estruturas de vidro

Que imitam uma nova artéria.

Uma nova artéria,

Um novo estilo de vida,

Uma nova companhia

E uma precoce parada cardíaca.

Como os carros que se beijam nas avenidas

Encontro a companheira perfeita

Que me fala ao pé do ouvido:

"_Me aceite como a definitiva!"

Finalmente, o medo percorre minhas veias

E alimenta um sentimento esquecido,

Uma vontade absurda de ver o próximo dia

E tentar outra saída.

Todas as ruas estão congestionadas.

Uma favela inteira acaba de ser incendiada

Enquanto alguns moradores tentam salvar

O que resta de uma vida inteiramente falida.

Há uma reviravolta

Em torno desse humilde coração,

Um carnaval,

Quase que uma provocação.

Todas as veias são velhas e fracas,

Há melancolia em tudo.

Mesmo sem haver poesia,

E vice-versa, há vida em tudo.

Essa cidade é apenas tijolo,

Metal, suor, concreto e vidro,

Cimento preso a sentimento

Muitas vezes belo e muitas vezes feio.

Essa cidade é areia,

Concreto e sentimento,

Tristezas e alegrias,

Poesias jogadas ao vento.

Tem gente que aprende cedo, outras não -

Vivem a vida dia sim e dia não.

Alguns dançam conforme a canção,

Outros se perdem antes do refrão.

Alguns sempre têm razão, outros não -

Muitos se perdem em ilusão.

Enquanto alguns correm, outros dormem

E todos buscam alguma direção.

Alguns sonham o fundo do poço,

Outros sonham com o fundo do rio.

Alguns buscam independência,

Outros são a exceção.

Tem gente que ganha,

Tem gente que se perde,

Tem gente que se torna o problema

E outros pensam ser solução.

Divago sobre o tempo

E sobre os "tipos" que encontro nessa vida.

Perco uns segundos nesse tempo perdido

E, mesmo com tão pouco sentido, quão raro é o momento!

Se você não faz ideia, tampouco eu sei.

Talvez a fome que me consome consuma a você também.

Talvez o vício que afeta os iguais

Seja algo que surja somente entre anormais.

Eu me vicio com os seus tapas

E em cada gole de sua taça,

Cada carinho exagerado oferecido

Em troca de alguns trocados.

Eu me sujo com as tuas mentiras

E assimilo a água das suas sarjetas,

Aprendo atalhos novos em cada caminho

E apago os rastros dos meus próprios passos.

Eu te persigo em cada Igreja e cada casa

E me abasteço da tua ironia,

Visito cada idoso

E faço amizade com os internos do hospício.

Até onde chega a tua maldade

E a quantos abraça a tristeza alheia?

Pode a maldade ser tão inspirada

A ponto de a própria surpresa ser esperada?

Vida que deixa sangrar do lado esquerdo do peito

Os filhos do mundo que o mundo não quer,

Espalhe a novidade que a tristeza tem cabelos

E olhos castanhos mais castanhos que os meus.

Percebo requintes de crueldade

Nesse masoquismo urbano

Onde a pobreza não tem mais idade

E a mentira tornou-se apenas uma vaidade.

Eu me transformo

Em tudo que mais abomino,

Eu surjo no espelho

Como meu próprio assassino.

Eu sufoco e amarro no escuro do meu quarto

Almas pequenas ameaçadas de extinção

E atiro no lixo os sonhos de quem

Acreditou piamente um dia fazer parte da realidade.

Eu ainda sinto na pele marcada por fogo

A marca que machuca, a marca da verdade

E peço que um dia cessem as buscas

E que tudo se torne uma futilidade.

O combustível da felicidade

Corrói e esvai-se aos poucos

E aos poucos me contento

Com o equilíbrio que me sustenta.

Quando olho para meu próprio rosto, dói.

Eu exalo do corpo o resto do medo

E tento não ver como é estranha a linha da verdade.

Procuro o caminho que leva à liberdade.

Disfarço os meus desejos

E reprimo meus absurdos,

Abraço cada pesadelo

E mascaro meu lado mais obscuro.

Eu tento ver algo além do abismo,

Encontrar algo a mais além dos muros,

Transcrever todos os anseios

Escondidos por detrás de cada sonho.

Eu sou eterno,

Sinistro,

Terreno e fraterno

Enquanto dure o mundo.

Há nesse peito um coração dividido

Criado praticamente entre dois mundos,

O mundo que há dentro do abismo

E o que se vislumbra por detrás dos muros.

O meu canto está perplexo

Como também a voz pequena e incerta

Do pequeno que se esconde do outro lado,

Meu outro lado desse mesmo muro.

O que contam em outros cantos

Também contam nesses lados

Mas, o que vale nesses cantos

Também rima em outros vales.

