Quadro da vida
Aquela imagem do poeta dentro do retrato
parece que fala, mesmo estando calado;
bem, também, me olha; mexe com eles parados.
Enfim, sai de lá, e já não mais está na parede;
senta no sofá, deita na rede;
diz, ainda, querer um pouco de água para matar sua sede.
Em seguida, me pede um café, e logo de pé,
tira do bolso um cigarro e um isqueiro;
no mesmo instante, o acende e começa a fumar.
Eu acho graça em toda a sala cheia de fumaça;
com o semblante de mágoa, pede-me o cinzeiro,
coloca a mão num papel que estava sobre a mesa.
E, assim, do nada, como mágica,
faz aparecer, entre os dedos, uma caneta.
Escreve um poema que é uma beleza,
e queixa, apesar disso, de seu enredo, de sua inspiração;
faz alguns riscos e rabiscos,
e algumas caretas que não trazem nenhum medo.
Em flagrante, encontro-o com o pensamento distante,
sabe-se onde; pois, pergunto e ele não me responde,
fica, quem diria, dando risada.
Desconsolado, dá uma olhada para o lado;
de um jeito torto, com toda prática e aprendizado,
tenta me convencer ao dizer que bom é o poeta morto.
Dali, eu mesmo via que não mais existia no quadro
sua imagem,
dando margem que nasceu de novo.
Dentro dessa "ressuscitação", passou por uma restauração,
para ter de volta a fama, caiu na graça do povo,
e o povo, como ama, o pôs na crucificação.
Mataram-no, deixaram vivo o seu espírito,
mas, mesmo depois de morto, deixou o seu grito.
Dessa forma, permanecia vivo no quadro da vida,
mesmo pregado, agia em forma de poesia;
como eu mesmo prego, mesmo com prego, não nego,
que continua vivenciado.
Enfim, vós vedes
que até assim és um poeta imortal,
e, de repente, somente, voltastes, afinal,
ao quadro da parede.