Bairro da Paz é pura poesia e coração
Conheci hoje uma das fronteiras desta cidade desigual. Salvador é loteada, esfacelada,
murada por todos os lados. A má distribuição da renda nacional se reflete aqui
de forma violenta. Enquanto prédios de trinta, quarenta andares brilham ao
nascer do sol, bairros inteiros são apartados, escondidos pelos espigões. E com
avenidas que mais parecem rios envenenados, como definiu Enrique Peñalosa,
ex-prefeito de Bogotá quando de sua visita à capital baiana, a cidade mais
parece uma teia de aranha com becos, vielas, ruas apertadas, e muito abandono.
O Bairro da Paz é um exemplo desse abandono. Nascido de movimentos de invasão,
a região é a cara de outras partes da capital, onde as pessoas vivem em
bairros-dormitórios, viajando, literalmente, todos os dias, para trabalhar e
estudar no centro e em outras localidades de Salvador. Mas o bairro não se
deixa isolar. Tem uma vida própria, com um comércio movimentado, igrejas de
todas as denominações, moto-táxi, restaurantes, supermercados, farmácias,
barzinhos e todo tipo de estabelecimento comercial. Possui linhas de ônibus,
mesmo precárias e um povo trabalhador, lutador no dia a dia desigual desta
cidade desigual.
Apesar da desigualdade que se nota sem fazer esforço, o bairro vive e sobrevive
como uma cidade dentro da cidade. Aliás, parece mesmo um outro lugar, uma outra
realidade. Caminhar pelas ruas ainda é possível, sem o barulho de trânsito e
sem a pressa da região central de Salvador, que parece caminhar sempre rumo ao
esmo, com rapidez e sem olhar para os lados. No Bairro da Paz, ao contrário, o
tempo dá para tudo, ainda bem. E tem muita arte ali.
Arte e educação, pessoas do lugar e de fora, que se juntam, se irmanam, em um
trabalho belíssimo, como é o exemplo do Espaço Avançar, onde se pode ler livros
de autores consagrados e novatos, tem oficina de música e de teatro, tem
orientação religiosa e educacional, tem poesia nas gavetas, mentes e bocas da
juventude.
Que tal participar do mais novo espaço poético de Salvador? Não passe a 80km
por hora na Paralela sem diminuir a marcha e conhecer o Bairro da Paz e o Sarau
da Paz, que breve gritará poemas para os céus de Salvador...
Salvador, 13 de novembro de 2013