Carlos Silva

Carlos Silva
O Músico, poeta cantor e compositor CARLOS SILVA, segue a trajetória de cantadores utilizando o canto falado em seus shows, palestras e apresentações em unidades de ensino fundamental e superior.
Nasceu a 14 Abril 1963 (São Paulo)
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UMA CRÔNICA COM REQUINTES DE SAUDADES

O tempo age em nossas vidas, como um guardião, um protetor invisível, um acolhedor, um corretor de nossas atitudes, um memorizador das nossas ações que nos tornam pessoas que com o passar dos anos, começa sentir saudades de tudo aquilo que a sua mente ainda armazena e traz a tona de um recordar. Por mais distante que tenha sido o ocorrido, a mente sempre armazena, as melhores lembranças das nossas vidas.

Assim, sentado num banco da solidão e bebendo as gotas do meu passado insistente em me fazer recordar, fiz uma mente regresso e comecei viajar nessas andanças do meu cérebro que ainda guarda momentos que forçosamente tenta extrair e exteriorizar, para que eu possa transcrever cada partícula de tempo em que vou recordando.

Saudade bate, coração pulsa, alma sente, e a vida me cobra um proceder como se criança eu ainda fosse, ao ver tantas crianças ainda por mim passar, com a leveza desses infanto recordar que hoje mima o meu ser de gente grande almejando ser “minino de calças curtas” a perambular pela vila com os olhares juvenis onde era proibido não ser, não fazer e não se sentir feliz.

Talvez, você nunca em sua vida, tenha ouvido falar da Serra. Da Serra do Aporá, que fica perto de Cajueiro, (Acajutiba) de Barracão, (Rio Real), Mocambo ou Novolinda, (Olindina) da Natuba (Nova Soure) de Sobrado (Aporá) De Dendê, Bomfim, Vila Rica (Crisopolis). Não! Jamais eu poderia condena-lo por isso, afinal, nossos topônimos talvez estejam muito distantes dos teus. Mas saiba que foi por aqui, nessas imediações entre litorais e sertões que eu fui criado e tido como gente vivente para desbravar essas terras. Oriundo sou de outro local onde por lá deixei enterrado meu umbigo como uma identidade, um pertencimento e uma forma de me achar inserido nalgum canto desse imenso país. Talvez, isso nem implique mais em identificar-me lá onde meu umbigo um dia foi enterrado, pois foi daqui que comecei meu primeiro contato com o povo que passou ser meu povo, com a gente que passou a ser a minha gente, e que por este aceito fui e por isso identifico-me até com o seu modo de falar e de fazer a vida ter sentido nesse viver alucinado em busca dos sonhos que nunca se perdem pelo andar desse mundo tão complexo e cheio de descobertas, lembranças, prazeres duvidas, sonhos e até decepções. Na complexidade desse meu discurso em busca de mim mesmo, é que me apresento para que entendam que eu também tive quimeras que hoje as lembranças tangem o meu viver para esses mais remotos encantos da minha vida. Assim, passo a lhes convidar para conhecer um pouco dessa minha Serra, a Serra do Aporá que fica perto de todas as cidades acima citadas, para não ser redundante.

Por favor, queira por gentileza concentrar sua atenção em mais esta narrativa que lhes passo como uma reparação trazida nesse momento pelos deleites das minhas lembranças.

EITA, a idade chegou, o cansaço me veio e a fadiga me alcançou.

Sentado num banco de praça (perto de casa para não me afastar muito) vejo as crianças brincando numa gritaria exagerada como somente elas sabem e podem fazer. Sim, podem. Toda criança pode ter o direito de gritar, extravasar a meninice e ao seu modo ser feliz. Afinal, ser criança, é um curto tempo que passa ligeiro e em nós deixa saudades, ainda que vivamos 100 anos.

Avisto um dos meus netos correndo com seus coleguinhas, e outro que passa na minha frente e feliz grita pra chamar minha atenção: OLHA VOVÔ. Todo orgulhoso em pedalar sua bicicleta.

Meus olhos se enchem de saudades e numa fração de segundos, eu me lembro da bicicleta que papai comprou pra mim e da alegria que eu senti em poder dizer: Eu tenho a minha bicicleta que papai comprou pra mim.
Era pra ir pra escola, pra ir à venda comprar algo pra mamãe, pra dar um recado, pra chamar alguém para ajudar em casa e principalmente para fazer o que o meu neto está fazendo agora: PARA BRINCAR. Preencher o tempo de menino em meio a tantos gritos aproveitando aquela liberdade que só quem é (ou quem já foi) criança sabe o seu significado.

A vida passou, Itamira cresceu o açude que era imenso, diminuiu juntamente com o tanque grande. Quando a gente é criança tudo é grande. O pé da serra era imenso, a ladeira do João Luiz era enorme e atolava carros por lá quando chovia e os tanques transbordavam e as pessoas iam pescar e saiam carregando suas enfieiras de peixes.

