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Entrevista concedida a André Luís Barros

A natureza nunca mais foi a mesma depois de passar por suas frases. O poeta pantaneiro Manoel de Barros, que está lançando um novo ajuntamento de versos e vida, o Livro sobre nada (Editora Record) , se considera acima de tudo um "fazedor de frases": "A frase para ser boa precisa ser uma coisa ilógica, o ilogismo é muito importante pois a razão diminui a poesia", ensina. Avesso a entrevistas, quanto mais por telefone, Manoel de Barros, considerado por muitos o maior poeta brasileiro vivo, concordou em concedeu conversar com o caderno Idéias, por telefone, de sua casa em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, onde vive a quatro horas de sua fazenda de criação de gado e costuma sair à tarde para "desenferrujar" e bicar umas pingas com amigos. Com simplicidade, o autor de livros como Compêndio para uso dos pássaros (1960), Arranjos para assobio (1982), Livro de pré-coisas (1985) e O guardador de águas (1989) falou sobre paixões literárias, o gosto pelo ócio e por programas divertidos na televisão, como Os trapalhões e até o mexicano Chaves e lembrou até um insuspeitado passado no Partido Comunista. "Mas nunca fui afeito a grupos, gerações, não podia mesmo durar muito naquele partido. Hoje, conquistei o ócio, o que é muito importante para o poeta", comemora.
ANDRÉ LUÍS BARROS:
- O senhor só ficou famoso como um grande poeta depois dos 70 anos. Isso foi algo planejado, ou aconteceu por acaso?
- Isso é negócio do meu temperamento. Nunca tive projeto, só livro. Também nunca achei que precisasse me isolar no Pantanal para compor melhor. Sou pantaneiro, nasci aqui, só podia viver e escrever mesmo sobre as coisas daqui. Mas nunca tive preocupação em aparecer muito, ser uma pessoa conhecida, isso é sincero mesmo. Eu queria só fazer poesia. A minha vergonhez explica muita coisa. Sou tímido por temperamento, é possível que só seja poeta por causa disso. Sou um ser abúlico, tenho minhas contradições e tento me encontrar através da poesia. É claro que sucesso é bom, ser amado, admirado pela poesia é bom, quem disser que não está mentindo. Fui descoberto de repente, as pessoas começaram a me perceber. Nunca na minha vida fui de participar muito de grupo. Acho que em poesia também não pertenço a nenhuma geração, a tal geração de 1945 não é a minha, e vejo outros poetas, como João Cabral de Melo Neto, que não é de geração nenhuma. Aliás, como classificar o Rimbaud? Em que geração classificamos o Augusto dos Anjos? Eles são simplesmente grandes poetas.
- O senhor conheceu, tem uma grande admiração e até prometeu um livro sobre João Guimarães Rosa. O primeiro livro dele, o inédito Magma, será lançado em breve. Onde está o livro prometido?
- Foi adiado. O Ênio Silveira tinha me sugerido fazer esse livro e eu topei o negócio, fiquei animado. Mas quando fui escrever, em vez de ser minha, a frase que saía era do Rosa. É que eu tinha relido muita coisa dele e fiquei impregnado. Não convém isso, não é bom porque você acaba mergulhado mesmo na obra do autor, acaba afogado. Anos atrás eu tinha tentado fazer um ensaio quase lingüístico sobre o conto Cara-de-Bronze, do Rosa, de que gosto muito. Mas me embananei todo, no meio. Eu não falo mais que três línguas e o Rosa conhecia língua demais, achei que seria possível fazer o ensaio mas ficou muito difícil. Disseram que o Magma não é tão bom quanto os outros livros do Rosa. Realmente ele tinha talento mesmo era para a prosa, e o engraçado é que ele foi poeta no fim da vida. Geralmente o sujeito é poeta aos 18 anos, quando aparecem as espinhas, e depois pode virar prosador. Mas há versos perfeitos no livro Ave, palavra, seu último livro, e Tutaméia e A terceira margem do rio são pura poesia. Eu sou mais de fazer frases, sou bom em criar frases.
- O seu trabalho é mais fragmentado.
- Cada vez mais. O próprio mundo está obrigando a gente a se fragmentar. É uma falta de unidade, o homem moderno não tem mais as grandes unidades, como Deus. A gente não tem crença em mais nada, aliás, toda a arte deste século é fragmentada, ninguém defende mais uma ideologia, hoje. O homem não acredita mais nem em ideologia, as religiões estão se fragmentando, o protestantismo está se dividindo, o cristianismo.
- O senhor é religioso?
- Sim, tenho formação católica, estudei dez anos interno em colégio de padre. Evidente que depois de alguns anos eu era comunista. Foi minha fase libertária, fui filiado ao Partido. Foi ali que conheci o Carlos Lacerda. O Apolônio de Carvalho me botou lá, depois ele foi da dissidência do Partido. Fui companheiro do Lacerda, que na época era muito diferente do que ele se tornaria, era comunista mesmo.
- Até que ponto a despreocupação com o dinheiro é importante para o poeta?
- Levei vários anos até conquistar o ócio, isso é importante para o poeta, ele não pode ter a cabeça virada só para coisas a resolver. Fiquei muitos anos arrumando minha vida, saldando dívidas, atendendo papagaio. Há oito anos, cheguei aqui pra Mato Grosso, tomei pé aqui. Agora estou vagabundo, tenho direito a isso. Herdei uma fazenda, em campo aberto, terra nua, sou fazendeiro de gado, vaca, não sou "o rei do boi, do gado" mas vivo bem. Este é o meu caso: enquanto estava tomando pé da fazenda não escrevi uma linha. Mas sabemos de outros casos, como o Dostoiévski, que escreveu perseguido por dívidas, ou o Graciliano Ramos, que além das dívidas ainda tinha família pra criar.
- Qual é o tema do poeta?
- O tema do poeta é sempre ele mesmo. Ele é um narcisista: expõe o mundo através dele mesmo. Ele quer ser o mundo, e pelas inquietações dele, desejos, esperanças, o mundo aparece. Através de sua essência, a essência do mundo consegue aparecer. O tema da minha poesia sou eu mesmo e eu sou pantaneiro. Então, não é que eu descreva o Pantanal, não sou disso, nem de narrar nada. Mas nasci aqui, fiquei até os oito anos e depois fui estudar. Tenho um lastro da infância, tudo o que a gente é mais tarde vem da infância. Nesse último livro meu, Livro sobre nada, tem muitos versos que vieram da infância. Tem um poema que se chama "A arte de infantilizar formigas". Num vídeo que fizeram sobre mim, o rapaz chega uma hora que pergunta: "Escuta aqui, o senhor escreveu que formiga não tem dor nas costas. Mas como é que o senhor sabe?". Outro rapaz me escreveu do Rio, diz que freqüenta as aulas de um professor muito inteligente em energia nuclear, física, poesia e romance, e ele fez a pergunta, que é um verso meu: "Professor, por que a 15 metros do arco-íris o sol é cheiroso?". O professor, que tinha estudado Einstein e outros autores, disse: "Essa pergunta não vou responder, é absurda". Ou seja, encabulou. Creio que a poesia está de mãos dadas com o ilógico. Não gosto de dar confiança para a razão, ela diminui a poesia.
- Como é seu dia-a-dia?
- Pela estrada, chego a minha fazenda em quatro horas, estou bem perto do Pantanal. Agora o clima é seco, e dá para correr de carro. Mas quando a estrada enche, só de avião. Fico em casa lendo, escutando músico, vejo televisão. De manhã, fico escrevendo, terminando livro, fazendo entrevista.
- Hoje, o senhor lê que autores?
- Já li muita coisa séria, além dos escritores, li filosofia, Nietszche, Kant, Walter Benjamim, Adorno, essas coisas. Mas hoje tô lendo mais porcaria mesmo, quero descansar a cabeça. E estou com a vista meio ruim. Vejo também muitas coisas engraçadas na TV, o Didi e o Dedé (Os trapalhões), o Chaves, sabe quem é?, aquele chato mexicano. E escuto muita música. De tarde, saio pra tomar umas pingas, enquanto meu fígado não arrebentou. Mas às vezes sofro aqui nessa cidade. A poesia faz da gente uma espécie de mito, e as pessoas acabam fazendo da gente uma imagem diferente da realidade. Tem gente aqui que pensa que eu vivo isolado, sozinho, sem amigos, falam que eu sou intratável. Não sou isolado, não.
- Como nasceu seu amor pelo trabalho da linguagem?
-<
"A religião é um freio!", dizia o conselheiro Acácio, venerado filho do boticário Honrais, e neto de monsieur de La Palisse.

Parece, porém, que o Rio de janeiro, esta árdega e desbocada cidade em que vivemos, não se contenta com um só freio: o Rio de Janeiro precisa de muitos freios, cuja ação combinada lhe modere e sofreie o ardor dos instintos em marcha acelerada para a abolição dos pecados.

O Rio de Janeiro não tem Religião: tem Religiões. Os cariocas acreditam ardentemente ganhar o reino do céu, lançam mão de todas as amarras, e recorrem ao mesmo tempo ao auxílio de todos os credos e de todos os ritos. Ora, graças! Já não se dirá de nós o que dos Tasmânios incréus disse o missionário Clark: "Morrem sem pensar em Deus, como os cangurus", ou o que dos hotentotes disse Campbell: "Só vieram ao mundo para matar e comer". Nós viemos ao mundo para... crer e rezar.

Ninguém imaginava que houvesse tantas religiões por aqui: nós somos católicos, positivistas, budistas, protestantes, batistas, luteranos, calvinistas, hierosolimitas, sebastianistas, ocultistas, gnosticistas, cabalistas... que sei eu? O Rio de janeiro é Credópolis: aqui, como naquele vale do Egito, em que Flaubert localizou a Tentação de santo Antão, todas as religiões da terra... e do espaço vieram reunir-se, e exibir-se em parada de mostra.

O meu companheiro João do Rio deu-se agora a um inquérito sobre todas essas religiões, e os seus artigos, publicados nesta mesma Gazeta, têm revelado cousas maravilhosas. Ontem, encontrei João do Rio... Ele resplandecia: pareceu-me que cada uma das religiões estudadas e devassadas lhe tinha dado um pouco do seu clarão do Além-Mundo... João saía do Mistério, todo cheio de Mistério: tinha mistério na face, no corpo, no chapéu, nas botas. E, assim como as mulheres de Florença diziam de Dante, quando ele passava pelas ruas: "Lá vai aquele que voltou do inferno!" — também do meu querido João do Rio se pode dizer, com respeitoso espanto: "Lá vai aquele que voltou do Mistério!".

Essas revelações têm despertado um interesse justo. Não houve ainda, desde o princípio das eras até hoje, problema que, mais do que o problema religioso, apaixonasse a alma humana. Alguns psicólogos acreditam que há no cérebro humano uma região especial, onde reside o domínio privado da religiosidade...

O inquérito da Gazeta, conduzido com talento e brilho, vem provar que esse domínio da religiosidade, se existe, nunca terá talvez as suas fronteiras anuladas.

João do Rio tem corrido vários templos — uns encantadores e sóbrios, outros severos e solenes, outros lôbregos ou equívocos, ou sinistros, ou cômicos, instalados em bibocas ou em fundos de clubes de dança. E ainda o inquiridor não visitou as casas em que se praticam a quiromancia, a necromancia, a cartomancia, a piromancia, [***], a oniromancia, e todas as outras artes da magia, que, pelo seu caráter cultual e místico, também fazem parte da grande repartição das religiões.

Somente agora, podemos avaliar os mistérios que a nossa Capital, sob a sua enganadora aparência de leviana futilidade, guarda e esconde no seu seio.

Mal sabíamos nós que vivíamos a acotovelar por essas ruas tantos sacerdotes!

Olhai aquele sujeito, que vai de rosto magro e chupado, pitando melancolicamente um cigarro, com um ar apagado e insignificante de quem não sabe o que está fazendo no mundo... Não vos deixeis iludir pela sua aparência nula: aquele sujeito é um vidente, que confabula de dia e de noite com os mortos e a cujo aceno imperativo e seco as almas fogem do limbo e vêm roçar de novo, com a ponta da sua asa imaterial, a Terra corrompida.

Vede aquele homem calmo, pacato, gordo, vestido com correção e limpeza, pisando firme, com a mão na algibeira da calça, sacolejando as chaves da burra. Pensais que aquele pacífico burguês só trata dos seus negócios e da prosperidade de sua casa comercial? Puro engano nosso: aquele homem vive dentro de um halo de espíritos, e conversa com eles, e deles recebe lições, e por eles conhece todos os segredos do éter infinito, em cuja amplidão, entre os mundos volantes, erram as Psiques e os Corpos Astrais...

Reparai agora naquele mocinho imberbe, esbelto, com um buço no beiço e um clarão de garotinho nos olhos. Cuidais que é um alegre colegial, somente preocupado com o sum-es-fui e com o teorema de Euclides, dividindo o seu tempo entre o estudo dos preparatórios e o namoro das meninas janeleiras? Longe disso! aquele mocinho é um sacerdote de Mitra, para quem a Gnose não tem segredos, e para quem o Talmude é mais claro do que um copo d'água...

E ali tendes um mendigo, sentado à soleira de uma porta, com a cabeça calva ao sol, estendendo o chapéu aos transeuntes. Não vos enganeis... Aquele mendigo é mais rico que Rockefeller e Morgan: sabe consultar os astros, possui um pedaço da pedra filosofal, vende aos centilitros o elixir da longa vida, e, versado em todos os arcanos da alquimia, sabe converter o chumbo em ouro, com o simples auxílio de uma pitada de pó e da boa vontade do divino Hermes Trimegisto...

Nos bondes, nos teatros, nos cafés, nós vivemos irreverentemente a pisar os calos de grandes heresiarcas, de poderosos magos, de fortes arquiatros, de sagrados pastores de almas. Em cada uma das ruas de Botafogo, ou do saco do Alferes, da Gamboa, ou das Laranjeiras, há um templo, uma basílica, um delubro, uma capela, um antro de pitonisa, uma caverna de oráculo: o Rio de janeiro é Credópolis.

A todas essas religiões cujo culto é público ou secreto, mas que têm uma organização mais ou menos metódica, é preciso juntar as religiões individuais, as superstições que são peculiares a cada indivíduo.

Este nunca sai de casa sem fazer quatro piruetas seguidas no patamar da escada; aquele não vai para o trabalho sem beijar sete vezes um pedaço de corda de enforcado; aquele outro tem na corrente do relógio um dente de veado morto no quarto minguante da lua de outubro; qual não realiza negócio senão em quarta-feira; qual não arrisca cinco tostões no jogo dos bichos sem oferecer um copinho de aguardente a santo Onofre; e um sujeito conheço eu (não lhe escrevo o nome para não o vexar) que, há doze anos, ao descer do bonde, entra na cidade pondo o pé direito na mesma pedra da mesma calçada da mesma esquina da mesma rua...

Também essas superstições são governadas pelo instinto de "religiosidade". Religião não é somente "um freio", como dizia o conselheiro Acácio: é um freio para as almas ardentes e impetuosas; mas, para as almas lerdas ou apáticas, não é freio: é acicate, é chicote, é espora, é estimulante, é álcool, é choque elétrico... Da Religião se pode dizer o que dizem do hábito de fumar os fumantes incorrigíveis: dá fome a quem não a tem, e aplaca a fome a quem a tem...

Estou em dizer que nunca se fez, no Rio de janeiro, como pesquisa de psicologia social, um inquérito tão interessante como esse da Gazeta.

O século XIX, no seu último quartel, assistiu a um reflorescimento de crenças. O século XX está assistindo à exacerbação desse movimento de regresso à fé. O reverdecer, não da Religião, mas das Religiões, não se está fazendo apenas no Rio de Janeiro: faz-se em todo o mundo civilizado. Multiplicam-se as conversões, ressuscitam crenças mortas, exumam-se ritos antigos, reacendem-se apagadas seitas. Na culta Europa, em Paris e em Londres, já existem templos do masdeísmo, do budismo e do sabeísmo.

Que quer dizer esse regresso à fé? É um sinal de progresso ou de decadência moral?

Pela mistura das religiões, pela complicação dos credos, pelo baralhamento das seitas — parece a princípio que há aí um sintoma de degenerescência. O primeiro sintoma de queda de Roma foi a importação e a implantação de todos os cultos e de todas as religiões das províncias
A seguinte farsa de folgar foi representada ao muito alto e mui poderoso rei D. João, o terceiro do nome em Portugal, no seu Convento de Tomar, era do Senhor de MDXXIII. O seu argumento é que porquanto duvidavam certos homens de bom saber se o Autor fazia de si mesmo estas obras, ou se furtava de outros autores, lhe deram este tema sobre que fizesse: segundo um exemplo comum que dizem: mais quero asno que me leve que cavalo que me derrube. E sobre este motivo se fez esta farsa.

A figuras são as seguintes: Inês Pereira; sua Mãe; Lianor Vaz; Pêro Marques; dous Judeus (um chamado Latão, outro Vidal); um Escudeiro com um seu Moço; um Ermitão; Luzia e Fernando.


Finge-se que Inês Pereira, filha de hüa molher de baixa sorte, muito fantesiosa, está lavrando em casa, e sua mãe é a ouvir missa, e ela canta esta cantiga:

Quien con veros pena y muere
Que hará quando no os viere?

E diz

INÊS Renego deste lavrar
E do primeiro que o usou;
Ó diabo que o eu dou,
Que tão mau é d'aturar.
Oh Jesu! que enfadamento,
E que raiva, e que tormento,
Que cegueira, e que canseira!
Eu hei-de buscar maneira
D'algum outro aviamento.

Coitada, assi hei-de estar
Encerrada nesta casa
Como panela sem asa,
Que sempre está num lugar?
E assi hão-de ser logrados
Dous dias amargurados,
Que eu possa durar viva?
E assim hei-de estar cativa
Em poder de desfiados?

Antes o darei ao Diabo
Que lavrar mais nem pontada.
Já tenho a vida cansada
De fazer sempre dum cabo.
Todas folgam, e eu não,
Todas vêm e todas vão
Onde querem, senão eu.
Hui! e que pecado é o meu,
Ou que dor de coração?

Esta vida he mais que morta.
Sam eu coruja ou corujo,
Ou sam algum caramujo
Que não sai senão à porta?
E quando me dão algum dia
Licença, como a bugia,
Que possa estar à janela,
É já mais que a Madanela
Quando achou a aleluía.

Vem a Mãe, e não na achando lavrando, diz:

MÃE Logo eu adivinhei
Lá na missa onde eu estava,
Como a minha Inês lavrava
A tarefa que lhe eu dei...
Acaba esse travesseiro!
Hui! Nasceu-te algum unheiro?
Ou cuidas que é dia santo?
INÊS Praza a Deos que algum quebranto?
Me tire do cativeiro.

MÃE Toda tu estás aquela!
Choram-te os filhos por pão?
INÊS Prouvesse a Deus! Que já é razão
De eu não estar tão singela.
MÃE Olhade ali o mau pesar...
Como queres tu casar
Com fama de preguiçosa?
INÊS Mas eu, mãe, sam aguçosa
E vós dais-vos de vagar.

MÃE Ora espera assi, vejamos.
INÊS Quem já visse esse prazer!
MÃE Cal'-te, que poderá ser
Que «ame a Páscoa vêm os Ramos».
Não te apresses tu, Inês.
«Maior é o ano que o mês»:
Quando te não precatares,
Virão maridos a pares,
E filhos de três em três.

INÊS Quero-m'ora alevantar.
Folgo mais de falar nisso,
Assi me dê Deos o paraíso,
Mil vezes que não lavrar
Isto não sei que me faz
MÃE Aqui vem Lianor Vaz.
INÊS E ela vem-se benzendo...

(Entra Lianor Vaz)

LIANOR Jesu a que me eu encomendo!
Quanta cousa que se faz!

MÃE Lianor Vaz, que é isso?
LIANOR Venho eu, mana, amarela?
MÃE Mais ruiva que uma panela.
LIANOR Não sei como tenho siso!
Jesu! Jesu! que farei?
Não sei se me vá a el-Rei,
Se me vá ao Cardeal.
MÃE Como? e tamanho é o mal?
LIANOR Tamanho? eu to direi:

Vinha agora pereli
Ó redor da minha vinha,
E hum clérigo, mana minha,
Pardeos, lançou mão de mi;
Não me podia valer
Diz que havia de saber
S'era eu fêmea, se macho.
MÃE Hui! seria algum muchacho,
Que brincava por prazer?

LIANOR Si, muchacho sobejava
Era hum zote#tamanhouço!
Eu andava no retouço,
Tão rouca que não falava.
Quando o vi pegar comigo,
Que m'achei naquele p'rigo:
- Assolverei! - não assolverás!
-Tomarei! - não tomarás!
- Jesu! homem, qu'has contigo?

- Irmã, eu te assolverei
Co breviairo de Braga.

- Que breviairo, ou que praga!
Que não quero: aqui d'el-Rei! -
Quando viu revolta a voda,
Foi e esfarrapou-me toda
O cabeção da camisa.
MÃE Assi me fez dessa guisa
Outro, no tempo da poda.

Eu cuidei que era jogo,
E ele... dai-o vós ao fogo!
Tomou-me tamanho riso,
Riso em todo meu siso,
E ele leixou-me logo.
LIANOR Si, agora, eramá,
Também eu me ria cá
Das cousas que me dizia:
Chamava-me «luz do dia».
- «Nunca teu olho verá!» -

Se estivera de maneira
Sem ser rouca, bradar'eu;
Mas logo m'o demo deu
Catarrão e peitogueira,
Cócegas e cor de rir,
E coxa pera fugir,
E fraca pera vencer:
Porém pude-me valer
Sem me ninguém acudir...

O demo (e não pode al ser)
Se chantou no corpo dele.
MÃE Mana, conhecia-te ele?
LIANOR Mas queria-me conhecer!
MÃE Vistes vós tamanho mal?
LIANOR Eu m'irei ao Cardeal,
E far-lhe-ei assi mesura,
E contar lhe-ei a aventura
Que achei no meu olival.

MÃE Não estás tu arranhada,
De te carpir, nas queixadas?
LIANOR Eu tenho as unhas cortadas,
E mais estou tosquiada:
E mais pera que era isso?
E mais pera que é o siso?
E mais no meio da requesta
Veio hum homem de hüa besta,
Que em vê-lo vi o p'raíso,

E soltou-me, porque vinha
Bem contra sua vontade.
Porém, a falar a verdade,
Já eu andava cansadinha:
Não me valia rogar
Nem me valia chamar:
- «Aque de Vasco#de#Fois,
Acudi-me, como sois!»
E ele... senão pegar:

- Mais mansa, Lianor Vaz,
Assi Deus te faça santa.
- Trama te dê na garganta!
Como! isto assi se faz?
- Isto não revela nada...
- Tu não vês que são casada?
MÃE Deras-lhe, má hora, boa,
E mordera-lo na coroa.
LIANOR Assi! fora excomungada.

Não lhe dera um empuxão,
Porque sou tão maviosa,
Que é cousa maravilhosa.
E esta é a concrusão.
Leixemos isto. Eu venho
Com grande amor que vos tenho,
Porque diz o exemplo antigo
Que a amiga e bom amigo
Mais aquenta que o bom lenho.

Inês está concertada
Pera casar com alguém?
MÃE Até `gora com ninguém
Não é ela embaraçada.
LIANOR Eu vos trago um casamento
Em nome do anjo#bento.
Filha, não sei se vos praz.
INÊS E quando, Lianor Vaz?
LIANOR Eu vos trago aviamento.

INÊS Porém, não hei-de casar
Senão com homem avisado
Ainda que pobre e pelado,
Seja discreto em falar
LIANOR Eu vos trago um bom marido,
Rico, honrado, conhecido.
Diz que em camisa vos quer
INÊS Primeiro eu hei-de saber
Se é<
À Farsa seguinte chamam Auto da Índia. Foi fundada sobre que üa mulher, estando já embarcado pera a Índia seu marido, lhe vieram dizer que estava desaviado e que já não ia; e ela, de pesar, está chorando e fala-lhe üa sua criada. Foi feita em Almada, representada à muito católica Rainha Dona#Lianor. Era de 1509 anos.

Entram nela estas figuras:
Ama, Moça, Castelhano, Lemos, Maridreo.


MOÇA Jesu! Jesu! que é ora isso?
É porque se parte a armada?
AMA Olhade a mal estreada!
Eu hei-de chorar por isso?
MOÇA Por minh' alma que cuidei
e que sempre imaginei,
que choráveis por noss' amo.
AMA Por qual demo ou por qual gamo,
ali, má hora, chorarei?

Como me leixa saudosa!
Toda eu fico amargurada!
MOÇA Pois por que estais anojada?
Dizei-mo, por vida vossa.
AMA Leixa-m', ora, eramá,
que dizem que não vai já.
MOÇA Quem diz esse desconcerto?
AMA Dixeram-mo por mui certo
que é certo que fica cá.

O Concelos me faz isto.
MOÇA S'eles já estão em Restelo,
como pode vir a pêlo?
Melhor veja cu Jesu Cristo,
isso é quem porcos há menos.
AMA Certo é que bem pequenos
são meus desejos que fique.
MOÇA A armada está muito a pique.
AMA Arreceio#al#de#menos.

Andei na má hora e nela
a amassar e biscoutar,
pera o o demo levar
à sua negra canela,
e agora dizem que não.
Agasta-se-m'o coração,
que quero sair de mim.
MOÇA Eu irei saber s'é assim.
AMA Hajas a minha benção.

Vai Moça e fica a Ama dizendo:

AMA A Santo António rogo eu
que nunca mo cá depare:
não sinto quem não s'enfare
de um Diabo Zebedeu.
Dormirei, dormirei,
boas novas acharei.
São João no ermo estava,
e a passarinha cantava.
Deus me cumpra o que sonhei.
Cantando vem ela e leda.

MOÇA Dai-m' alvíssaras, Senhora,
já vai lá de foz em fora.
AMA Dou-te üa touca de seda.
MOÇA Ou, quando ele vier,
dai-me do que vos trouxer.
AMA Ali muitieramá!
Agora há-de tornar cá?
Que chegada e que prazer!

MOÇA Virtuosa está minha ama!
Do triste dele hei#dó.
AMA: E que falas tu lá só?
MOÇA: Falo cá co'esta cama.
AMA: E essa cama, bem, que há?
Mostra-m'essa roca cá:
siquer fiarei um fio.
Leixou-me aquele fastio
sem ceitil.

MOÇA: Ali eramá!
Todas ficassem assi.
Leixou-lhe pera três anos
trigo, azeite, mel e panos.
AMA: Mau pesar veja eu de ti!
Tu cuidas que não t'entendo?
MOÇA: Que entendeis? ando dizendo
que quem assi fica sem nada,
coma vós, que é obrigada...
Já me vós is entendendo.

AMA: Ha ah ah ah ah ah!
Est'era bem graciosa,
quem se vê moça e fermosa
esperar pola irá#má.
I se vai ele a pescar
meia légua polo mar,
isto bem o sabes tu,
quanto mais a Calecu:
quem há tanto d'esperar?

Melhor, Senhor, sé tu comigo.
À hora de minha morte,
qu'eu faça tão peca sorte.
Guarde-me Deus de tal p'rigo.
O certo é dar a prazer.
Pera que é envelhecer
esperando polo vento?
Quant'eu por mui nécia sento
a que o contrário fizer.

Partem em Maio daqui,
quando o sangue novo atiça:
parece-te que é justiça?
Melhor vivas tu amém,
e eu contigo também.
Quem sobe por essa escada?
CASTELHANO Paz sea n' esta posada.
AMA Vós sois? Cuidei que era alguém.
CASTFLHANO A según esso, soy yo nada.

AMA Bem, que vinda foi ora esta?
CASTELHANO Vengo aquí en busca mía,
que me perdí en aquel día
que os vi hermosa y honesta
y nunca más me topé.
Invisible me torné,
y de mí crudo enemigo;
el cielo, empero es testigo
que de mi parte no sé.

Y ando un cuerpo sin alma,
un papel que lleva el viento,
un pozo de pensamiento,
una fortuna sin calma.
Pese al dia en que nascí;
vos y Dios sois contra mí,
y nunca topo el diablo.
Reís de lo que yo hablo?
AMA Bem sei eu de que me ri.

