

AurelioAquino
Deixo-me estar nos verbos que consinto, os que me inventam, os que sempre sinto.
1952-01-29 Parahyba
281881
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31
Itinerário da URSS, com piracema implícita e outras impressões
I
desde Kurkino
meu olho me dizia
que a felicidade congelava
como o dia
Moscou, indormida,
nem era tanta
que não fosse lógica
da esperança
colher futuros
era apenas serventia
dos prazeres que a vida
sempre urdia
e se roubava o céu
o jato nem mentia
aos que dos olhos cobravam
a rapidez da alegria
Moscou, em inverno posta,
era um iceberg vagando
em todas as minhas portas
II
Mikhail trazia Moscou
na algibeira
e a desmontava em verbos
pela noite inteira
e os cachos de sonho
que empilhava na mesa
tinham um gosto de futuro
e alguma coisa de cerveja
Mikhail, em continência,
era uma bandeira
empalmando a vida
com íntima certeza
III
desde Vyborg
rugia o exercício
de estar com a alma
em constante comício
Leningrado
deitada ao Neva
era uma saudade estendida
no peito das pedras
eram-lhe íntimos
os francos motivos
que as ondas dão ao mar
quando em seu ofício
de repente,
a catedral de Santo Isaac
arrepiou-se de fé
nem quase exata
de sua porta
como uma ave
voou a pássara manhã
de tanta tarde
por dentro do Smolny
em corredores afeito
singra o sentimento
a franja incauta do peito
e descabela-se a razão
numa fração desconforme
em que o numerador é o mundo
e a divisão é a sorte
IV
Em Kiev
a pátria anuncia
que a noite é, apenas,
disfarce do dia
deitada de bruços
a Ucrânia é serventia
de qual cidadão permita
urdir-se em alegria
Tchernovitsy alinha as horas
na quântica feição da tarde
e nem se teima universo
porquanto basta-se cidade
não dessas baldias
que nem se chegam à vontade
mas uma urbana atitude
de campos desregrados
Tchernobil ainda vige
no coração do seu átomo
como uma química vontade
que em cada cidadão ainda cabe
V
e meus moldavos sentimentos
eram contraponto do espaço
quem em mim a Moldávia urdia
retirante quase de meus passos
o trem solfejava o caminho
numa lauta liberdade
e a Moldávia era um campo
arquivada alma das cidades
VI
O Rio Prut lambia os beiços
da Ucrânia em vão incontrolada
e eu nem sentia a dor
da brasileira trama em mim gravada
VII
Mikhail Egorovitch
carpia verbos
como quem roesse as lágrimas
do universo
tinha a compleição
de um exato camarada
e o pranto fácil
de quem costura a alma
Mikhail Egorovitch
era tanto e pouco
espargindo pelos corredores
todo seu esforço
o partido em si vigia
como uma nave desgarrada
nos mares que seu verbo
teimava em molhar de alma
VIII
em Kurkino
o sol é lâmina
de cortar o todo gelo
que é sempre chama
a neve na vidraça
é uma felicidade idônea
que nem consegue gelar
o coração em chamas
IX
Wladimir em sono
é uma morte acampada
nas cabanas dos Haslivs
que se tem na alma
Wladimir deitado
é bandeira consumida
de tanto drapejar nos ventos
que se tem na vida
Wladimir é um eletron
e uma saudade infanta
na grave química da pátria
em que se derrama.
desde Kurkino
meu olho me dizia
que a felicidade congelava
como o dia
Moscou, indormida,
nem era tanta
que não fosse lógica
da esperança
colher futuros
era apenas serventia
dos prazeres que a vida
sempre urdia
e se roubava o céu
o jato nem mentia
aos que dos olhos cobravam
a rapidez da alegria
Moscou, em inverno posta,
era um iceberg vagando
em todas as minhas portas
II
Mikhail trazia Moscou
na algibeira
e a desmontava em verbos
pela noite inteira
e os cachos de sonho
que empilhava na mesa
tinham um gosto de futuro
e alguma coisa de cerveja
Mikhail, em continência,
era uma bandeira
empalmando a vida
com íntima certeza
III
desde Vyborg
rugia o exercício
de estar com a alma
em constante comício
Leningrado
deitada ao Neva
era uma saudade estendida
no peito das pedras
eram-lhe íntimos
os francos motivos
que as ondas dão ao mar
quando em seu ofício
de repente,
a catedral de Santo Isaac
arrepiou-se de fé
nem quase exata
de sua porta
como uma ave
voou a pássara manhã
de tanta tarde
por dentro do Smolny
em corredores afeito
singra o sentimento
a franja incauta do peito
e descabela-se a razão
numa fração desconforme
em que o numerador é o mundo
e a divisão é a sorte
IV
Em Kiev
a pátria anuncia
que a noite é, apenas,
disfarce do dia
deitada de bruços
a Ucrânia é serventia
de qual cidadão permita
urdir-se em alegria
Tchernovitsy alinha as horas
na quântica feição da tarde
e nem se teima universo
porquanto basta-se cidade
não dessas baldias
que nem se chegam à vontade
mas uma urbana atitude
de campos desregrados
Tchernobil ainda vige
no coração do seu átomo
como uma química vontade
que em cada cidadão ainda cabe
V
e meus moldavos sentimentos
eram contraponto do espaço
quem em mim a Moldávia urdia
retirante quase de meus passos
o trem solfejava o caminho
numa lauta liberdade
e a Moldávia era um campo
arquivada alma das cidades
VI
O Rio Prut lambia os beiços
da Ucrânia em vão incontrolada
e eu nem sentia a dor
da brasileira trama em mim gravada
VII
Mikhail Egorovitch
carpia verbos
como quem roesse as lágrimas
do universo
tinha a compleição
de um exato camarada
e o pranto fácil
de quem costura a alma
Mikhail Egorovitch
era tanto e pouco
espargindo pelos corredores
todo seu esforço
o partido em si vigia
como uma nave desgarrada
nos mares que seu verbo
teimava em molhar de alma
VIII
em Kurkino
o sol é lâmina
de cortar o todo gelo
que é sempre chama
a neve na vidraça
é uma felicidade idônea
que nem consegue gelar
o coração em chamas
IX
Wladimir em sono
é uma morte acampada
nas cabanas dos Haslivs
que se tem na alma
Wladimir deitado
é bandeira consumida
de tanto drapejar nos ventos
que se tem na vida
Wladimir é um eletron
e uma saudade infanta
na grave química da pátria
em que se derrama.
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