O Coração do Forasteiro
Ser imigrante é muito mais do que cruzar fronteiras. É carregar no peito um pedaço de terra que ficou pra trás, um idioma que já não cabe inteiro na boca, uma saudade que insiste em falar mais alto que o fuso horário. É andar por ruas novas com passos antigos. É tentar recomeçar onde tudo já começou sem você.
E, sim, há beleza nisso — mas também há dor.
Porque quem deixa sua terra, muitas vezes, deixa também parte de si. Deixa os cheiros conhecidos, os rostos familiares, os lugares onde a memória já sabia o caminho de cor. E
chega num novo mundo com o coração cansado, às vezes ferido, às vezes desconfiado, como quem já foi empurrado pelo abandono uma ou duas vezes a mais do que deveria.
Mas é justamente aí que mora a força do imigrante.
Não é fácil ser forasteiro. Ser o “diferente”, o que fala com sotaque, o que ainda se perde nas entrelinhas da cultura local. Mas há uma coragem profunda em quem se permite recomeçar. Em quem troca o conhecido pelo possível. Em quem, mesmo machucado, escolhe continuar amando a vida — mesmo quando ela parece não reconhecer de onde você veio.
E essa força não se vê de longe. Ela mora nos detalhes: no sorriso tímido ao aprender uma nova palavra, na persistência de quem procura emprego mesmo sem diploma reconhecido, no olhar firme de quem planta esperança em solo estranho.
A motivação que pulsa no peito de quem parte é a mesma que pode inspirar quem ficou: a capacidade de seguir em frente mesmo com o coração remendado. De criar novos laços, novas histórias, nova casa — dentro e fora de si.
Você não precisa ter mudado de país pra se sentir estrangeiro em algum momento da vida. Basta mudar de fase, de trabalho, de ciclo. Todos somos imigrantes em algum momento: da infância para a vida adulta, de uma versão antiga de nós para uma mais forte, mais consciente.
E quando o coração estiver ferido pelo abandono — seja de pessoas, de lugares ou de tempos que não voltam — lembre-se: é possível florescer mesmo longe das raízes. Basta seguir, passo por passo, com fé no que se constrói... e com amor pelo que ainda virá.
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