CASTELHANO Reívos del mal que padezco,
reívos de mi desconcierto,
reívos que tenéis por cierto
que miraros non merezco.
AMA Andar embora.
CASTELHANO Oh, mi vida y mi señora,
luz de todo Portugal,
tenéis gracia especial
para linda matadora.

Supe que vuesso marido
era ido.
AMA Ant' ontem se foi.
CASTELHANO Al diablo que lo doy
el desestrado perdido.
Qué más India que vos,
qué más piedras preciosas,
qué más alindadas cosas,
qué estardes juntos los dos?
No fue él Juan de Çamora.
Que arrastrado muera yo,
si por cuanto Dios crió
os dexara media hora.
Y aunque la mar se humillara
y la tormenta cessara,
y el viento me obedcciera
y el cuarto cielo se abriera,
un momento no os dexara.

Mas como evangelio es esto
que la India hizo Dios,
solo porque yo con vos
pudiesse passar aquesto.
Y solo por dicha mía,
por gozar esta alegria,
la hizo Dios descobrir:
y no ha más que dezir,
por la sagrada María!

AMA Moça, vai àquele cão,
que anda naquelas tigelas.
MOÇA Mas os gatos andam nelas.
CASTELHANO Cuerpo del cielo con vos!
Hablo en las tripas de Dios,
y vos hablaisme en los gatos!
AMA Se vós falais desbaratos,
em que falaremos nós?

CASTELHANO No me hagáis derreñegar
o hazer un desatino.
Vós pensáis que soy devino?
Soy hombre y siento el pesar.
Trayo de dentro un léon,
metido en el coraçón:
tiéneme el alma dañada
de ensangrentar esta espada
en hombres, que es perdición.

Ya Dios es importunado
de las ánimas que le embío;
y no es en poder mío
dexar uno acuchilado.
Dexé bivo allá en el puerto
un hombrazo anto y tuerto
y después fuilo a encontrar;
pcnsó que lo iva a matar,
y de miedo cayó muerto.

AMA Vós queríeis ficar cá?
Agora é cedo ainda;
tornareis vós outra vinda,
e tudo se bem fará.
CASTELHANO A qué hora me mandáis?
AMA Às nove horas e nô mais.
E tirai üa pedrinha,
pedra muito pequenina,
à janela dos quintais.

Entonces vos abrirei
de muito boa vontade:
pois sois homem de verdade
nunca vos falecerei.
CASTELHANO Sabéis qué ganáis en esso?
El mundo todo por vuesso!
Que aunque tal capa me veis,
tengo más que pensaréis:
y no lo toméis em gruesso.

Bésoos las manos, Señora,
voyme con vuessa licencia
más ufano que Florencia.
AMA Ide e vinde muit' embora.
NO TÚMULO DO MEU AMIGO
JOÃO BAPTISTA DA SILVA PEREIRA JÚNIOR

Lira dos Vinte Anos
Primeira Parte


Perdão, meu Deus, se a túnica da vida...
Insano profanei-a nos amores!
Se da c'roa dos sonhos perfumados
Eu próprio desfolhei as róseas flores!

No vaso impuro corrompeu-se o néctar,
A argila da existência desbotou-me...
O sol de tua gloria abriu-me as pálpebras,
Da nódoa das paixões purificou-me!

E quantos sonhos na ilusão da vida!
Quanta esperança no futuro ainda!
Tudo calou-se pela noite eterna...
E eu vago errante e só na treva infinda...

Alma em fogo, sedenta de infinito,
Num mundo de visões o vôo abrindo,
Como o vento do mar no céu noturno
Entre as nuvens de Deus passei dormindo!

A vida é noite! o sol tem véu de sangue...
Tateia a sombra a geração descrida!...
Acorda-te, mortal! é no sepulcro
Que a larva humana se desperta à vida!

Quando as harpas do peito a morte estala,
Um treno de pavor soluça e voa...
E a nota divinal que rompe as fibras
Nas dulias angélicas ecoa!

“Soltem as fechaduras das portas!
Soltem também as portas dos seus batentes!”

Dedicado a Jack Kerouac, novo Buda da prosa americana, que borrifou inteligência em onze livros escritos na metade deste número de anos (1951-1956) – On the Road, Visions of Neal, Dr. Sax, Springtime Mary, The Subterraneans, San Francisco Blues, Some of the Dharma, Book of Dreams, Wake Up, Mexico City Blues e Visions of Gerard –, criando uma prosódia bop espontânea e uma literatura clássica original. Várias frases e o título de Uivo são tirados dele.
William Seward Burroughs, autor de Naked Lunch, uma novela sem fim que deixará todo mundo louco.
Neal Cassady, autor de The First Third, uma autobiografia (1949) que iluminou Buda.
Todos esses livros estão publicados no Céu.


Uivo
para Carl Solomon


I
Eu vi os expoentes da minha geração destruídos pela loucura, morrendo de fome, histéricos, nus,
arrastando-se pelas ruas do bairro negro de madrugada em busca de uma dose violenta de qualquer coisa,
hipsters com cabeça de anjo ansiando pelo antigo contato celestial com o dínamo estrelado na maquinaria da noite,
que pobres, esfarrapados e olheiras fundas, viajaram fumando sentados na sobrenatural escuridão dos miseráveis apartamentos sem água quente, flutuando sobre os tetos das cidades contemplando jazz,
que desnudaram seus cérebros ao céu sob o Elevado e viram anjos maometanos cambaleando iluminados nos telhados das casas de cômodos,
que passaram por universidades com olhos frios e radiantes alucinando Arkansas e tragédias à luz de Blake entre os estudiosos da guerra,
que foram expulsos das universidades por serem loucos & publicarem odes obscenas nas janelas do crânio,
que se refugiaram em quartos de paredes de pintura descascada em roupa de baixo queimando seu dinheiro em cestos de papel, escutando o
Terror através da parede,
que foram detidos em suas barbas púbicas voltando por Laredo com um cinturão de marijuana para Nova York,
que comeram fogo em hotéis mal pintados ou beberam terebintina em Paradise Alley, morreram ou flagelaram seus torsos noite após noite com sonhos, com drogas, com pesadelos na vigília, álcool e caralhos e intermináveis orgias,
incomparáveis ruas cegas sem saída de nuvem trêmula e clarão na mente pulando nos postes dos polos de Canadá & Paterson, iluminando completamente o mundo imóvel do Tempo intermediário,
solidez de Peiote dos corredores, aurora de fundo de quintal com verdes árvores de cemitério, porre de vinho nos telhados, fachadas de lojas de subúrbio na luz cintilante de néon do tráfego na corrida de cabeça feita do prazer, vibrações de sol e lua e árvore no ronco de crepúsculo de inverno de Brooklyn, declamações entre latas de lixo e a suave soberana luz da mente,
que se acorrentaram aos vagões do metrô para o infindável percurso do Battery ao sagrado Bronx de benzedrina até que o barulho das rodas e crianças os trouxesse de volta, trêmulos, a boca arrebentada e o despovoado deserto do cérebro esvaziado de qualquer brilho na lúgubre luz do Zoológico,
que afundaram a noite toda na luz submarina de Bickford’s, voltaram à tona e passaram a tarde de cerveja choca no desolado Fuggazi’s escutando o matraquear da catástrofe na vitrola automática de hidrogênio,
que falaram setenta e duas horas sem parar do parque ao apê ao bar ao Hospital Bellevue ao Museu à Ponte de Brooklyn,
batalhão perdido de debatedores platônicos saltando dos gradis das escadas de emergência dos parapeitos das janelas do Empire State da Lua,
tagarelando, berrando, vomitando, sussurrando fatos e lembranças e anedotas e viagens visuais e choques nos hospitais e prisões e guerras,
intelectos inteiros regurgitados em recordação total com os olhos brilhando por sete dias e noites, carne para a sinagoga jogada à rua,
que desapareceram no Zen de Nova Jersey de lugar algum deixando um rastro de cartões-postais ambíguos do Centro Cívico de Atlantic City,
sofrendo suores orientais, pulverizações tangerianas nos ossos e enxaquecas da China por causa da falta da droga no quarto pobremente mobiliado de Newark,
que deram voltas e voltas à meia-noite no pátio da ferrovia perguntando-se aonde ir e foram, sem deixar corações partidos,
que acenderam cigarros em vagões de carga, vagões de carga, vagões de carga que rumavam ruidosamente pela neve até solitárias fazendas dentro da noite do avô,
que estudaram Plotino, Poe, São João da Cruz, telepatia e bop-cabala pois o Cosmos instintivamente vibrava a seus pés em Kansas,
que passaram solitários pelas ruas de Idaho procurando anjos índios e visionários que eram anjos índios e visionários,
que só acharam que estavam loucos quando Baltimore apareceu em êxtase sobrenatural,
que pularam em limusines com o chinês de Oklahoma no impulso da chuva de inverno na luz das ruas de cidade pequena à meia-noite,
que vaguearam famintos e sós por Houston procurando jazz ou sexo ou rango e seguiram o espanhol brilhante para conversar sobre América e Eternidade, inútil tarefa, e assim embarcaram num navio para a África,
que desapareceram nos vulcões do México nada deixando além da sombra de suas calças rancheiras e a lava e a cinza da poesia espalhadas pela lareira Chicago,
que reapareceram na Costa Oeste investigando o FBI de barba e bermudas com grandes olhos pacifistas e sensuais em suas peles morenas, distribuindo folhetos ininteligíveis,
que apagaram cigarros acesos em seus braços protestando contra o nevoeiro narcótico de tabaco do Capitalismo,
que distribuíram panfletos supercomunistas em Union Square, chorando e despindo-se enquanto as sirenes de Los Alamos os afugentavam gemendo mais alto que eles e gemiam pela Wall Street e também gemia a balsa de Staten Island
que caíram em prantos em brancos ginásios desportivos, nus e trêmulos diante da maquinaria de outros esqueletos,
que morderam policiais no pescoço e berraram de prazer nos carros de presos por não terem cometido outro crime a não ser sua transação pederástica e tóxica,
que uivaram de joelhos no metrô e foram arrancados do telhado sacudindo genitais e manuscritos,
que se deixaram foder no rabo por motociclistas santificados e urraram de prazer,
que enrabaram e foram enrabados por esses serafins humanos, os marinheiros, carícias de amor atlântico e caribeano,
que transaram pela manhã e ao cair da tarde em roseirais, na grama de jardins públicos e cemitérios, espalhando livremente seu sêmen para quem quisesse vir,
que soluçaram interminavelmente tentando gargalhar mas acabaram choramingando atrás de um tabique de banho turco onde o anjo loiro e nu veio trespassá-los com sua espada,
que perderam seus garotos amados para as três megeras do destino, a megera caolha do dólar heterossexual, a megera caolha que pisca de dentro do ventre e a megera caolha que só sabe ficar plantada sobre sua bunda retalhando os dourados fios intelectuais do tear do artesão, que copularam em êxtase insaciável com uma garrafa de cerveja, uma namorada, um maço de cigarros, uma vela, e caíram da cama e continuaram pelo assoalho e pelo corredor e terminaram desmaiando contra a parede com uma visão da boceta final e acabaram sufocando um derradeiro lampejo de consciência,
que adoçaram as trepadas de um milhão de garotas trêmulas ao anoitecer, acordaram de olhos vermelhos no dia seguinte mesmo assim prontos para adoçar trepadas na aurora, bundas luminosas nos celeiros e nus no lago,
que foram transar em Colorado numa miríade de carros roubados à noite, N. C. herói secreto destes poemas, garanhão e Adónis de Denver –
prazer ao lembrar das suas incontáveis trepadas com garotas em terrenos baldios & pátios dos fundos de restaurantes de beira de estrada, raquíticas fileiras de poltronas de cinema, picos de montanha, cavernas ou com esquálidas garçonetes no familiar levantar de saias solitário à beira da estrada & especialmente secretos solipsismos de mictórios de postos de gasolina & becos da cidade natal também,
que se apagaram em longos filmes sórdidos, foram transportados em sonho, acordaram num Manhattan súbito e conseguiram voltar com uma impiedosa ressaca de adegas de Tokay e o horror dos sonhos de ferro da Terceira Avenida & cambalearam até as agências de desemprego,
que caminharam a noite toda com os sapatos cheios de sangue pelo cais coberto por montões de neve, esperando que uma porta se abrisse no East River dando para um quarto cheio de vapor e ópio,
que criaram grandes dramas suicidas nos penhascos de apartamentos do Hudson à luz azul de holofote antiaéreo da lua & suas cabeças receberão coroas de louro no esquecimento,
que comeram o ensopado de cordeiro da imaginação ou digeriram o caranguejo do fundo lodoso dos rios de Bovery,
que choraram diante do romance das ruas com seus carrinhos de mão cheios de cebola e péssima música,
que ficaram sentados em caixotes respirando a escuridão sob a ponte e ergueram-se para construir clavicórdios em seus sótãos,
que tossiram num sexto andar do Harlem coroado de chamas sob um céu tuberculoso rodeados pelos caixotes de laranja da teologia,
que rabiscaram a noite toda deitando e rolando sobre invocações sublimes que ao amanhecer amarelado revelaram-se versos de tagarelice sem sentido,
que cozinharam animais apodrecidos, pulmão coração pé rabo borsht
& tortillas sonhando com o puro reino vegetal,
que se atiraram sob caminhões de carne em busca de um ovo,
que jogaram seus relógios do telhado fazendo seu lance de aposta pela Eternidade fora do Tempo & despertadores caíram nas suas cabeças por
todos os dias da década seguinte,
que cortaram seus pulsos sem resultado por três vezes seguidas, desistiram e foram obrigados a abrir lojas de antiguidades onde acharam que estavam ficando velhos e choraram,
que foram queimados vivos em seus inocentes ternos de flanela em Madison Avenue no meio das rajadas de versos de chumbo & o estrondo contido dos batalhões de ferro da moda & os guinchos de nitroglicerina das bichas da propaganda & o gás mostarda de sinistros editores inteligentes ou foram atropelados pelos táxis bêbados da Realidade Absoluta,
que se jogaram da Ponte de Brooklyn, isso realmente aconteceu, e partiram esquecidos e desconhecidos para dentro da espectral confusão das ruelas de sopa & carros de bombeiros de Chinatown, nem uma cerveja de graça,
que cantaram desesperados nas janelas, jogaram-se da janela do metrô,
saltaram no imundo rio Passaic, pularam nos braços dos negros, choraram pela rua afora, dançaram sobre garrafas quebradas de vinho descalços arrebentando nostálgicos discos de jazz europeu dos anos 30
na Alemanha, terminaram o whisky e vomitaram gemendo no toalete sangrento, lamentações nos ouvidos e o sopro de colossais apitos a vapor,
que mandaram brasa pelas rodovias do passado viajando pela solidão da vigília de cadeia do Gólgota de carro envenenado de cada um ou então a encarnação do Jazz de Birmingham,
que guiaram atravessando o país durante setenta e duas horas para saber se eu tinha tido uma visão ou se você tinha tido uma visão ou se ele tinha tido uma visão para descobrir a Eternidade,
que viajaram para Denver, que morreram em Denver, que retornaram a Denver & esperaram em vão, que espreitaram Denver & ficaram parados pensando & solitários em Denver e finalmente partiram para descobrir o Tempo & agora Denver está com saudades dos seus heróis, que caíram de joelhos em catedrais sem esperança rezando por sua salvação e luz e peito até que a alma iluminasse seu cabelo por um segundo,
que se arrebentaram nas suas mentes na prisão aguardando impossíveis criminosos de cabeça dourada e o encanto da realidade em seus corações que entoavam suaves blues de Alcatraz,
que se recolheram ao México para cultivar um vício ou às Montanhas Rochosas para o suave Buda ou Tânger para os garotos ou Pacífico Sul para a locomotiva negra ou Harvard para Narciso para o cemitério de Woodlawn para a coroa de flores para o túmulo, que exigiram exames de sanidade mental acusando o rádio de hipnotismo & foram deixados com sua loucura & suas mãos & um júri suspeito,
que jogaram salada de batata em conferencistas da Universidade de Nova York sobre Dadaísmo e em seguida se apresentaram nos degraus de granito do manicômio com cabeças raspadas e fala de arlequim sobre suicídio, exigindo lobotomia imediata,
e que em lugar disso receberam o vazio concreto da insulina metrasol choque elétrico hidroterapia psicoterapia terapia ocupacional pingue-pongue & amnésia,
que num protesto sem humor viraram apenas uma mesa simbólica de pingue-pongue, mergulhando logo a seguir na catatonia, voltando anos depois, realmente calvos exceto por uma peruca de sangue e
lágrimas e dedos para a visível condenação de louco nas celas das cidades-manicômio do Leste,
Pilgrim State, Rockland, Greystone, seus corredores fétidos, brigando com os ecos da alma, agitando-se e rolando e balançando no banco de solidão à meia-noite dos domínios de mausoléu druídico do amor, o
sonho da vida um pesadelo, corpos transformados em pedras tão pesadas quanto a lua,
com a mãe finalmente ****** e o último livro fantástico atirado pela janela do cortiço e a última porta fechada às 4 da madrugada e o último telefone arremessado contra a parede em resposta e o último quarto mobiliado esvaziado até a última peça de mobília mental, uma rosa de papel amarelo retorcida num cabide de arame do armário e até mesmo isso imaginário, nada mais que um bocadinho esperançoso de alucinação –
Ah, Carl, enquanto você não estiver a salvo eu não estarei a salvo e agora você está inteiramente mergulhado no caldo animal total do tempo –
e que por isso correram pelas ruas geladas obcecados por um súbito clarão da alquimia do uso da elipse do catálogo do metro & do plano vibratório,
que sonharam e abriram brechas encarnadas no Tempo & Espaço através de imagens justapostas e capturaram o arcanjo da alma entre 2 imagens visuais e reuniram os verbos elementares e juntaram o substantivo e o choque de consciência saltando numa sensação de Pater Omnipotens Aeterne Deus,
para recriar a sintaxe e a medida da pobre prosa humana e ficaram parados à sua frente, mudos e inteligentes e trêmulos de vergonha, rejeitados todavia expondo a alma para conformar-se ao ritmo do pensamento em
sua cabeça nua e infinita,
o vagabundo louco e Beat angelical no Tempo, desconhecido mas mesmo assim deixando aqui o que houver para ser dito no tempo após a morte,
e se reergueram reencarnados na roupagem fantasmagórica do jazz no espectro de trompa dourada da banda musical e fizeram soar o sofrimento da mente nua da América pelo amor num grito de saxofone de eli eli lama lama sabactani que fez com que as cidades tremessem até seu último rádio,
com o coração absoluto do poema da vida arrancado de seus corpos bom para comer por mais mil anos.


II
Que esfinge de cimento e alumínio arrombou seus crânios e devorou seus cérebros e imaginação? Moloch! Solidão! Sujeira! Fealdade! Latas de lixo e dólares inatingíveis! Crianças berrando sob as escadarias!
Garotos soluçando nos exércitos! Velhos chorando nos parques!
Moloch! Moloch! Pesadelo de Moloch! Moloch o mal-amado! Moloch mental! Moloch o pesado juiz dos homens!
Moloch a incompreensível prisão! Moloch o presídio desalmado de tíbias cruzadas e o Congresso dos sofrimentos! Moloch cujos prédios são julgamento! Moloch a vasta pedra da guerra! Moloch os governos atônitos!
Moloch cuja mente é pura maquinaria! Moloch cujo sangue é dinheiro corrente! Moloch cujos dedos são dez exércitos! Moloch cujo peito é um dínamo canibal! Moloch cujo ouvido é um túmulo fumegante!
Moloch cujos olhos são mil janelas cegas! Moloch cujos arranha-céus
jazem ao longo das ruas como infinitos Jeovás! Moloch cujas fábricas sonham e grasnam na neblina! Moloch cujas colunas de fumaça e antenas coroam as cidades!
Moloch cujo amor é interminável óleo e pedra! Moloch cuja alma é eletricidade e bancos! Moloch cuja pobreza é o espectro do gênio!
Moloch cujo destino é uma nuvem de hidrogênio sem sexo! Moloch cujo nome é a Mente!
Moloch em quem permaneço solitário! Moloch em quem sonho com anjos! Louco em Moloch! Chupador de caralhos em Moloch! Mal-amado e sem homens em Moloch!
Moloch que penetrou cedo na minha alma! Moloch em quem sou uma consciência sem corpo! Moloch que me afugentou do meu êxtase natural! Moloch a quem abandono! Despertar em Moloch! Luz
escorrendo do céu!
Moloch! Moloch! Apartamentos de robôs! subúrbios invisíveis! tesouros de esqueletos! capitais cegas! indústrias demoníacas! nações espectrais!
invencíveis hospícios! caralhos de granito! bombas monstruosas!
Eles quebraram suas costas levantando Moloch ao Céu! Calçamentos, árvores, rádios, toneladas! Levantando a cidade ao Céu que existe e está em todo lugar ao nosso redor!
Visões! profecias! alucinações! milagres! êxtases! descendo pela correnteza do rio americano!
Sonhos! adorações! iluminações! religiões! o carregamento todo de bosta sensitiva!
Desabamentos! sobre o rio! saltos e crucifixões! descendo a correnteza!
Ligados! Epifanias! Desesperos! Dez anos de gritos animais e suicídios! Mentes! Amores novos! Geração louca! jogados nos
rochedos do Tempo!
Verdadeiro riso santo no rio! Eles viram tudo! o olhar selvagem! os berros sagrados! Eles deram adeus! Pularam do telhado! rumo à solidão!
acenando! levando flores! Rio abaixo! rua acima!


III
Carl Solomon! Eu estou com você em Rockland
onde você está mais louco do que eu
Eu estou com você em Rockland
onde você deve sentir-se muito estranho
Eu estou com você em Rockland
onde você imita a sombra da minha mãe
Eu estou com você em Rockland
onde você assassinou suas doze secretárias
Eu estou com você em Rockland
onde você ri deste humor invisível
Eu estou com você em Rockland
onde somos grandes escritores na mesma abominável máquina de escrever
Eu estou com você em Rockland
onde seu estado se tomou muito grave e é noticiado pelo rádio
Eu estou com você em Rockland
onde as faculdades do crânio não aguentam mais os vermes dos sentidos
Eu estou com você em Rockland
onde você bebe o chá dos seios das solteironas de Utica
Eu estou com você em Rockland
onde você bolina os corpos das suas enfermeiras as hárpias do Bronx
Eu estou com você em Rockland
onde você grita dentro de uma camisa de força que está perdendo o verdadeiro jogo de pingue-pongue do abismo
Eu estou com você em Rockland
onde você martela o piano catatônico a alma é inocente e imortal e nunca poderia morrer impiamente num hospício armado,
Eu estou com você em Rockland
onde com mais cinquenta eletrochoques sua alma nunca mais
retornará a seu corpo de volta da sua peregrinação rumo a uma cruz no vazio
Eu estou com você em Rockland
onde você acusa seus médicos de loucura e prepara a revolução socialista hebraica contra o Gólgota nacional e fascista
Eu estou com você em Rockland
onde você rasga os céus de Long Island e faz surgir seu Jesus vivo e humano do túmulo sobre-humano
Eu estou com você em Rockland
onde há mais vinte e cinco mil camaradas loucos todos juntos cantando os versos finais da Internacional
Eu estou com você em Rockland
onde abraçamos e beijamos os Estados Unidos sob nossas cobertas os Estados Unidos que tossem a noite toda e não nos deixam dormir
Eu estou com você em Rockland
onde despertamos eletrocutados do coma pelos nossos próprios aeroplanos da mente roncando sobre o telhado eles vieram jogar bombas angelicais o hospital ilumina-se paredes imaginárias desabam Ó legiões esqueléticas correi para fora Ó choque de misericórdia
salpicado de estrelas a guerra eterna chegou Ó vitória esquece tua roupa de baixo estamos livres
Eu estou com você em Rockland
nos meus sonhos você caminha gotejante de volta de uma viagem marítima pela grande rodovia que atravessa a América em lágrimas até a porta do meu chalé dentro da Noite Ocidental
Escute só, isto é muito sério.

Anda, escuta que isso é sério!

O mundo está tremendamente esquisito. Há dez anos atrás o Leon me disse que existe uma rachadura em tudo e que é assim que a luz entra, não sei se entendi. Você percebe alguma coisa da mistura entre falhas e iluminação?

Aliás, me diga, você percebe alguma coisa de carpintaria? Você sabe por que meteram um boi naquele estábulo ao invés de um pequeno rinoceronte? Deve ter tido alguma coisa a ver com a geografia. Ou com os felizmente insolussionáveis mistérios que só podem vir do misticismo asiático. Um boi é um bicho tão… inexplicável. Ainda bem.

O amor é um animal tão mutante, com tantas divisões possíveis.
Lembra daqueles termômetros que usávamos na boca quando éramos pequenininhos? Lembra da queda deles no chão?

Então, acho que o amor quando aparece é em tudo semelhante à forma física do mercúrio no mundo. Quando o vidro do termômetro se quebra, o elemento químico se espalha e então ele fica se dividindo pelos salões de todas as festas. Mercúrio se multiplicando. Acho que deve ser isso uma das cinco mil explicações possíveis para o amor.

Ah é! Eu gosto de você. A luz entrou torta por nós a dentro, mas, olha, eu gosto de você! A luz do verão passado quebrou o vidro da melancolia e agora ela fica se expandindo pelas ruas todas. Desde aquele outro lado do Sol até esse tremendo agora.

Hoje ainda faz bastante frio. As cinzas ainda não aterraram sobre as cabeças disfarçadas, tem gente batucando suor e cerveja pelas ruas de nossa cidade sul. Na cidade norte, há ondas de sete metros tentando acertar no terceiro olho dos rapazinhos disfarçados de cowboys.

[suspiro]

O mestre ainda não veio decretar o começo da abstenção e, olha, a luz ainda está conosco. Sim, o mundo está absurdamente esquisito. Já ninguém confia nas imposições dos prefeitos, a esta hora na terra é um tanto carnaval, um tanto conspiração, um tanto medo. Metade fé, metade folia, metade desespero. E, provavelmente, a esta hora, uma metade do mundo está vencendo e a outra metade dormindo, há ainda outra metade limpando as armas, outra limpando o pó das flores. Mas, por causa do que me ensinou o místico, eu acredito que exista, agora, alguém profundamente acordado. Alguém que esteja vivendo entre o intervalo tênue entre o sonho e a agilidade. Suponho que ele saiba perfeitamente que este começo de século será nosso batismo do voô para nossa persistência no amor.João molhou a testa de Manuel. Os gritos das ruas molham as testas de nossos corações.

De que lado você está, eu não me importo! De que garfo você come, de que copo você bebe, que posto certo você escolhe, qual é seu orixá, seu partido, sua altura, de qual de suas cicatrizes cuida, que pássaro você prefere, quem é seu pai, qual é seu samba, Pinot noir ou Chardonay, que protetor você usa, qual é sua pele, seu perfume, qual político, quantos amores você sonha, em que Fernando, em que Ofélia, em que cinema, em que bandeira, em que cabelo você mora, qual dos túneis de Copacabana. Rezo para seus santos quando atravessar.

É… é impossível viver no país de Deus. Isso eu te dou de barato. Mas, atravessar o gramado de Deus em bicicleta, isso não é impossível, não.

Escuta, isso é sério!

Andamos crescendo juntos, distraidamente. As árvores crescem conosco. Nossa pele se estende, nosso entendimento, teso, também. O século cresce conosco. O amor pelas ventas da cara do mundo, também.
Quanto a um pra um entre nós dois, isso logo se vê. Não sei nada sobre a paixão, suspeito que você também não. Mas, começo a entender que o compasso da fé está mudando a passos largos. Dois pra lá e dois pra cá.

Portanto, escute.
Isto é muito serio!
Isto é uma proposta aos trinta anos.

Agora que o mercúrio assumiu sua posição certa, vem comigo achar o meu trono mágico entre a folhagem. E, no caminho até lá, vem dançar comigo, vem!

