Just_Karl

Just_Karl

Só deixando salvas as sessões de terapia comigo mesmo. Eu, um bloco de notas e um filtro de censura desligado.

1988-01-11
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Alguns Poemas

É carinha, você envelheceu.

O seu sorriso não consegue esconder as rugas do lado dos olhos, as veias te saltam e sua barba já está ficando decorada de fios prateados...
O tempo passou. Seu corpo já não se recupera como antes. As dores são mais persistentes, o cansaço parece mais pesado e o descanso está longe de ser restaurador.
Os problemas da vida adulta se misturam com os daquela criança apaixonada pela vida, que fazia tudo de forma inconsequente. Mas se jogar de peito aberto em aventuras agora machuca ainda mais. Seus amores, suas paixões, os seus hobbies, tudo tem que ser mais cauteloso, mais delicado, porque qualquer intensidade a mais do que você pode suportar irá sugar o pouco de energia que vem te sobrando.
Logo você, que sempre disse que nunca passaria dos 30. Que pensou em ter um filho. Mas nunca pensou que essas duas informações não poderiam se complementar. Se pudesse voltar ao passado, diria pra se acalmar, você passará dos 30, mas o plano de um filho teve que ser adiado.
Como está seu coração? Cansado? Cuidado? Quem diria que, logo você, um apaixonado pela vida, que viveu loucos e intensos amores, iria conhecer o que é amor a primeira vista depois de velho? Bastou um sorriso.
Como está sua cabeça? Cansada? Cuidada? Suas angústias do passado foram separadas em caixinhas, pra hoje poderem dividir espaço com responsabilidades, ansiedades e vontades. 
Ao se olhar no espelho, você tenta ver aquele rosto que você conheceu há 20 anos atrás. Você sabe que ele está ali, em algum lugar, tentando dar as caras, mas continua preso atrás das suas "marcas de expressão". Você, que achava ruim quando as pessoas implicavam com você franzindo a testa bravo, ou erguendo suas sobrancelhas, hoje vê seu rosto se enrugando até nos sorrisos.

É, meu caro. O tempo passou rápido. Quase tudo que você deixou pra amanhã não vingou, porque o amanhã veio como um trem desgovernado, te atropelou, virou ontem e você não conseguiu nem ver de que estação ele veio.
O que você tem hoje? O que você carrega com você?
Algumas cicatrizes e uma bagagem enorme né?
Você já não tem aquela vista da montanha, que mesmo nos piores momentos, estava ali no seu aniversário. Seus amigos não são mais os mesmos. Estão todos longe, tratando de lidar com o tempo deles. Os amores são outros, e as coisas que você valoriza também.
Pode ser que olhando pra tudo isso, uma ou duas lágrimas escorram do seu rosto, talvez tentando hidratar essas imperfeições. Mas se nem Monange salvou a Xuxa de envelhecer, não vão ser elas que vão desfazer tudo isso que o tempo te trouxe. Mas além de rugas, o tempo te trouxe experiência, vivência, e até um pouco de malandragem. Agora você sabe como o jogo funciona, entende o jogo, e entende que ainda dá pra ser o protagonista dele.
Você tem duas opções, se sentir velho, como o seu reflexo no espelho mostra. Ou você pode falar um bom e velho "foda-se", como aquele moleque de 15 anos dentro de você diria, mostrar um dedo do meio pro espelho e sair pra viver.

Se você está apaixonado de novo, lute por isso. Se você quer sentir o frio das nuvens, lute por isso. O mundo sempre foi seu, você sempre lutou pra conseguir tudo que queria. E você sempre conseguiu. Já passou da hora de entender que o mundo não está disposto a te dar as coisas de mão beijada, então se é pra jogar a vida no modo hard, vamos ser a pedra no sapato do chefão final. E se não der certo, a gente recomeça o jogo. O game over não veio nos 30. Agora ele que espere, porque você está cheio de fichas.

Será que você consegue voltar e ler isso daqui alguns anos? Se sim, oi você (eu) do futuro. Espero que tenha dado tudo certo. Fiz meu melhor até aqui.

