Mui vezes, meus familiares me pegaram distraído
E gritaram para me despertar.
Isso desde que eu era miúdo,
Mas já perderam a esperança de que eu venha a mudar...
E assim cresci, meio oprimido,
Tentando entender por que não consigo me encaixar.
E foi apenas há pouco tempo
Que descobri algo que preciso contar:
Distração é concentração...
Ou talvez eu não seja o distraído—vocês é que são.
Não ouvem as árvores gritarem de júbilo quando o vento chega para brincar,
Não auscultam os louvores das aves dedicados a Deus,
Ao contemplarem o esplendor deste lindo mundo no ar.
Não enxergam os acenos das estrelas, voando pelo céu noturno,
Convidando-nos a sair da Terra ao menos por um segundo
Para a face de Deus contemplar.
A Lua é o servo que Ele envia para nos chamar,
E há outro servo, o Sol, que com sua luz vem sinalizar...
Eles, junto às nuvens,
Nos dizem todos os dias que não é apenas o céu,
A Terra também é divina.
Até a Lua cheia confirma—
As pessoas é que estão distraídas...
Às vezes, desejo ajudar as pessoas a despertar,
Dizendo: “Ei, o Sol está chamando por ti,
Vê como a Lua fixa o olhar em ti,
Vê-se claramente que ela tem algo a falar.”
O céu, desesperado, apaga as luzes e cala os sons,
A fim de mostrar-vos a beleza que vos espera e atrair-vos para lá.
Fizemos da Terra uma mulher de casa, que usamos para trabalho, prazer e só.
A Terra nunca deixou de ser divina—fomos nós que paramos de contemplá-la.
Sinais da divindade da Terra podem ser encontrados em qualquer lugar:
À noite, enquanto estão distraídos nas telas,
Nas histórias que as estrelas, junto da Lua, costumam contar,
Nos sorrisos singelos das crianças,
No mar, quando ele e o vento brincam de se embalar...
Enfim...
Espero que não seja necessário perder
Essa linda esposa que costumamos apenas usar
Para, enfim, o devido valor lhe dar.
Entre as coisas que não voltam,
Pode ser que esteja essa Terra linda que estamos a banalizar...
Luanda, Setembro de 2024