Notas para um século surpreendente

Está tarde já. Parece muito cedo, mas está tarde. Tem gente morrendo por aí, gente íntima e gente privada, há explosões acontecendo bem no meio de nossos quartos, em nossos banheiros, na testa de nossos filhos. Alguns de nossos filhos pertencem ao futuro. Está tarde, por enquanto está tarde, faz tanto tempo desde a última vez que fomos até à entrada do rochedo, mais tempo ainda desde que mergulhámos na enseada e nos deparámos com o coral, com o brilho, com a coloração perfeita que fazia lembrar a transumância. Tenho pensado na palavra transumância. Tenho pensado muito naquele excerto do diário de Pavese que fala dos mitos e da atenção, dos símbolos, dos nomes. Nalgum momento, ele diz qualquer coisa como: estamos convencidos de que uma grande revelação só poderá sair da teimosa insistência numa mesma dificuldade. E também: sabemos que o modo mais seguro — e mais rápido — de nos espantarmos é fitarmos impávidos sempre o mesmo objeto. Segundo Cesare Pavese, é pela atenção e pela repetição que acontece o estouro do milagre. Ainda acredito em milagres. Ficou tarde de repente e alguns de nós não podem dormir, por muito que nos esforcemos só sabemos passar noites em branco fixando a parede e as sombras na parede. Ficamos até de madrugada brincando com as mãos e com o recorte delas, pelo menos a luz ainda incide sobre nossas mãos, há qualquer coisa de magia nos desenhos noturnos que se projetam nos tapumes de nossas casas, de nossas cavernas, de nossos ilusórios covis. Sim, fitamos impávidos sempre o mesmo objeto. Somos pessoas atentas, pelo menos deveríamos ser, piscamos os olhos devagar para que não se cansem nossas pálpebras, está tudo entrando por nossa cara adentro ao ritmo de um murro de Joe Frazier. Joe chegou a derrotar Muhammad Ali, cuidado. É preciso poupar nossas caras, nossos narizes, nossas línguas. A língua, essa, está muito relacionada com o segredo — é debaixo dela que guardamos o tesouro. Como uma criança que guarda um caroço de cereja na boca durante um dia inteiro, nós seguramos nossos segredos por meses seguidos. Só o segredo nos salvará mais tarde, muito mais tarde do que isto, agora é o tempo da transição e dos desastres aéreos, o tempo da descoberta de planetas muito semelhantes ao nosso mas a 1400 anos-luz daqui, o tempo da morte dos campeões, dos camponeses e dos escritores. Nunca se viu um ano como este, ou talvez sim, todo ano é uma foice e a foice da temporada 2015 está levando tantas cabeças. Pense no Herberto, no Manoel, pense no Galeano, pense no James Tate, estávamos tão distraídos quando morreu Tate, e os poemas dele são círculos tão absurdos quanto costurados pela linha da esperança — às vezes acho que é só disso que precisamos, precisaríamos, um cordel tosco e ao mesmo tempo iluminado, um objeto meio bola de praia, meio ostra, meio plástico meio talismã. Está tarde, talvez estejamos só cansados. Somos os descendentes do passado e o passado sempre foi meio esquisito, aprendemos a ler pelo mapa dos transportes públicos, subiu tanto o preço dos transportes públicos, os mapas das cidades se alteraram, há um desenho novo a cada esquina, só o desenho de nosso corpo não mudou e até isso é mentira. Nossos corpos vão se renovando a cada dia, a cada hora, agora que penso nisso: graças a Deus. Somos o reflexo da cordilheira. Fomos abençoados com a possibilidade do movimento, o constante movimento entre as falésias, abençoados com as tardes de verão e com o cinema que surgiu das cabeças francesas debaixo de um certo sol, foi-nos dada a estufa fria para de dentro dela poder contemplar a natureza que rebenta com tudo lá fora, foram-nos concedidos os vidros e o poder dos vidros. Fomos abençoados com a manhã, com o suor e com as coisas que conseguimos fazer com nosso suor até aos trinta e oito anos, foram-nos concedidas igrejas e cavernas e toda a espécie de templos que impressionam o silêncio, temos a possibilidade do templo em nosso próprio eixo humano, veja bem que sorte a nossa. Estamos atentos, estamos calados, estamos fixando sempre o mesmo objeto. Repetimos os nomes e os gestos para que nos possamos aproximar da realidade. Mito e realidade, que surpresa, afinal é tudo o mesmo. Está tarde, hoje a morte não entrou por nossos túneis, e é muito devagar que vamos movendo os animais para a montanha, da planície para a montanha, de casa para casa. Talvez esta noite possamos dormir em paz. Porque agora em nossas mãos está escrito a carvão aquele trecho de um poema do Pavese, que diz: “Lá fora, depois do jantar, virão as estrelas tocar/ a grande planície da terra. É debaixo deste silêncio que acontece o estouro.”

23 de Agosto de 2015

Crónica. Notas para um século surpreendente
Está tarde já. Parece muito cedo, mas está tarde. Tem gente morrendo por aí, gente íntima e gente privada, há explosões…
www.publico.pt

Matilde Campilho é uma poeta portuguesa, nascida em Cascais, 1982, estudou Literatura em Lisboa e História da Arte em Milão. Morou no Rio de Janeiro, onde também trabalhou como jornalista e redatora freelancer entre os anos de 2010 e 2013 e foi nessa estadia entre Rio e Lisboa que deu vida a sua primeira obra, Jóquei, misturando a dicção das duas cidades.

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Formada em letras, mestranda em estudos literários, escritora nas horas vagas. Ama café e praia e, nesse meio tempo, fotografa.

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Quando ela está feliz, saracoteia, vai pra lá e pra cá, não pára! Com suas manias, seus livros, suas músicas, seus chocolates e claro com sua própria companhia, como havia de ser diferente? Quando se sente parte do mundo e sente que pode fazer algo para que tudo fique melhor…

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Jan 25, 2018

A arte de contar as horas nos dedos
Parece que foi ontem, eu estava sentada na calçada de uma rua que sempre quis que fosse minha, foi ontem, nesse mesmo lugar que eu apanhava amoras do pé e manchava todos meus uniformes. Foi lá, aqui, acá que tudo aconteceu ontem. Um ontem tão breve, mas tão infinito ao…

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Jan 25, 2018

Estado de despedida
O último ano tem trazido consigo algumas despedidas que são inevitáveis ao final de um ciclo. Algumas despedidas que não as chamaria muito bem como despedidas, mas sim como finais necessários. Aquele tipo de coisa que, por mais que seja passageiro, (afinal, o que na vida não o é?) …

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Estado de despedida
Jan 25, 2018

Tarde nostálgica
Hoje a nostalgia bateu aqui, para tomar um cafezinho. Pois é, chegou de mansinho e inundou o coração de gratidão, saudade, amor, vontade. Tudo pulsou e pulsa. Meus olhos veem, minha mente se recorda e eu continuo não acreditando. É tanto agradecimento fluindo que nem sei… É como se o…

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Tarde nostálgica
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Ana Jesus
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Formada em letras, mestranda em estudos literários, escritora nas horas vagas. Ama café e praia e, nesse meio tempo, fotografa.

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Olha lá vai passando a procissão
Se arrastando que nem cobra pelo chão
As pessoas que nela vão passando
Acreditam nas coisas lá do céu
As mulheres cantando tiram versos
Os homens escutando tiram o chapéu
Eles vivem penando aqui na terra
Esperando o que Jesus prometeu

E Jesus prometeu vida melhor
Pra quem vive nesse mundo sem amor
Só depois de entregar o corpo ao chão
Só depois de morrer neste sertão
Eu também tô do lado de Jesus
Só que acho que ele se esqueceu
De dizer que na terra a gente tem
De arranjar um jeitinho pra viver

Muita gente se arvora a ser Deus
E promete tanta coisa pro sertão
Que vai dar um vestido pra Maria
E promete um roçado pro João
Entra ano, sai ano, e nada vem
Meu sertão continua ao deus-dará
Mas se existe Jesus no firmamento
Cá na terra isto tem que se acabar

ergo sum, aliás, Ego sum Renatus Cartesius, cá perdido, aqui presente, neste labirinto de enganos deleitáveis, — vejo o mar, vejo a baía e vejo as naus. Vejo mais. Já lá vão anos III me destaquei de Europa e a gente civil, lá morituro. Isso de “barbarus — non intellegor ulli” — dos exercícios de exílio de Ovídio é comigo. Do parque do príncipe, a lentes de luneta, CONTEMPLO A CONSIDERAR O CAIS, O MAR, AS NUVENS, OS ENIGMAS E OS PRODÍGIOS DE BRASÍLIA. Desde verdes anos, via de regra, medito horizontal manhã cedo, só vindo à luz já sol meiodia. Estar, mister de deuses, na atual circunstância, presença no estanque dessa Vrijburg , gaza de mapas, taba rasa de humores, orto e zôo, oca de feras e casa de flores. Plantas sarcófagas e carnívoras atrapalham-se, um lugar ao sol e um tempo na sombra. Chacoalham, cintila a água gota a gota, efêmeros chocam enxames. Cocos fecham-se em copas, mamas ampliam: MAMÕES. O vapor umedece o bolor, abafa o mofo, asfixia e fermenta fragmentos de fragrâncias. Cheiro um palmo à frente do nariz, mim, imenso e imerso, bom. Bestas, feras entre flores festas circulam em jaula tripla — as piores, dupla as maiores; em gaiolas, as menores, à ventura — as melhores. Animais anormais engendra o equinócio, desleixo no eixo da terra, desvio das linhas de fato. Pouco mais que o nome o toupinambaoults lhes signou, suspensos apenas pelo nó do apelo. De longe, três pontos... Em foco, Tatu, esferas rolando de outras eras, escarafuncham mundos e fundos. Saem da mãe com setenta e um dentes, dos quais dez caem aí mesmo, vinte e cinco ao primeiro bocado de terra, vinte o vento leva, quatorze a água, e um desaparece num acidente. Um, na algaravia geral, por nome, Tamanduá, esparrama língua no pó de incerto inseto, fica de pé, zarolho de tão perto, cara a cara, ali, aí, esdruxula num acúmulo e se desfaz eclipsado em formigas. Pela ou na rama, voce mettalica longisonans, a araponga malha ferro frio, bentevi no mal-me-quer-bem-me-quer. A dois lances de pedra daqui, volta e meia, dois giros; meia volta, vultos a três por dois. De onde em onde, vão e vêm; de quando em vez, vêem o que tem. Perante o segundo elemento, a manada anda e desanda, papa e bebe, mama e baba. Depois da laguna, enchem a anterior lacuna. Anta, nunca a vi tão gorda. Nuvens que o gambá fede empalidecem o nariz das pacas. Capivara, estômago a sair pelas órbitas, ou, porque fartas se estatelam arrotando capinzais ou, como são sabem senão comer, jogam o gargalo para o alto, arreganhando a dentadura, tiriricas de estar sem fome. Ensy, joão chamado bobo, não tuge nem muge, não foge tiro, brilho nem barulho — gálbula, brachyptera, insectívora, taciturna, non scansoria, stupida — , para jogar sério a esmo. Monos se penteando espelham-se no banho das piranhas, cara quase rosto no quasequase das águas: agulhas fazem boa boca, botam mau olhado anulando-lhes a estampa, símios para sempre. Na aguada, o corpanzil réptil entretece lagartos e lagostas. Monstros da natura desvairada nestes ares, à tona, boquiaberta, à toa, cabisbaixa, o mesmo nenhum afã. Tira pestana ao sol uma jibóia que é só borboletas. Tucanos atrás dos canos, máscara sefardim, arcanos no tutano. Jibóia, no local do crime, desamarram espirais englobando cabras, ovelhas, bois. Chifres da boca para fora — esfinges bucefálicas entre aspas — decompõem pelos mangues o conteúdo: cospem cornos o dobro. Exorbitantes, duram contos de séculos, estabelece Marcgravf, na qualidade de profeta. Vegetam eternidades. Crias? Mudas? Cruzam e descruzam entre si? Não, esse pensamento, não, — é sístole dos climas e sintoma do calor em minha cabeça. Penso mas não compensa: a sibila me belisca, a pitonisa me hipnotiza, me obelisco, essa python medusa e visa, eu paro, viro paupau, pedrapedra. Dédalos de espelho de Elísio, torre babéu, hortus urbis diaboli, furores de Thule, delícias de Menrod, curral do pasmo, cada bicho silencia e seleciona andamentos e paramentos. Bichos bichando, comigo que se passa? Abrir meu coração a Artyczewski. Virá Artyczewski. Nossas manhãs de fala me faltam. Um papagaio pegou meu pensamento, amola palavras em polaco, imitando Articzewski (Cartepanie! Cartepanie!). Bestas geradas no mais aceso fogo do dia... Comer esses animais há de perturbar singularmente as coisas do pensar. Palmilho os dias entre essas bestas estranhas, meus sonhos se populam da estranha fauna e flora: o estalo de coisas, o estalido dos bichos, o estar interessante: a flora fagulha e a fauna floresce... Singulares excessos... In primis cogitationibus circa generationem animalium, de his omnibus non cogitavi. Na boca da espera, Articzewski demora como se o parisse, possesso desta erva de negros que me ministrou, — riamba, pemba, gingongó, chibaba, jererê, monofa, charula, ou pango, tabaqueação de toupinambaoults, gês e negros minas, segundo Marcgravf. Aspirar estes fumos de ervas, encher os peitos nos hálitos deste mato, a essência, a cabeça quieta, ofício de ofídio.
Quem verazmente se importa
de que esteja tão abatida com as respostas do oráculo?
Ele me ama? perguntei.
Por quatro vezes respondeu silêncio, conflito,
infortúnio e outra vez silêncio.
Terá Vosso amor, ó Deus, tanta beleza,
Vós que não tendes mãos, nem pés,
nem aquele nariz perfeito
por quem ardo até a última estrela?
Se Jonathan me amasse...
Mas quem me ama é João
e amo Jonathan desde os 12 anos,
desde a única boa lembrança de irmã Guida
que ensinava desenho,
as formas escapando de conselhos, doutrinas,
mais antigas que o pai, a mãe,
mais antigas que o avô,
reclamando de mim uma providência,
para que perdurassem, ficassem ali comigo no caderno.
Eu desenhava mal entusiasmadamente,
furando o papel com o lápis,
querendo expulsar de mim, hoje sei
— e queria mais não saber —,
aquela beleza mortal.
Eu lutava com o Anjo,
com o Mensageiro que nunca mais me deixou.
Que nome tem o que não morre?
O nome de Deus é qualquer,
pois, quando nada responde,
ainda assim uma alegria poreja.
Quantas lavras! As de "S. João", as de "Cocaes", as da "Chapada", as de "Jacey", as da "Conceição", as do "Sutil"... Tudo a jorrar ouro! Ouro, às arrobas, do melhor, mais puro, diziam, que o das Gerais. Esse ouro, como um clarim, conclamava sem cessar as gentes. Forasteiros e naturais, nortistas e sulistas, vinha tudo, por esses sertões afora — e sabe Deus como! — atrás do ouro de Cuiabá. Não havia barreiras que os fizessem estacar. Não havia perigos que os fizessem refletir. Nada! Nem os matos, nem os rios, nem as feras, nem a indiada, nem a fome, nem as misérias infinitas, horrorizantes da jornada.

Cuiabá tornou-se o açude onde se aglutinava a escumalha lodosa do Brasil. Era o desaguadouro de todos os aventureiros. E que aventureiros! Bandidos, fugidos às justiças, jogadores, matadores sanguinários, ladrões, salteadores. Ralé vil, ralé imunda, ralé repugnante.

E que vida, no Cuiabá, heterogênea e bruta! Nas tascas, onde havia sempre "mulheres bastardas e jogos de parar", desencadeavam-se tragédias selvagens, violentíssimas, em que fuzilavam facões e toledanas. Assassínio era coisa de todo o dia. Roubos também. Toda a gente roubava! Os negros, com perícias pasmosas, surripiavam ouro das bateias e iam, nos dias de folga, emborrachar-se com ele nas tavernas. Os índios, que sempre foram racialmente falsos, escondiam na boca os granetes que podiam e, à noite, muito às ocultas; entregavam-no aos ourives a troco de pedaços de fumo. Mulatas quitandeiras, com os tabuleiros à cabeça, viviam nas catas a vender broinhas aos escravos. Os escravos pagavam-nas com folhetas roubadas aos amos. Até os padres, contaminados pela fúria das riquezas, contrabandeavam. Rodrigo César, para cortar tudo aquilo, todas aquelas mortes, todos aqueles roubos, todo aquele contrabando, lançava, ininterruptamente, bandos sobre bandos. Ninguém mais, ordenava o Governador, "havendo de fazer jornada a Cuyabá, não a faça sem licença minha e sem tirar o paçaporte na secretaria do Governo". E mandava fechar as baiúcas de jogo. E proibia, sob penas carrancudas, que partissem forasteiros para as minas. E negros sem dono. E índios avulsos. E mulheres de vida fácil. E padres castelhanos. Estes, sob pretexto algum, mesmo sob pretexto de missão, não tinham sequer permissão de atravessar as minas. Mas os bandos, por mais rigorosos, eram vãos. O ouro de Cuiabá enlouquecia. Que importavam aquelas proibições? Toda a gente, para atingir o metal satânico, as fraudava. E não havia meio de impedir a fraude. Por isso, cada ano, as monções partiam repletas. E cada ano, nos povoados, contavam-se as misérias e os padecimentos dessas monções.


Publicada no livro O Ouro de Cuiabá (1933).

SETÚBAL, Paulo. O ouro de Cuiabá: crônicas. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1956. p. 61-63. (Obras de Paulo Setúbal, 8)
Quase um século após sua morte, a publicação das
obras reunidas serve de estímulo para reavaliar o
poeta que, objeto de entusiasmo popular na sua
época, tornou-se o alvo preferido dos modernistas

Obra reunida - Olavo Bilac - Organização de Alexei Bueno
Nova Aguilar, 1.078 páginas R$ 67

Oitenta anos separam a morte de Olavo Bilac da publicação ônibus de seus livros. É quase um século - mas século de grandes transformações estéticas e políticas. O poeta, que nasceu durante a Guerra do Paraguai e morreu, com a belle époque, no fim da Grande Guerra, reapresenta-se ao público em plena guerra da Chechênia, depois do desmoronamento do império soviético. Mas nunca deixou de ser publicado avulsamente, e lido, analisado nas escolas, e de tal forma que muitos de seus versos hoje fazem parte da memória popular, como "Ora (direis) ouvir estrelas!" ou "Última flor do Lácio, inculta e bela, / És a um tempo, esplendor e sepultura".
Sempre foi transcrito com fartura nas antologias, entronizado na liderança do movimento parnasiano, criticado e defendido, depois da morte como em vida. Mas, como disse T. S. Eliot, de tempos em tempos, em cada 100 anos mais ou menos, é desejável que algum crítico apareça para rever o passado e dispor os poetas e os poemas em nova ordem.
Segundo Eliot, nenhum poeta nem qualquer outro tipo de artista tem seu significado completo sozinho. Sua apreciação é a apreciação da relação com os poetas e artistas mortos. Não se pode avaliá-lo isoladamente. Quando nova obra de arte é criada, algo novo ocorre com todas as obras que a precederam.
O ciclo a que Bilac pertenceu chocou-se de frente com o fogo de barragem da Semana de Arte Moderna. De fato, quatro anos depois da morte dele, em 1918, os modernistas, em 1922, que, na fórmula de Ivan Junqueira, não sabiam bem o que queriam, embora soubessem perfeitamente o que não queriam, escolheram-no como alvo de predileção, abalaram-lhe o prestígio, e tudo "porque sua poesia não interessava em absoluto ao projeto modernista, e não porque o julgassem mau poeta".
O verso livre já destronara soneto, alexandrino e rimas em outras plagas, mas hoje se sabe, com o distanciamento crítico que só o tempo proporciona, que nenhum verso é livre para o homem que deseja fazer bom trabalho. Grande quantidade de prosa de má qualidade tem sido escrita, desde então, com o nome de verso. E vice-versa. Apenas um mau poeta poderia considerar o verso livre libertação da forma.
No entanto, a clivagem entre parnasianismo e modernismo enraizou-se para sempre. Basta comparar a exaltação militar de Bilac, na campanha pelo alistamento obrigatório, com o pacifismo de Clã do jabuti, de Mário de Andrade, dez anos depois, para constatar o abismo que a revolução modernista cavou entre as duas gerações. O abismo teve várias conseqüências. Gonçalves Dias, Castro Alves e Olavo Bilac foram os últimos na literatura brasileira a despertar ao mesmo tempo entusiasmo culto e popular. Implantou-se entre o grande público e as artes, incluindo a poesia, um mal-entendido, uma dissociação, até hoje não suficientemente esclarecida.
Num banquete monstro de que foi alvo, em 1907, Bilac lembrou que quarenta anos antes não havia propriamente homens de letras no Brasil. "Havia estadistas, parlamentares, professores, diplomatas, homens da sociedade ou homens ricos, que, de quando em quando, invadiam por momentos o bairro literário..." Na fase seguinte, poetas e escritores que desejavam ser apenas poetas e escritores cometeram o erro de mostrar desdém pela consideração que a sociedade lhes recusava. A geração de Bilac, e ele principalmente, transformaram o que era então passatempo em profissão, culto, sacerdócio. "Viemos trabalhar cá em baixo, no seio do formigueiro humano."
Hoje em dia não há banquetes monstros para poetas. O formigueiro humano sequer gosta da poesia que lê, alegando que não a entende. Já Bilac, da estréia ao crepúsculo, revelou-se antes simples do que complicado, e isto talvez seja uma das causas da extrema receptividade que tiveram e ainda têm seus versos. José Veríssimo criticava em Bilac a falta de extensão e profundeza, mas reconhecia feição descritiva, pompa, o brilho novo de sua forma, feitos para agradar, dando sempre "impressão de acabado, de perfeito". Machado de Assis, em A nova geração, definiu a poesia parnasiana como uma inclinação nova nos espíritos, sem se utilizar ainda da expressão parnasiana. O parnasianismo renegou o romantismo, e exaltou uma arte fria ("Serás para mim uma deusa, / (...) inviolável e fria", escreveu Bilac), impassível, intelectualizada, contra o transe, a participação e a emotividade - em suma, a hipertrofia do eu. Em Profissão de fé Bilac pregou o trabalho formal, o culto ao estilo: "Torce, aprimora, alteia, lima / A frase; e enfim, / No verso de ouro engasta a rima, / Como um rubim." Queria que a estrofe, cristalina, "Dobrada ao jeito / Do ourives, saia da oficina / Sem um defeito".
No correr da história literária, os parnasianos da primeira hora, como Alberto Oliveira, Raimundo Correia e Bilac (a "trindade parnasiana") têm sido identificados como românticos retardatários. Filiavam-se ao parnasse francês (Gautier, Bainville, Lisle, Baudelaire e Hérédia). Bocage superou Camões na veneração parnasiana brasileira. As obras bem escritas são eternas. Aboliu-se o mistério na poesia. Evitavam-se recursos musicais, como aliterações, homofonias, ecos, expressões de poder encantatório. Repudiava-se o contexto medieval e se proclamava a superioridade da vida, da saúde, da sensualidade, da objetividade, do conhecimento do mal e do homem, sobre a morte, a doença, a melancolia, o sentimentalismo, a objetividade, a inocência e Deus (João Pacheco, em O realismo).
Mas a impassibilidade parnasiana não se manifestou totalmente nos poetas brasileiros, sempre atormentados pela incontinência da sensibilidade nacional, o brilho da paisagem, a exigência do sensualismo. O próprio Bilac, citado por Pacheco, mais de uma vez reclamou, em versos, da asfixia imposta pela escola, demasiadamente atada à prisão da lógica: "O pensamento ferve, e é um turbilhão de lava: / A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve..." Manuel Bandeira, em Poemeto erótico, mostrou que isto não acontecia sempre: "Teu corpo claro e perfeito, / Teu corpo de maravilha, / Quero possuí-lo no leito / Estreito da redondilha." Pode-se, portanto, como fez Bandeira, e Bilac tantas vezes, tirar proveito das limitações da forma, quando se quer. Mário de Andrade, em O empalhador de passarinho, disse, a propósito de Bilac: "A escultura das palavras também tem suas belezas. A solaridade, a luz crua, a nitidez das sombras curtas de certos verbalismos enfunados, pelo próprio afastamento em que estão da verdadeira poesia, têm seu sabor especial, pecaminoso."
Ao estrear, aos 23 anos, com Poesias, Bilac já estava perfeitamente enquadrado no rigor da forma, e com a sensualidade à flor da pele. Na adolescência, encharcou-se dos ecos da Guerra do Paraguai ("Todo esse espetáculo de heroísmo dominando a vida nacional, e por muitos anos alimentando a altivez do povo"). O Rio de sua maturidade era estranho burgo colonial, com quase três quartos de negros. A casa onde nasceu, na Rua da Vala, atual Uruguaiana, pertencia à área que melhor exprimia a fealdade e sujeira da capital. Perto estava a Rua do Ouvidor, com seu singular comércio francês. Conforme descreveu Ledo Ivo, o que dominava o centro urbano era o comércio atacadista de aspecto sinistro. Quando um tílburi corria pelos calçamentos irregulares, os pedestres se colavam às paredes. Passava-se manteiga da Dinamarca no pão de trigo inglês, bebia-se cerveja alemã, comiam-se queijos flamengos na Confeitaria Pascoal, usavam-se os esgotos da City e andava-se em bonde da Botanical Garden. Os cidadãos inconformados reclamavam das loucuras do prefeito Pereira Passos.
Um ano antes da publicação de Poesias (1888) Bilac n
O Apóstolo São João foi realmente
um poeta extraordinário como igual
não houve depois —
nem Dante
nem Blake
nem Lautréamont.

Teve todas as visões antes da gente.
Viu as coisas que são e as que serão
no mais futuro dos tempos, e que resta
a prever, a como-ver, aos repetentes míopes
que somos e não vemos o Dragão
e nem mesmo o besouro?

Viu animais cheios de olhos em volta e por dentro,
glorificando Alguém no trono, semelhante
ao jaspe e à sardônica.
Viu a mulher, sentada na besta escarlate
de sete cabeças e dez chifres
e na fronte da mulher leu a inscrição: Mistério.
Viu o Nome que ninguém conhece
nem saberia inventar, pois se inventou a si mesmo.
Os surrealistas não puderam com ele.
Viu a chave do abismo
que Mallarmé não logrou levar no bolso.
Viu tudo.
Viu principalmente o supertrágico, a explosão nuclear, e nisto me afasto dele.

Não, não gostaria de predizer o fim do mundo,
com sete taças de ouro repletas da ira de Deus
despejando-se sobre a Terra.
Quero ver o mundo começar
a cada 1o de janeiro,
como o jardim começa no areal
pela imaginação do jardineiro.

Desculpe, São João, se meu Apocalipse
é revelação de coisas simples
na linha do possível.
Anuncio uma lâmpada, não sete
(e nenhuma trombeta)
a clarear o rosto amante:
são dois rostos que, se contemplando,
um no outro se veem transmutados.
Pressinto uma alegria
miudinha, trivial, embelezando
em plena via pública o passante
mais feio, mais deserto
de bens interiores.

Profetizo manhãs para os que saibam
haurir o mel, a flor, a cor do céu.
O mar darei a todos, de presente,
junto à praia, e o crepúsculo sinfônico
pulsando sobre os montes. Um vestido
estival, clarocarne, passará,
passarino, aqui, ali, e quantos ritmos
um pisar de mulher irá criando
na pauta de teu dia, meu irmão.
Oráculo paroquial, a meus amigos
e aos amigos de outros ofereço
o doce instante, a trégua entre cuidados,
um brincar de meninos na varanda
que abre para alvíssimos lugares
onde tudo que existe existe em paz.

E mais não vejo, e calo, que as pequenas
coisas são indizíveis se fruídas
no intenso sentimento de uma vida
(são 20 ou 70 anos?)
limitada e perene em seu minuto
de raiz, de folha dançarina e fruto.
01/01/1965
para Roberto Piva & Cláudio Willer
1.

Dez horas da noite.
Percorro os meandros do Chinatown em San Francisco
e entre becos de névoa e olhares aflitos
é a ti que procuro
-- São Paulo, comoção da minha vida --
na voz de Mário, teu poeta,
subindo e descendo as ladeiras de angústia
de uma cidade que anseia pelo mar.

