Entressonho e fricção
Antes de você chegar me encontrava em silêncio,
entorpecida como os vulcões dormentes,
tristes e acanhados.
Chegastes lentamente,
desenhamos enredos,
teias arranjadas com sublimes intenções.
Conversamos sobre poesia e filosofia,
nos aproximamos, graciosas afinidades,
logo, sentimos a brutal dor da saudade.
Você recitou um poema,
o meu preferido,
declamou delicadamente.
Foram olhares distantes que penetraram em minha alma,
criando pequenas fogueiras que saíram das páginas do livro dos Abraços
e hoje incendeiam meu corpo.
Foram ditas palavras sigilosas, indecentes histórias;
de peito aberto te contei meus maiores segredos,
meus maiores desejos.
Você me acalmou com palavras,
me ajudou a enterrar fantasmas,
me libertar das algemas, esquecer o passado,
já não penso no estrago.
Com medo, você tentou se isolar,
talvez por temer o desconhecido
ou por não acreditar cegamente em minhas palavras.
Decidi também me afastar,
notei os riscos de algo tão raro,
tudo ficou fora de controle.
Você passou a fazer parte dos meus sonhos,
alvoradas solitárias em que percebo você,
ainda bem que tenho a lua, minha aliada!
Sou moradora das ausências,
me encontro e me perco em águas turvas,
solidão inevitável, sou viajante das utopias,
vivo perto das estrelas.
Sangro em noites de tormenta,
desafio o oceano de águas profundas,
singro, aceito as rajadas.
Em muitas noites experimento você,
coração dispara, calor toma conta,
procuro você no cômodo vazio.
Tenho um olhar de abismo
e te encontro na névoa, te procuro na imensidão,
falo contigo em pensamentos,
te chamo, espero o abraço, procuro suas mãos.
Procuro sua força!
Imagino você me prendendo em seus braços,
abraço potente, apartando meus cabelos
e submergindo seu rosto no emaranhado dos fios.
Procuro seu cheiro,
procuro sua pele,
procuro seus olhos escrupulosos,
procuro você.
Quero sua boca enérgica,
quero-te inteiro,
preciso preencher o vazio.
Sinto meu corpo tremer, enrijecer,
perco a fala, perco o chão,
aceito enlouquecer,
boca que seca.
Coração dispara, desejo em profusão,
espero seus doces lábios,
sua barba marcando meu corpo,
arranhando meus sentidos.
Um dia te chamo
e você me apresenta novos caminhos,
me mostra o acaso, outras amarrações.
E, por fim, nos entregaremos nas estradas da cantiga,
como trilhos solitários à espera da passagem dos trens!
Você?
Meu poema mais belo!
Autora: Ive Nenflidio