mr_sergius

mr_sergius

Sou uma pessoa que fez biologia, que fez direito, que se fez de pintor, que se aventurou a escrever e que alguma gentil alma leu e por empatia ou falta de definição melhor, chamou de poeta. Se não fosse a necessária modéstia quase acreditaria ser um. Escrevo do que vi e do que vivi.

1955-05-18 São Paulo
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Alguns Poemas

Longe

De cabeça baixa estavas e parecia que me fitavas
Teus seios afloravam da renda do vestido de festa
Na parte entreaberta sobre o teu ombro esquerdo
Nessa última imagem que vi de ti já não tinhas vida
A dor me trespassa o peito, já nem consigo chorar
Estendo a mão com tremor, alcanço teu braço nu
Tento te imaginar como há horas atrás e te cobrir

Palavras tínhamos dito, decisões seguras e rápidas
Decidimos com leveza as direções de nossas vidas
Pois sabíamos toda luta que teríamos a enfrentar
Para reunir nossas vidas e esperanças num futuro
Volto a nossa noite passada. Foi algo inesquecível
Cada uma era sempre como se fora a primeira vez
Mas esta não. É a última vez, jamais vais retornar

Sinto-me em um deserto de areias negras sob o sol
Elevo os olhos aos céus para buscar por respostas
Mas não vejo nada, não há uma luz, não há nem ar
Privado de ti me quedo vencido em meio a sangue
Porque queria te seguir, te rever dizendo que sim
Mas não tenho essa graça. É só silêncio e angústia
Não há um mínimo alívio para aplacar essas dores
Já nem vejo mais, escurece, ouço sirenes ao longe

Sabes quanto eu queria te tirar dali, trocar contigo
Nas profundas chagas que eu mesmo abri em mim
Pensei que assim iria te seguir, te amar pelos céus
Estaríamos num espaço azul e anjos nos sorririam
Trazendo a ti de volta para meus braços refeitos
Mas tudo que encontrei foram somente sombras
De tanta tristeza esse meu coração quase morto
Vai revivendo solitário o ar quente daquela manhã


As Esferas

       Prólogo
O céu da noite é como um negro mar de invisíveis conflitos
Que persistem em seu movimento de arco rumo à luz do dia
O céu que semelha um manto perfurado de brancos pontos
Desperta os sentidos do poeta, que o observa e o descreve
 
          Do amor
O pensamento verte ao amor, que é como o trigo a crescer
No doce contraste da noite com o clímax da fome de amar
Mas não se extingue quando deixa corpos salgados de suor
Pois que caminha pelas sendas paralelas até o nascer do sol
 
          Da andança
O dia reconduz a novos pensamentos, uma ponta de saudade
Cada passo da estrada, cada um, move-se em sua própria luz
Todas as manhãs se reiniciam em sua vigília e faina solitárias
Que se sucedem infindas, numa louca esfera de Sacrobosco
 
          Da luta
Os inimigos escondem suas armas obscuras, sua força oculta
Estende-nos os dedos, mas para fazê-lo prisioneiro nesta vida
Para conter seu surto de vontade, sua força, sua resistência
Para tornar-nos frágeis e roubar o sentido de nossas palavras
 
          Do sonho
A ação se desenrola nas fábulas perpétuas da roda do tempo
Para fazer grandioso um sopro de vida inicial que recebemos
Para eternizar o que fora transitório num único abrir de asas
Receber todo o fogo de ser pássaro, voar rumo ao sol poente
 
          Epílogo
As realidades objetiva e subjetiva vão arar o chão desta terra
O poeta em seus laços com o infinito, traça os versos no papel
Como as margens paralelas de um rio, as sujeitam ao seu curso
Mas alastra, linha a linha, pela geometria própria de quem os lê

A Lenda do Alquimista e sua busca inquietadora.

Sou o poeta nascido nos céus, lançado ao inferno, que teu amor ressucitou
Quem, pelo sortilégio próprio da poesia, tem a chave das portas do tempo
Ora vem contar a lenda do peregrino que rompeu o vazio com seus passos

O alquimista faz seu sonho viajar por anos luz de distância, sem cessar
Num segredo que jaz oculto no vento, ele carrega o negrume nebuloso
O fogo dos lampejos, ao som dos trovões, risca o negro do céu da noite

São memórias em ouro que jamais serão perdidas no poço do oblívio
Todo acontecimento têm seu ritmo interior e vem cercado de mistério
Que à tênue, e tanto amarga, fábula da vida não é dado compreender

A tarde se foi carregando uma busca de respostas, um jogo de porquês
Em nossa voz há mil palavras impronunciadas num poema não escrito
Irá decompor o espelho metamorfo das nossas pretensas estabilidades

A real face de nosso desejo, ocultamos atrás das máscaras que vestimos
Contudo tentamos dar à trama vã um sentido, ontem se por vias paralelas
Hoje convergentes, quiçá a nos resgatar do lago das escassas conquistas