Luzes fortes incomodam muita gente.

A escuridão alimenta o inconseqüente.

Muros altos com grades de bronze reluzentes

São contrastes em pintura de uma tela sem cor.

Flores urbanas são tão surpreendentes

E essa depressão é tão estimulante.

Os sorrisos são amargos e carentes

E a dor casada com juras de amor.

Esses edifícios são tão interessantes,

Onde as ruas molhadas na noite reluzem como diamantes,

Onde transitam os justos e honestos

Que mastigam vaidade e rancor.

Os carros passam e iluminam tanta gente,

Brancos, negros e crianças sem cor.

Poetas são tão metidos a irreverentes

Que assimilam a dor e tudo o que for.

Vejo vidas que traçam um mesmo plano,

Gerações de alegria por engano,

Marcas de época que são puro desespero

Traçando juntos um futuro incolor.

Vejo rostos repletos de esperança

Queimar em público por causa de sua cor,

Os que vivem sem nem mesmo perceber,

Uma pintura fria que escorre sem por que.

Corpos que dançam de altos parapeitos

Quase sempre se vão tão cedo

Desafiando teorias e conceitos

E ignorando todo tipo de amor.

Meus passos são tão lentos

E os movimentos tão intensos,

Os rostos são sempre os mesmos

E espero novamente o sol se pôr.

A justiça que se encarregue de dar clemência

Aos supostos inocentes

Que transitam nas ruas

Espalhando esperança e amor.

Eu quero ter a chance de ver o nascimento de Vênus

E a anunciação em plena primavera,

Quero ser como Santo Agostinho

E ler as sagradas escrituras à luz de velas.

Quero ser como Van Gogh e pintar girassóis

Mesmo que em dezembro a tinta seja vermelha.

Quero ter de novo jardim florido no quintal

E que o beijo que sai de meus lábios não seja nunca mais acidental.

Basta querer algo apaixonadamente

Mesmo estando tão cego e só?

Que o adeus seja digno

E que tudo retorne, finalmente, ao pó.

Surge a idéia de repente

De festejar como um analfabeto,

Aprontar uma mesa e convidar

Apenas os que passam fome.

Todo esse tumulto,

Todo esse protesto,

Todos os roubos

Dessa legião dentro de mim...

Melancolia sempre teve seu espaço,

Amor, tristeza e regressos amargos,

Sentir-se só e ser como sombra na multidão

E abraçar a própria escuridão.

Achar que é romântico sofrer

Por dor que reconhece, dor que sempre se vê

É mais que uma doença, é um caso de amor

Por tudo que machuca e o que causa dor.

Eu deixo que pensem que fui derrotado

Com os ataques inesperados

Dos que bradam gritos de vitória

E esqueceram-se de ser enterrados.

Eu deixo que joguem em minhas costas

A culpa de todos os culpados,

Deixo que queimem toda minha história,

Não importa tanto assim.

Meus lábios correm em busca de palavras

E meus olhos correm em busca de beleza,

Desenho sentimentos mentirosos

Que calam todos os sinos ao redor.

Palavras saem como lâminas

Na voz rouca que sai de minha boca

Desse outro eu que me aborrece tanto

E desafia tudo à primeira vista.

Nas manhãs de primavera as folhas dançam

Ensaiando seus balés desde o nascer do dia,

Será isso vida?

_Será isso o que chamam vida?

Eu quero encontrar a palavra perdida

Entre os afazeres do dia a dia

Que seja tão profana

Quanto proibida.

Quero ir de encontro a uma nova estação

Que me traga uma sensação de alívio,

Procurar o que chamam felicidade

E talvez aprender o que seja isso.

Uma epidemia,

Uma leucemia,

Rimas que ilustram

Um eterno melodrama.

Não se pode ter tudo!

Nem sempre belos são os nossos dias

E continuamos acordando.

As rosas não falam, mas, também estão vivas.

Há fome de amor!

Há fome e o que será?

Há fome nesse lar?

Se há fome, então, há.

Há tempo para tudo!

Há tempo pra sorrir,

Há tempo pra chorar,

Há tempo pra partir.

Eu quero fugir de casa sem deixar aviso,

Correr entre os campos de trigo

E deixar todos aflitos

Tentando entender o que teria acontecido.

Eu quero causar confusão,

O mesmo tipo que trago em meu coração.

Quero molhar todos em volta

Com a tempestade dentro de mim.

Eu quero acordar os que dormem

E os que nunca acordaram,

Quero descobrir quem são eles

E espalhar quem somos.

Amantes dessa dor,

Sedentos sem saber

Onde mais se ter prazer,

Onde mais chamar de "lar".

Eu desvio o meu olhar

Com todo o ódio desse mundo

De todos os maltrapilhos e vagabundos

Que me reconhecem em um segundo.