Vou tentar Descrever um pouco do meu viver numa vila que me viu crescer, amparado nessa minha meninice ali vivida, mesmo sabendo que a mente, não vai obedecer alguns detalhes que o tempo apagou. Mas deixou alguns lampejos dessas lembranças onde agora passo a fazer a minha narrativa, ou o que sobrou de todo esse meu lembrar.

Existia a praça onde eu morava com minha família, seguindo reto chegávamos à casa de Manezinho e Dona Bemvina que era a mãe de Tinego. O comércio se dividia assim:
Tinha a pensão de Dona Amélia e de Dona Eduarda. A farmácia de Terezinha de Pasquinho, O bar de Manoel de Juca, o Departamento de Correios e Telégrafos (D.C.T) onde minha mãe trabalhava, tinha a loja Santos de Olímpio e o armazém de Guilherme Chaves, (ambos da cidade de Olindina). A loja de Jaldo Mendes (De Inhambupe) as padarias de Seu Zé Batista/Seu Enoque e também a de Noel, a venda de Raimundo do gás, o comércio de Zé do Ouro, a venda de tio Joel, a tenda do Sr. Timóteo, e lá na saída da rua a tenda de “Seu Lalu” (o 10º Prefeito do município) o bar de “Seu” Rozi, a venda de João da Pedra (Pai de Dezinho) a venda de “Seu” Zé da jaqueira (Eram dois irmãos do Retiro), o Bar de Cabo Mário, a cachaçaria de Durval (Pai de Herbert) de Inhambupe, que até hoje mantém o comércio. Na esquina (onde hoje é de João papa, era a venda de Clovis Mendes Vasconcelos). Por ali também tinha o bar de Antônio Vieira (TONHO DE ZÉ VIDA TORTA), a loja de tecidos do Sr. Godofredo Mendes de Souza (O quarto Prefeito), O Sobrado do Finado Mauricio e Dona Julia. No bar que era de Manoel de Juca (Que antes era de Otoniel) foi instalado o primeiro supermercado de Itamira, cujo proprietário era o Daniel (da cidade de Inhambupe).

O beco do mercado (Que por uma insanidade ou falta de conhecimento cultural de preservação de um patrimônio derrubaram para construir uma instalação da prefeitura) que dava acesso, e ainda dá a praça da igreja, onde do lado esquerdo tinha as vendas de Dedézinho do pé da serra e a marcenaria do “Seu” Zé Biita casado com D. Alice do tijuco. No fim da rua (a esquerda) existia uma casa que abrigava a cisterna.

Subindo, sentido a saída para Aporá que hoje se chama Av. Coronel José Simões de Brito (Que até hoje nem sei quem foi, mas carece de um estudo sobre a vida do Homem que empresta o seu nome para uma das principais vias da cidade).

Tinha o armazém do Seu Neném de Pequeno (irmão de Pasquinho) a venda de João de Francisquinha, depois a casa de Paraguai, o comércio do Senhor Cosmo ai vinha à farmácia de Terezinha, - onde fora ali a recepção do casamento de Milton e Esmeralda- A casa de Nezinho de prazer e D. Amélia (Os pais de Zé Renato, ou Zé Tiliba), depois a do Senhor Agenor Mendes de Oliveira 8º Prefeito, (contando com a curta Gestão de Zezito Correia). Seguindo reto iriamos encontrar a casa de Chica Dantas, Tio Lucas, quase em frente à casa de Mané de Zé Santo e Dona Ana (Mãe de Mariazinha, Tais e Louro Som) e seguindo pelo lado esquerdo, a casa de Seu Zuminho e Dona Zefa. (RAPAZINHO DIREITO) era assim que ele chamava meu irmão Raimundo e eu.

E lá adiante a casa de Pedro Bueiro e Dona Martinha, e em seguida a casa e a tenda de ”Seu” Vicente Ferreira, Sinó e toda família, que eu os tinha E TENHO como parte de minha família também, em face de aproximação que tínhamos com eles e com os meninos.

A venda de Ulisses de Cosmo. E do lado esquerdo a casa de Dona Elisa e do lado direito, Dobrava-se ali na esquina que dava acesso a casa do Senhor Pionório, na tão conhecida Rua da Delegacia. Onde vi muitas perversidades acontecer naquela época, com os presos que eram levados para lá. (Por falar nisso, vale ressaltar os nomes dos soldados: Etevaldo, - que vivia maritalmente com Dona Santinha irmã de Tio Sé, e outro por nome Antônio Soldado, que me parece que era da região de Serrinha).
Seguindo até o final, dava acesso ao Caetano (Terras do “Seu” Suta, que posteriormente passa pertencer ao “Seu” Zelito de Celi) que seguindo ia sair lá adiante já perto onde hoje é a casa dos herdeiros do nosso querido ZÉ RIACHÃO – O BRASILEIRO. Dali, seguindo para a direita na bifurcação, ia pro campo de bola (O carecão), mas antes tinha a casa de Seu Mané Felix, passava em frente da casa do “Seu” ZE LAPADA, lá adiante era a casa de “Seu” Chiquinho curador, a casa de Tonho curador, Freboni, Manelinho, Geronisso, Badinho e a esquerda descia pro açude, passava pela casa do “Seu” Marciano, mais adiante, a casa de Domingo futuro, Pedro Cambueiro, “Seu” Bispo até chegar às aguadas.