Anteponho-me aos obstáculos, luto contra o vácuo e o sonho irrealizado
Na minha luta me faço incansável no meu voo além dos nus horizontes
Voarei com o vento a abrir nos limbos caminhos de ausentes presenças

Abro os espaços em círculo, onde sou análogo à medida de teu corpo
Vou trocar as fechaduras, grilhões, correntes e tudo que negar a fábula
Ou nos ligue às convenções, pelo cheiro de terra úmida após a chuva
 
Assim te guardarei, de sorriso fácil e cabelos dourados num futuro melhor

Assim me acompanharás invisível, todo tempo, nessa busca inquietadora
Atravessando as inúmeras portas por onde só a palavra haverá de passar

Distância

Foram numerosos silêncios tão crus quanto ásperos
Uma fome insaciada, uma névoa de muito desalento
Mãos distantes a se buscar ébrias em meio ao sonho
Foram tempos de um nó insano a arder na garganta
Foi o frio da vida seguindo numa angústia sem saída
Foi a dor da perda num reencontro de cartão postal
Tal a dor que dói à terra a flor que se lhe desenraiza
Onde restam cicatrizes que nem o tempo vai apagar

Mas a mão do destino esconde segredos em silêncio
Mantém em si todas razões que a razão desconhece
Com esmero de reduzir a nada todas as construções
no que seja improvável; Romper as impossibilidades
de tudo aquilo que se pudesse nomear de impossível
No ventre que gera a vida está o germe da renovação
Para se fazer tempo de reencontro, de reaproximação
Acalmar as dores, angústias, dúvidas e hipertensões

Enfim uma flor se desabrocha, é a vida reeditando-se
Nos portais do espaço e tempo semeamos esperança
Para reaprender que distância é apenas uma ficção
Chegas no sonho, mas és corpo, és carne e realidade
Cada vez que nossas almas se encontram no infinito
As memórias de vida se refazem na energia ancestral
O nosso tempo já não é como nos relógios sonolentos
Não haverá monumentos ou heranças de nosso viver

Devo falar do que há muito tenho guardado em mim
Já devia ter te dito: dá-me a tua mão e fecha os olhos
Aconchega tua cabeça sobre meu peito neste abraço
Sem imaginar se é possível ou distante, sem projetos
Apenas fica. Seja para sempre ou apenas um instante
Mas que tenha a duração da eternidade dos amantes
Sempre me pertencerás na minha ilusão de nós dois
O existir não tem outro sentido senão o que criamos
Sergius Dizioli nasceu em São Paulo, neto de imigrantes italianos. A veia artistica proveio da família de seu pai, cuja irmã - a tia Yolanda, conhecida como Yole Meira que era atriz ligada a Cacilda Becker, Bibi Ferreira entre outros Sempre foi apaixonado pela leitura e pela língua portuguesa desde muito jovem. Se dependesse de seus pais, de um lado, seria uma pessoa ligada às ciências biológicas; de outro ao Direito. Foi os dois. Gostava de desenhar com grafite, todas as vistas que tinha de alguma janela das casas do amigos. O resultado foi uma série chamada "Vista pela janela afora" e tudo era retratado: outros prédios, ruas, praças, vistas da praia... O gosto de desenhar chamou a atenção de amigos que lhe presentearam com 3 telas, 3 pincéis e 6 tubos de tintas a óleo, além de acessórios. No mesmo instante pegou os pincéis e começou a deitar as tintas aleatóriamente o que resultou em um pássaro algo surrealista. Esse foi o marco de que se possa chamá-lo de artista. Sempre autodidata nunca fez um curso de pintura. Alguns quadros podem ser vistos em segundo plano na foto do perfil. Passou a pintar paisagens a partir de fotos. O gosto pela pintura cresceu muito quando ganhou um livro com uma coletânea de pinturas de Salvador Dalí. Apaixonou-se pelo surrealismo e passou fazer réplicas de quadros de Dalí. A influência do surrealismo também levou-o a escrever, e a poesia foi a forma escolhida. Leu Andrè Breton, Paul Éluard, Murilo Mendes e Jorge de Lima entre outros surrealistas. Nos tempos da escola já havia lido Augusto dos Anjos. Assim nasceu sua linha poética principal: versos construídos com um certo amargor vistos pela ótica do surreal. A esta altura já consegue compilar mais de 350 poemas. Veio há algum tempo planejando a edição de dois livros: um que reúne os poemas mais 'sombrios' reunídos sob o título "Cicatrizes" e outro que reúne temas mais diversos e leva o nome de "As Marcas do Tempo". Já tem o primeiro publicado e espera ainda este ano publicar o segundo. Leia e opine, sua opinião é valiosa. Temos certeza que vocês vão gostar.
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mr_sergius
Agradeço a leitura. Será uma honra se acompanhar.
10/setembro/2020
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isabel-morais-ribeiro-fonseca
Parabéns poeta! Estarei acompanhando! Abraços!
10/setembro/2020

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