"Logo eu que sempre achei legal ser tão errado..."
(17/Out/2024)

Aos cuidados de quem ao menos se importou em abrir

Olá. 

Sim, eu ainda estou aqui. Lutando — ou apenas resistindo — contra tudo o que se passa nessa cabeça cansada, nessa mente que carrega o peso de muitas palavras engolidas e silêncios forçados.  Essa cabeça de amendoim que por fora carrega duas orelhas e cultiva, orgulhosamente, alguns fios brancos.

Desta vez, confesso que estou dividido entre agradecer e xingar — e, talvez, se fosse socialmente aceitável, esmurrar — algumas pessoas. Não posso dizer que sou obrigado a escutar certas coisas que não gostaria, mas, infelizmente, a vida em sociedade me obriga a vestir uma fina camada de educação para que tudo transcorra na mais falsa paz possível. 

Mas está difícil, viu?

Sim, eu fiz uma mudança radical na minha vida e no meu corpo.
Não, eu não consultei todo mundo.
Não, eu não sigo os protocolos médicos como deveria.
Não, eu não entendo tudo o que gostaria sobre mim mesmo.

Respondidas as três perguntas que mais ouço, permitam-me perguntar:

  • Onde estava essa súbita preocupação de vocês quando eu deixava bem claro, ainda que em silêncio, que eu estava quebrado, carente de qualquer gesto que fosse sincero?
  • Onde estavam quando eu implorava — mesmo que com o olhar — para compartilharem comigo momentos simples, em atividades que me faziam bem?
  • O que passava pela cabeça de vocês quando eu abria mão de mim para estar presente nos ambientes que interessava a vocês, mesmo sem nenhuma afinidade da minha parte?
  • O que esperavam que acontecesse comigo ao me tratarem como um depósito emocional, um cantinho da bagunça onde se joga tudo o que não se quer mais olhar?
  • O que vocês imaginaram que eu me tornaria depois de levar tanta pancada de todos os lados — algumas, inclusive, bem literais?

Sim, eu tentei.
Tentei ter uma vida normal.
Pedi companhia, pedi atenção, pedi ajuda.
Cheguei a implorar.

Depois eu só desisti.

Talvez, se eu tatuasse na testa “Desaparecer é melhor do que pedir ajuda”, e não discretamente no braço, traduzido e bem claro, esse grito teria sido compreendido. Mas fiquem tranquilos: é só uma música que eu gosto (inserir aqui minha melhor cara de sarcasmo ou, melhor ainda, aquela figurinha do Cebolinha sentado que eu adoro usar no WhatsApp). Se eu realmente tivesse gritado tudo isso esperando que alguém ligasse, eu teria chegado aqui sem voz.

Então, sim: eu vim até aqui sozinho. Porque vocês me ensinaram a ser assim. 

Sozinho. 

Fui moldado para ser a companhia ideal de todos, e quando não era necessário, eu aprendia a ser minha própria companhia. Me esforçava para ser o parceiro ideal. O filho ideal. O amigo ideal. O funcionário ideal. O ser humano ideal. Mas ideal pra quem?

Será que eu precisava me esforçar tanto por pessoas que me tratavam "como dava"?
Será que eu deveria me doar tanto por quem só lembrava de mim quando precisava ou se sobrava tempo?

Não foi meu gosto por músicas diferentes, nem meus hobbies, nem meu jeito. Foi sempre falta de vontade.
Porque se faltasse vontade a qualquer um de vocês, era aí que eu tentaria. Mesmo desajeitado, eu tentaria. Tentaria estar lá. Tentaria fazer parte. Tentaria acolher.

Mas, de vocês, faltou atenção.
Faltou abraço.
Faltou toque.
Faltou afeto.

Hoje ainda não tenho nada disso. Mas pelo menos não sou mais obrigado a conviver diariamente com quem me negava essas coisas.

Durante muito tempo, achei que não passaria dos trinta. Me enganei.
Mas não foram poucas as vezes em que considerei seriamente não chegar aos quarenta.
E, acreditem ou não, desisti da ideia por consideração a alguns poucos — exatamente os mesmos que, ironicamente, me empurraram até a beira do abismo.