Eu quero quebrar essas correntes,

Riscar paredes,

Promover a anarquia

E aprisionar o meio-dia.

Eu quero que chova canivetes

Enquanto rasgo minhas roupas,

Corto meus pulsos

E conto todas as gotas.

Um dia pode ser

Que algo aconteça

E faça que cesse essa tristeza sem fim

E tudo mude, enfim.

Então perco a ingenuidade

Do que ainda resta dessa madrugada

Vislumbro o absurdo de que tudo o que vejo

Ainda seja algo a ser lembrado.

Quem sabe um dia

A poesia se faça cantar

E a brisa leve o canto

A todo lugar.

Eu quero buscar um mundo perfeito,

Eu quero amar o que tem defeito,

Eu quero explorar meu próprio quarto,

Fazer contigo outro trato.

Eu quero te sacudir com violência nesse caixão

E mostrar onde estão todos os ratos,

Incendiar cobertores velhos

Que ora foram belos.

Eu quero te mostrar que te amo

E também te odeio,

Que posso viver só,

Mas, não também não vivo sem você.

A minha loucura é produtiva

E ao mesmo tempo, destrutiva:

Machuca uma multidão

E satisfaz a multidão dentro de mim.

Eu me recuso a fazer parte da matilha

Que passeia em supermercados,

Fingindo uma paciência tão desmedida

Quanto sofrida.

Eu como restos,

Coleciono poeira,

Faço inimigos,

Cultivo sonhos.

Eu troco constantemente de identidade

E perco a noção de realidade,

O meu estado é doente

E eu sou terminal e descartável.

Eu participo desse jogo,

Dessa novela em decadência

Desse repugnante teatro de horrores

Onde somente os cegos são honestos.

Eu sou minuciosamente escravizado

Enquanto me privam do privilégio da escolha,

Enterram nossa vontade

Na cova mais profunda.

O muro que nos separa é baixo

E andamos pulando de um lado para o outro,

Muitas vezes ambos existimos

E, outras, apenas eu existo.

Somos uma freira e uma prostituta

Que traçam uma eterna disputa

Entre os dois lados da moeda

Pra decidir quem foge e quem luta..."

CARTA AO IRMÃO DISTANTE (trecho)