Dez horas da noite.
Meus pés,
que já pisaram as ruínas de Yucatán
e a medina de Marraquech,
o cais de Amsterdã
e o deserto de Alcácer-Quebir,
chegam cansados à Union Square, no coração de San Francisco,
e este chão morno coberto de pombos me acolhe
como se eu pisasse a rua Lopes Chaves em noite de crimes.

Dez horas da noite.
A culpa do insofrido, onde está?
Ali, Mário, põe a máscara!
O rei de Tule jogou a taça ao mar,
vendaval a levou -- e hoje,
troféu cravado na torre mais alta da Golden Gate,
banhada em luar,
ela anseia pelo Oriente onde, dizem, o sol reside.

Dez horas da noite.
Vem, Mário, vou mostrar-te San Francisco,
cidade esculpida em bruma a oriente do Oriente, onde a Primavera existe e
se ergue do mar todo ano, ofertando presságios e desassossego,
ladeira abaixo
ladeira acima.
Aqui os corações são arrastados pelos bondes sapateando nos trilhos como
o nosso dlem-dlem Santana! ei-ô! rumo à Voluntários da Pá--tria
ou às madrugadas arrepiadas de frio do largo de São Bento
mas aqui os bondes arrastam nossa aflição Powell St. acima, depois pelo
Embarcadero até o Fisherman’s Wharf e por fim nos despejam
na Ghirardelli Square,
de onde avistamos nossos sonhos,
catedrais ancoradas no cais impossível,
e a Primavera mais terrível
cobre de flores nossos ombros pensos --
arlequinal!
comoção de nossas vidas!

2.

A noite agora não é mais criança.
A cidade assolada em neblina acolhe os deuses da madrugada e nos vê
passar.
Não é nossa Londres das neblinas finas, onde as rolas da Normal esvoaçam
entre os dedos da garoa,
mas é a cidade que nos abrigou com sua Primavera incandescente e guiou
nossa vagabundagem por labirintos de espanto, numa noite ilu-
minada pelo desespero de náufragos e rainhas exi-ladas.
Foi aqui,
naquele bar imundo da O’Farrell quase esquina com a Market, em meio ao
cheiro azedo e oleoso de tantas noites mal-dormidas, de-pois da
milésima cerveja, depois de esgotarmos todos os versos bem
amados, que sabíamos de cor,
foi aqui,
naquele canto escuro que Allen Ginsberg it’s too long that I have been alone, it’s
too long foi-se chegando irritado e implorou come Poet, shut up &
eat my word e você o embalou no colo e depois sonhou que tinha
vomitado a cidade de San Francisco no oceano azul.
Foi aqui
que Leadbelly, o negro desdentado, sentou-se à nossa mesa e nos ensinou a
chorar em uníssono com seu banjo prodigioso e você lhe ensi-
nou os passos da dança que todos sabíamos e ele en-tão, com
outro brilho nos olhos, voltou a nos chamar irmãos e nos dese-
jou alegria e você o abençoou.

Depois,
arrancamos de cada rua os fantasmas que ali se abrigavam e derruba-mos to-
das as pedras que se acumularam no caminho
e as mãos sangradas e famintas finalmente descobrimos que San Francisco
(Alexandria, você sabe, a Tebas impossível que nunca pudemos
pisar) é uma cidade viúva de segredos e os fantas-mas que aí
avistamos são os nossos próprios fantasmas, para sempre per-
didos

-- como teu coração paulistano,
Mário,
que um dia você enterrou no Pátio do Colégio
e ali estava, quente e vivo,
entre as ruínas da O’Farrell quase esquina com a Market,
dedilhando um blues sem esperança
-- como tua língua,
que você um dia guardou no alto do Ipiranga,
para cantar a liberdade, saudade,
mas esta já não foi possível encontrar mais, não.
Por isso também nos perdemos e nos achamos,
comoção de nossas vidas!

3.

Depois
rolamos nosso sono em delírio, pelas ruas,
e em nossos olhos ardia
a lembrança daquilo que nenhum de nós sabia.
Depois,
diante do cais, em Lands End, os braços abertos em cruz,
você gritou para o abismo em frente,
ou sussurrou para as almas encolhidas de medo:
-- A noite vem do mar cheirando a cravo!
E por um instante
o baiano poeta Sosígenes bailou entre nós
naquela madrugada em San Francisco,
mas logo regressou a seus castelos em Belmonte.
No fundo das águas havia dragões e havia sereias
e ao longe, e-eh-ô!, Boi Paciência e o Irmão Pequeno.
Cada rua era um rio que o mar desenhara na terra
e a lua enorme
uma ânfora plantada na torre mais alta da Golden Gate.

-- Garoa do meu São Paulo,
garoa sai dos meus olhos!
E a garoa caía em San Francisco
ou em Londres das neblinas finas.
Depois
rolamos nosso sono em delírio pela Mission St., como um rio,
de leste a oeste cruzamos toda a cidade,
à procura do sol,
guiados pelo cheiro do mar,
mas o cheiro do mar nos levou para longe do mar.
-- Água do meu Tietê,
onde me queres levar?
Rio que entras pela terra
e que me afastas do mar...
Nessas águas Boi Paciência se afogou,
que o peito das águas tudo soverteu.

Você queria um porto seguro na terra dos homens,
por isso perguntava pela culpa do insofrido
e suplicava:
-- Garoa, sai dos meus olhos!
Por isso
você desceu ao léu da corrente do rio
e entrou na terra dos homens ao coro das quatro estações
mas não me ensinou o caminho
ou não aprendi a lição.

Ao regressar,
teus olhos eram só preguiça e mágoa,
teus olhos bailavam no ar,
o ar de mansa maresia dos mares de San Francisco,
teus olhos bailavam no ar a grandeza de todas as glórias
e teu coração entoava:
-- Estou pequeno, inútil,
bicho da terra derrotado,
e já nem sei se vale a pena
cantar São Paulo na lida

Você recusou a Paciência (Boi morto) e a esperança
e em teus olhos as águas murmuravam hostis,
levando as auroras represadas
para o peito do sofrimento dos homens.
Nem eram tantas essas águas, nem tamanhas.
Era uma lágrima, apenas, uma lágrima
das águas turvas do nosso Tietê, límpida
lágrima em que brilhava um céu de chumbo,
arlequinal!
comoção de nossas vidas!

4.

Quatro horas da manhã.
Caminhamos em silêncio pelo longo e frio corredor infinito da Powell St.
à espera do primeiro carro do subway que nos levará de volta a Berkeley e à
Telegraph Avenue,
onde a Revolução é um estado de espírito permanente e, qual Oroboros, do
seu próprio tédio se alimenta,
onde até o breakfast cheira a conspiração e onde os filhos dos hippies ven-
dem penduricalhos & melancolia e aceitam credit card.
Mas você sabe, Mário,
São Paulo também sempre foi berço de revoluções.

Quatro horas da manhã.
Deixamos para trás o cais e a noite negra
e em nossos ouvidos ecoa o grito de Álvaro de Campos:
-- Ó coisas navais! Meus velhos brinquedos de sonho!
Componde fora de mim a minha vida interior!

Caminhamos em silêncio pela Powell St.
e você começa a saltar pela calçada
como se estivesse na avenida São João.
De repente,
o riso debochado
que brota dos teus e dos meus lábios
se espraia pelas ruas solitárias
e divide a madrugada.

Antes você perguntava pela culpa do insofrido
e se
Amor América (1400)

Antes do chinó e do fraque
foram os rios, rios arteriais:
foram as cordilheiras em cuja vaga puída
o condor ou a neve pareciam imóveis;
foi a umidade e a mata, o trovão,
sem nome ainda, as pampas planetárias.


O homem terra foi, vasilha, pálpebra
do barro trêmulo, forma de argila,
foi cântaro caraíba, pedra chibcha,
taça imperial ou sílica araucana.

Terno e sangrento foi, porém no punho
de sua arma de cristal umedecido
as iniciais da terra estavam escritas.


Ninguém pôde
recordá-las depois: o vento
as esqueceu, o idioma da água
foi enterrado, as chaves se perderam
ou se inundaram de silêncio ou sangue.


Não se perdeu a vida, irmãos pastorais.

Mas como uma rosa selvagem
caiu uma gota vermelha na floresta
e apagou-se uma lâmpada da terra.


Estou aqui para contar a história.

Da paz do búfalo
até as fustigadas areias
da terra final, nas espumas
acumuladas de luz antártica,
e pelas Lapas despenhadas
da sombria paz venezuelana,
te busquei, pai meu,
jovem guerreiro de treva e cobre,
ou tu, planta nupcial, cabeleira indomável,
mãe jacaré, pomba metálica.


Eu, incaico do lodo,
toquei a pedra e disse:
Quem me espera? E apertei a mão
sobre um punhado de cristal vazio.

Porém andei entre flores zapotecas
e doce era a luz como um veado
e era a sombra como uma pálpebra verde.


Terra minha sem nome, sem América,
estame eguinocial, lança de púrpura,
teu aroma me subiu pelas raízes
até a taça que bebia, até a mais delgada
palavra não nascida de minha boca.




I
Vegetações
Às terras sem nomes e sem números
baixava o vento de outros domínios,
trazia a chuva fios celestes,
e o deus dos altares impregnados
devolvia as flores e as vidas.


Na fertilidade crescia o tempo.


O jacarandá levantava espuma
feita de resplendores transmarinos,
a araucária de lanças eriçadas
era magnitude contra neve,
a primordial árvore acaju,
de sua copa destilava sangue,
e no sul dos lariços,
a árvore trovão, a árvore vermelha,
a árvore do espinho, a árvore mãe,
o ceibo vermelhão, a árvore borracha,
eram volume terrenal, a ressoar,
eram existências territoriais.


Um novo aroma propagado
enchia, pelos interstícios
da terra, as respirações
convertidas em fumo e fragrância:
o tabaco silvestre erguia
seu rosal de ar imaginário.

Qual lança terminada em fogo
surgiu o milho, e sua estatura
debulhou-se e de novo nasceu,
disseminou sua farinha, teve
mortos sob as suas raízes,
e, logo, em seu berço, viu
crescer os deuses vegetais.

Ruga e extensão, disseminava
a semente do vento
sobre as plumas da cordilheira,
espessa luz de gérmen e mamilos,
aurora cega amamentada
pelos ungüentos terrenais
da implacável latitude chuvosa,
das cerradas noites mananciais
e das cisternas matutinas.

E ainda nas planuras
como lâminas de planeta,
sob uma suave povoação de estrelas,
rei da selva, o umbuzeiro detinha
o ar livre, o vôo rumoroso
e cavalgava o pampa, dominando-o
com seu ramal de rédeas e raízes.


América arvoredo,
sarça selvagem entre os mares,
de pólo a pólo balançavas,
tesouro verde, a tua mata.


Germinava a noite
em cidades de cascas sagradas,
em sonoras madeiras,
extensas folhas que cobriam
a pedra germinal, os nascimentos.

Útero verde, americana
savana seminal, adega espessa,
um ramo nasceu como uma ilha,
uma folha foi forma da espada,
uma flor foi relâmpago e medusa,
um cacho arredondou seu resumo,
uma raiz desceu às trevas.




II
Algumas bestas

Era o crepúsculo do iguano.

Da arcoirisada rosácea
sua língua como um dardo
fundia-se na verdura,
o formigueiro monacal pisava
com melodioso pé a selva,
o guanaco fino como o oxigênio
nas largas alturas pardas
ia calçando botas de ouro,
enquanto a lhama abria cândidos
olhos na delicadeza do mundo cheia de rocio.

Os macacos trançavam um fio
interminavelmente erótico
nas ribeiras da aurora,
derrubando muros de pólen
e espantando o vôo violeta
das borboletas de Muzo.

Era a noite dos jacarés,
a noite pura e pululante
dos focinhos saindo do lodo,
e dos lamaçais sonolentos
um ruído opaco de armaduras
retornava à origem terrestre.


O jaguar tocava as folhas
com a sua ausência fosforescente,
o puma corre nas ramagens
como o fogo devorador
enquanto ardem nele os olhos
alcoólicos da selva.

Os texugos coçam os pés
do rio, farejam o ninho
cuja delícia palpitante
atacarão com dentes rubros.


E no fundo da água magna,
como o círculo da terra,
está a sucuri gigante
coberta de barros rituais,
devoradora e religiosa.




III
Vêm os pássaros

Tudo era vôo em nossa terra.

Como gotas de sangue e plumas
os cardeais mergulhavam em sangue
o amanhecer de Anáhuac.

O tucano era uma adorável
caixa de frutas envernizadas,
o colibri guardou as chispas
originais do relâmpago
e suas minúsculas fogueiras
ardiam no ar imóvel.


Os ilustres papagaios enchiam
as profundidades da folhagem
como lingotes de ouro verde
recém-saídos da massa
dos pântanos submersos,
e de seus olhos circulares
mirava uma argola amarela,
velha como os minerais.

Todas as águias do céu

nutriam sua estirpe sangrenta
no azul não-habitado,
e sobre as penas carnívoras
voava acima do mundo
o condor, rei assassino,
frade solitário do céu,
talismã negro da neve,
furacão da falcoaria.


A engenharia do joão-de-barro
fazia do barro fragrante
pequenos teatros sonoros
onde aparecia cantando.


O atalha-caminhos ia
dando o seu grito umedecido
na margem dos poços.

A torcaz araucana fazia
ásperos ninhos de mato
onde deixava a real prenda
de seus ovos azulados.


A loica do sul, fragrante,
doce carpinteira de outono,
mostrava o seu peito estrelado
de constelação escarlate,
e o chincol austral erguia
sua flauta recém-recolhida
da eternidade da água.


Mas, úmido como um nenúfar,
o flamingo abria as suas portas
de rosada catedral
e voava como a aurora
longe do bosque bochornoso
onde se pendura a pedraria
do quetzal, que de repente acorda,
se mexe, desliza, fulgura
e faz voar a sua brasa virgem.


Voa uma montanha marinha
para as ilhas, uma lua
de aves que vão para o sul,
sobre as ilhas fermentadas
do Peru.

É um rio vivo de sombra,
é um cometa de pequenos
corações inumeráveis
que escurecem o sol do mundo
como um astro de cauda espessa
palpitando para o arquipélago.


E no final do iracundo
mar, na chuva do oceano,
surgem as asas do albatroz
como dois sistemas de sal.

instituindo no silêncio,
entre as rajadas torrenciais.

com a sua espaçosa hierarquia,
a ordem das soledades.




IV Os rios acodem

Amada dos rios, combatida
por água azul e gotas transparentes,
uma árvore de veias é teu espectro
de deusa escura que morde maçãs:
então ao acordares despida
eras tatuada pelos rios,
e nas alturas molhadas a tua cabeça
enchia o mundo de novos orvalhos.

A água te estremecia na cintura.

Eras de mananciais construída
e lagos te brilhavam na fronte.

De tua floresta mãe recolhias
a água como lágrimas vitais,
e arrastavas as torrentes às areias
- através da noite planetária,
cruzando ásperas pedras dilatadas,
quebrando no caminho
todo o sal da geologia,
cortando bosques de compactos muros,
separando os músculos do quartzo.



Orinoco
Orinoco, deixa-me em tuas margens
daquela hora sem hora:
deixa-me como outrora partir despido
em tuas trevas batismais.

Orinoco de água escarlate,
deixa-me mergulhar as mãos que retornam
a tua maternidade, a teu transcurso,
rio de raças, pátria de raízes,
teu largo rumor, tua lâmina selvagem
vem de onde eu venho, das pobres
e altivas soledades, dum segredo
como um sangue, de uma silenciosa
mãe de argila.



Amazonas
Amazonas,
capital das sílabas da água,
pai patriarca, és
a eternidade secreta
das fecundações,
te caem os rios como aves, te cobrem
os pistilos cor de incêndio,
os grandes troncos mortos te povoam de perfume,
a lua não pode vigiar-te ou medir-te.

És carregado de esperma verde
como árvore nupcial, és prateado
pela primavera selvagem,
és avermelhado de madeiras,
azul entre a lua das pedras,
vestido de vapor ferruginoso,
lento como um caminho de planeta.



Tequendama
Tequendama, lembras
tua passagem solitária nas alturas
sem testemunha, fio
de solidões, vontade fina,
linha celeste, flecha de platina,
lembras passo a passo
abrindo muros de ouro
até cair do céu no teatro
aterrador da pedra vazia?


Bío-bío
Fala-me no entanto, Bío-Bío,
são as tuas palavras na minha boca
as que deslizam, tu me deste
a linguagem, o canto noturno
mesclado de chuva e folhagem.

Tu, sem que ninguém olhasse um menino,
me contaste o amanhecer
da terra, a poderosa
paz de teu reino, o machado enterrado
com um ramo de flechas mortas,
o que as folhas da caneleira
em mil anos te relataram.

e logo te vi ao entregar-te ao mar
dividido em bocas e seios,
largo e florido, murmurando
uma história cor de sangue.




V
Minerais

Mãe dos metais, te queimaram,
te morderam, te martirizaram,
te corroeram, te apodreceram
mais tarde, quando os ídolos
já não podiam defender-te.

Cipós subindo aos cabelos
da noite selvática, acajus
formadores do centro das Flechas,
ferro agrupado no desvão florido,
garra altaneira das condutoras
águias de minha terra,
água desconhecida, sol malvado,
vaga de cruel espuma,
tubarão espreitante, dentadura
das cordilheiras antárticas,
deusa serpente vestida de plumas
e enrarecida por azul veneno,
febre ancestral inoculada
por migrações de asas e formigas,
tremedais, borboletas
de aguilhão ácido, madeiras
avizinhando-se do mineral,
por que o coro dos hostis
não defendeu o tesouro?

Mãe das pedras
escuras que tingiam
de sangue as tuas pestanas!
A turquesa
de suas etapas, do brilho larvário
apenas nascia para as jóias
do sol sacerdotal, dormia o cobre
em seus sulfúricos estratos,
e o antimônio ia de camada em camada
à profundidade de nossa estrela.

A hulha brilhava em resplendores-negros
como o total reverso da neve,
negro gelo enquistado na secreta
tormenta imóvel da terra,
quando um fulgor de pássaro amarelo
enterrou as correntes do enxofre
ao pé das glaciais cordilheiras.

O vanádio vestia-se de chuva
para entrar na câmara do ouro,
afiava facas o tungstênio
c o bismuto trançava
medicinais cabeleiras.


Os vaga-lumes equivocados
ainda continuavam nos altos,
soltando goteiras de fósforo
nos sulcos dos abismos
e nos cumes ferruginosos.


São as vinhas do meteoro,
os subterrâneos da safira.

O soldadinho nas mesetas
dorme com roupa de estanho.


O cobre funda os seus crimes
nas trevas insepultas
carregadas de matéria verde,
e no silêncio acumulado
dormem as múmias destrutoras.

Na doçura chibcha o ouro
sai de opacos oratórios
lentamente até os guerreiros,
converte-se em rubros estames,
em corações laminados,
em fosforescência terrestre,
em dentadura fabulosa.

Durmo então com o sonho
de uma semente, de uma larva,
e as escadas de Querétaro
desço contigo.

Me esperaram
as pedras de lua indecisa,
a jóia pesqueira da opala,
a árvore morta numa igreja
gelada pelas ametistas.


Como podias, Colômbia oral,
saber que tuas pedras descalças
ocultavam uma tormenta
de ouro iracundo,
como, pátria
da esmeralda, ias perceber
que a jóia de morte e mar,
o fulgor no seu calafrio,
escalaria as gargantas
dos dinastas invasores?

Eras pura noção de pedra,
rosa educada pelo sal,
maligna lágrima enterrada,
sereia de artérias adormecidas,
beladona, serpente negra.

(Enquanto a palmeira dispersava
sua coluna em altas travessas,
ia o sal destituindo
o resplendor das montanhas,
convertendo em veste de quartzo
as gotas de chuva nas folhas
e transmutando os abetos
em avenidas de carvão.
)

Corri pelos ciclones até o perigo
e desci à luz da esmeralda,
ascendi ao pâmpano dos rubis,
mas calei-me para sempre na estátua
do nitrato estendido no deserto.

Vi como na cinza
do ossudo altiplano
levantava o estanho
suas corais ramagens de veneno
até estender como uma selva
a névoa equinocial, até cobrir o sinete
de nossas cereais monarquias.




VI
Os homens

Como a taça da argila era a raça mineral, o homem
feito de pedras e atmosfera,
limpo como os cântaros, sonoro.

A lua fez a massa dos caraíbas,
extraiu oxigênio sagrado,
macerou as flores e as raízes.

Andou o homem das ilhas
tecendo ramos e grinaldas,
de panos cor de enxofre,
e soprando o tritão marinho
à beira das espumas.


O tarahumara vestiu-se de aguilhão
e nas extensões do noroeste
com sangue e pederneiras criou o fogo,
enquanto o universo ia nascendo
outra vez na argila do tarasco:
os mitos das terras amorosas,
a exuberância úmida de onde
lodo sexual e frutas derretidas
viriam a ser atitudes dos deuses
ou pálidas paredes de vasilhas.


Como faisões deslumbrantes
desciam os sacerdotes
das escadarias astecas.

Os degraus triangulares
sustinham o inumerável
relâmpago das vestimentas.

E a pirâmide augusta,
pedra por pedra, agonia e ar,
em sua estrutura dominadora
guardava como uma amêndoa
um coração sacrificado.

Num trovão como um uivo
caía o sangue pelas
escarlinatas sagradas.

Mas multidões de povoados
teciam a fibra, guardavam
o porvir das colheitas,
trançavam o fulgor da pluma,
convenciam a turquesa,
e em trepadeiras têxteis
expressavam a luz do mundo.


Maias, havíeis derrubado
a árvore do conhecimento.

Com aroma de raças celeiras
erguiam-se as estruturas
do exame e da morte,
e perscrutáveis nos poços,
arrojando-lhes noivas de ouro,
a permanência dos germes.


Chichén, teus amores cresciam
no amanhecer da selva.

Os trabalhadores iam fazendo
a simetria dos favos de mel
em tua cidade amarela,
e o pensamento ameaçava
o sangue dos pedestais,
desmontava o céu na sombra,
conduzia a medicina,
escrevia sobre as pedras.


Era o sul um assombro dourado.

As altas soledades
de Machu Picchu na porta do céu
estavam cheias de azeite e cantos,
o homem desfizera as moradas.

e no novo domínio, entre os cumes,
o lavrador tocava a semente
com seus dedos feridos pela neve.


O Cuzco amanhecia como um
trono de torreões e celeiros
e era a flor pensativa do mundo
aquela raça de pálida sombra
em cujas mãos abertas tremulavam
diademas de imperiais ametistas.

Germinava nos terraços
o milho das altas serras
e nas vulcânicas sendas
iam os vasos e os deuses.

A agricultura perfumava
o reino das cozinhas
e estendia sobre os tetos
um manto de sol debulhado.


(Doce raça, folha de serras,
estirpe de torre e turquesa;
fecha-me os olhos agora,
antes de irmos ao mar
de onde as dores chegam.
)

Aquela selva azul era uma gruta
e no mistério de árvores e treva
o guarani cantava como
o fumo que sobe na tarde,
a água sobre as folhagens,
a chuva mim dia de amor,
a tristeza junto aos rios.


No fundo da América sem nome
estava Arauco entre as águas
vertiginosas, apartado
por todo o frio do planeta.

Olhai o grande sul solitário.

Não se vê a fumaça nas alturas.

Vêem-se apenas as nevascas
e o vendaval rechaçado
pelas ásperas araucárias.

Não procures sob o verde fechado
o canto da olaria.


Tudo é silêncio de água e vento.


Mas nas folhas espia o guerreiro.

Entre os lariços um grito.

Uns olhos de tigre ao meio
das alturas da neve.


Olha as lanças a descansar.

Escuta o sussurro do ar
atravessado pelas flechas.

Olha os peitos e as pernas
e as cabeleiras sombrias
brilhando à luz da lua.


Olha o vazio dos guerreiros.


Não há ninguém.
Trina a diuca
feito água na noite pura.


Cruza o condor o seu vôo negro.


Não há ninguém.
Escutas? É o passo
do puma no ar e nas folhas.


Não há ninguém.
Escuta.
Escuta a árvore,
escuta a árvore araucana.


Não há ninguém.
Olha as pedras.


Olha as pedras de Arauco.


Não há ninguém, somente as árvores.


Somente as pedras, Arauco.
Já vou dormir, não vou dormir.
No silente Caminho Novo,
sete tiros da carabina.
Eu nada escuto do meu quarto.
Ninguém escuta, de tão longe.
Mas adivinho sete tiros
estampados na noite fria.

É João Pupini festejando
seu natalício italiano,
atirando contra as estrelas
o chumbo gaio de estar vivo.
É João Pupini ameaçando
o sono azul do município,
o equilíbrio e a paz do mundo.

Já se eriça, irado, o bigode
marcial de Guilherme 2o.
O czar, o king George, Francisco
José e mais altas potências
protestam contra o despropósito
de João Pupini fazer anos
declarando guerra mundial.

O delegado de polícia,
sentinela internacional,
convoca seu destacamento:
“Eia, sus, ao Caminho Novo,
a prender o guerreiro doido,
que além de ser mau elemento
vota sempre na oposição”.

Sua casa logo arrombada
a coronha, facão e ombro,
João Pupini dá o sumiço
pelos fundos de treva e brejo,
embolado mais a família,
pois lutar contra a Força Pública,
nem o ousara Napoleão.

Mas é preso nos vãos atalhos
em que zaranza atarantado,
e recolhido à enxovia
o formidando atirador.
Nem Deus te salva, João Pupini!
(fico cismando, no sem sono
de carabina, junho e noite.)

Solitário, incomunicável,
Pupini diz: “Vou suplicar
à autoridade justiciosa
o direito de fazer anos
e jovialmente celebrá-lo”.
Mas retrucam-lhe: “Assine e sele
petição na forma da lei”.

Onde papel, no úmido escuro
do xadrez todo enxadrezado
de feros ferros e ferrolhos?
Onde estampilha, Deus do céu,
se só uma barata sela,
no chão da cela, madrugada,
a prova de estar acordada?

Sem requerer, como provar
que, entre mil mortos e feridos
pela arma-fúria de Pupini,
estão todos salvos, tranquilos?
Como explicar ao Presidente,
a Hermes, Pinheiro, Jangote,
que ninguém fez mal a ninguém?

Tiro de noite é novidade
na cidade sem distração
e noite por demais comprida?
O rádio está por inventar,
a televisão, nem se fala.
Quem tem fogo vai despejá-lo
na horta gelada, por que não?

Ainda há dias, rente ao quartel,
no rancho insone do Thiers,
tiros sem alvo pipocaram,
ninguém foi preso, até foi bom
ouvir alguém vencer o tédio
detonando a salva nervosa
que infundia vida ao mar morto.

Mas João Pupini, suspeitado
(suspeita, não: certeza plena)
de sorrir para os perdedores
da eleição presidencial;
João ruísta, João subversivo,
João celebrar seu nascimento
a poder de bala, o bandido?

Lá dorme João no chão sem lã.
Estou sentindo: a poucos passos
da cadeia ali bem em frente,
e dormirá tempos e luas,
se ruístas alvoroçados
não soltarem pelas quebradas
o latino grito: Habeas corpus.

(Que só mais tarde entenderei.
Por enquanto, perto de mim,
algo se passa, impercebido,
como sempre se passam coisas
no deserto Caminho Novo
ou
neste menino peito ansioso.)


Feito alma.
Feito carne.
Feito dor.
Feito santo criador?

Oh! Desatam d’alma os nós das personas quão os opostos da incônscia, ó bardo?
Azo a sós, dê-se em essência parido, teces, opilas pelo bico da Parkinson jângais (dê) versos idem léxicos que os alinhavais a ponto perfeito?

Não o ranço? Não o vil escárnio que o encana entoado, vertendo rimas, esputa versos em escarros.
Oh! A de não tê-las n’outras cartilhas o verbo ser-dor sido purgado, alma arreboza para sê-la carne?

Vês? Vês que dor se for [do que duvido!] por não saber-se dor e não saber-se o nada, não é dor purgada a dor quê não se guarda: não é verbo conjugado; nem anima sofregada para
sê-lo arte encantada.


Vês? Vês que dor se for (do que duvido) não é dor para sê-la cria;
Não é carne para sê-la afim;
Não é alma autista para ser às sós: nem verbo cavo, martírio que não se faz.


Feito dor.
Feito verbo.
Feito carne. 
Feito alma malcriada?