Já pesquisei tudo: como cortar, quanto tomar, quanto custa pra atirar, como apagar sem dor.
Olhar para baixo, de janelas ou nos meus voos, era uma rotina.

A única coisa que ainda me prende aqui é uma consideração que eu não deveria mais ter.
E, como uma composteira emocional, tento transformar toda essa merda que fermenta dentro de mim em algo que preste.
Às vezes ainda penso em desistir, dormir e não acordar.
Mas achei mais interessante virar uma espécie de pesquisador.

Hoje, conduzo um estudo sobre as dores que me causaram. Testo meus próprios limites. Revisito traumas. Revivo cenas.
Porque, com a ajuda de vocês, eu conheci lugares dentro da dor que jamais deveria ter visitado.

Sei o que é apanhar para comer e também sei o que é passar fome.

Sei o que é ser espancado. 

Sei o gosto do meu próprio sangue, posto na minha boca da forma mais indigesta que se pode oferecer a uma criança. 

Sei o que é ver pessoas que conhecem essas histórias se juntarem para dar risada como se minha vida fosse um episódio de uma SitCom, com risadas falsas rolando ao fundo tentando transformar aquilo em uma grande piada. 

Sei como é implorar por carinho e receber silêncio.

Essas tatuagens vocês não veem. Mas elas estão aqui, marcadas com fogo na pele da memória, e me arrepiam dos pés à nuca enquanto escrevo isso.

Então, quando ouço:

“Isso pode te fazer mal.”
“Mas isso é sério, você pode morrer.”

A única coisa que consigo pensar é: agora vocês se importam?

Enquanto eu nunca tive problema em falar sobre a morte, vocês nunca demonstraram se importar com a minha vida.
E, sendo sincero, se um dia eu não estiver mais aqui, espero que a causa tenha sido eu mesmo, tentando melhorar um pouco do que sobrou, porque desistir por quem nunca assumiria um centésimo de responsabilidade seria, no mínimo, trágico.

Desculpem por ter tirado de vocês o prazer de me destruir e ter começado a fazer isso sozinho.
Devo admitir: chega uma hora em que a dor vicia. A dor confunde. A dor preenche.

E, se existe uma coisa que sempre elogiaram em mim, foi minha criatividade e minha capacidade de adaptação. E essa combinação é maravilhosamente interessante.

No fim, só me resta dizer:

Obrigado. Por quase nada.
Ou melhor: pelo mínimo.

Continuem sustentando essa vida de aparências, essa ilusão de normalidade.
No fim das contas, é o que vocês têm em comum. É o que importa para vocês.

Só peço uma última gentileza:
Continuem fingindo preocupação.
Porque, por mais irônico que pareça, isso ainda me dá algum alívio. O dia em que isso acabar, vou achar que finalmente chegou o dia que eu decidi não levantar mais da cama.

Com quase nada de carinho, mas ainda com alguma ironia que me sobra,
De quem vocês ajudaram a enterrar vivo.

Eu sempre quis ser pro mundo o que o mundo nunca foi pra mim

Há uns dias atrás, essa frase veio muito forte na minha cabeça. Essa frase surgiu pra mim, DO COMPLETO NADA, enquanto pensava em outras pessoas... Pessoas específicas, inclusive. Talvez esse plural seja até um excesso desnecessário.

Retribuí violência física, emocional e sexual com abraço, sorriso e acolhimento. Minha cabeça fica tentando entender onde está o erro: na minha tentativa de agradar, ou na minha tentativa de não me entregar à resposta óbvia desses estímulos?
Já percebi que sou uma pessoa que normalmente escolhe o caminho mais fácil ou cômodo. Mas aqui, nesse "minúsculo" aspecto da minha vida, quando todas as minhas forças poderiam resultar em revolta e violência, acabei tomando um outro caminho. Talvez, ao invés de ser o motivo de mais uma pessoa se sentir como eu, eu queria ser o abraço dessa pessoa. E isso não é ou foi nada cômodo.

