Samuel da Mata

Samuel da Mata

Nasci e cresci pobre, mas não tenho vergonha disso. Sofri na pele as injustiças da pobreza, mas mesmo assim vivi feliz pois não conhecia a sua verdadeira fonte. Saudei heróis forjados na podridão, mas vestidos no linho fino do engodo e da publicidade paga.

1965-10-17 Aracaju
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Natal à Brasileira

Dia vinte e cinco, noite estrelada.
Maria, em parto, geme na parada.
Transeuntes da noite vêem e não fazem nada,
Apenas contemplam e dizem: coitada!

José, no Inamps, clama desesperado.
A ambulância se encontra em outra "emergência",
Pois desde a tarde, fato não registrado,
Saíra a serviço de alguém da gerência.

José volta atônito e encontra Maria
Transtornada de dor e de tanta aflição.
Apresenta no rosto uma amarga alegria,
Pois já tem em seus braços o menino Tião.

Tião nasceu prematuro, quase natimorto:
Só mesmo um milagre o manteve com vida.
Raquítico, doente, só em pele e osso,
Amargo retrato da mãe desnutrida.

Vivia Tião como os garotos pobres,
Se alimentando do lixo da sua cidade,
Se escondendo do ódio de tantos Herodes
Assassinos vestidos de justiça e verdade.

Apreenderam o Tião em plena capital,
Clamando por pão e sedento de escola.
Taxaram-no de ladrão e de vil marginal
E o calaram com o vinagre do ópio e da cola.

Autódromos, metrôs e obras faraônicas
Consomem os recursos de um governo cruel
Que deixa com fome as nossas crianças:
É Herodes matando os filhos de Raquel.

No calvário das ruas das nossas cidades
Jazem nossas crianças em estado letal,
E os que nada fazem contra esta calamidade
Com Pilatos e Herodes celebram o Natal.
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