"Meu irmão,
Meu querido irmão,
Bom dia!
Que o raiar do dia
Brilhe em seu rosto
E brilhe em sua vida!
Que os seus dias
Sejam ricos
De alegria.
Meu amado
E querido
Irmão,
Estamos vivos!
Tenho de lhe dizer:
Estamos vivos!
Você
Não está
Sozinho!
Você está
No meu coração
E na minha alma.
Você está
Dentro de mim
E no reflexo da água.
Você é parte de mim
E eu sou parte
De você!
Nós somos um
Dentre
Todos os outros.
Nós não
Estamos
Sozinhos.
Que o dia
Testemunhe
Nosso nascimento!
Que a aurora
Perceba
A nossa existência!
Que os campos
Recebam
Os nossos passos!
Que o mundo
Aceite
A nossa presença!
Meu irmão,
Meu querido
E amado Irmão,
Há tempos
Tento lhe falar
Uma coisa:
Eu estou aqui!
Me escute:
Eu estou aqui!
Você
Não está
Sozinho!
Eu preciso
Desesperadamente
De você.
Eu preciso
Desesperadamente
Saber de você.
Eu preciso
Desesperadamente
Estar com você!
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
A minha tenda
Está aberta
A você
Caso queira
Se esconder
Dessa noite fria.
A minha tenda
Está aberta
A você
Caso queira
Enganar
A fúria dos lobos.
Meu coração
Está ligado
Ao seu.
Meu sangue
É vermelho
Assim como o seu.
Nem o tempo
Pode apagar
Isso.
Nem a própria vida
Pode apagar
Isso.
Meu irmão,
Quem será você
Nessa multidão?
Abraçará a verdade
Ou fará parte
Da ilusão?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Percebe
A escuridão
Que se aproxima?
Percebe
O mal
Que agora cresce?
Escuta o som
Do trovão
Ao longe!
Escuta o som
Das trombetas
Ao longe!
Escuta
O bater de asas
Dos gafanhotos!
Escuta
Os gritos da turba
Furiosa!
A multidão
Que nos persegue
Insistentes
Têm fome
De sangue
Entre os dentes.
Todos querem
Um pedaço
De nós.
Todos desejam
Uma libra
De nossa carne.
Eles vêm
Durante
A noite.
Eles vêm
Durante
O dia.
Eles
Nunca
Dormem.
Eles
Nunca
Desistem.
Eu vejo somente
Ódio
Em seus olhos.
Eu vejo somente
Rebeldia
Em seus olhos.
Eles nascem
Dos murmúrios
E contendas.
Eles são frutos
Da raiva
E da hipocrisia.
Eles veneram
Ídolos
De mármore.
Ídolos de ouro,
Prata
E bronze.
Eles Clamam
Um pedaço
De nossa terra.
Eles Exigem
Até mesmo o suor
De nossa testa.
Não há alimento
Nesta terra
Que sustente,
Pois, sua
Fome
É desmedida.
Não há cobertor
Nesta terra
Que aqueça,
Pois, seu coração
É o frio do inverno
Mais extremo.
Não há justiça
Nesta terra
Que satisfaça,
Pois, esperam
Que o mal maior
Sempre prevaleça.
Não há razão
Pra que nada disso
Aconteça
E, ainda assim,
Tudo
Acontece!
Quem
Pôs nossos irmãos
Contra nós?
Quem
Nos pôs contra
Nossos próprios irmãos?
Quem nessa Terra,
Realmente,
Somos nós?
Quem nessa Terra,
Realmente,
São eles?
Quem sabe
De que lado estamos
Do espelho?
Todo esse ódio
Não nasce sozinho
Nas dunas.
Toda essa raiva
Não cresce sozinha
Na areia.
Então, quem nos odeia tanto
Querido e amado
Irmão?
Quem, há tempos,
Tem nos jogado
Um contra o outro?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Alguém, há tempos,
Rouba
Todo o nosso gado.
Alguém, há tempos
Contamina
Toda a nossa água.
Alguém, há tempos,
Assalta
Os nossos sonhos.
Alguém, há tempos,
Queima
Tudo o que nos resta.
Mas, quem nos odeia
Há tanto tempo,
Amado irmão?
A culpa
De tudo isso
Não é sua.
A culpa
De tudo isso
Não éminha.
Então de quem será,
Na verdade,
Toda a culpa?
Quem será,
Afinal, o nosso
Único acusador?
Quem vem
Para roubar
Todo o nosso fôlego?
Quem vem
Para destruir
As nossas esperanças?
Quem
Nasceu
De uma contenda?
Quem
Nasceu
De uma simples mentira?
Quem rasteja
Entre os lagartos
Do deserto?
Quem conversa
Com as estrelas
Do infinito?
Quem trama
Contraseus
Próprios irmãos?
Quem blasfema
Contra os céus
E o próprio criador?
Quem será
O nosso maior
Assassino?
Quemserá
O nosso maior
Adversário?
Quem será
Nosso irmão
Desconhecido?
Quemirá
Quebrar o silêncio
Nesse fim tão violento?
Meu irmão,
Imploro que me salve
Dessas ruas sujas.
Imploro que me abrace
Nessa noite
Tão fria e tão escura.
Imploro que me conceda
Uma simples oração
Nesse silêncio momentâneo.
Alguém trama
Constantemente
Contra nós.
Alguém
Quer ver
O nosso fim.
Meu irmão,
Querido e amado
Irmão,
Me abrace
Quando o vento
For gelado demais.
Me abrace
Quando ouvir
Meu suspiro de dor.
Minhas mãos
Tremem
De frio e de medo.
Meus ossos
Tremem
De frio e de medo.
Meu irmão,
Onde você estará
Agora?
Você estará
Dentro dos carros
Que passam velozes?
Você estará
Nas vitrines
Das lojas de roupas caras?
Você estará
Nos outdoors de neon
No centro da cidade?
Você estará
Nas propagandas
De marcas famosas?
Onde você
Estará,
Meu amado irmão?
O som
Do trovão
Se aproxima!
Quase
Explode
Meu coração!
Meus ossos
Tremem
De frio e medo.
Eu espero
Por algo
Que não me deve explicação.
Eu espero
Por algo
Que não compreendo.
Eu espero
Por algo
Que seja uma revelação.
Decerto
Surja
Entre os cactos.
Decerto
Cresça
Entre a grama queimada.
Decerto
Seja apenas
Mais um sonho.
Decerto
Seja apenas
Outro desejo escondido.
Meu irmão,
Nesse dia especial,
Quem será você hoje?
Nesse dia especial,
Onde estará
Você hoje?
Será você,
Meu irmão,
Meu único amigo?
Será você,
Meu irmão,
Meu maior inimigo?
Estará você,
Irmão, ao meu lado
Nessa noite fria?
Estará você,
Irmão, junto
À turba furiosa?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Será você
Aquele
Que dorme ao relento?
Será você
Aquele que
Luta contra o frio?
Será você
Aquele
Que enfrenta os lobos?
Será você
Aquele
Que protege os seus?
Quem será
Você,
Meu querido e amado irmão?
Meu irmão,
Eu imploro
Que me receba.
Meu irmão,
Eu suplico
Que me ouça.
Meu querido
E amado irmão,
Me aceite!
Me perceba,
Me entenda
E me acolha.
Me aceite
Do jeito
Que eu sou!
Me receba
Em sua tenda
Nessa noite fria.
Me aceite
De braços abertos
Nessa noite tão escura.
Me acolha
Nesses dias
Tão sombrios.
Me proteja
Desses dias
Tão terríveis.
Meu amado
E querido irmão,
Me abrace.
Eu preciso
Muito
Que você me abrace.
Eu necessito
Do ar
Que tu respiras.
Eu necessito
Do endereço
Dos teus passos.
Eu preciso
Ouvir
A tua voz rouca
Mesmo
Que seja
Por um mísero instante.
Mesmo
Que seja
Por um mísero segundo.
Mesmo
Que não diga
Absolutamente nada.
Mesmo
Que me diga
Absolutamente tudo.
Eu preciso
Que escute
Eu abrir meu coração
Nem que seja
Apenas
Por um segundo
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Eu sinto
Todo o frio
Que se avizinha.
Eu vejo
Todo o medo
Que não se explica.
Eu preciso
Tanto
De você!
Eu preciso
Que você
Esteja aqui por perto
E me aqueça
Caso esse frio
Persista.
Eu preciso
Que você
Me proteja
Caso
Todo o mal
Me alcance.
Eu necessito
Tanto
De você!
Eu preciso
Que me guie
Nessa noite densa.
Eu preciso
Que me esconda
Da fome dos lobos.
Que dissipe
Todos
Os meus medos,
Que lave
Todos
Os meus pecados,
Que seque
Até mesmo
As minhas lágrimas,
Que lute
Por mim
Com todas as suas forças.
Eu preciso
Tanto de você,
Meu querido irmão..."