Normalmente sou uma pessoa que se afasta de tudo e todos. Talvez porque tenha aprendido que praticamente tudo que se aproximou de mim trouxe problemas. Então o melhor é só evitar mesmo.
Acho que não à toa tatuei essa frase no meu braço: "Desaparecer dói menos que pedir ajuda". Sempre fez muito sentido pra mim. E escutar uma música em que, resumidamente, para ter uma vida melhor a pessoa se transformou em um espantalho, vazio, sem vida, sem sentimentos e com um sorriso rabiscado no rosto, fez sentido de tantas formas diferentes que acabou indo pra pele.

Meus esportes radicais, as artes marciais e o jeito inconsequente de lidar com a vida ajudam com os pensamentos intrusivos. Naqueles pequenos instantes de loucura ou em que eu estava autorizado a bater em algo/alguém, sou só eu pensando comigo mesmo. Nunca fui à extremos, mesmo que extremo seja uma questão de perspectiva. Mas algumas coisas já passaram na minha cabeça. E se? Me agarrei com as forças que sobravam no que eu tinha, e esse "e se?" nunca saiu do papel. Mas e se?

Aprendi a pedir desculpas. Mais do que deveria. Mesmo quando não deveria. Mas sempre tentei dar esse passo. Confesso que as vezes falhei por orgulho, mas tentei. As vezes a palavra era pesada demais pra sair do meu peito, mas um chocolatinho e um abraço não faz mal a ninguém e deixa subentendido...  
Ou será que não? 
Será que foi compreendido dessa forma pelas pessoas?
E se todos pedissem desculpas dessa forma, o que poderia acontecer? Será que tudo ficaria mais em paz ou a palavra "desculpa" ficaria mais vazia e cliché que "tudo bom?/estou bem e você?" ou o famigerado "eu te amo"? Dos questionamentos que eu costumo fazer nessas conversas comigo mesmo, quase num tom de esquizofrenia, essa resposta aqui eu nunca vou ter. 

Mas eu também aprendi a amar por inteiro. Aprendi a abraçar. Aprendi a sentir o cheiro do cabelo de um amigo dentro desse abraço. Aprendi a segurar uma mão e dizer que vai ficar tudo bem. Aprendi a dar um sorriso e dizer "se você precisar, meu abraço está aqui". E sempre está.
Se você não me afastou de você, talvez você tenha sido capaz de testemunhar que isso é verdade. Se você não conseguiu isso, peço desculpas, tive que seguir. Meu coração entende apenas dois comandos: gostar ou ir embora. Seja com família, seja com amigos, seja com amores.

(E eu me pergunto aqui: quem é esse você? Eu sei que vou no máximo mostrar isso pra meia dúzia de pessoas, mas cabem diversos vocês nessa conversa que nunca saberão que isso ocorreu)

