O Papel da Poesia



Passo tudo num papel autêntico;

pois, para mim, tudo é papel, até papel higiênico.

Deus deve estar me esperando no céu;

mas antes de ir para lá,

acho que, primeiro, no inferno, terei de passar.

Não freio na curva da estrada,

sorrio da vida por ser uma piada.

Não tenho medo de minha hora chegar;

se for hora de morrer,

fique sabendo: vou apenas me mudar;

seja onde for,

aqui, não vou deixar de estar.

Se eu mudar para outro plano,

deixo pago o hotel,

porque estou cansado de ver, em minha porta,

cobrarem-me o aluguel.

Não deixarei dívidas,

nem morto.

Isso é o que me conforta,

mesmo que a minha preferência fosse o aborto.

E, dessa existência, pretendo, somente, levar:

meu piano,

meu charuto cubano,

que nem sei bem se vem mesmo das terras de Fidel.

Pretendo, também lembrar o rosto que, sempre, foi posto véu;

terminar o pastel; antes que outros, em meu lugar, o provem;

em todo resto, meter fogo;

depois, misturar com minhas cinzas.

Penso em morrer jovem

e não terminar como meu avô:

velho e ranzinza.

Poder ver o sol se pôr;

já que, no máximo, acordo ao meio-dia.

Mas cadê o papel, pô?!

Se bem acabou, nem tô,

pois me deu vontade de fazer cocô.

E vejo que, por necessidade,

vou ter que limpar,

custe o que custar,

com este mesmo papel que fiz esta poesia.



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