O DESMATAMENTO DA ALMA (trecho)

"Hoje estava difícil de pegar no sono,

Quem diria uma vez mais enfrentar a estrada.

Calejada é a alma e o dom da palavra;

Quem diria; antes tudo hoje não diz nada.

Ouço vozes que partiram no vazio,

Vejo rostos que traziam novas histórias,

Tomo vinho numa taça e parece água,

Toco o corpo da amada que já foi embora.

Sinto-me bandeira em dia de domingo -

Baioneta pronta pra uma nova luta armada,

O hino que desfila em cada corda atrai vitória

Que é certa como o circo que já foi embora

E transforma o menino em homem feito e vivo,

Cada acorde é sentido e subentendido,

Toda letra é espelho do que já foi feito

Nessa terra que um dia sonhei ser perfeita.

Quem dera vida ser baile de sexta-feira,

Ter par certo esperando na hora marcada,

Perceber em cada flor aroma de desejo,

Em cada pétala roubada novo aprendizado

Mas, a lição que a vida emprega é cruel e triste:

A fatia desse bolo não é para todos,

O tiro muitas vezes sai pela culatra

E o ouro desejado é ouro de tolo.

Nesse teatro o palco quase sempre está lotado

Cada cor tem seu papel e nobre espaço,

Na platéia todos querem ser estrela,

As cadeiras vazias anunciam o fim dessa bonança.

Os tijolos dessa Igreja ainda estão quebrados,

Cada linha do teu livro soa tão amarga,

A confusão que se procede à verdade assusta,

Quero uma bailarina que me conduza.

Mostre-me que todo amor supõe ser verdadeiro,

Todo sangue derramado não é por acaso,

O suor que escorre lento da testa dos justos

É esforço que no fim será recompensado.

Mostre-me que ser honesto ainda é virtude,

A bondade é cobertor e ainda aquece.

Mostre-me que a justiça é cega e liberta

E que essa liberdade não é para poucos.

O que é que queima mais que gasolina?

1

De repente fui tomado como por acaso,

Mera introdução de algo errado.

Queria ser final feliz de ato insensato

Mas, sou estilhaços de vaso quebrado.

Não me diga que "o certo rima com o errado",

A tempestade de hoje é obra do acaso,

Há poesia em todo canto e o canto é sagrado...

Não há nada que conserte algo tão incerto!

Se o incesto que ocorre é proibido

E o aborto da questão, sopro do pecado,

O que diria da palmeira ao vento na avenida

E o sonho de sereia amaldiçoado?

Das noites claras e obscenas quase sem sentido,

Dos amigos e "amigos" cheios de favores,

Do veneno servido em taça de cristal

Produzido e engarrafado em fundo de quintal?

A voz que sai é presa, seca, lenta e tenta tanto

Produzir algo de bom em todo encontro,

Mas quis a vida que o banquete fosse dado aos ratos

E o tolo se servisse das sobras do prato.

O tempo toma tanto tempo e nosso tempo é curto,

Um mudo xinga um soneto e só um surdo escuta,

Cruzar a linha do absurdo é tão perigoso,

Improvável que se possa ver o outro lado.