Essa minha cara de bravo, de estressado, ou o meu tom de voz, as vezes pode te preocupar. Mas se me perguntar se tá tudo bem, eu vou dizer "estou bem" com um sorriso, as vezes forçado, pra não transparecer todas as brigas internas. Entranhas devorando entranhas. Mas o sorriso estará lá. 
Vejo que no fim das contas, tudo que eu ofereço é tudo aquilo que sempre precisei. Abracei por precisar de um abraço. Em muitos momentos, lá no fundo do poço, quando tudo sufocava, as vezes um abraço seria a mão estendida, e mesmo com tantas pessoas que diziam se importar, nunca veio. Então eu aprendi a sinalizar a disponibilidade do meu abraço. E já me sujeitei a tanta coisa pra ganhar esse bendito abraço...
Amei por precisar ser amado. Amar por inteiro não era uma opção. Era uma necessidade. Necessidade de ter por perto alguém que, ao sentir que está sendo amado, retribuiria essa completude para mim. Não deu certo totalmente, como posso ver pela minha situação atual, mas deu certo enquanto durou. Se deixou de dar certo, foi porque em algum momento, deixou de fazer sentido toda essa energia gasta.
E aprendendo a amar, aprendi a dividir as pessoas em caixinhas, tendo consciência plena de qual caixinha cada um ocupa. Os amigos, os amores, os sexos ardentes e a família. Cada um com a sua importância, mas todos que eram importantes o suficiente para serem mantidos nessas caixinhas (que sofriam limpezas de tempos em tempos) tinham 100% de mim, mesmo que eu não encontrasse 100% nelas.
Hoje não sou a pessoa mais fácil de lidar. Mas olhando pra dentro, consigo ver que sou uma pessoa bem melhor do que está aqui na minha cabeça. No fundo, acho que isso já parou de tentar sair de mim. Essa angústia misturada com rancor e raiva já entendeu que se ela quiser continuar existindo, vai ser ali, na minha caixinha do sofrimento (que eu costumo me referir como a Caixa de Pandora). E essa caixinha é só minha. Toda vez que precisar ser aberta, o farei em silêncio e distante de todos. Até porquê quando ela é aberta, o rio é grande...
Mas guardar essa caixinha à sete chaves não é uma escolha. Eu já caí na besteira de deixar ela se abrir, e todas as vezes que isso aconteceu, a reação das pessoas foi muito dura. Quando tentei transparecer o que realmente estava aqui, assustei pessoas. Então com essa caixinha eu tomo mais cuidado, e tenho consciência que ela é só minha.

Talvez a pergunta central de tudo isso seria: fazer isso tudo pros outros pensando que lá no fundo eu vou estar satisfazendo uma necessidade minha me transforma no quê? Um manipulador? Dissimulado? Egoísta? Aproveitador? Não consegui justificar o questionamento dessa atitude com um adjetivo bom... Se for isso mesmo, deixar os meus sentimentos se apropriarem da frase do título do texto vai me fazer parecer ainda pior...
Eu já fiz perguntas demais pra mim enquanto escrevia, e talvez pra algumas delas eu talvez não queira saber a resposta. Então vou me permitir chegar a uma conclusão, talvez faça mais sentido. 

Se você me ver e for um amigo, vista seu melhor sorriso e me abrace. (olha lá o "você" aparecendo de novo, seu maluco)
Se a caixinha que você está te permite: me beije. Me ame. Aproveite do meu corpo de forma consentida e mostrando que somos dois querendo estar naquele momento, seja ele qual for.
Mostre o quanto eu importo simplesmente por existir aqui, desse jeito. 
Eu sou  o resultado de tudo de ruim que aconteceu comigo, mas que eu tentei fingir não terem importância no meu dia-a-dia pra dar importância aos outros. E provavelmente por sua causa, eu ainda brigo com esses fantasmas pra evitar que eles te assombrem. Essa parte vai fazer bem mais sentido com a música do final...
Tirei o que estava na minha cabeça e coloquei aqui. Agora falta mostrar isso aqui pra todos, de alguma forma, pra que talvez eles entendam que por mais que eu esteja longe de ser um super herói de capa, eu também não sou o vilão, não enquanto eu estiver ganhando essa briga interna. Só posso prometer força. Pudera isso chegar a todos os "vocês" desse texto.

 

"...Entenda que dentro de mim
Tem tanta coisa pra eu resolver
Essa casa eu tenho que arrumar
Pra poder receber você

A minha casa é assombrada
São meus esses fantasmas
Por onde quer que eu vá
Comigo sempre vou levar
E é só a mim que eles vão atormentar..."
(11/Out/2024)