És preciso tu, ó Narcísico [a], espelha rasa aquém do útero, fragma d'um Eu despedaçado, venera estampa, refugo da carne afeada, que o pensa sê-lo: o "nell'oblio" remido; o frame ali por um segundo: o mito no rito da punga, a gira; a blague imaginária para o desengano; o verbo tosco, opaco, ultor? Ó sede vós além dos umbrais ancestrais dos vossos avós.

És preciso tu, ó Escárnio infame, escória que o pensa sê-lo, mais que tudo: o Deus, o Verbo e o Nada? Sido purgado, verbo ser essa dor; alma e carne depurada; poesia para ser arte? Ó sede vós além dos nós alinhavados dos vossos ilhoses.


Então, ousas a ti dizeres, ó bardo? Ou é-me essência parida? Ou de fenestra a ambrósia dos mortais.


*"nell'oblio" [Língua itáliana = esquecimento]


Comentário: Inês de Castro intelectual e fotografa.



Date: Mon, 24 May 2010 09:38:56 -0700

From: decastrig@yahoo.com.br
Subject: câmbio...câmbio...
To: manoel.serrao@hotmail.com

Caro amigo Esse bate papo é muito legal. Percebo, porém que meu ritmo não acompanha o seu. Vc se comunica com muita gente. Eu não. To vivendo enclausurada no Arpoador, é mole?

Vou tentar passar uma mudança que percebi nos teus textos. Ñ é uma análise literária, apesar de eu ter estudado letras na USP (ñ me formei, é claro).achei engraçada a sua mudança de estilo e norma conforme o veículo. Foi nesta ordem que as percebi:· Na poesia vc se expande.  Vc fala na interseção dos planos universal/individual. Seu inconsciente (Junguianamente falando) se apodera de suas línguas, de sua palavra, de sua parole (Saussure) que são lançadas nas ondas reais e virtuais da grande rede. Aqui a norma ñ é culta nem inculta, aqui vc é Serrões. Vc as declama tb, nas tertúlias da Ilha?· Nos e-mails, vejo o advogado formado no Recife: norma culta, plano universal, formal, barroco quase pomposo, um discurso imponente e impressionante aliada a uma certa malandragem de comerciante que eu já havia ouvido, mas nunca lido. Lembre-se que o pai de minha filha era um pernambucano comunista e político que, aos 15 anos ganhou um concurso de oratória da Assembléia Legislativa de Pernambuco com o tema da prostituição, defendendo as putas e concorrendo contra políticos adultos conhecidos. E olha que eu acho os meus e-mails formais demais (rimou).· Não sei como se chama aquela conversa escrita on-line que nós tivemos. Pois, é. Ali eu reencontrei o velho Serrão que eu conhecia de ouvido com sua linguagem cotidiana por um lado muito maranhense, por outro trazendo outras vivências e uma pitada das formas acima descritas, tudo isso no plano individual e informal. É coloquial, regional, mais a pitada de apuro.  Eu sei que sou lenta e complicada, mas não tinha, até então, me aberto com ninguém. Tenho esta trava com "autoridades constituídas que me atrapalha muito.  Serrão, responde, vai!Bjs,Inês 

NOTA: Na imagem [Inês de Castro, João Batrista do Lago e Manoel Serrão] às margens do Rio Una, Cidade de Morros [MA] .



Valmiro Silva "Monstro"....vc! Uma pena, q o usuário do FACE só enxerga fotos. Se fosse uma foto teria umas 300 ou mais curtidas. Agora, uma MAGNITUDE dessa, no máximo, umas 10 curtidas...😪 Fazer o q De quem é a culpa ! CALMA!! Não estou lhe agredindo meu poeta!! Sei q vc é uma ESTRELA e q apenas se diverte com nossa ingenuidade... [Comentário Facebook – Dia 09 de outubro de 2019].
 

Meu avô, minhas avozinhas,
quando Deus vos levou,
ainda eu era uma criança.
Muitos anos já passaram
e vocês estão bem vivos, na minha mente.
Lembro tão bem,
como se o tempo não tivesse passado,
Está bem guardado na minha memória
o vosso rostro já cansado,
pela fadiga do trabalho,
e tambem pela vossa idade,
E em cada uma das minhas partidas,
havia sempre uma despedida triste.
cada um de vocês me olhava, me abraçava,
desses seus tistes olhos saiam lágrimas salgadas,
imagem essa, por mim continua bem guardada,
Lá em cima no céu,
como era cá em baixo na terra,
vos amo, meus queridos avós...

Luzern, 26.07.2018, Joao Neves...

O ANO ESTÁ NO FIM
QUERENDO RECOMEÇAR DE NOVO
TRAZENDO NOS BRAÇOS DO VENTO
A ESPERANÇA O SORRISO A FELICIDADE
MUITOS SE PERDERAM PELOS CAMINHOS
DEIXANDO NOS LEMBRANÇAS E SAUDADES
MAS É A VIDA
FAZ PARTE DESTE CICLO EM QUE VIVEMOS
E NÃO IMPORTA SE VAMOS NOS
DESPEDAÇANDO PELO CAMINHO
SE FALTA ISSO OU AQUILO
O MAIS IMPORTANTE SÃO AS CONQUISTAS
OS NOVOS AMIGOS OS POEMAS AS POESIAS
QUE LANÇAMOS AOS QUATRO CANTOS DESTE
MUNDO PARA QUE ELES COM SUAS ASAS
PUDESSEM VOAR
LEVAR QUEM SABE UM SONHO UMA ALEGRIA
PARA ESTES CORAÇÕES APAIXONADOS
E É ISSO O QUE IMPORTA
SORRIA... VOCÊ É FELIZ E NÃO SABE.
(PARA TODOS OS POETAS DE ASTORMENTAS
E PARA QUEM REALIZOU NOSSOS SONHOS
DE TER UM SITE TÃO MARAVILHOSO ASSIM.
QUE DEUS ABENÇOE CADA UM COM SUA LUZ
POIS 2012 VEM AI CHEINHO DE FELICIDADE.
AGARRE A SUA E VIVA NA PLENITUDE DESTE
AMOR.) (JOÃO EUZEBIO)
Ações que engrandecem ao ser humano.
Algumas citações retiradas do Facebook, veja se você pode mudar o mundo também.
Escrito do coordenador da JM da Paróquia São Francisco Xavier.
Daniel Freitas Cruz Do Carmo
Ontem às 13:28
A primeira foto é uma foto atualizada, de hoje de manha, de um dos locais que foram limpos ontem (foto 2). 😥
Infelizmente as pessoas reclamam da falta de políticas para manter limpa a cidade ou para prevenir enchentes, na boa... falta cada um assumir a sua responsabilidade pelo caos que vivemos...
Queremos reclamar dos políticos? Comecemos mudando nossas atitudes no pouco!
Viu jogando lixo, interfira! viu algo errado, faça algo em relação a isso!
E, vejam o que escrevi no comentário, que fiz. Acredito que todos nós podemos com pequenas atitudes mudar o mundo.
"Ação que qualquer morador deveria fazer. Primeiro varrer e juntar o lixo da própria calçada e meio fio(sarjeta), onde nós todos inundamos com bitucas de cigarro, papéis de bala ou outros, até mesmo os pinos de entorpecentes. Custa para as pessoas limparem a própria calçada. Custa causarmos enchentes, sim nós que provocamos enchentes no Planeta. Jogando o lixo, quando moramos perto de córregos(riachos) pela janela, achando que a Natureza levará aquele lixo para outro lugar, depois vem as chuvas, enchem as casas, e clamamos a Deus?!!!! ERRADO. Nós provocamos isso.
A ação da JM Paróquia São Francisco Xavier, foi excelente, espero que não cai no esquecimento das pessoas. Que os jovens valorizem mais, quando eu por exemplo como mãe, pedi a Anninha Castro, ou a Manuel Castro, que varra a nossa calçada assim, como eu e minha mãe de 81 anos, dona Deo, fazemos sempre, e não jogamos o lixo para a calçada de ninguém, pegamos e o depositamos numa sacola, recolhemos para que não fique nas ruas. Espero que essa ação faça realmente a diferença para as pessoas.
Aqui na Frei Lourenço, digamos eu, minha mãe, o meu vizinho José Marcio´, e um senhor de origem oriental, fazemos muito mais que a nossa parte nesse Planeta, cabe agora os demais tomarem como exemplos.
Sigamos a cartilha dos 5 Rs: REUTILIZAR. REPENSAR. REAPROVEITAR. REDUZIR. RECICLAR.
O lixo reciclado desse evento veio parar na minha garagem, na quinta -feira, colocarei para fora, pois aqui na Vila Missionária, passe o caminhão do lixo seletivo: Plásticos(polímeros de toda espécie), metais, menos pilhas, pois em grandes mercados como o Carrefour, têm o papa pilhas, e devemos levar lá, para serem recicladas, devido a toxidade dos metais pesados, como o cádmio, e outros. Além disso, baterias de celulares, também, levar em lugares autorizados. Outros materiais recicláveis são os papelões, caixinhas de leite e outros.
Vamos melhorar nossa Vila Missionária sim, a começar por nós. Não adianta esperarmos a Suprefeitura da Cidade Ademar, Júlio Carreiro, vamos fazer nossa parte. Vamos ter organização. Pois Deus nos deu gratuitamente árvores, água, animais, para convivermos em dignidade e paz. Vamos ser cristãos, espiritas, evangélicos, umbandistas, do bem, respeitando a Mãe Natureza. Vamos reduzir o consumo de copinhos descartáveis nas escolas, nos bares e padarias, vamos reduzir, diminuir o uso de canudos, e vamos solicitar a subprefeitura que coloque grades nos bueiros, têm muitos que cabe um ser humano adulto, o que dirá de uma criança?!!!! E, com isso os bueiros não precisarão mais serem desentupidos. E, não irá mais plásticos ao encontro dos mares e de espécies em extinção.
Parabéns Daniel Freitas Cruz Do Carmo, e a turma da JM, Padre Ace Valdez, pela ação, mas cabe a população RESPEITAR ao Meio Ambiente, como diria Fernando Mendes: " Não adianta ir à igreja rezar, e fazer tudo errado, querer a frente das coisas, olhando de lado."
Abraços a todos. Paz e bem. Ambientalista, professora de Química, escritora, filha, mãe e esposa: Téka Castro, fora os nomes marcados: For: Sueli Aparecida Candido de Paula, Geovanna Sousa Adilson Mikami 🕷🕸🌳🌳🌳🌳🌳🌳🌷🌷🎋Marjorie Yoshioka, Katia Dos Santos Geraldo, Katia Cristina, Everton Seixas, Luciana P. L. Barreto Eleni Flores Messias, João Bosco Ferreira Coelho João Scortecci Antonio Eli Luiz Ferreirinha André Lopes Loula Jorge Aguiar Angela Mattos Ângela Ferreira Patricia L. Domingos Patricia Martins Maria Clotildes Santos Emidio Rodrigues John Raju Nerella Vera Sabino Vera Lucia N Souza ......Júlio Carreiro, vamos todos nós compartilharmos essa ação, mas cabe a população evitar jogar lixo nas ruas!!!



Breve Resenha Crítica

"Santa Brígida" de Humberto Mesquita, um Belo Romance de Amor e Devoção no Agreste

Humberto Mesquita

Humberto Mesquita tem um currículo vivencial e tanto. Fora de série. Nasceu em Campina Grande, Paraíba, estudou no Liceu Paraibano, em João Pessoa capital. Com 16 anos era repórter esportivo da Rádio Arapuan. Um ano depois era redator na Sport Press e na Rádio Tupi, no Rio. Foi redator da Rádio Bandeirantes de SP. Na TV Excelsior de SP foi chefe de Reportagem do telejornalismo e produtor do programa "Advogado do Diabo", apresentado por Osvaldo Sargentelli. Na famosa "Revista Realidade" escreveu artigos e reportagens principalmente sobre o cangaço. Nos Diários e Emissoras Associados foi diretor de Redação das rádios Tupi e Difusora, e dirigiu o rádio jornalismo, apresentando, na TV, juntamente com Almir Guimarães, o programa "Pinga Fogo". Participou da antológica revista "O Cruzeiro". Na TV Bandeirantes foi chefe de Reportagem dos "Titulares da Notícia" e apresentador do programa de debates "Xeque Mate", além de editor-chefe do SBT - Sistema Brasileiro de Televisão, onde apresentou igualmente o programa "Isto é Brasil". Foi o autor de intrépida pergunta ao ditador Figueiredo que retrucou: "Abro e quem não quiser que eu abra, eu prendo e arrebento". Em 1987 entrevistou Fidel Castro em Cuba.

Só esse breve introdutório de currículo e ainda em resumo, já nos apresenta HUMBERTO MESQUITA como um dos maiores e melhores jornalistas do Brasil de todos os tempos, de têmpera forte, ético, humanista, determinado e turrão em prol da legalidade, da democracia social, da justiça para todos, de uma mídia sarada, da ética para um Brasil em que, a partir do chamado fim das utopias, contesta o cínico estado mínimo neoliberal e suas terceirizações inumanas e o próprio neoescravismo, para que possamos assim pelo menos sonhar um humanismo de resultados de um Brasil de justiça social inclusiva, já que o poder que emana do povo em seu nome deve ser exercido.

Santa Brígida, a obra

Ao visitar Santa Brígida, a cidade onde nasceu e viveu Maria Bonita, companheira de Virgulino Ferreira, o Lampião, o jornalista e repórter de faro fino conheceu o personagem do seu livro, que é um romance num misto de ficção e realidade, e cujo enredo foca a infância e a juventude de Paulo Calixto que viveu na mesma cidade onde o autor morou, no Engenho Gavião, na cidade de Alagoa Grande, Paraíba. O personagem central depois de uma desilusão amorosa de meio e origem, o primeiro amor, torna-se por circunstancias de percursos um caixeiro viajante, e em uma toleima, uma rixa, briga e mata um devedor. A partir disso, consciência pesada, um filho de Deus sem eira nem beira então, errante foge e peregrina pelas áreas pobres de vidas secas e agrestes das matas do Nordeste, tentando se penitenciar de algum modo pelo crime, chegando finalmente (pelas mãos de Deus?) a Santa Brígida, onde é então entendido como um santo, e assim acolhido faz moradia e roçado de permanência com implicações e mudanças. Daí que a história se desenvolve, num novelo que faz do personagem, medida as proporções de levante, meio, e agregados, uma espécie assim de Antonio Conselheiro local, um homem enviado por Deus aos confins de um deus-dará, onde o judas perdeu as alpercatas...

"Santa Brígida", aliás, na opinião do autor, foca o cenário nordestino cheio de contradições. Descreve o cangaço, um movimento que resistiu às forças policiais durante mais de vinte anos e que teve em Lampião sua grande figura. O romance assim tem sob prisma o universo cultural da região nordestina, quando descreve o funcionamento de um engenho de cana de açúcar, onde seu personagem (um mascate) viveu a infância e a juventude, as feiras e a incipiente agricultura da região.

Romance jornalístico? Romance documentário? Entre o romantismo e a realidade, o romance que é em tese uma obra literária que apresenta narrativa em prosa, com fatos criados, inventariados ou relacionados a personagens, que vivem diferentes conflitos ou situações dramáticas, numa sequência de tempo relativamente ampla, portanto, no caso do autor, um romance com algo realista e ainda regional, por assim dizer. Se literatura enquanto manifestação artística funde-se na arte de recriar a realidade a partir da visão de determinado autor, o artista, com base em seus sentimentos, seus pontos de vista e suas técnicas narrativas, Humberto Mesquita criou um livro que aflora um tempo, um povo, um lugar, e deu-nos um clássico contemporâneo de narrativa densa e cativante.

Finalizando, com a qualidade literocultural e o quilate de jornalista de primeiro time, Humberto Mesquita conta com maestria o historial todo, somando ainda uma história de amor impossível, depois a busca em torno de um lugar ao sol, um sinal redentor, e assim a narrativa fluente fica num enfoque gostoso tipo um jeito peculiar de contar causos, entra em ramos do folclore, cai na graça de um milagre e o amor, e suas demandas, desnaturezas, ah o amor, sempre ornando tudo, o amor a terra-mãe, moendas e engenhos, secas e agruras, raiz de todos nós, passando por caminhos, trilhas, amarras, andanças e lonjuras, cisternas e perguntamentos, mais a mão do criador, o real e o numinoso, e termina tudo meio a la Romeu e Julieta tupiniquim só que invertido, sem perfumes nem venenos, quando o amor sempre vence no final, mas não o amor telúrico, mas um amor que nem sempre a ficção ou mesmo a realidade explicam, mas o coração do homem curte, fermenta, enreda, evoca - "almai"-vos uns aos outros, está escrito? - salpica de estrelas, sonhos e lágrimas, corações, mentes e veredas, chãos, e dá nisso: um livro pra gente aguçar sentidos e crer no milagre da vida, no milagre do amor, no milagre do reencontro, já que também na casa da ficção há muitas moradas...

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BOX Santa Brígida, Romance, 2009

Editora Ibrasa, SP

www.ibrasa.com.br

E-mail: ibrasa@ibrasa.com.br

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Silas Correa Leite

Jornalista Comunitário, Professor, Escritor membro da UBE-União Brasileira de Escritores

E-mail: poesilas@terra.com.br - Site: www.artistasdeitarare.blogspot.com/

Autor, entre outros de GUTE GUTE, Barriga Experimental de Repertorio, Romance, Editora Autografia, RJ, 2015

O NOVO MUNDO

Os caminhos do Atlântico


Enfrentar o incomensurável oceano
Seguindo caminhos que ninguém ousara,
Por roteiros nunca antes navegados
O intrépido, povo nauta lusitano
Dando impulso à aventura desbravara
Reprimindo medos e temores ignorados


O movimento da conquista dos mares
Caminhos até então impossíveis trilhar
Por mares escarpelados e agitados,
Que só afinada prática de anos no mar
E uma acurada leitura estelar
Somada à destreza e instrumentos usados


Orientados pela bússola e o astrolábio
Os guiou singrando os mares desconhecidos
Envolvidos pelo espírito das cruzadas
Milagrosamente quis o destino sábio
Sucesso na missão, nautas destemidos
A expansão ganhou forças redobradas


Finalmente enfrentando o longo mar
Navegando nele por mais de um mês
Seiscentas e sessenta léguas percorrer
Avistaram algas abundantes sem par
Sinais de terra a quatro milhas talvez
Sua esperança se fez rejuvenescer


A Descoberta


Frente a frente, abriram-se novos horizontes,
Quando aos vinte e dois de abril de mil e quinhentos
Avistaram um grande monte, alto e redondo
Ao sul terra chã, e mais baixos montes
Grandes arvoredos de espécies aos centos
E aí as naus ancoraram, não se expondo.


E amainando as velas desembarcaram
Na terra que chamaram Vera Cruz
Na praia, nativos nus, eles avistaram
E com prudência redobrada lhes falaram
Por sinais, um sombreiro e um capuz
Que no primeiro contato lhes jogaram


Ao que um deles retribuindo a oferta
Arremessou um penacho de papagaio
E assim recebidos em paz aguardaram
Novo dia p’ra pisar terra descoberta
Onde nativos nus, impávidos como raio
Ocultar suas vergonhas, jamais pensaram


Sem fé, sem lei, sem rei, esse povo era assim
Entre eles não tinham bens particulares
Moravam em cabanas muito grandes
Tudo era comum em seu viver alfim
Cada um senhor de si, de seus polegares
Não conheciam o ferro, nem flandres


Foi aí então, que dois mundos separados
Por séculos... milênios se encontraram
O pré-histórico e o mundo civilizado
Perante o futuro ali foram marcados
Os primeiros sinais que ao mundo levaram
O conhecimento de um povo ignorado



A TERRA DE SANTA CRUZ
E a Pré-Colonização


Aquilo que uma ilha lhes parecia ser
Era quase um continente em extensão
De exuberante fauna e densa flora
Com espécies desconhecidas a crescer
A cada caminhada, a cada exploração
Como nunca tinham visto até outrora


Terra descoberta de índios povoada
De Jês, Caraíbas, Aruaques e Tupis
Frondosos rios, cachoeiras e cascatas
Era terra muito fértil se plantada
No sub solo ouro, prata e rubis
Riquezas conhecidas, frondosas matas


Somente o extrativismo do pau-brasil
Foi a princípio o achado primordial
A extração e o embarque da madeira
Eram pagas aos índios com preço vil
Através de bugigangas, et cetera e tal
E o escambo era a moeda costeira


Os termos do o Tratado de Tordesilhas
Os franceses não reconheciam válido
E grupos de corsários diretamente
Enchiam embarcações até às escotilhas
Negociado com os índios a valor esquálido
Prejudicando os lusitanos certamente


O que levou a Coroa portuguesa
Em mil quinhentos e dois a terras arrendar
A comerciantes como Fernando de Noronha
Em troca de benfeitorias à realeza
Para explorar pau-brasil e negociar
Parte do lucro que o arrendatário sonha


As incursões freqüentes dos franceses
E outros europeus à terra descoberta
Levou o Reino de Portugal a organizar
Expedições para expulsar maus fregueses
Insuficientes ao que a cobiça desperta
E só a destemida esperança os fez parar


DEGREDADOS E SOBREVIVENTES DE NAUFRÁGIOS


A Colonização Acidental


Diogo Alves Correia na Bahia naufragou
Em mil quinhentos e dez, ali ficou perdido
Casou com a filha do maior chefe guerreiro
Teve filhos e outras mulheres esposou
Pelos Tupinambás muito querido
Se à valentia da morte foi herdeiro


João Ramalho no litoral de São Vicente
Deu mostras iguais de força e valentia
Casou com Bartira, filha de guerreiro
Muitas concubinas, índias certamente
Jamais podia mostrar fraqueza e cobardia
Perigo não assusta o velho marinheiro


E milhares de degredados portugueses
Aos sobreviventes de naufrágio somados
Facilitaram a defesa e a ocupação
E uma integração sem elmos e arneses
E às condições dos índios adaptados
Os jesuítas deram início à missão.


A Escravidão Indígena


O que seria a conquista espiritual
Tornou-se desde logo escravidão
Impondo ao povo índio a tortura
Pela violência, matança sem igual
Ao invés da prometida salvação
Deram ao povo a canga e o timão


Constrangendo comunidades inteiras
A entregar parcelas de sua produção
Prestar serviços temporários gratuitos
Foram estas as exigências estrangeiras
Impostas aos donos da sua própria nação
Sufocando pela espada os seus gritos


Os passos dos primeiros brasileiros
Foram assim cruéis e tenebrosos.
Racionais e bem mais organizados
Impunham-lhes sacrifícios verdadeiros
Atrocidades e ardis pavorosos
Donos da nação foram escravizados


E aos poucos os povos primitivos
Iam sendo expulsos ou dizimados
Da terra descoberta e explorada
Passando por intrusos os nativos
Das terras iam sendo desapossados
O vilão de tudo se enaltece na tomada


Em nome do cristo pilhavam inocentes
Conspurcando toda dignidade humana
Com o uso de atrocidades selváticas
Procedimentos que são tão intolerantes
Quanto o incesto e a sodomia na cabana
O canibalismo, e todas suas práticas


As violências cruéis executadas
Com matanças, incêndios e escravidão
Reduzindo povos livres à dependência
Praticados por pessoas civilizadas
Demonstra terem menos evolução
Do que os índios que imploravam clemência


E assim, a gente a que se referiu Caminha
De santa inocência, segundo as aparências
Teve transformada a sua simplicidade
Porque a obra dos cristão foi tão mesquinha
Derramando ódio, semeando violências
Como tem feito ao longo da humanidade


Levou os índios em sua auto defesa
A passarem a ser cruéis e sanguinários
Porém, não tanto como os dominadores
Que os perseguiam com tanta safadeza
Que se mais houvesse mais seriam
Sacrificados em nome dos valores


Das grandes qualidades e da moral
E por ser fraca a força dessa gente
Impunham regras para eles desconhecidas
Como se seu viver não fosse natural.
E com a lança e a espada, geralmente
Faziam as suas leis serem cumpridas


A busca de metais preciosos, ouro e prata
Riquezas mil, diamantes e esmeraldas
E a mão de obra dos senhores de engenho
Intensificou-se na escravidão pirata.
A bandeira que foi luz já não desfralda
E o timão que os guiou, passou a lenho.


O ciclo do ouro


E aquilo que uma ilha parecia ser
Era quase um continente em extensão
De exuberante fauna e densa flora
Com espécies desconhecidas a crescer
A cada caminhada a cada exploração
Como nunca tinham visto até outrora


Rios e arvoredos em profusão
Frondosas cachoeiras, lagos e cascatas
Com a descoberta de ouro e diamantes
No velho mundo, provocou repercussão
Dois séculos após a exploração das matas
O achado de riquezas importantes


Homens e mulheres, uns novos, outros velhos,
Plebeus e nobres, fazendo fuxicos
Clérigos e religiosos de várias seitas
Na terra descoberta meteram o bedelho
Pois todos queriam fortuna, ser ricos
O caminho das minas, doses perfeitas


A busca do ouro a desordem gerou
Quando no ano de mil setecentos e dez
Mil paulistas tentavam precaver-se
De setenta mil forasteiros. Fracassou
porque a coroa sem controle de lés-a-lés
Temendo sua opulência não os apoiou


Como resultado das crescentes desavenças
Ocorreu a dita Guerra dos Emboabas.
Mas de lavra em lavra, barranca em barranca
Os garimpeiros paulistas sem licenças
Na busca de outros campos, outras tabas
Buscaram jazidas, onde a lei é franca


Formavam uma população errante,
Que se deslocava ciganamente
Em busca do ouro aluvial ou de minas
Outros, levaram a pecuária adiante
Na vontade que o costume lhe consente
Se a tanto ajudassem prados e campinas


Escravidão no Brasil


Na primeira metade do século XVI
Teve início no Brasil a escravidão
Por navios negreiros conduzidos
Para mão-de-obra escrava dos coronéis
Nos engenhos de açúcar em servidão
Os negros da África eram trazidos


Na cana de açúcar ou minas de ouro
Tinham de trabalhar de sol a sol
Com alimentação de baixa qualidade
Recolhidos nas senzalas com desdouro
Acorrentados desde a noite ao arrebol
Seus senhores deles não tinham piedade


Mil castigos ainda lhe eram infligidos
Sendo o açoite entre eles o mais usado
Amarrados ao lenho eram chicoteados
Até ficarem prostrados, desfalecidos
Como se seu amo fosse recompensado
Por seus desatinos banais e impensados


As restrições eram tantas e tamanhas
Que mesmo apesar de acorrentados fugiam
Das sevícias continuas e desumanas
E aos poucos em inédita façanha
Criaram quilombos onde se protegiam
E onde a liberdade tinha forma humana


Foi na metade do século XIX
Os Ingleses, tanto tráfico haviam feito
Passaram a contestar a escravidão
Ditando lei que aprisionar aprove
Navio nessa prática ao mar afeito
Carregue em seus porões, dita nação


Só em mil oitocentos e cinqüenta o Brasil
Pôs fim ao ignóbil tráfico negreiro
Para vinte e um anos depois aprovar
A Lei do Ventre Livre com o perfil
Da liberdade. Foi o pendão pioneiro
Que a Lei Áurea acabou por expressar



TIRADENTES


O apagar das luzes do século XVIII
Com o esgotamento das minas a Coroa
Ávida na cobrança de impostos, instituiu
A Derrama que consistia pelo intróito
Cobrar de cada um com força de leoa
Uma quota d’ouro que suado auferiu


A Casa da Fundição foi reprimida
Tal punição, foi violência acesa
Quando morto seu líder Felipe Santos
A repressão à liberdade foi vencida
Pela influência da Revolução Francesa
Criou o desejo de liberdade, entre tantos


Surgiu um movimento pela liberdade
Na busca de igualdade e conhecimento
Sob o signo: “Liberdade ainda que tardia”
E no auge da expansão e densidade
Por um traidor, foi delatado o movimento
Em troca do perdão por tudo que devia


Joaquim Silvério dos Reis, era seu nome
Que levou à forca e ao esquartejamento
O alferes Joaquim José da Silva Xavier
A cabeça decepada até que o tempo consome
Fixada num poste, em puro atrevimento
Em plena Vila Rica, para estremecer


O anseio de liberdade e de igualdade
Que o pensamento filosófico Francês
Face à Revolução recente, acontecida
Influenciou esse grupo por liberdade
Clamando contra o domínio português
Que sufocado teve a chama extinguida


Dom JOSÉ I
A era do Marquês de Pombal


Em 1750, morre Dom João V,
Aquele que por fausto, luxo e poderio
Ao rei francês Luis XIV comparado
Deixa o reino em grave crise, faminto
De ouro e diamantes o cofre vazio
Tesouro que d’colônia havia transportado


Sucede-o Dom José I, bragantino
Que para o cargo de secretário de estado
Escolhe Sebastião José de C. e Melo
Marquês de Pombal por força do destino,
Para superar dificuldades do estado
E reerguer o combalido reino, com zelo.