Plantaram árvore em terreno que é condenado,

Condenaram a verdade a pegar atalho,

A falsidade se esconde em cada sorriso,

Cada abraço, cada ato feito ao acaso.

Feliz de todo estado que somar cidade,

Achar que tarja - preta é necessidade,

Descobri que falsificam tanto sentimento

Em prol da massa unida, a massa do momento.

Diga-me que cada gesto é abençoado,

Todo desejo puro será realizado,

Cada passo no asfalto não será em falso,

Cada tombo, cada soco é parte do passado.

Diga-me que quem perdoa será perdoado,

Todo jogo só termina no último ato,

Diga-me que foi fiel quem; na beira do abismo,

Abriu os braços e pagou por todos.

Quem é que dança mais que bailarina?

2

Ainda espero como espera alguém pelo trem

Que nunca vem e quando vem já está lotado,

Que entendam que não posso viajar sentado

E não espero que aplaudam ao estar calado.

Não leve tão ao pé da letra os cacos do espelho,

Nunca diga tudo num Confessionário,

Não comece a segunda com o pé esquerdo,

No domingo o orgulho estará machucado.

Muito tarde pra mudar o sobrenome,

Virar santo, ter um filho e morrer de fome.

Muito cedo pra nadar em poço de petróleo,

Ser vendido, ter vizinho e já saber o nome.

Todo o gado está marcado e foi alimentado,

Toda raiva faz sentido e o gosto é caro.

O perfume é barato e o rosto, lindo.

A vaidade é vendida em uma estrebaria.

Que esnobe o meliante que não aceita restos

Do que vendem de melhor nessa casa nobre!

Quantos cegos necessita no seu castelo

Pra que veja que o escravo almeja a sua terra?

Quantos dias têm seu mês e como gasta as horas?

Quantos nomes desconhece e quantos fazem falta?

Quantas pontes já cruzou e quantas cruza agora,

Quantas portas, quantos becos pelo mundo afora?

Quem dera ter da esperança endereço certo

E; por pura coincidência, ser perto de casa

E entre as casas não haver cerca que separe,

Mas; onde os carros passam não nasce mais nada.

Toda ofensa nessa tribo gera algum desfalque,

O traje usado na alvorada é um imenso ultraje,

A convenção dessa matilha foi iniciada

E hoje a fome é desmedida na maçonaria.

Se soubesse o que era espinho no meio da estrada

Pegaria outro caminho na volta pra casa.

Quem sabe dessa dança o seu passo certo

Dança até de salto alto e corre de chinelo.

Ainda espero ser visita e ter tapete persa,

Ser desenho e ter motivo pra mostrar sorriso.

Faço prece que a lágrima seja entendida,

É presente e foi passado para uns e outros.

O que é que brilha mais que diamante?

3

Valorizo o enlatado desse supermercado,

Vem em engradados de grandes possibilidades.

Tudo nessa fábrica vem com código de barras

Ou com marca de nascença, tudo planejado.

Busco sentido no insensato,

Dou espaço ao ingrato,

Se razão em manicômio é dissonante,

Desperdiço a sanidade de forma insensata.

Tudo soa original

Ao mal-acostumado,

Tudo soa secreto

Ao despreparado.

Tudo o que era mensagem foi apresentada

Ao delegado do bordel alado

E a passagem do sonho foi desvendada

Ou o delegado está enganado?

Esperam sentados os que sabem tudo,

Supõe-se que nasceram predestinados.

A arquibancada está vibrante com os pés de barro,

Com toda a ração doada pelos abastados.

Já vão longe os que se acham donos

Dessa terra onde o cordeiro foi sacrificado.

Do pecado que escorre pela montanha

Nada é mais valioso que o sangue novo.

Assunto velho em jornal velho!

Será velho o assunto se mudar a capa?

Tudo o que foi falado é escrito,

Tudo o que foi noticiado é relatado.

Escrevo o que vejo,

Grito porque vivo,

Vejo o que sou,

Sou o que escrevo.

Tenho agora semente do que era sonho

E quase sei o resultado da nova etapa.

Toda busca é sacrifício e é necessário

Que se aprenda a levar tapa mais do que se bata.

O indigente se alegra com a jaqueta nova,

A meretriz se contorce na calça de couro,

O bêbado se afoga com café quente

E todos fazem parte agora do mesmo corpo.

O que é mais quente que o corpo da amante?

4

Ansioso de fim de mundo,

Analiso vitrais de casas abandonadas.

Manequins são isentos de culpa,

Únicos a emocionar esse vagabundo.

Os quadros mais caros foram rasgados,

Os bordéis mais baratos estão lotados,

Os sonhos mais lindos foram esquecidos,

Os passos mais largos foram dados.

O que assola essa cidade é o seu estado

Que transforma qualquer coisa com o toque.

