

Filipe Marinheiro
Nasceu em Coimbra, 30 de Julho de 1982. É natural e reside em Aveiro.
Poeta.
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1982-07-30 Aveiro
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Sem Título 58
Repeti:
o sol rebenta-me
nas mãos afastadas seja a escolha
ou a luz relampejante
absorvi-me numa vida ímpar
onde se dança com espanto a beleza.
Dum cândido jardim mimoso
em rodopio ao dióxido de carbono a ser delicado,
devido à intocável experiência metafísica
sob a poeira a derreter-se entre alfinete fritado
na memória poética sonho de criação.
Justamente vivo numa bondade
sem interferências.
Assim precedente como uma doçura fecunda
a alastrar-se-me infinita
por um cremoso recife simples
que provém das entranhas a enrodilhar
lá do fundo e pronto.
O mesmo se passa no quanto escrevo
a ideia do feio que teimam falar
ante pé a ante pé interessa-me
porque o tóxico é a meia repulsa
e também atrai.
Tento explicar doutro modo
os espinhos severos das coisas rachadas.
Outro modo desvairado mas suave.
Quando menos esperam fluo
como o rigor duma pedra preciosa
ou como as chuvas tremendas a entrar nos céus vivos
em torno do silêncio da treva arqueada
e toda a gentileza
sobe-me pelos dedos acima
extasiando um perfume no fundo a propagar-se.
Imagino o mundo. Imagino as pessoas.
Imagino a sua fala.
Imagino o que dizem para fora para dentro.
Imagino girarem as suas inteligências terríficas.
Imagino a cantarem-se para os espelhos estilhaçados,
a penderem-se nas flores húmidas
como um pedaço de espírito enlouquecido.
Imagino o seu sentir. Imagino a verem os outros.
Os outros como eles mesmos o são.
Imagino a verem-se estremecidos.
É sempre outro terror - tantas dores.
Imagino pois homens e mulheres a puxarem
do seu cigarro. A olhar os gestos dessa obsessão cruel.
Por vezes, imaginam-se no próprio podre cigarro
a tecer o fogo como degraus mergulhados
na mortalha no ar fabulosos.
Imagino-os a fumarem esquinas, ruas, avenidas,
terras, países, continentes
noites, dias, tardes e como enrolam no fumo
as esquecidas estrelas, a lua arder, o sol a misturar-se
com o mar alcançado.
Toda a matéria de que é feita a eternidade
completamente interior. O mar leva na corrente as suas
máculas.
Imagino a ruminarem ao universo desses impulsos
e a não se perdoar
na linguagem no espaço e tempo absolutos. Julgo eu!
Quem sou eu? Afirmo sensato. Direi sensata ironia
deste infinito a ingerir-se esquecido. Lá longe e futuro
sensacional.
As frases divergentes a esconderem-se
porém a subir
no sopro feminista
sequer ingénuo da crescente explosão cognitiva
a entrar-me como uma força interior que nada sei dela
a rasgar-me os lados dos lábios cadentes
perfurando as artérias num pânico animal.
Concentro-me ali. Concentro-me nisso
ao mesmo tempo que me desloco
no sofrimento desse incêndio
aniquilando-o com o perfil das pagãs folhas
reescritas. Nada feito, estou em mim,
fora deste infinito berro atirado ao acaso.
São as metidas poesias
deixam-te nauseada, arreliada,
mas em alerta máximo
porque vai contra a docilidade
mágica dos astros e galáxias ou constelação
a desmancharem-se aquando escuto da deslocação
entre as vigas dos predicados
e fungos da retórica a suar.
Será isto que me importa entender?
Desalentador. Enquanto escuto
esse sol em passos vagarosos
numa armadura crudelíssima.
Talvez a orgânica imperfeita dos tempos
onde me encerro à margem da lei,
lei insegura perscruta-me,
mostra-me a sua agulha
indolor.
Irá permanecer uma sensação estranha
como se o doloroso olhar apoiado no antebraço
da retina cavalgasse
dentro da minha
e atira-se a mim com agudeza, estranheza,
aspereza melancolia visceral
para o amor vindouro, eterno, macio.
Belo esse momento
em que nos conhecemos...
Estremeci do fígado desanimado
logo passei a acordar a cabeça desobedecida
aos pés dessa cabeça decifráveis,
depois selado percebi
que ias ser o paraíso de levar no peito embrulhado
pouco indício de uma macabra alma.
Olhei-te afoito porventura defeso
por de trás desses astronómicos olhos
uma primeira vez a réplica dos corredores
de xisto a desproporcionar as leituras ensurdecendo-as
e soube-te ate à espécie da morte.
Talvez não decifrem as alegorias,
tanto sarcasmo como sofrimento
isso remonta à minha láctea poesia.
Quem não aprecia ou compra
poderei oferecer um caixote do lixo altamente breu
para vomitarem as canonicidades
e a seguir reciclarem-se no mesmo paraíso
cuja semeada estância nem sabem
aonde fica.
De estrofes esmigalhadas a escutarem
hoje, ontem e amanhã vazios
desloco a inspiração para inspiração
partindo-a no fundo instantâneo.
Nessa inspiração
gravitam-se sons e imagens a engaiolarem
à pancada as cores e mesmo tons a inquietar
o violento ofício da própria poesia.
Poesia sempre a despedir-se duma alucinação perturbadora
como um ramo grosso a estalar quando se parte
no dia a dia vertiginoso.
Nela coroa as terras e pessoas sem identidade
com safiras por cima a cobrir.
Contudo seus nomes ressoam
como num trovão a esquartejar cavernas de nuvens
a escorrerem, mesmíssimo desse marulho acutilante,
gravitacional das inóspitas desgraças.
Como se vêem as pupilas
a chorar sabedoria abaixo
rodeando as flores debruçadas nas faces extintas,
descaídas dos "mosquitos" estupefactos
com as luzes amarradas
aos violinos que ainda sabem tocar canções de embalar.
A noite tórrida de superelegantes musas a arder
nos vidros dos olhos longilíneos
e o sol tamanho deste universo passageiro,
digestivo
deflagra-se-lhe nas têmporas a ferver
contra a encosta do queixo ingratas
e o universo inimaginável ferve indisposto
frente ao sol esmigalhado revestindo-se no próximo sismo
para inspirar os terceiros raios doutro igual sol repetido.
As mãos essas servirão
para desabotoar raro verniz se entretanto estala
dessa maneira perceberão
que abriram os meus poemas do avesso.
Totalitariamente Errado! Erraste! Errarei!...
Cerro-me num ponto sensível
acima do rasgo desta veia arrastada
p'la vara da nossa vida imperfeita escassamente muda.
Apenas mais folclore depenado
mas a minha inacessível busca
magoa muito.
Magoa o quanto basta.
Magoa o sangue em cúpulas
doutros sangues cuja vitalidade,
oculta o outro sangue a estilhaçar-se
sem razão alguma.
Como mendigo vence-me mansamente
durante puríssimo coar.
Finalizo:
Abalo-me como quantas janelas estranham
novas mãos a tocarem no vidro
a tornar-se líquido das chuvas apaixonantes,
é uma questão de amores e vontades estéticas.
Percebam isto duma vez por todas.
Por enquanto,
em vão
recomeço toda uma nova poesia.
(Ponto final mude de página)
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