Incentivou o comércio e a agricultura
‘streitou relações com a colônia Brasil
Capitanias hereditárias extinguiu
Ao desvio d’ouro e diamantes, linha dura
Enérgico e cruel, era seu perfil
Os Jesuítas de cá e de lá baniu


Transferiu a capital de Salvador
Para São Sebastião do Rio de Janeiro
Criou no Rio, o Tribunal da Relação
De companhias de comércio, ordenador
Adotou medidas em que foi o pioneiro
A controlar as jazidas e extração.


Em 1755, um terremoto
Arrasou toda a cidade de Lisboa
Na reconstrução imprimiu sua marca
E quando o povo ficou sem um proto,
2,5 milhões de toneladas de ouro amontoa
Milhões d’quilates de diamantes tira d’arca


E cheio de energia e dinamismo
Lisboa inteira a seus pés reconstrói
Dois anos após, falece Dom José I
Assume Dona Maria, sem civismo
Pela doença que sua mente corrói,
E aí o Marquês, foi o imolado cordeiro...


A Corte Portuguesa no Rio de Janeiro (1808-1821)
D. JOÃO VI


Aos 10 de fevereiro de 1792
Assume regência em nome de sua mãe
Dona Maria, em razão da doença
Em nome próprio, sete anos depois.
No ano sete, do século XIX, vem
A ameaça de invasão francesa, pretensa


Pois com o advento da Revolução Francesa
Uma luta contra os países absolutistas
Tinha iniciado e sentiam-se ameaçados
Por isso a vinda da coroa Portuguesa
Fugia às sanhas de Napoleão imprevistas
E ao Bloqueio Continental criados


Assim, às pressas nesse final de ano
Uma esquadra composta de oito naus
Três fragatas, vinte navios mercantes
Zarpa rumo ao Brasil cruzando o oceano
Acomodando quinze mil pessoas no caos
Aportaram em Salvador os viajantes


Com pulgas, piolhos, imundos e fedidos
Chegando um mês depois ao Rio de Janeiro
Final da travessia, do sofrimento
A corte se instala em prédios cedidos
Por ordem de lei determinando, primeiro
Dar o segundo bem aos migrantes sem assento.


Dom João, logo após aportar na Bahia
Assinou a Carta Régia abrindo os portos
Revogou a proibição de manufaturas
Abre tecelagens p’ra crescer a economia
Criou o Banco do Brasil e outros confortos
Oferecendo ao Brasil novas estruturas


Brasil a Reino Unido a Portugal e Algarves
Elevou. para, com a morte da rainha
Em mil, oitocentos e dezesseis, suceder-lhe
Com o título Dom João VI, sem adarves.
No Rio, foi coroado como convinha
E uma soberana nação, prover-lhe


A revolta de Pernambuco enfrentou.
Em 1821, regressou a Portugal,
P’ra acalmar ânimos dos reinóis indignados
Dom Pedro regente do Brasil nomeou
Passando a nação soberana. A antes colonial
Promovendo também importantes tratados.


Independência do Brasil

7 de setembro de 1822


O fato histórico de maior relevância
É o que marca a Independência do Brasil,
Não só pela conquista política
Como também pela grande importância
De marcar o fim do domínio servil
Ao governo que Tiradentes fez crítica.


O príncipe D. Pedro, teve sondado acesso
A fim de conquistar e obter sua adesão
À nobre causa para o poder da nação
E ao receber carta exigindo o regresso
Abolindo a regência, às Cortes disse não
Permanecer no Brasil, foi sua decisão


Assim a nove de janeiro de 1822,
Por um Brasil independente pronunciou...
- Se é para o bem de todos e felicidade
Geral da nação, diga ao povo que “Fico”
Nesta decisão, José Bonifácio se destacou
Quando a paz é almejada, há liberdade


Tomou medidas que desagradaram Sua Alteza
E à metrópole, pelo caminho que trilhava
À independência. Organizando a Marinha de Guerra
Repatriando todas as tropas portuguesas
E uma Assembléia Constituinte convocava
E que, sem o “cumpra-se” toda a lei caia por terra


Voltava de Santos, quando chegou ao Ipiranga
Paulo Bregaro correspondia lhe trazia
Dom Pedro agoniado por uma disenteria
Ao Padre Belchior pediu ler as cartas, de tanga
E tremendo de raiva, de volta as pedia
Pisou-as no chão e um grito se ouviu


Era sete de setembro a independência proclamou
Às margens do riacho do Ipiranga, oh! Céus !
Fazia um sol de verão, o céu cor de anil
O Príncipe desembainhou a espada e gritou
- Pelo meu sangue, pela minha honra, pelo meu Deus,
juro fazer a liberdade do Brasil”


A história diz que levantou a espada e gritou
- “Independência ou morte”, dístico de ouro
Que mandou seu ourives Lessa fazer
Numa fita verde a amarela o colocou
No braço, indo ao espetáculo sem desdouro
Quando foi chamado rei do Brasil, sem ser.


Primeiro Reinado (1822-1831)
D. PEDRO I

A Constituição de 1824
E o predomínio do Partido Português
E a oposição ao autoritarismo
Geraram momento crise, o retrato
Atrelado à baixa do preço dos cafés
Levou o Governo Imperial a um abismo


O liberalismo era oposto ao mercantilismo
Praticado pelos Estados absolutistas
E favoráveis à redução do poder
Dividindo em três esferas de civismo
Executivo, Legislativo e Judiciário
Na esperança de um equilíbrio obter.


Agravando a crise, em mil, oitocentos e vinte e cinco
Eclodiu a Guerra Cisplatina e a perda
Da província e a independência do Uruguai
O conflito durou três anos com afinco
Até que a tropa já cansada e lerda
Reconhecendo a independência sai


Deixando o governo mais enfraquecido
A insatisfação com os gastos militares
Desgaste aliado à outorga da lei maior
Ao grandioso empréstimo contraído
O Banco do Brasil indo pelos ares,
Fez crescer a oposição ao Imperador


E querer conservar o Poder Moderador
Gerou em seu reinado sérios conflitos
Agravada pelo problema financeiro
Minaram a popularidade do Imperador
Não conseguindo reverter estes atritos
Abdicou ao trono, do reinado primeiro.


Período Regencial
(1831 - 1840)


A abdicação de Dom Pedro criou um vazio
A nação continuou mergulhada no caos
Aumentando a incerteza quanto ao futuro
A disputa pelo poder. Verdadeiro desafio
Os ânimos se acirraram em todos os degraus
Foi para todos envolvidos um apuro


Os integrantes do partido brasileiro
Eram os moderados favoráveis às reformas
E os restauradores partidários a D. Pedro
Do partido português o escudeiro
E os liberais radicais de outras formas
Chamados farroupilhas, contra Pedro.


O agravamento da situação econômica
E o anseio de uma maior participação
Das camadas popular e da classe média
Duas correntes em disputa gnómica
Aristocracia rural em oposição
Aos liberais exaltados querendo a rédea


do poder. Eles que haviam-se aliado
Para derrubar D. Pedro do poder
Lutavam agora entre si, decepcionados
Ante a impossibilidade do fim colimado
Três as tendências políticas, a saber:
Restauradores, liberais e moderados


Nesse quadro de agitações políticas
Organizar o Governo era imperioso
De lês a lês, o clima era de agitação
Explodiam conflitos, sobravam criticas
Aguardando Pedro de Alcântara, majestoso
Atingir a maior idade e/ou emancipação


Neste período uma Regência Provisória
De setenta dias sua curta duração
Outra, com Bonifácio, a Trina Permanente
Por acerca de quatro anos na história
Quase cinco a Una, até à emancipação
Com Feijó e Araújo Lima à sua frente


Segundo Reinado (1840-1889)
D. PEDRO II


O período regencial que se prolongou
Por toda a década de mil, oitocentos e trinta
Foi uma das fases mais conturbadas da história
Que a unidade do império feriu e ameaçou
De tal forma que minha exposição sucinta
Não permite os detalhes de toda a trajetória


A ponto de introduzir o Ato Adicional
À Lei Maior para fortalecer o poder
Dando às províncias um mínimo de autonomia
Para não impor repto ao poder central
Como a revolução farroupilha em vigor
Criando a República Piratini, logo extinta


O movimento farroupilha Laguna,alcançou
No ano de mil, novecentos e trinta e nove
Onde instalou a República Juliana.
As tropas legais que Caxias comandou
Impôs derrotas nas batalhas que promove
O ponto final na guerrilha desumana


Havia ao mesmo tempo outras insurreições
A Cabanagem, luta entre Rio Negro
E Grão-Pará, atual Amazonas
Desejando de Belém separações.
Outra, a Baialada e, se todo esforço emprego
No Maranhão uma das vis intentonas.


Por grupo que se opunha ao Ato Adicional.
Outra insurreição chamada Sabinada
Ocorria em Salvador e Feira de Santana
Defendia a autonomia provincial
Querendo impor naquela situação gerada
Um governo de tendência republicana.


E foi entre as agitações políticas e sociais
E o perigo da divisão territorial
Que em junho de mil, oitocentos e quarenta
A antecipação da maioridade pelos liberais
Consta apreciação da Câmara em seus anais
Com menos de quinze anos, liberto da placenta


E assim, subiu ao trono Dom Pedro II,
Na esperança de agregar todas as tendências
Em torno do jovem, o novo Imperador.
Foi criado um ministério que a fundo
Governava tal qual, como nas regências
Face à prematura idade do Imperador


Os irmãos Andradas e os Cavalcanti
Formavam o novo gabinete imperial
Seu partido de Liberal, só tinha o nome
Era discricionário, predominante
O cacete, era o regime eleitoral
Nas eleições realizadas seu cognome


Os partidos Conservador e Liberal
Tanto um como o outro eram integrados
Pelos grandes proprietários escravistas
Cujo interesse recíproco unilateral
Era antidemocrático e irracional
Imotivado de idéias progressistas


Entre ambos, não havia diferenças profundas
Já que as duas correntes concordavam
Manter a monarquia e o regime servil
E apesar de tamanhas barafundas
Liberais e Conservadores se revezavam
Na presidência dos ministros do Brasil.


O ministério mais eficaz da monarquia
E o que mais consolidou a política
Centralizadora, foi o de Olinda
Aquele que o tráfico negreiro suspendia
Com lei que impôs ao tráfico, malgrado a critica
A monocultura cafeeira florescia.


Nesse mesmo ano de mil, oitocentos e cinqüenta
Nosso Código Comercial foi promulgado,
Vigorando até hoje em nossos Tribunais
Neste reinado, novo horizonte se apresenta
Dois anos depois o telégrafo instalado
Em seguida a primeira estrada de ferro brasileira


Um novo horizonte se descortinou neste reinado
Com a extinção do tráfico o fluxo de capital
Passou a ter outra demanda na economia
Em atividades financeiras e de mercado
Acentuado aumento na produção industrial
Com a aplicação dos recursos sem tirania


Dir-se-ia que um novo país despontava
Mas mesmo assim, os conchavos e intrigas
Fomentavam sob influência da facção áulica
Face à supressão do tráfico iniciada
As aguerridas oposições inimigas
Despontavam nos deputados a futrica


A razão era simples, toda a economia
Desde a época colonial estava pautada
No trabalho escravo e deste prescindia
Só a Lei Euzébio de Queiroz reprimiria
O tráfico negreiro, no clamor duma virada
Entre conservadores e progressistas


Após o malogrado gabinete Zacarias
No segundo, impondo ares de moral e justiça
Aposentou velhos ministros da alta corte.
Pela abolição gradual da escravatura
A situação se agrava e incita a guerra
No Uruguai, prelúdio da do Paraguai


Estendeu-se a monocultura cafeeira,
Do vale do Paraíba ao Rio e Minas,
Mas a florescente lavoura prescindia
Da mão de obra escrava e costumeira
Gerou insurreição, a quebra de rotinas
Em lutas partidárias, repúdio maior


À monarquia.; em prol d’idéias liberais
Que varriam a Europa no século XIX
A favor da república e reforma total
Num Manifesto, que se opunha aos reais
poderes pessoais do Imperador, remove
Sob os efeitos da guerra do Paraguai


Aos 3 de dezembro de 1870 é publicado
O manifesto de mudança republicano
De não pela resolução, mas pela evolução
O ministério São Vicente é derrubado
pelos liberais. Mas a situação decano
Com Rio Banco manteve a mesma situação


Em maio de 1875, quando era
Vista a situação em franco progresso
Deteriora-se com a crise bancária
Uma terrível seca, grave e mortífera
Com perdas de homens, recursos e preços
Impelindo os nordestinos a outra área


Evidentes sinais que chegava ao fim.
A crise prolonga-se até 1886
Quando em Londres o país faz empréstimos
Porém, já tarde de mais para o festim
O prestígio do monarca começa a declinar
Com acirradas críticas aos seus préstimos.


Na última década do governo de Pedro II
O poder monárquico teve dez governos
Com pontos de vista diversos ou opostos
E houve quatro legislaturas no período
As três primeiras autorizavam nada menos
Que dissolver a câmara. A quarta perdia posto


Impedida pela implantação da república.
Nos dois últimos anos que a antecederia,
Ficou o Imperador gravemente doente
Embarca para a Europa deixando pública
Na regência a princesa Isabel, assumia
Decretou a Lei Áurea, escravidão não consente


A situação, passada a onda de euforia
Ganha corpo a campanha republicana
Medo do reinado da princesa e Conde d’Eu
O prenúncio do terceiro Reinado, seria.
Com a ausência de Dom Pedro sobe a gana
Dos que se batem contra o emperro do regime.


Aos vinte e dois de agosto de 1888
Regressa D. Pedro II da Europa
E é recebido sob acolhida triunfal
Calorosa manifestação, o povo afoito
Dava mostras de fidelidade e toda tropa
Mostrava adesão e aplausos sem igual


Dom Pedro não era mais o mesmo homem
Cioso de seu poder e diligente
Como sempre foi antes de adoecer
Por sua vez a libertação dos escravos
Gerou insatisfação nos fazendeiros
Os militares também estavam descontentes


A supremacia do poder civil ao militar
A oficialidade não via com bons olhos
Os primeiros sinais foram as punições
Aplicadas ao coronel Alexandre Vilar
Em seguida ao tenente–coronel Madureira
E ao coronel Ernesto Cunha Matos


Esse reflexo gera mal-estar e o senado
Em manifesto do Visconde de Pelotas
E do Marechal Manuel Deodoro da Fonseca
Exprimem desapontamento, dão o recado
E mostras da força do exército em suas botas
E o Clube Militar ficou levado da breca


No ministério Visconde de Ouro Preto
Novos incidentes entre militares e governo
Acusando aqueles de insubordinação
E de incidente em incidente chega outubro
Quando se iniciaram as articulações
Entre militares descontentes e republicanos


A exaltação militar expandia-se
Nada os intimidava o desafio lançado
Benjamin Constant procura atrair
Deodoro, para o golpe finalizar-se
Presidente do Clube Militar a seu lado
O grosso da tropa poderiam atrair


Foram recebidos por Deodoro em sua casa
Quintino Bocaiúva, Francisco Glicério,
Aristides Lobo e também Rui Barbosa
Deodoro mostrou-se esquivo e reservado
Por derradeiro, acabou levando a sério
Na revolta sua missão seria a militar


E, assim, quatro dias depois o exército
Aos 15 de novembro de 1889
Sob o comando de Deodoro da Fonseca
Em nome daquele, da armada o do povo
Pôs fim à monarquia e ao Império
Com a proclamação da República



Poesia em elaboração (até à república) 23/04/2007


São Paulo, 14 de abril de 2006
Armando A. C. Garcia

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O Ano é 95 d.C. O cenário é a solitária de Patmos, no Mar Mediterrâneo, próximo da Ásia Menor. Patmos era improdutiva, deserta e rochosa. Um local seguro para os navios aportarem durante as tempestades, mas inadequado para a habitação de seres humanos.

Mas, no primeiro século da era cristã, Patmos era uma colônia penal usada pelos romanos. Cercado de águas por todos os lodos, era uma penitenciária de segurança máxima: o Alcatraz daqueles dias.

Separado dos irmãos em Crista, não tendo comida suficiente, precariamente vestido, dormindo numa caverna fria, escura e solitária. João estava ali como prisioneiro. Seu Crime? Pregar o evangelho de Jesus Cristo (ler: Apoc. 1:9).

Com o Som de Trombeta

João identifica-se à Igreja como um irmão e companheiro na aflição, ou tribulação. Por que João não se apresenta como apóstolo e líder das igrejas da Ásia? É porque, naquele momento, os dias de seu ministério já haviam ficado para trás. João desempenhava ali a última tarefa de sua vida.

É justamente quando sofremos, e nos sentimos esquecidos, que Deus se manifesta para usar-nos de modo maravilhoso. João pensava que o seu ministério já havia chegado ao fim. Mas o melhor estava para vir... É nessa hora de sofrimento e aparente derrota que Cristo se manifesta na vida de João.

Foi em meio ao confinamento que João ouviu o alerta final de Jesus Cristo: "Eu fui arrebatado em espírito no dia do Senhor, e ouvi detrás de mim uma grande voz, como de trombeta" (Apoc. 1:10).

João ouve uma voz semelhante a trombeta - uma voz forte, distinta, penetrante e dominadora. A voz de Jesus Cristo. Já haviam se passado mais de 65 anos desde que João a ouvira pela última vez intimando-o a deixar a rede para segui-Lo. Tempos mais tarde, ouviu-A soar: "Está consumado!" Depois, ouviu-a em tons de despedida e na promessa de retornar a este mundo.

Agora, João ouve novamente aquela voz. Desta vez, diferente. Ele não ouve o sussurro gentil do Servo do Senhor que, como o profeta anunciara: "Não clamará, não se exaltará nem fará ouvir a Sua voz na praça" (Isaías 42:2). Ao invés disso, João ouve a voz forte e penetrante do Cristo glorificado que soa aos seus ouvidos como uma poderosa trombeta.

O Filho do Homem

Ao ouvir a voz como som de trombeta, João virou- se e viu sete castiçais de ouro. Nos tempos antigos, os castiçais eram colocados no canto do aposento com uma pequena lamparina sobre si. O propósito do castiçal era manter a lâmpada no lugar de maior destaque do aposento. O castiçal não era a luz; ele era o suporte da luz. O mesmo ocorre conosco. Somos o suporte da luz de Cristo, neste mundo em trevas. Esta é a missão da Igreja.

Os castiçais visto por João são de ouro, o metal mais precioso. O ouro representa o grande valor da igreja. Nosso valor é incalculável. Jesus derramou seu preciosíssimo sangue para nos resgatar. Pagou por nós um preço superior ao do ouro e da prata (I Pedro 1:18- 19). Somos preciosos para Ele!

No meio dos castiçais, João vê a figura como de um homem. Não um homem comum! Não um homem qualquer, mas o Filho do Homem. Este é um título messiânico profundamente enraizado no Antigo Testamento, pois fala daquele que haveria de vir, ungido pelo Espírito, para inaugurar o reino de Deus na Terra.

O Profeta Daniel viu o Filho do Homem vindo para governar o mundo com soberana autoridade: "Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do Céu um como o Filho do Homem... E foi- lhe dado o domínio e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas O servissem: o Seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o Seu reino o único que não será destruído" (Daniel 7:13-14).

João observa as vestes de Cristo. Seus trajes suntuosos significam Sua autoridade suprema sobre a Igreja - a Sua soberania. Jesus não está mais vestido como Servo sofredor. Ele é visto com as vestes de um poderoso governante - as vestes daquele que domina: Ele estava "...vestido até os pés com um, vestido comprido. e cingido pelos peitos com um cinto de ouro"(Apoc. 1:13).

Nos tempos antigos, este era um aparato de reconhecida autoridade, dignidade e poder. Quanto mais longo o vestido, maior a autoridade. Por isso, na visão que lsaías teve de Jesus glorificado, as orlas de Seu vestido enchiam o templo (lsaías 6:1). O domínio de Cristo é infinito, não cabia no templo sequer uma representação dele - por menor que fosse a escala usada.

Seu Caráter Puro

João volta-se neste momento para a cabeça e o cabelo de Cristo: "E a Sua cabeça e cabelos eram brancos com lã branca, como a neve..." (Apoc. 1:14).

Os cabelos de Jesus são brancos. Não de um branco comum e vulgar. É um branco que refulge tão brilhantemente quanto a neve que cai num dia ensolarado. Este branco é símbolo da absoluta pureza e santidade de Cristo, Santidade é o atributo que mais sobressai em Cristo. É o topo de Seus atributos.

A Santidade de Cristo é vista em Seu ódio pelo pecado. Ele acha-se totalmente afastado do pecado. Para que se possa estar em sua presença, é necessário ser santo. Quando os anjos pecaram, foram expulsos do Céu, e separados da Sua presença. Por rejeitarem a Cristo Jesus, os homens serão expulsos de Sua presença no Juízo Final (e destruídos).

É santidade o que Cristo espera de Sua Igreja. Precisamos estar separados do mundo; não podemos ser como o mundo. Pedro nos adverte: "Mas, como é santo aquele que vos chamou, sede vós também santos em toda a vossa maneira de viver. Porquanto escrito está: Sede santos, porque Eu Sou santo" (1 Pedro 1:15-16)

Seu Profundo Olhar

João contempla, neste instante, os olhos de Cristo, A visão torna-se sobremaneira impressionante. Raios de fogo saem dos olhos do Senhor Jesus: "...e os Seus olhos são como chama fogo" (Apoc. 1:14 u.pj.

Jesus vê os lugares mais profundos e secretos de cada Igreja. Nada Lhe está oculto. Porque "não há cri atura alguma encoberta diante dEle; antes todas coisas estão nuas e patentes aos olhos dAquele a Quem havemos de prestar contas" (Hebreus 4:13).

Jesus observa tudo com uma visão mais poderosa que raios X. Nada escapa à Sua atenção. Nada pode obscurecer-Lhe a visão. Nenhum conhecimento está fora de Seu alcance. Ele vê perfeitamente cada ministro e membro de Sua Igreja.

Com olhar penetrante, Jesus sabe completamente cada detalhe sobre nós. Não há pensamento secreto, palavra ou intenção que Jesus não conheça! De fato, Jesus conhece nossos pensamentos mesmo antes de os expressarmos (Salmo 139:4). Ele lê a nossa correspondência sem ter de abrir o envelope!

Com olhos penetrantes como chamas de fogo, Jesus olha para Sua Igreja. Ele diz à Igreja em Éfeso: "Eu sei as tuas obras" (Apoc. 2:2). A Esmirna, Ele observa: "Eu sei tuas tribulações" (Apoc. 2:9). A Pérgamo Ele fala: "Eu sei onde habitas" (Apoc. 2:13). Às Igrejas em Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodicéia Ele diz: "Eu sei as tuas obras" (Apoc.2:19e3:1,8e 15)

Com "os Seus olhos como chamas de fogo" Jesus está a olhar e acompanhar a vida de cada membro de Sua Igreja. E o que é que Ele procura? A resposta pode ser dada numa única palavra: Santidade. Jesus busca. Jesus espera. Jesus sonha em ver santidade na vida dos membros de Sua Igreja.

Sua Disciplina Severa

A visão vai além . Observando a Cristo, João vê que de Sua boca saía uma arma mortal - uma espada: "... e da boca saía-lhe uma afiada espada de dois gumes..." (Apoc.1:16). À espada de dois fios mostra a autoridade judicial de Cristo para administrar disciplina em Sua Igreja. Quando a Palavra de Deus é desobedecida, Jesus empunha Sua espada para disciplinar. Mas o inimigo de Cristo não é a igreja, e sim o pecado.

Com esta espada afiada, Jesus remove cirurgicamente o pecado de Seu corpo - a igreja. O pecado é um tumor maligno! Se o seu corpo for atingido pelo câncer, com certeza você fará o possível para recuperar a saúde. Isso requer submissão ao bisturi do cirurgião. Não porque você odeie seu corpo, mas justamente por amá-lo.

O pecado, da mesma formo, tem que ser extirpado do corpo da Igreja - onde quer que ele se encontre! Jesus ama Sua igreja e deseja-lhe a saúde espiritual. Por isso, onde houver pecado Ele o remove com a Sua espada aguda de dois fios.

Embora pareça traumático, esse tratamento não é maléfico ou vão, O pecado tem de ser removido, a disciplina tem de ser aplicada, por amor ao membro e por amor ao corpo - a Igreja.

Em sua graça, Cristo muitas vezes contém Sua disciplina para dar mais tempo para que nos arrependamos. Ele prefere que nós mesmos tratemos o pecado. Mas não devemos pensar, nunca, que Sua tardança significa que Ele não vai nos disciplinar - que Ele esteja passando por altos nossos pecados. A Bíblia adverte: 'O Senhor é tardio em irar-se, e de grande poder. e ao culpado de maneira alguma terá por inocente (Naum 1:3).

Apelo

Esta visão, dada a João, nos traz um alerta final, da parte de Deus. O tempo é curto. todos as profecias estão se cumprindo. O fim se aproxima. Cristo virá em breve. Aliás. Ele já está voltando. Não há mais tempo a perder! Esta é a hora mais importante de toda a História humana São os momentos que precedem a volta de Jesus Cristo. E tempo de acordar e servir ao Senhor. E tarde da noite!

O apóstolo Paulo nos adverte: "e isto digo, conhecendo o tempo, que já é hora de despertardes do sono; porque a nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé. A noite é passada, e o dia é chegado. Rejeitemos pois as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz (Romanos13:11-12).

Esta passagem mostra crentes espiritualmente sonolentos. Indiferentes ao cumprimento das profecias. Alheios aos sinais da vinda de Jesus. Mas já é tarde, o amanhecer da volta de Cristo está despontando. A igreja precisa estar pronta; é hora de despertar e dar à trombeta o sonido certo. É hora de avisar o mundo! Jesus está voltando!


Lá na UPA, bem nos CONFINS da CIPA já não CEI se a ALCA CUT o IGP ou se o ITBI dá para o IPC, quanto mais se a NASA, o PENTÁGONO e o MST invadirão a RFFSA, a Amazônia ou a EMBRAER. Wells há mais sigla entre o CEO e a terra do que supõe nosso Van filosofia [só para não dizer que não falei de siglas].

Só SANSEI é que se UNE o CTN ao Leão [do] IMPOSTO [R]; o ERÁRIO o FISCO DEFICIT ao ECONOMÊS de mestre ERG [UE-se] imposto [s] a todo [s] num dial D sol para a CND só RIR perversa. Assim entorpe sob a umbra fiscal, dominados e subsumidos por singelas siglas e signos de aparência neutral serve o fisco maître no cardápio da Mesa de Renda o fel amaro da tributação, um purée, um AGU pra CEAS na DATAPREV's. Quando não é INSS, ICMS, IR, ISS? É IPI, IPTU, ITBI? É IRRF, IPV?

Potassa cáustica confisca do MERCOSUL e ainda cobram do POP assalariado a PIB DE ILUMINAÇÃO.

Ó Lady SELIC! Ó Sir. DOW JONES! Ó Inhá CONFAZ! Isso não SENFAZ!
Por que tanta usura jurássica? Tantos juros no purgo de Hades se nada fazem e nos dão DAIS?

Olha que até o Código de Hamurábi limitou a cobrança de juros nos empréstimos? Olha que até o Pentateuco fez a primeira condenação ética à cobrança de juros? Além de Aristóteles, o Antigo Testamento, a homilia de S. Basílio Magno, São Thomas de Aquino e o Condex normativo pátrio proíbe e pune a tal prática do "aluguel sobre o dinheiro"? Não vê que por cá tem que ter a CUT para dizer? Que para tanto imposto a pagar tem que ser Deus?