Que força responde a um estalo

O que é belo, mas já não mais ncomove?

Achar que é magia é heresia,

Achar sentimento nesse momento,

Achar saída no fim do dia

É quase apaixonar-se pelo sofrimento.

Como criança com brinquedo novo

Costuro o meu dia e imagino um acordo,

Procuro nas esquinas o sonho

Prometido durante meu sono.

O que é que se esconde há tanto tempo?

O que é que se permite há tanto tempo?

O que é que mata sem ressentimento

E ainda propaga todo o esquecimento?

Comoção não se vende com facilidade

E a ilusão é inimiga em qualquer idade.

Tudo o que um dia foi vantagem

Foi vendido com a própria virgindade.

Vou furar os olhos em homenagem

Dos que se foram pelos outros.

Vou escrever uma canção e exaltar a guerra,

Esperar que reconheçam os corpos

Que apodrecem nesse imenso campo

E todos os entes queridos e seu pranto.

Aos poucos se perde todo o encanto,

Tudo o que era pra ser santo!

O que é que me provoca terremoto?

O que é que me corrói todo por dentro?

O que é que desmorona o meu mundo,

Tudo em apenas um segundo?

O que é que pesa mais que todo o ouro?

5

Enquanto alimento idéias em meu sofá,

Fumo lembranças de um passado.

Invento tragédias inteiras no meu caderno,

E aprendo; na marra, a dançar tango.

O cemitério só acolhe o cliente certo,

Os mortos sempre acham que estão no salão errado,

A tumba que se fecha com certo atraso

Leva embora todo tipo de ira e descaso.

A mentira é moradia do covarde

E mais fácil de ser disseminada,

A distração preferida entre os sem-teto

E também daqueles que não tem mais nada.

Um aviso do síndico, nesse momento, é dado:

O tímido é besta e cínico,

Cola frases pelo teto e todos os lados

E espera ser justificado.

Volto agora ao tema que freou meu sono,

Não espere que eu seja limitado.

Pode-se beber aos poucos pelo gargalo,

Não deixe que escoe tudo pelo ralo.

Já não faz mais diferença essa idade,

Já não há vaidade,

Já não há espaço na sociedade,

Nem ao menos data de validade.

A educação do infeliz deve ser testada

Para que não espalhe a piada errada.

A noção de realidade ainda é exata

E o preferido da dona-de-casa é comida em lata!

Escolhas feitas podem ser desfeitas,

Caminhos podem ser evitados,

Cada exemplo serve de aviso,

Cada trilha tem o seu perigo.

O pastor que prepara o jantar noturno

E oferece a própria cadeira ao convidado

Honra o nome que lhe deram

Todos os justos e os desviados.

Nosso problema foi solucionado?

O início da aliança foi abençoado?

O tributo está pra ser mostrado,

O sol que nasce hoje é fruto disso tudo.

O que é que vale mais que um tesouro?

6

Meus olhos, nesse instante, vão à deriva

Vasculhando os escombros desse espaço

Na esperança tênue de chegar à tua ilha

E desbravar teu mundo nesse mapa

De valiosas possibilidades,

Sinceras raridades,

Grotescas vaidades

E famosas disparidades.

O barco está em mar aberto

E não sabe bem qual o rumo certo.

Passa longe a vontade de pedir socorro,

A ousadia é combustível dos outros.

A linha torta no oceano não se discute?

O ponto cego no vazio que me perdoe!

O que anda atrás da linha do horizonte

É desenho de algo que se esconde.

Se houver algum sinal que oriente,

Mostre-me o caminho do Ocidente,

Acompanhe esse desacostumado

A navegar sem bússola nesse mar imenso.

Meus olhos estão doentes

E a cegueira de espírito é permanente.

Dores no corpo são persistentes,

Não há palavra para o que se sente.

Não há ilha, não há lado,

Não há salvação, não há lodo,

Não há nada, não há lama

Não há mais Dalai-lama.

O que resta da viagem é sobra,

O que resta na bagagem, resto,

O que resta já não faz falta

E todo o resto sobra.

As ondas são seguras,

Batem com violência nesse casco.

A única certeza é o naufrágio,

A tempestade põe o barco à prova.

Esse mar é inimigo,

Esse mar é inimigo do ar que respiro,

Esse mar que me sacode sem aviso

É meu amigo, meu próprio inimigo.

O que é mais amargo que o sono da verdade?

7

A festa teve início

E o salão, no momento, está lotado.

Os olhares indiscretos, furtivos

Dançam junto aos desajeitados.

O trigo apodrece na sala ao lado,

Corvos dão sutilmente o seu recado,

A ceia é servida após a meia-noite

Para que celebrem todos os fantasmas.