Se essas paredes falassem

Só a gente mesmo consegue dizer o que se passa quando estamos sozinhos dentro do quarto ou dentro da nossa cabeça. Só a gente conhece nossa própria escuridão.
E intercalando esses momentos de solitude e solidão, a gente fica tentando encaixar peças, como se estivesse em um quebra-cabeça que nunca nos esforçamos o suficiente para terminar. A gente tenta entender contextos e ressignificar sensações. A exaustão, a ansiedade, o desespero dançam em volta da gente como velhos amigos enquanto lutamos pra tentar transformar essa presença em algo um pouco mais aceitável ou um pouco menos destrutivo.
Enquanto tentamos olhar tudo isso "por fora", aquele grito incomoda ainda mais a sua garganta, tentando achar uma rota de fuga pra se libertar daquele nó que ele mesmo criou. Ele é o resultado da nossa cabeça dizendo pra gente: "- não tá bom". Isso é o peito mostrando que talvez, do mesmo jeito que aquele grito não cabia mais dentro da gente, talvez a gente não caiba mais onde estamos nesse momento.
E sair de dentro da nossa cabeça exige uma energia que muitas vezes a gente não tem. E não é porque não quer. É porque toda essa energia foi utilizada por todos os pensamentos intrusivos que ocorriam. As angústias em relação ao passado, ansiedades pelo futuro e todas as incertezas que o presente traz.
Nesse ringue, lutando contra nós mesmos, as vezes já se passaram muitos rounds. O bastante pra energia estar a um passo de se esgotar. E nesse ponto, não existe mais cabeça ou raciocínio, não sai mais nenhum soco ou chute. Até se defender é difícil. A exaustão só deixa o seu coração responder, o resto já está entregue.
Nessa hora temos duas opções: nos deixar nocautear e voltar pra dentro da cabeça, aquele lugar que nos fez dar toda essa volta em vão, ou tentar focar naquilo que seu coração tenta fazer com o restinho de energia que sobrou.
Se a gente cai, só consegue sentir a culpa de estar de volta ao velho percurso, sempre dizendo que vai ser diferente da próxima vez. Talvez repetindo essa mentira várias vezes a gente até se convença disso. Esse looping da destruição infelizmente eu conheço melhor do que eu gostaria. Sempre foi muito mais fácil desistir, e aquele lugar que a gente sabe que é ruim se torna um lar por puro comodismo. E nas paredes cercando a gente, pôsteres dos nossos melhores momentos, aqueles que a gente não se esforça para se repetirem, e garranchos, rabiscos de pedidos de socorro que fizemos nos momentos de mais profundo desespero, na esperança que alguém além de nós mesmos pudesse ler e estender uma mão pra nos tirar dali.

Nesse momento, estou me sentindo como alguém treinando apneia embaixo d'água, e a cada tentativa, consegue aguentar um segundinho a mais. Nesse exato momento, de tanto passar por aquela sensação de ter só um restinho de energia pro coração responder, esse restinho foi mais do que o suficiente. E agora, tal qual a pessoa em apneia, eu tirei a cabeça de dentro d'água e estou tentando processar a novidade. Uma parte de mim me fala pra comemorar esse pequeno avanço, a outra tenta me fazer imergir a cabeça de novo pra tentar "melhorar ainda mais". 
Nessa luta, de tanto tomar esse golpe baixo de mim mesmo, acho que o melhor a fazer é tirar as luvas e comemorar o momento.
Reler tudo isso me traz um misto de alívio e estranheza... 
Como fiquei ali tanto tempo? 
Que cicatrizes esse lugar vai deixar em mim?
Será que vou conseguir parecer normal e convencer todo mundo em volta, mesmo que nesse exato momento eu esteja aqui sozinho, conversando comigo mesmo?
E no fim das contas, será que eu preciso convencer alguém? Onde estavam até agora?
Espero não voltar pra “lá”. Torço para enquanto tiver me curando, essas paredes guardem os segredos que eu escrevi ali. O esforço daqui em diante é para transformar esse período fraqueza em um ponto diminuto no livro final. Uma nota de rodapé, que explica algo realmente importante, mas consegue sintetizar isso em uma frase pequena.

Mas no fim das contas isso não é o livro final. Não é nem a nota de rodapé. É só o som do grito que conseguiu escapar do peito. Se depois dele eu não ficar sem voz, talvez outros apareçam... Ou quem sabe eu consigo silenciar eles com um sorriso? 

“Eu tentei pintar na minha cara um sorriso igual àquele que eu sei, está lá, num grão de areia entre as Mostardas e o Pinhal...” 
(05/Out/2024)

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