Junte-se a nós. Você pode. Vão pra PQP? Como diria Sartre: O inferno não são os outros, o inferno são os impostos!

Desde a.D e a.C batiza o Cristo o mesmo FOB.

É CEMPRE a idiossincrasia do reduzir a pó a nomenclatura toda CEMANA.

Se não for o repetitivo e o mal educado do CEO CIAC sem LER o ABC com o CPU do PC tarado molestando a UFIR da TR ou o DORT distúrbio [nado] osteomuscular a mandando há anos pegar na RAIS e por no DAT a seco sem DNOCS no IOF no MP no TCU lá onde o TIPI e o TFE tomam no CONTU? D'outro é o data show digital sem OFFSETT emendando uns fatos e fotos extra para as arquibancadas no COSPY DESK.

Triste é vê a BR na TPM rodada entulhada de pau e pedra, cheia de pó e lama no fim da estrada mal sinalizada KM da vida mandando o DNIT tomar lá nos buracos e nas curvas onde a BR-3 toma só pra vê a PRF nos por a nu pelado no RABECÃO do IML, enquanto o $ cínico do PEDÁGIO manda eu, manda tu, manda ele, manda nos e vos, manda você tomar nu... E soprar no BAFÔMETRO com a cara cheia de ALCA lá do DPVAT da SUSEP, no IPVA do CETRAN, do DETRAN, da CIRETRAN no CBT do CONTRAN bem fundo FED do DENATRAN?

Caracas! Quando não fora o HAMMAS, fora o HESBOLLAR do Bin Laden, agora é o Estado Islâmico jogando Boston no Tio SAM?

É a ASFARC ou a MIS U.S. A num ABREV [iar] do de cujus Hugo Chávez? Sin., pero non mutcho Maduro!

É o FBI com a Cia, a SUAT e a FAB no CPOR do DAC?
É o GATTE do DEIC no CTA da ROTA socando a MÁFIA e o SENAD na COSA NOSTRA!

INRI Cristo DIU? O Ministério da Saúde ANVISA: É só a KS por no PET a Vênus para conter o HIV da AIDS que a invejosa BCG mal curando o KOCH chega logo sem bacilo com a DENGUE de picadura para a ZICA da SUCAM?

Sou NERD. Sou Nerd mesmo? Como é que por "livre e espontânea vontade" fui obrigado a contribui com a CPMF e agora no K.O infecto de IMPI GIA com FEB e FAQ tonto sem CAL [oria] e KV de potência não há um só DOUTOR do CRM e leito no CTI da UTI? Não há uma AMBU COPOM da AMB nem o DDT da CEME na "gaiola" das UCAS? Ó OMS! AI que SUS!

Não! Não! Não sou OTAN!

Sem SUNAB, sem Inmetro e sem PROCON?

Sem ST, sem STM, sem TJ, TST, TSE, TRT, TRF, TCM, TCE e TCU? UA?
Goethe ou não Goethe [m] vão todos para o CNPq?
Ou vão parar na USP, na UnB. Parar na PUC e na UFMA?
Ou vão parar no CAPES, no SESU, no ITA? Lá terão Sophia e Sofos?

Sou do prozac, mas não vivo sem DP.
Sou da CF pra viver sem ter PF, sem ter CIVIL, sem ter PM, mas não chupar DOPS no xadrez!

Tenho CI e CPF do MF sim!

Tenho DOC - CRACHÁ - CEF - COMPROVANTE DE ENDEREÇO e fator RH.

Tenho no escorregado: HABEAS-CORPUS, SALVO CONDUTO meu ADV. e ALVARÁ.

DOU o DARF pago pontual em cash ou via TED o IRPF.
DOU o CNPJ? DOU no CNPJ ou IRPJ imposto recolhido sem sonegar

DOU a CTPS assinada e guia do FGTS autenticada.

Olha vê se não enche DIEESE?

O IBGE acusa o IGP de sabotar o PIB, mas jura o IPE e a OIT que o IDH é baixo.

Confessou a SEF e a INEPE, a FUNBEC, a FUNDEF, a SBPC e ao diretor do MEC que sem o finado MOBRAL o IDEB da Escola Pública que não ANDES sabendo, tomou um ZERO!
Deu nas ondas moduladas da RADIOBRÁS que nem a ONU a FEBEM suporta mais, e que a OEA com o UNICEF já não seguram as verdejantes parreiras do ENEM.

Ora, porque não aproveita então e vai de SUFRAMA dizer ao INPA falar ao SINRED denunciar ao sistema pátrio cuidar bem da FUNAI e do IBAMA sem parar de olhar para as florestas que aos poucos vão morrendo sem chorar na UTI vitimadas pelo lucro voraz da BOVESPA; do BM&F; do BID e o BIRD; do BCB; da FEBRABAN; das MADEREIRAS; do CAPITAL ESTRANGEIRO e da OMISSÃO do próprio gov.com. br.

Mayday... Mayday.

DDD, DDI, LBV, LBA.

Ligue já! Bela importa a PESTALOZZI e a saga boa da APAE!

Quanto mais tem ÍBIS no futebol, CRE, CRB? Dá FLA e FLU? Tem FIFA, FISA, FITE COE?

Quanto mais tem CBF, CBM, CBV, CBT, CBB, CBJ, CBA, CBAT? Tem CONMENBOL e COI?

Quanto mais tem FIPE, FINEP, FUNDEB, FESESP e FIESP?
Mutilam o Portinari, o Aldemir e a Tarsila do Amaral.
Bel. -art. [Belas-artes] ó PÍNEL?

Acaso querem o IPHAN no UHDF?

Que sandeus de nós meu Deus!

OXÊNTE! Não pare lá na sig [L] a? Não pare? Signos!
Siglonimizar? Siglonimização? O ato de criar siglônimos?

UÉ! Até o infixo afixo no interior das palavras, o DIS em indispor e o do por Z em florzinha já o conhece?

BAH! Inté o tê é té do até da aférese aparece?

Hein, hem! Assim não dá! Assim não dá inhô Zé?
UAI! Ou vai pra DF de JK ou segue pra MG de JF e BH?
Quando não é o PAC, é o PIB, é o PIS e o PASEP.
Quando não é o SEST, é o SEBRAE, é o SENAI e o SESC.
Quando não é o SENAT, é o SESI, é o SENAC e o SERPRO.

É o IBOPE inábil opinando ao INCRA que não há a sós "sem terras"?
Ó CREA! Não ABRAS boca IBOPE.

É o FUNRURAL fuçando na bengala do tio SERASA.
É o FIM! O MST no PNDH denuncia levar pau do TFP e sal da UDR.
É a INFRAERO de VARIG e o GOV. de VASP indo Pro G9 impressionar com o PRÉ-SAL a OLP e a OPEP.

É o SPU cobrando um mar de dunas e o domínio do mar azul para si.
É o SPC cagando na me e o cartório do ócio negócio carimbando os ossos do protesto.
É o ABECEDÁRIO do AA, AAA, AABB, BB, ABC, ABCD, AACD querendo a CEF... FUI!

Ora... Ora... Vão-se pro MAM ou pro MASP que os carregue.
Vou surtar. Vou surfar.
Vou sentar. Vou mesmo é [a] fundar uma ONG no sofá.
Vou pedir um empréstimo à SUDAM e um "papagaio" junto do BNDES.

Uni-duni-tê salame míngüe!
Para o PV que não vê? A mídia da TV?
Misericórdia D'us. Um PT saudação.
Vou é deitar e rolar.
Ainda bem que no THE END me resta a FUNARTE, a ABI, a OAB e a ABL.
A CNBB? A CNBB é só a voz roca de Deus no Brasil.
Ciranda cirandinha... Vamos todos cirandar...
Quem gostar de mim sem ANEL? Sou Eu ANATEL!




Leia o COMENTÁRIO DE: João Batista do Lago [Articulista e analista político, poeta e escritor, foi editor de vários jornais e tem livros publicados]. ["João Batista do lago, maranhense, pode ser considerado, atualmente, um dos mais completos poetas e cronistas do Brasil, haja vista a consciência plural e significativa de sua intuição cultural, fato que o faz passear entre musgos históricos gregos e o modernismo clariciano, espargindo o pensamento poético alemão, americano ou inglês, sem esquecer das taças saboreantes dos vinhos que enebriaram o cismar dos poetas franceses como BAUDELAIRE (Charles Baudelaire), MALLARMÉ (Stéphane Mallarmé), FRANÇOIS COPÉE (François Édouard Joaquim Copée) e MUSSET (Louis Alfred de Musset) - o poeta do amor. Como eu, o Maranhão e o Brasil também, creio, se orgulham de João Batista do Lago, uma das maiores expressões literárias do mundo moderno. Fato que, realmente não deixa a desejar se comparado a nenhum dos franceses acima citados". Marconi Caldas Poeta, escritor e advogado São Luís - Maranhão - Brasil 2007].

Esta poesia do poeta Serrão Manoel, aos meus olhos, é de uma modernidade gritante. Percebam que falo de modernidade e não de modernismo! Faço questão de acentuar esta diferenciação para, assim, poder fixar-me na nucleação primeira, fundamental e fundaste deste poema.

O poeta constrói o poema a partir do campo siglonômico, uma ferramenta indispensável à modernidade do tempo do aqui e agora. E ele o faz com mestria: humor, sarcasmo, sátira, denúncia...

E vai mais além quando nos aprofundamos numa análise de conteúdo: de forma ímpar presentifica sinais que se nos remetem aos campos da Política, da Economia, da Filosofia, da Sociologia, da Psicologia...

Ao ler e reler este poema teve a nídita sensação de encontrar, na alma de cada verso, o espírito do "valor duplo, contraditório e indecidível" aventados pelo francês Jacques Derrida, isto é, Serão Manoel evidenciam nesta sua poética "posições" dos signos nos convocando a constantes e continuadas releituras do texto que vai construindo e desconstruindo valores desenhados no campo da mente de cada qual que toma conhecimento desta obra.

A siglomatização, como ele a infere a partir do título, é, ao mesmo tempo, uma convocação para a revolta, a partir do instante em que o campo siglonômico nos retorna ao ventre da nação como imbecis humanos destinados a obedecer ao status que letargia dos pela inocente incompetência de entender tantas siglas, mas ao mesmo tempo condenados à obediência de suas regras se não quisermos apodrecer no fundo de uma vida acivílica.

Ainda assim, o poeta, numa tentativa desesperada de desconstrução desse mundo real... Mais que real: surreal, oferece-nos sua indignidade como obra da mais pura razão de luta contra todas essas iniqüidades que são geradas no ventre o Poder, ao seu bel prazer, pois sabe que ao povo condenado resta apenas obediência insofismável da sua desconstrução diária:

"Ora... Ora... Vão pro MAM ou pro MASP que os carregue.

Vou surtar. Vou surfar.
Vou sentar. Vou mesmo é [a] fundar uma ONG no sofá.
Vou pedir um empréstimo à SUDAM e um "papagaio" junto do BNDES...".

Quem dera pudéssemos agir assim... Noutras palavras, palavras do tamanho do povo que fala: "Ò, aqui, banana pra vocês...".

Parabéns, poeta João Batista do Lago.

***
S E L E T A



D

I



V E R S O S









Antonio Cabral Filho





Letras Taquarenses Edições

2014

*

NOTÍCIAS DE MIM


Nasci em 13 de agosto de 1953, no município de Frei Inocêncio - MG. Em 1964, após o golpe militar, fui para a escola, por decreto do generalíssimo Castelo Branco, aos onze anos de idade. Em 1968 concluí a quarta série, com média 7. Nessa época eu fazia teatro, na escola e na igreja, e, com a ajuda da única pessoa que eu considero Professora neste mundo, a Dona Adir, como eu ainda a chamo, montamos a peça O FILHO PRÓDIGO, com a intenção de realçar a auto-destruição em que se encontrava a juventude naquele momento.

Durante as férias escolares de junho de 1968, dei uma chegada ao Rio de Janeiro para fazer uns biscates e comprar roupa nova, mas ao chegar no Catumbi, meu primo Sadi levou-me para conhecer a cidade. Era 26 de junho, dia da PASSEATA DOS CEM MIL. Passeei na passeata.

Em junho de 1969, meu Tio paterno Sebastião Cabral, mestre de obras no Rio de Janeiro, foi buscar peão para suas obras e eu me alistei. Falei com ele da necessidade de eu sair da roça, escapar das garras do meu pai, deixar de ser mão-de-obra gratuita. Tinha quinze anos e era escravo do meu próprio pai.

Ele compreendeu e arrancou-me da casa paterna, não sem antes anunciar-me as agruras da cidade. Ao chegar em seu barraco, na Favela da Mineira, meu romantismo com a cidade grande foi pelo valão abaixo. Vi cair aos meus pés um menino fuzilado pela polícia, que segundo foi dito, era traficante. Durante muito tempo eu tive pesadelos por causa disso.

Morei na casa do meu querido tio até ir para o quartel. Matriculei-me na Escola Geny Gomes, no Rio Comprido e cursei o ginásio. Era um tempo turbulento, com muitos professores fazendo "inquéritos" com os alunos. Logo a seguir, entrei no Colégio Martin Luther King, fiz a sétima e a oitava séries e fui para o profissionalizante, no Curso Santa Rosa, Largo de São Francisco, em frente ao IFCS-UFRJ. Era 1974, fui promovido a cabo do exército, mas de olho no curso de sargento. Fiz o curso e passei, fiquei até 77 aguardando a promoção que não veio e pedi baixa; passei no vestibular e fui cursar direito na UFF. Abandonei por desilusão com a filosofia do direito após o quarto período; fui para comunicação social, mas a psicologia da notícia acabou comigo. Caí na vida e estou pegando touro à mão.


1 -


1 - ECCE HOMO - POESIA, Edições Curupira, 1997;
2 - DUELO DE SOMBRAS, POESIA, Edições Curupira, 1999;
3 - VER...SO CURTO&GROSSO - POEMAS PIADAS, Edições Letras Taquarenses, 2006;
4 - CINZA DOS OSSOS, POESIA, Edições Letras Taquarenses, 2008;
5 - MEUS HAICAIS PREFERIDOS, COLETÂNEA DE 20 AUTORES, Org Antonio Cabral Filho, Edições Letras Taquarenses, 2010
6 - TROVAS DE TORCEDOR, TEMA FUTEBOL, E-BOOK, 2010;
7 - TROVADOR DE FÉ, RELIGIÃO, E-BOOK, 2011;
8 - TROVAS DE AMIGO, HOMENAGENS, CRÍTICAS, IRONIAS, E-BOOK,2011;
9 - AUTOBIOGRAFIA EM TROVAS & VERSOS FAMILIARES, E-BOOK, 2012;
10 - CADERNO DE HAICAIS, E-BOOK, 2013.
11 - SELETA DI VERSOS 2014


2 - PARTICIPAÇÕES


1 - POETAS DA CIDADE DE NITERÓI, ANE -
Associação Niteroiense de Escritores, 1992;
2 - POETAS 10ENGAVETADOS, Coletânea
, Org. Antonio Cabral Filho, Edição dos Autores, 1995;
3 - ANTOLOGIA POÉTICA VOL2, UFF/EDUFF 1996;
4 - INTERVALO, Ano II Nº10,
Edição Francisco Filardi, 2006;
5 - ANTOLOGIA BRASIL LITERÁRIO 2007,
Org Ivone Vebber, 2007;
6 - QVADERNS DE POESÍA SETEMBRO 2007,
Org Padre MossenPere Grau i Andreu,
Edição Le Club de Difusion Cultural,
Barcelona-Espanha 2007;
7 - CD DE POESIA 2008,
Org Carmem Borges 2008;
8 - DVD DE POESIA 2008,
Org Carmem Borges 2008;
9 - ANTOLOGIA BRASIL LITERÁRIO 2009,
Org Ivone Vebber 2009;
10 - QVADERNS DE POESÍA SETEMBRO 2010,
Org Padre Mossen Pere Grau i Andreu,
Edição Le Club de Difusion Cultural,
Barcelona-Espanha 2010;
11 - FANTASIAS COLETÂNEA,
Org Rozelia Scheifler Rasia et all,
Edição Alpas21/Ed Alternativa 2011;
12 - ANTOLOGIA 13 POSTAL CLUBE,
oRG Araci Barreto, Edição Postal Clube, 2011;
13 - POETAS EN / CENA 6 - BELÔ POÉTICO,
Org Rogério Salgado e Virgilene Araújo, BELÔ POÉTICO 2012;
14 - VERSOS DE OUTONO ANTOLOGIA
Org Delmo Fonseca, Edição Confraria de Autores 2013;
15 - ANTOLOGIA 15 POSTAL CLUBE,
Org Araci Barreto, Edição Postal Clube 2013;
16 - ANTOLOGIA DE POETAS BRASILEIROS CONTEMPORÂNEOS
Org Elenilson Nascimento, Editora Pimenta Malagueta, 2013;
17 - DIÁRIO DO ESCRITOR - Livro Agenda, Litteris Editora, 2013.

18 - APANHADOR DE SONHOS ANTOLOGIA - Editor Marcio M. do N. Sena - Beco dos Poetas 2014.


*

DEDICATÓRIA


A TODOS,

TANTOS,

QUE SABEM

A SUA IMPORTÂNCIA

NA MINHA VIDA.


***

ÍNDICE ( Lista de Poemas )



1 - Florão da América

2 - Poeta de Periferia

3 - Brecht Sob o Céu de Berlim

4 - Ladeira Saint Romain

5 - Me Disserem

6 - Lições de Tempo

7 - Solilóquio

8 - Cogitação

9 - Instinto Primitivo

10 - Política Anti - Literária

11 - Do Pobre Arlequim

12 - Lira dos Quinze Anos

13 - Cinza Wim Wenders

14 - Canção do Preto Inácio

15 - Canto a Ilu-ayê

16 - Delírios de prometeu

17 - Canção dos Guetos

18 - Tempo Fértil

19 - Lotação Esgotada

20 - Faluja

21 - Canções do Filho

22 - Rimbaudices

23 - Dezoito Brumário de Artur Rimbaud

24 - Deslumbramentos

25 - Neoliberal Postudo

26 - Poema Para Moacy Cirne

27 - Viver Sem Receita

28 - Shakespearíaco

29 - deuses do Gueto

30 - Cantiga Para Cassiano Nunes

31 - Quintana

32 - Quintana

33 - Quintana

34 - Quintana

31 - Ode ao Verso Livre

...

Apresentação



Mário de Andrade é uma fonte de inspiração à qual eu gosto muito de recorrer. Ele diz num determinado trecho do Prefácio Interessantíssimo que apresentação, prefácio, notas introdutórias, enfim, essas coisas de dar satisfações a que veio, são inúteis para quem nos despreza e desnecessárias para quem nos ama, ou algo assim.

Meu objetivo aqui não vai nessas direções. Não dou satisfações a quem despreza as diferenças nem preciso fazer preleções a quem as quer bem. Digo isto porque sempre marchei sozinho, sempre sem medo de aonde vai dar e no quê.

Minhas experiências com a escrita vêm desde a adolescência, quando da realização das festas juninas de 1967 em que meu pai pegou meu "Livro de Versos", apenas um caderno do MEC doado nas campanhas de alfabetização daquele período, e, acendendo o isqueiro do Vovó fumar, transformou-o numa tocha para pôr fogo na fogueira, não me lembro se de São João ou São Pedro, aos berros de " poesia é coisa de marica! " Lembro-me que no dia seguinte eu fui revirar as cinzas acreditando encontrar algum fragmento de poema que me ajudasse a reescrever alguma coisa. Inútil! Desde então trago comigo a noção de " estar só " naquilo que faço. Isso poderia ser um ponto de fraqueza para quase todos, mas aprendi a fazer disso a minha força: Não sei contar com ninguém, na hora do " pega-pra-capar ". Por isso, esta seleta de poemas eu a faço sem buscar apoio de ombros amigos, seja na escolha, seja na ordem dos poemas. E tudo que desejo registrar é que constitui-se de poemas bem divulgados, bem aceitos na nossa imprensa literária, a imprensa alternativa, hoje fortalecida pela internet, com seu mundo fantástico de sites, páginas e blogs.

Espero que quem os leia veja um pouco do meu trabalho, aqui representado por versos livres, sem nenhum poema minimalista, nem poemas-piadas, nem haicais, Nem trovas, nenhum soneto, sequer um poetrix. Apenas versos livres na sua expressão mais prosaica, mais solta, distante das formas fixas, modalidade na qual eu creio me mexer bem. Afinal, ser incluído em livros pela UFF - Universidade Federal Fluminense, ser editado em sites como o Jornal de Poesia, criado e dirigido pelo distinto Soares Feitosa, ou no Momento Litero Cultural, hoje tornado site pelo ilustríssimo Selmo Vasconcellos ou ainda figurar na ESCRITABLOG, do caríssimo Wladir Nader, não creio ser algo pouco significativo. E, com o devido respeito a quem gosta de tapinha nos ombros, eu não bajulei ninguém, não troquei favores, até porque não possuo nada trocável. Já cheguei a quinto lugar em diversos concursos, mas não me ressinto em injustiças e dou-me por satisfeito com os resultados até aqui. Mas de agora em diante, tudo muda.



***


FLORÃO DA AMÉRICA



O menino era pivete

E se chamava Joãozinho

Vivia como engraxate

Ganhando a vida por aí

Sem deus e sem diabo pra atentar



Foi estuprado por um maníaco

E encontrado morto na Lapa

Dentro de um latão de lixo



Não foi homenageado

Com honrarias militares

Nem imortalizado

Num samba de carnaval



Morreu e está morto

Morto, bem morto mesmo

Morto até na memória



O menino que era pivete

E se chamava Joãozinho

Que vivia como engraxate

Ganhando a vida por aí

Sem voz sem vez

E sem lugar na HISTÓRIA

*


POETA DE PERIFERIA



Nunca tirei um sarro

Nos bancos do Central Park

Nem aos pés da Estátua da Liberdade

Sequer algum dia

Imitei Hugh Grant

Trocando boquete

Com alguma Divine

Nos arredores de Los Angeles

Jamais mijei no Rio Hudson

Do vão central da Ponte do Brooklin

E nunca achei graça nenhuma

Em comer pipoca com bacon

No trem fantasma da Disney World

Tampouco nunca peguei um breack-fest

Em alguma lanchonete da Wall Street



Mas ninguém se assuste

Com o meu desdém debochado

Pelas coisas suntuosas

Desse mundo consumista

É que eu me sinto muito bem

Junto aos pés-de-cana

Dos butiquins pés sujos

Desses guetos suburbanos

Onde levo minha vida

De poeta proletário.

*


BRECHT SOB O CÉU DE BERLIM


Olhem para mim, vejam bem!

Eu estou aflito.

Não concebo ficar quieto

Diante da situação.

Se o tempo estiver bom,

Eu saio à rua a passear.

Se não estiver eu saio também.

Não dá pra ficar neutro.

Olhem para o tempo.

Como estão as nuvens?

Claras ou turvas?

Ou não há nuvens?

Chove e faz frio

Ou o calor é intenso?

Não importa!

Conforme a temperatura

Eu respondo à altura.

Não quero saber

Se são nuvens de tnt

Ou se neve suave de amanhecer.

Meus pés caminham...


*


LADEIRA SAINT ROMAIN



A Ladeira Saint Romain

Tem muita história a contar,

Mas a Ladeira Saint Romain

Não quer censura em sua história.



A Ladeira Saint Romain

Precisa de alguém que diga

Sua história com o Pasquim,

Mas que seja enquanto viva.



Pois a Ladeira Saint Romain

Não quer deixar sua história

Pra depois que ela morrer.



A Ladeira Saint Romain

Viu muita gente subir,

Mas não viu tanta gente descer.


*


ME DISSERAM



Eu menino me disseram

Que eu era HOMEM

Com todas as letras maiúsculas

Que eu teria uma mulher

Com a qual me casaria

E seríamos felizes para sempre



Porém eu descobri o AMOR e a LIBERDADE

E percebi que o amor é solteiro

E a liberdade não se casa com ninguém



Em seguida me disseram

Que todos tinham religião

E me venderam um deus

Que eu seguiria para sempre



Porém eu percebi

Que havia muitos templos

Tantas tendas onde comprar-se um deus

Que eu desisti

E fui tachado de ateu

Depois me disseram

Que todos tinham ideologia

E me venderam um partido

No qual eu ingressaria

E S P O N TA N E A M E N T E

E a ele serviria enquanto eu quisesse



Tornei-me então violento ativista

Mas constatei que todos tinham que ser iguais

E que o ser a si próprio era impossível



Até que um dia me avisaram

Que eu estava fora do partido

E que eu não era comunista



Desde então venho notando

Que todas as coisas têm um preço

E eu não posso comprar nada

Do que me querem vender

E ainda assim

o SHOW BUSSINESS

não quer deixar-me em paz

por onde quer que eu passo.



Como é possível

Numa mesma praça

De um lado um religioso

Fantasiado de cristo

Nos oferecendo a paz celestial

E do outro

Um comício eleitoral

Nos oferecendo um Strip-tease

Em troca de voto?

Agora restou-me a pecha:

Disseram que eu sou

ANARQUISTA.


*


LIÇÕES DE TEMPO



Houve um tempo

Não muito remoto

Em que me preocupei

Com a velhice

E até me programei

Pra fazê-la agradável,

Como lutei fiz planos

Formei vasta biblioteca

Pra passar o resto

Dos meus dias

Cercado de livros,

Planejei viagens

Pra conhecer a Ásia

A Europa a África

E da América

Visitar pelo menos

Machu Pichu.

Eu queria ser um

devorador de distâncias

guloso qual um marujo

pirata dos mares revoltos,

mas eu não sabia que o tempo passa

e que alguns copos de vinho

deixam a gente assim serelepe.

*


SOLILÓQUIO DE INVERNO



TUDO ANDA TURVO

Cigarras silentes

Arbustos estáticos

Há muito não noto

Formigas nervosas no seu ir e vir

Nem os grilos silvam mais


TUDO ANDA TURVO

Sapos aposentando pilões

Não sei mais dos agouros da côa

E o Bentivi não mais

Dedura ninguém

Os cães nem ladram mais

Nas noites frias

Não mais há bêbados

Cambaleando as calçadas

Rumo ao incerto caminho de casa


TUDO ANDA TURVO

Não mais se ouvem amigos

Falando alto na esquina

Contando histórias de amores furtivos

E mijando a saideira

Tomada agora há pouco


TUDO ANDA TURVO

E não basta dizer

Que tudo anda turvo

A manhã vem irrompendo

E Netuno acaba de soltar os ventos

E Vênus balança os cachos

Rindo-se de mim

Com seu sorriso de ninfa.


*


COGITAÇÃO


(Ao Poeta e Amigo Pedro Giusti)



Pense

Pense

&

Escreve

Se não puder sussurrar

Pense

Pense

&

Sussurre

Se não puder falar

Pense

Pense

&

Fale

Se não puder gritar.


*


INSTINTO PRIMITIVO



Foi assim

Sem mais

Nem menos

Me aproximei dela

E senti um odor diferente

Odor de terra molhada

Algo natural mesmo

Lhe cumprimentei

E senti todo meu corpo crispar-se

Ela notou e disse

Vem cá

E fomos de mãos dadas

Olhos nos olhos

Assim

Sem mais

nem menos

*

POLÍTICA ANTI - LITERÁRIA


O poeta ingênuo sai no pau com o crítico literário

Pra ver qual deles é capaz de regenerar

O poeta oportunista



Enquanto isso o poeta revolucionário

Panfleta nas favelas

O seu sonho visionário



E o poeta maior

O poeta menor

E o dito marginal

Fazem bolotinhas

Com meleca do nariz...


*


DO POBRRE ARLEQUIM





Nasci no sopé das montanhas

Lá onde terminam os bosques

E as florestas se adensam.

Bem cedo aprendi a brincar

Com os habitantes desse mundo

Onde reinam Sacis e Iaras.



Ainda menino fui pras cidades

Sem seio de mãe nem ombro de pai

Órfão de noite e de dia.



Segui sempre o sem-fim dos caminhos

E a poeira das estradas

Tingiu de vermelho os meus sonhos.

E o ronco do motor dos caminhões

É que ninou a soneca do menino

À sombra dos arbustos solidários.