Os espelhos não refletem nada,

E os cacos passeiam pela sala,

O sangue que gela minhas veias

É o que aquece toda a corja.

Nada que diga,

Nada que tente,

Nada que faça,

Nada adianta.

Começa agora o ensaio da loucura,

Tudo o que, um dia, detestava.

Considere ridícula a tentativa

De tornar verdade uma mentira.

E se quero que me veja...

E se quero que me escute...

E se quero que me entenda...

Que a chance não me abandone.

Do soro dessa seringa

Eu já sou da família.

Eu sou o "acaso" de todas as festas

E sempre o último convidado.

E se o soro acaba como é que fica?

E se o soro estraga, como é que fica?

E se o soro é vida, vem com demora

E é assim que me namora.

Não deixo que o sabor de derrota

Camuflada com menta e, às vezes, hortelã

Ache quarto arrumado nessa casa

E seja visita indesejada e constante.

Que seja tudo escrito,

Que seja bem-feito,

Que seja outro caminho,

Que seja bem-vindo.

O que é mais justo que a própria liberdade?

8

Agora tempo é puro desperdício.

Vem cobrar cada centavo a cavalo,

Chega mansinho, pedindo abrigo

E conta os passos já dados.

Que sirva de elixir o marasmo,

Seja aviso-prévio o recado,

Sirva de conselho o boato,

Asilo político nos meus braços.

Já não há tesouro quando aperto o passo,

O relógio foi enterrado.

O remédio era tão fraco, nesse caso.

Toda tosse é prenúncio de resfriado?

A doença fez efeito?

A pobreza é defeito?

Há proeza no consenso

Que loucos têm sobre bom-senso?

O recado foi passado e eu me acuso

Que desse crime sou culpado.

Mas, compaixão e algum cuidado

Pelo iniciado em todos os pecados.

Há algo pior nesse mundo

Que a sorte ser prima da morte?

Há algo que realmente valha a pena?

Talvez lucidez, alma serena.

Agora assaltam meu direito de respirar

O pouco ar que ainda existe nesse parque,

E assegurar promessas e poemas

A alguém que venha a ler; quem sabe, um dia.

E o sono já me ataca!

Estraga-me, sinceramente, o dia

Em que se rebelam os desejos

E o resultado é a sarjeta.

E se a madrugada é piada,

O palhaço está de folga essa semana.

A dureza dessa carne é acostumada

E faz hora extra em casa mal-assombrada.

O que ocorre na penumbra é a mordaça

Que me cala e cala o mundo e ameaça

Com desaparecimento de celacanto

Quem confunde barítono com soprano.

O que é mais doce que o gosto da vingança?

9

Se me abraça desejo de ser desenhado,

Rabisco em paredes de concreto,

O incêndio é criminoso

E não há quem apague o fogo.

Ainda os mesmos desejos

E, claro, os pecados.

Estranhos os ensejos

Que levam ao acaso. Acaso?

Pago o preço da passagem

E convido pra jantar um esfomeado,

Assino com o nome de um desconhecido

A conta do homicídio nesse ninho.

Que brilhe o canto,

Seja encanto,

Domine o espanto,

Não seja reles por enquanto!

Talvez seja engano

E a (in) certeza, um erro.

Talvez haja mesmo movimento

Em prol do ego no momento.

Dos nomes em contexto,

Nomes usuais antes do surto,

Rimei obsessivo-compulsivo

Com pedinte, vagabundo.

Não há perigo antes do tema,

Nem pecado antes do ato,

Nenhum soluço,

Tudo é perdoado.

Pecado é o medo de ser

Livre, inusitado.

Medo de engolir a seco,

De trazer sujeira ao lago.

O desfile dos filhos bastardos

Que fugiram de casa

Começou antecipado e se tornou surpresa,

O arrependimento foi em massa.

A palavra foi entregue

Deturpada,

Receita em becos

Onde o desespero fez do medo, reino.

O que é mais forte que um fiapo de esperança?"

10

Funcionário público, compositor, professor, poeta e escritor brasileiro, natural de Telêmaco Borba - PR, nascido em 23 de dezembro de 1975, filho de Adroaldo Barbosa e Maria Eloiza Barbosa. Formado em Letras Português/ Espanhol pela UNIOESTE (2004) e pós-graduado em Métodos e técnicas de Ensino pela UTFPR (2007). Possui residência fixa em Foz do Iguaçu há 40 anos. É casado e não possui filhos. Ex-vocalista da banda de Rock underground dos anos 90, Queima de Arquivo, é Autor de 5 livros publicados. Sua produção literária abrange todo o território nacional e está sendo vendido em mais de 100 países. Escreve para todos os públicos, desde o público infanto-juvenil ao adulto. Parte considerável do material apresentado pelo Autor já havia sido escrito há mais de 20 anos e somente está sendo publicado recentemente.

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