Na saída da rua (Sentido Inhambupe) primeiro tinha o acesso ao cansa bode (e ainda tem que seguindo por ali vai pra várzea, chapada e por ai afora).

Seguindo pela direita: A casa de Zé Pedro de Negune, Nezinho da Várzea, Dona Vina, (Alguns ranchos de feira) D. Zélia e Mané Dantas. A rua acabava ali.

Mais a esquerda era a saída principal onde hoje é o posto medico (Ao lado da casa de Seu Nestor e Dona Anizia, Mãe de Neuman, Neumize e Neurandi, e mais adiante era o matadouro, onde nas imediações era a casa de Dona Julia (Mãe de Zé de Mauricio, Salvador e Aurélio). Foi ali na casa de Dona Julia, que eu vi chegar o caixão do Sr, Antônio de Mariana, que era proprietário de um caminhão e muito amigo do meu pai, o Sr. Otácilio (PARAIBA).

Lá em cima na saída pelo lado direito era a casa de Chico Surdo e em seguida A malhada de Dona Agda, a casa de Zé Vida Torta e D.Salvelina, E quase em frente, era(E AINDA É) a casa de Totonho e Dona Coité, vizinho de Fraterno e Honorata. Seguindo ainda pelo lado esquerdo, a casa de Dona Mariquinha, João de Pedro a casa da avó de Tizío (Esqueci o nome dela, que era também avó de um sujeito chamado Marivaldo) e o prédio escolar.

Existiam ali quatro entradas para o carrapato: A primeira onde hoje é a casa de Boquinha, a segunda a casa do Finado Teodoro Mendes a terceira após o Prédio, (Vizinho a Zé Caiçara e Dona Moça) em frente à matança de Zé Maia (Pai de Zé Pretinho) a quarta era depois da casa de Seu Zé Pereira, que após a entrada era a casa de Seu Pedrinho e em frente à casa de Seu Do Reis. Passando dessa casa vinha a morada de Bento e Zita (Que eram os pais de Teobaldo, Miudinho, Carminha e tinha uma outra que não recordo o nome). Logo em frente - Colado com seu Pedrinho - morava a finada Caetana e depois era a casa de Zé Maia e Dona Davina, e em seguida era a casa de D.Odete (que era vizinha de Januária de Vitoriano, pai de Marão) e quase em frente morava Pedro Sergipano com a professora Nenzinha e família.

Ao lado dele a roça de Manoel Dantas que ficava em frente à casa de Seu Lucas e Dona Nita, e em frente morava Seu Juca e Dona Zulmira, e ao lado deste, Seu Luiz e Dona Maria (que eram os pais de Dadá, Zé e Alice). A frente morava Dona Nicácia seus filhos e sua filha Izilda.

Ali no sitio residiam Jeronilson, Petu, Rui que foi casado com Amália, Antônio de Apolônio, o Pai de SEU NÉ, Ricardo, D.Raquel (Mãe de Zé) Seu Olímpio, Mané Coruja, Seu Davi (e sua grande família), os pais do finado Zelão, e Seu Amando e chegava às vendas, ali entrada da chapada.

Como não guardar na mente tantas lembranças que hoje mesmo estando grande ainda sinto-me pequeno demais, como se ainda coubesse o meu corpo no afago dessa terra que um dia me teve embalando em seus braços que eram tão meus, mas que o tempo (como um guardião, um protetor invisível, um acolhedor, um corretor de nossas atitudes, um memorizador das nossas ações que nos tornam pessoas que com o passar dos anos crescem) tirou-me de lá, mas nunca me afastou de fato daquele torrão que ainda AO MEU MODO, eu amo sem saber explicar como e nem por que. E, num suspiro de saudades eu afirmo em dizer que eu, sim, que eu sou da Serra, da mesma Serra do Aporá, da então Itamira que um dia hei de ver emancipada, onde hoje pra ela, dedico essas minhas memórias.

Fim... Mas sem nunca terminar, pois amor, nunca termina, aquilo que um dia a vida começou.

Carlos Silva - poeta cantador, Mestre de culturas populares e Itamirense de todo meu coração inspirado nas saudades tão minhas que divido com todos aqueles que entendem o que quero de fato dizer.

Com gratidão e muito afeto, Muito obrigado.

Contatos (75) 99838-5777
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