Meu prato requentado e rápido

Eu soube sempre o seu sabor de sal

Temperado de relento e sol.



Na cidade sou um peixe fora d'água

E vez por outra ponho-me frente aos bares

Perscrutando por que essa gente bebe tanto.



O meu amor não sabe o pranto

Tão fartas comigo foram as mulheres francas

Em darem-se inteiras e detalhes tantos.



Não prometo ser algum dia um gentleman

Mas eu não mijo calçada a fora

Após uns chopes com steinhägen.


*


LIRA DOS QUIZE ANOS



Oh que alívio que eu tenho

Daqueles colegas de infância

Com seus mundos cor-de-rosa,

Heróis de história em quadrinho,

Coca-cola, chiclete, carmanguia,

Lencinhos perfumados, documentos,

Sem sombra de movimentos

Que os anos não trazem mais.



Como eram frios os versos

Profundamente românticos!

Mas contra os versos

Profundamente românticos

A alma dos versos meus

É francamente livre

E cospe na cara do eu-lírico

Que caça borboletas azuis.



Oh que alegrias que eu trago

Das minhas gazetas da infância,

Daquelas tardes jongueiras

À sombra dos oitiseiros

Entre o Largo da Carioca

E o tabuleiro da Baiana

Com tudo quanto é quitute,

Cuscuz, cocada, quindins

E os chamegos da mulata.



Oh que saudades que eu tenho

Da minha Avenida Central,

Avenida dos meus sonhos

Colhidos na Cinelândia

E comidos nos Arcos da Lapa

Por alguma linda Brigite

Com beijo gosto de menta

E seios de Marilyn Monroe.


Pobre do espírito pudico

Que nunca esbarrou com Cupido!

Jamais se esbaldou

Nas tabernas da Praça Mauá

Degustando cuba-libre

Com as nossas Bardots,

Nem trocou beijos calientes

Entre senha e contrassenha

Com alguma companheira

Aos cicios " pela revolução!"

Nas esquinas da Rio Branco.



Livre filho suburbano

Desfilava desafeto

Por meu boulevard sem Paris

Da minha Avenida Central,

Que só virou Rio Branco

Para agradar ditos-cujos,

E ria com meus olhos leigos

Da anarquia arquitetônica

Daquele casario sem eiras,

Que o Pereira "passo" extinguiu

Com um só "bota-baixo".


Naqueles tempos ruidosos

De ardente adolescência,

Papai montava a cavalo

E saía pra campear,

Mamãe brandia o chicote

E o leite fervia

No fogão a lenha,

Eu era pingente de trem

E ofice-boy da Light

E Che Guevara era bandeira

Nas barricadas de Paris.



Ai que saudades que eu tenho

Da Avenida Rio Branco

Como um palco a céu aberto

P'rum côro de cem mil vozes

Cantando Geraldo Vandré:

"Vem, vamos embora,

Que esperar não é saber,

Quem sabe faz a hora,

Não espera acontecer."


Mas "saudades" que eu sinto,

"Saudades" que me doem fundo mesmo

São da Avenida Rio Branco

Na Passeata dos Cem Mil

No auge dos meus quinze anos,

Daquela gente bronzeada

Mostrando tanto valor

Só pra mudar o Brasil,



Dos " bailes" que eu dei nos "ome"

Na Biblioteca Nacional

Com o saco de bola-de-gude,

Do Wladimir trepado no poste

Gritando "Abaixo a Ditadura!"

Alheio ao gás lacrimogênio,

Das balas com endereço certo

E o sangue correndo solto.....

................................................

São "saudades" que a palavra

Lhes recusa a assinatura,

Coisas muito duras para esquecer

Como diz o Rei Roberto,

Mas me fazem muito bem

Que os anos não tragam mais.



Por isso eu sigo cantando

"Caminhando" com Vandré:

" Vem, vamos embora,

Que esperar não é saber,

Quem sabe faz a hora,

Não espera acontecer."


*


CINZA WIM WENDERS


O céu turvo de Berlim

Lembra lona de circo velho,

Onde nossos avós nos levavam

Para vermos aquele palhaço

De há muito nosso conhecido.



Seus prédios cinzas,

De um cinza há muito conhecido,

Soltam o reboco feito animais

Que de tempos em tempos

Mudam de pele.



Suas árvores, em eterno outono,

Sem folhas pelo chão...

Suas cores, não sei como, jazem

Sob esse cinza perene

À espera da plena primavera...


*


CANÇÃO DO PRETO INÁCIO



Nasci nos caminhos de dentro,

Que ligam Minas Gerais à Bahia,

Ali pelas imediações do Suassuí,

Lugar de muita casa grande

E senzala mais ainda.



De início éramos todos lavradores,

Gente de lida que os senhores arrebanham

Com ajuda dos bate-paus,

Ora pegos em quilombos

Ora arrematados em leilões

Feitos pelos negreiros à beira dos cais.



Mas de tempos em tempos

Alguém saía de trouxa nas costas

Pendurada no pau de dois bicos,

Como fez o Preto Inácio

Que nunca mais deu sinal.


Quando fugia, dizia-se

Que fez poeira;

Quando saía por conta própria

Dizia-se que foi pra vida;

E, quando era posto pra fora,

Buchichava-se à boca miúda:

Foi vender puáia,

Que era como tratavam

esses pretos velhos

vendedores de raízes

nas feiras da cidade.



Entre uma e outra leva

Dessa gente que partia

Fui aprendendo com a vida

Lição por lição de partida

E assim que peguei tope

Aprontei meu pau de dois bicos

E fiz poeira,

Fui pra vida

Vender puaia.

*


CANTO A ILU-AYÊ



Negro é raiz da liberdade

Mais forte que qualquer outra

E faz nosso povo se unir

Hoje muito mais que outrora.

Porém, os chacais que o rondam

Ainda encontram lacaios

Contra o nosso porvir,

Pois quem nasceu para Judas

Não se cansa de trair.



Ilu-ayê tem o sorriso negro

Pra fortalecer meus irmãos

E regar a flor da resistência

Desde a grimpa dos morros

Até à vereda mais úmida

Em prontidão na tocaia

Para emboscar bate-estradas

E avisar aos capatazes

Que quem brinca com corda

acaba dependurado.


Ilu-ayê tem o abraço negro

Pra fortificar os quilombos

E multidões de Zumbis

Com suas bandeiras erguidas

Pra celebrar nosso Rei,

Que deu seu sangue por nós

E merece glória eterna.



Ao cismar sozinho relembro

Que todo instante da vida

É sempre vinte de novembro

Com a dignidade iluminada

E o espírito pleno de axé.



Pois nossa pele tem mais sol,

Nosso céu tem mais luar,

Nosso povo tem mais força

Quanto mais doar amor.



Não permita Deus que eu morra

Sem que ainda faça um poema

Digno da beleza negra,

Com maior engenho e arte,

Que exalte Rainha Dandara,

Zumbi e Solano Trindade

Com uma imensa quizomba

Para alegrar nossa raça

E cantar pra Ilu-ayê!

*


DELÍRIOS DE PROMETEU


Acossado por despautérios,

As Tróias do presente

E as Cartagos do futuro

Obrigam-me a transpor muros

Da epopéia de quimeras

E prever que qualquer dia

Serei mito de ficção.



Algo ímpar na literatura universal,

Maior que Sherazad,

Maior que Dom Quixote,

Mais forte que os Três Mosqueteiros,

Mais valente que Robin Hood,

Mais sortudo que Robinson Cruzoé

Com Segunda Feira e tudo.



Desses que viram objeto de estudo,

Mais que Joyce e Ezra Pound

E dão pesadelo em curiosos,

São temas de teses acadêmicas

E motivo de congressos mundiais

Com reunião de exegetas renomados,

Cada qual com seu aporte

Sobre o pobrezinho aqui.


E o maior frisson

É o momento culminante

Em que todos vão à práxis

Acomodados em mesa redonda

Para provarem seus enfoques,

Quando enfim sou dissecado

Letrinha por letrinha

Até à exaustão,



Inclusive com preleção

De Leonardo da Vinci

E sua aula de anatomia.



Depois, todos partem felizes,

Com ares de dever cumprido,

Enquanto eu pairo sobre tudo

Alheio ao suor derramado,

À adrenalina gasta

E ao fosfato queimado,

Todo senhor de mim,

Dono do meu ser ficcional

Infinitamente inexaurível,

Como bem apraz à obra prima!


*


CANÇÃO DOS GUETOS





YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD.



Guetos de Roma

Hanói, Formosa

Pequi, ou de la Habana Vieja

Y sus "desintegrados"



YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD.



Guetos londrinos

Bem à margem do Buckingham

Guetos germânicos

De Bonn ou Berlim

Divididos em "Òssis e Véssis"

Cada um velando

em seu umbigo

o ovo da serpente

MADE IN GERMANY



YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD.


Guetos da Bolívia

E seus índios "cocaleros"

Da tribo Quéchua,

Guetos do Peru

E seus guerrilheiros

Sem sendeiros luminosos

Para TUPAC AMARU,

Guetos da Venezuela

E seus caracazos bolivarianos



YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD



Guetos dos guetos amarelos

Brasilverdesifilíticos

Gonorrêicos que não lhes quero

Assim do Oiapoque ao Chuí

Das palafitas ribeirinhas de Manaus

Cheias de prostitutazinhas meninas

Vendida por seus próprios pais

A caftens made in europe

Às margens das trans...amaz

Ônicas de meninos e meninas ao relento

Nas praças da república

De suas megacapitais



YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD


Guetos de São Paulo

Dos casarios miseráveis

De tábua e zinco

Das zonas norte

Desnorteadas pro

Sul leste oeste

Que apesar dos pontos cardeais

Que os atritam

Nenhum cardeal

Nos deixam em paz

Nos seus sermões dominicais



YO LOS HABLO HERMANOS

ACÁ TAMBIEN HAY APARTHEYD



Guetos do Rio de Janeiro

De tontas maravilhas

De janeiro a janeiro

E cariocas brejeiras

De cartão postal

De Chapéu Mangueira

E Pavão Pavãozinho

Vidigais e Vigários Gerais

Onde a palavra FAVELA

Fala a língua do "bigode grosso"

Pela graça da mordaça

De tantos COMANDOS



Há que buscar uma linha

Mesmo que seja vermelha

Mesmo que seja amarela

Ainda que seja anêmica

Para juntar tantas

Rocinhas Morros das Viúvas

Ladeiras dos Adeuses

Baixadas e Jardins Catarinas

Contra tantos opressores.





Pero hermanos

Hablar no me basta

Como no me basta

Llorar los hermanos caídos

Pois para poner fin

A tanto apartheyd







HAY QUE ENSUCIARSE LAS MANOS!


*


TEMPO FÉRTIL


Não sei se Homero foi à guerra,

Mas exaltou seus heróis

Que foram fazer fortuna.



Camões eu sei que foi

E cantou em verso e pólvora

Os crimes que cometeu.



Tem bardos compondo hinos

Por honra de seus irmãos

Mortos em alheio chão.



Não sei o que sentiriam

Se tivessem os seus lares

Invadidos por estranhos,



Mas eu digo a todos eles:

Não hastearei minha bandeira

Sobre os restos de ninguém,

Como apraz aos cães de guerra;



Não entoarei cantos de gesta

Pelas desgraças alheias,

Tão caras aos pais da usura;

Não gastarei tinta e papel

Só para matar o tempo

Ou agradar ociosos

Com coisas tão caras.



Nunca joguei porrinha

Valendo escalpe de índio

Nem minas de Vila Rica.



LOTAÇÃO ESGOTADA



Brasil cheio

De raças

De classes

De castas



Brasil rico

De prosas

De histórias

De causos



Brasil farto

De seitas

De facções

De máfias



Até o dia em que

Veremos ruir

Isso tudo

E o caos

Entorne a taça

E eu possa rir

O riso largado

Da sangria desatada

Com o potro solto no pasto

E o nosso povo altivo

Com a bandeira na mão.



FALUJA



Vou-me embora pra Faluja,

Aqui eu não sou feliz,

E vou sem Manoel Bandeira,

Pois na hora da partida

Virou porquinho da Índia.



Vou-me embora pra Faluja

E já disse porque vou.

Faluja é uma terra livre

Onde o povo não tem rei.



Vou-me embora pra Faluja,

Aqui eu não volto mais.

Faluja é terra de luz

Onde o povo faz a lei.



Vou-me embora pra Faluja,

Viver lá é uma aventura

De tal modo comovente

Que churrasco de yankee

É servido ainda quente.


Vou-me embora pra Faluja,

Vou juntar-me àquela gente

E fazer que um mundo surja

Sem choro e ranger de dente.


Vou-me embora pra Faluja,

E encerrar a ladainha

Senão eu não chego lá

Nem saio desta terrinha...



Vou-me embora pra Faluja,

Lá sou inimigo do rei

E minha maior diversão

É combater a opressão.


*


CANÇÕES DO FILHO

Parte I

Na minha genealogia

Tem um Pataxó destribalizado

E uma negra Haussa evadida,

Restolhos das "Entradas

E Bandeiras," por parte de mãe.



Ambos foram caçados

Por um bandeirante

E seus bate-paus,

Por parte de pai.



Nesta terra de Caminha

Que em se plantando tudo dá,

A escravidão sexual

Vira miscigenação

E ganha status em canção

De muito filho bastardo.



Muitos se ufanam

De serem mestiços

E até receitam isso

Com certidões de mulatos.



Mas eu não tenho dúvida,

Não cometo suicídio de raça

Nem viro escravo de sangue.



Parte II



Chamam-te AMÉRICA

E após tomarem teu corpo

E devassá-lo milhões de loucos,

Esquartejaram-no com mil cavalos

E aonde acharam manchas do teu sangue

Batizaram com nomes eurobestiais,



Mas pra conferirem ares santos

Providenciaram as bênçãos

De certa santa madre igreja

E em cada parte violada

Cravaram aí uma espada

Simbolizando a nova fé,

À qual chamaram cruz de cristo.



Santa Mãe Terra,

Tão divina, tão ultrajada,

Teu nome são teus filhos

E tu vives em todos nós

Desde a mais antiga Era

Ao mais distante Futuro.

Como eu vivo em meus avós

E o rio na montanha,

Somos todos um só,

Santa Mãe Terra.


*


Menos teus inimigos,

Que perecerão ao relento

Sem chão sob seus pés

Nem céu sobre seus rostos,

Como os ratos, sem berço

De Mãe nem Pátria.


Parte III


Este é um país de poetas

Em sua maioria crioulos,

Que derramam no papel

Transatlânticas nostalgias

Pelas pátrias de seus pais.



Desde Bento Teixeira e Manoel Botelho

Que lançam seus tentáculos

Aos confins de suas itálias,

Ricas em leonardos dantes;

Às suas lisboas fartas

De lusidíacas iguarias das índias

E bacalhau norueguês;

Às suas Londres opacas

Túmidas de piratas da rainha;

D'espanhas e franças e holandas

De germânicas reminiscências.



Felizmente não vivo aqui

Com o umbigo além-mar,

Não sofro a mácula

Do pecado original,

Não trago em meus ombros

Pesadas montanhas

De negros e índios

Dizimados por meus pais,

Para que eu vivesse em paz.



Não canto, não toco nem faço coro

Com o coral da escravidão,

Pois eu estou em minha terra,

Terra natal eterna

Dos meus antepassados longínquos,

Dela broto e a ela volto

E me deito sem colchão

E me desfaço em seu corpo de mãe.



Parte IV



Minha terra não é "minha"

Nem é de quem diz ser dono,

Mas tem impostor assim, oh,

Que a chamam de minha terra.

Muitos dizem minha terra,

Mas com os pés em chão alheio;

Só que esses "terratenientes"

Passam o dia no formol

Pra vampirá-la de noite

Com seus versinhos biáfricos

Por uma caneca de vinho.



Mas o fazem ser saber

Que só vinho não dá verve

Pra suas poéticas esquálidas

Tirá-los de cena à francesa,

Como se fossem nababos.

E tornam careta o Brasil,

Chinfrinizam os seus milagres

E deixam os marajás tupiniquins

Morrerem comendo acarajé

Na aba do sabiá.

*


RIMBAUDICES





Não confie em ninguém

Que xingue deus e o diabo,

E, como um litle bad boy,

Queira estuprar os anjos,

Mesmo que perca a perna esquerda

E a direita perca também

E ainda morra em Marselha,

Bem à porta do oriente

Carcomido pelo câncer.





Não acredite em ninguém

Com mais de trinta dinheiros,

Com mais de trinta invernos,

Que acredite em demônios,

Que fuja para a Abissínia

E contrabandeie armas

E ainda trafique escravos

E em sua hora final

Chame por seu Djami.*¹

Não confie em ninguém

Que levou tiro de Verlaine

E o colocou atrás das grades

E ainda fugiu para Roche

E, após uma Une Saisson em Enfern,

Mandou a Paul Demany

A Lettre Du Voyant,

Escreveu Iluminations

Sem dúvida bem além

Dos Paradises artificiales

De Monsieur Baudelaire,

Regado a muito haschisch.



Não confie em ninguém

Que nasceu gênio precoce,

Seja filho de gendarme,

Freqüente o CABARET VERT

E zombe de pátria e família

E vague noite a dentro no váquo

Como o Spleen de Paris.

Não confie em ninguém

Que sofra de rimbaudite

E viva pagando mico

Em algum coufeé maudit.



- *1 : Djami é o nome do mordomo de Rimbaud.

*


DEZOITO BRUMÁRIO DE ARHUR RIMBAUD



Tenho apenas vinte anos

A mais que Artur Rimbaud

E nem um segundo no inferno.



Nunca provei a taça da amargura

Nem quebrei a cara na Abissínia

Ou cheguei em casa perneta.



Jamais reneguei meus pais

Nem minha querida Jampruca

Por suas vidas pacatas.



E o fato de mochilar por aí

Não tornou-me um andarilho

Nem me fará urbanóide.



Sair da casa paterna, pra mim,

É o mesmo que ir ao trabalho

Ou à horta colher alfaces.



Não quero fazer do mundo

Um monte das minhas cinzas,

Porque me odeio e não tenho causa.

Não sofro de " cazuzismo ",

Acusando a burguesia

Por falta de ideologia.

*

DESLUMBRAMENTO



Meu primeiro amor

Foi como beijo roubado:

Sem liberdade de escolha.

Meu primeiro amor

Começou com a chupeta

Quando Ritinha ameaçou-me

"Só te namolo se laigá pepeta!"

Meu primeiro amor

Trocou bala boca-a boca

Na Igreja de Frei Inocêncio

Bem no meio da missa

E o Padre Daniel

Mandou-me rezar três Pai-Nossos

E eu rezei até mais

Para ficar bem perdoado

O pecadinho tão doce.

Meu primeiro amor

Bateu muita gazeta

Na pracinha da igreja

Só pra comer cocada

E dar beijinhos na boca

Das filhinhas-de-papai...

Meu primeiro amor

Passou nas provas

De educação sexual

Com notas de louvor,

Mas se o Grupo Escolar falasse...

Meu primeiro amor

Chupou muito ingá

Na galhada dos ingaseiros

Sobre as margens do Suassuí

Com a Dasdô do Mané Cachorro.



Meu primeiro amor

Tinha gosto de pé-de-moleque

Devorado com a gula

Do menino assustado

Com o presente da namorada

Que levantou a saia de chita

E lhe disse " mete aqui!"



Meu primeiro amor

Ficou de coração na mão

Com o bicho cabeludo

Da Maria Serafina

Nuinha na minha cama

Pra comer minha inocência,

Apesar dos avisos da mamãe

De que ela era rapariga.


*


Meu primeiro amor

Era como filme de Speelberg:

O tempo todo de suspense

E no fim sobra surpresa.

Meu primeiro amor

Nunca encontrou seu fim

Porque a poeira vermelha

Das estradas mineiras

Nos cobriu na encruzilhada

Entre o passado e o futuro

E o destino nos levou

Para distintos presentes.

*


NEOLIBERAL POSTUDO



Após a abertura

Lenta e gradual

Do General Geisel

Nos idos de 74,

Aceitei a receita

Do General Figueiredo

E empanturrei-me de democracia

Com eleição após eleição

E overdose de votos hoje

Pra curar o porre de ontem,

Nem sempre de votos.



Desde então aposentei

Meus apetrechos de guerrilha

Contra a ditadura militar,

Entre eles meu quixute

Mais veloz que bala de INA

E os arapongas do SNI

Com seus óculos Ray Ban

E cabelos James Dean,

Meus comprimidos de Redoxon

Contra gás lacrimogênio,

Minha lista de jornais

E ONGs de DH,


Minha coleção de calças jeans,

Meu Livro Vermelho de Mao Tsetung

E o trezoitão solidário

Que nunca "moscou" na hora

Quando fez-se necessário

Falar o idioma inimigo,

Além da inexorável certeza

De poder mudar o mundo

Nem que fosse a bala,



Mas a três décadas disso tudo

Não sou mais assim não,

Já não sei quem são meus inimigos,

Já não vislumbro as classes

Em que se antagonizam as pessoas

No seio da sociedade,



Não identifico mais ninguém

Como direita ou esquerda

E qualquer discurso ideologizado

Soa-me como algo anacrônico...



Enfim, tornei-me um reles

Neoliberal pós-tudo,

Sem os mínimos valores humanos

De respeito aos oprimidos

E à luta contra a opressão,

De solidariedade militante

Às minorias sociais

E aos despossuídos em geral.

Hoje, se o Tio Sam me pedisse,

Eu venderia minha própria mãe

E entregaria a alma ao diabo

Sem nenhum motivo aparente,

Porque tornei-me um neoliberal pós-tudo.


*


POEMA PARA MOACY CIRNE



Faz tanto tempo

Que não encontro alguém

Que há muito

Eu não encontrava

Alguém que me deixe assim

Alvissareiro

Como as flores e o sol

Às nove da manhã

Com o peito cheio de alegria

Pronto a dar vida às novas emoções,

Como aconteceu com o Cirne

E sua fada amante

Certo dia em Ceridó,

Que se sentiram crianças no parque

Com as façanhas que viveram

Tamanha a felicidade da dupla

Algo assim tão radiante

Que faz mister compartilhar

Fazer com que irradie

Em todo ambiente

Onde haja corações

Que buscam alguém

Digno de ser encontrado

Pelo puro prazer um do outro,

Como o vinho e os lábios

Da mulher amada.


*


VIVER SEM RECEITA


E assim foram-se vinte anos,

Vinte anos de namoro,

Após longas operações secretas

Nos hotéis da Frei Caneca

E seus corredores sinistros,

De arrepiar Hichtcock,

Com tantas fugas fantásticas

Pela Avenida Mem de Sá,

De congelar Mon Sieur Poirot

Depois de longas estadas

Nos cortiços da Gomes Freire

Durante tantos carnavais

Regados a frango assado

E muito vinho de buteco,

Muita lasanha com Black Prince

Nos bares da Cinelândia,

Filmes pornôs no Cine Íris

Só pra criar o clima,


*


Depois de muitos natais

Curtidos a dois nos quartinhos de favela

Regados a risoto de frango e Malzebeer,

Depois de muita briga besta,

Muita salada completa,

Muita "volta" recíproca,

Muita paz de beijo e abraço

Nos bancos da Cruz Vermelha,

Depois de Ana e de Edson,

Passaram-se vinte anos

Além dos cinco pregressos,

Almejo ainda mais vinte

Mas isto não é receita

Para mal sem cura...

*

SHAKESPEARÍACO



Ao tocar a sirene da fábrica

João não viu Maria sair

E bater o cartão de ponto

Às dezessete e trinta.



Às dezoito horas

João não viu Maria sair

E bater o cartão de ponto

Às dezoito e trinta

João soube pelo vigia

Que Maria fazia serão.



Às dezenove horas

João viu Maria sair

E bater o cartão de ponto

E despedir-se do amante

Com um longo beijo na boca.

João perdeu a linha,

Bebeu a noite inteira,

Chegou em casa de manhã

E matou Maria

Com um tiro na cabeça,

Depois saiu dançando rua afora

Tocando Carinhoso

Em sua flauta de bambu

E nunca mais foi visto.


*


DEUSES DO GUETO


Na topografia do caos

Veias são avenidas

E ninguém viu

Cruzar esta via

Um calango de pedreira

Mais veloz que um tisio

Ou um guri de patins

Nas vielas da favela,

Que ostenta o status

De "aviãozinho da boca"

Mais querido no pedaço

E finda abatido em pleno vôo

Nos becos do mundaréu...

O "patrão" paga o enterro,

O jornal gera emprego,

A família sabe o troco.


*


CANTIGA PARA CASSIANO NUNES



Recebi poemas durante anos

Do Mestre Cassiano Nunes

E saía com eles pra rua,

Levava para os eventos

E lia para os amigos,

Nas rodas e recitais

E quando soube da sua morte

Fiquei desconsolado, e agora (?),

Pensei, mas certo de não ter resposta,

Segui de boca seca.

Senti por não fazer acervo

De tantos poemas que recebi,

Mas me desfiz deles após

Lê-los para o meu público

E publicá-los em meus fanzines.

E a falta que sinto agora

Seja dos poemas ou do poeta

É a satisfação que vai comigo

Pelos destinos que lhes dei

Enquanto eles se foram

Para outras vidas e outras formas.

Mas quando alguém perguntava

Após a leitura de um poema

Quem é Cassiano Nunes,

Eu respondia todo enrolado:

É um paulista de São Vicente,

foi a Brasília fazer carreira

E nunca mais saiu de lá.


*


QUATO POEMAS A MÁRIO QUINTANA


1 - PARAISO QUINTANA


Dizem os abduzidos

Que ao chegar no Paraíso,

Tão bestunta quanto sempre,

Mário Quintana estacou,

Pregou na nuvenzinha

Que lhe servia de tapete

E ficou abestalhado

Com tanta beleza,

Tanta alegria, tanta paz,

Que até esqueceu de sair do lugar,

Sem dar um Passo sequer

E que um anjo louro,

Louro louro muito louro,

Aterrissou a seu lado

Pegando-o pela mão,

E saíram voando, voando,

De início a meia altura

Para logo em seguida,

Seguros de vôos mais altos,

Estenderem as asas

E ganharem outros ventos...


*


Coisas de abduzidos...

E dizem que Mário Quintana

Pensou em perguntar ao anjo

Que parque era aquele,

Lá embaixo, bem ao centro

De todo aquele Paraíso,

Mas como fosse um anjo

Leitor de pensamentos,

Foi logo explicando

Que era o Parque Mário Quintana,

Onde crianças e poetas

Se exercitam nos versos

Bem aos olhos das musas,

Que as suas lhe aguardavam ansiosas

Para ouvirem os versos seus.


*


E ao notar insegurança

Nos olhos tímidos do poeta

Pensando em Bruna Lombardi,

O anjo se adiantou dizendo

Que ela enviara todas suas semelhantes

Enquanto se desvencilhava

De seus encantos terrenos.

Segundo os abduzidos,

Quintana vive cercado

De musas e discípulos,

Exercitando seus encantos

Lá nos palcos do Paraíso,

Bem alheios à realidade.

Mas

Quem

Diz

São os

Abduzidos!

*


2 - QUINTAN'ESSÊNCIAS


Não consigo imaginar

Quintana chorando,

Cortando soluços sentidos

A não ser lágrimas

De extrema alegria

Para lavarem as faces

Queimadas pelo arco-íris,

Pois a palavra Quintana

Sugere criança brincando,

Alheia a tudo,

Imune a qualquer risco

Longe desta vida,



De direitos e deveres,

De ordens e obediências,

Reduzidas a números e papéis,

Aliás, como Quintana sempre quis.


*


3 - GRAVATA DE QUINTANA


Quintana empaca meu verso,

Mas eu puxo-lhe a gravata

E ele ri seu risinho besta

Cheio de desdém

Pelas coisas deste mundo,

E sem largar a desgraça do cigarro.



Intimo-o a não rir de mim,

Mas sem dar-me nenhuma atenção

Mantem-se concentrado em seu vinho

Sem descuidar com o olhar

Atento para surpresas

Que eu possa aprontar-lhe,

Até que desata a rir mais ainda

E desfaz-se o nosso entrevero,

Como se defraudasse

A bandeira colorida

Dos seus sonhos infantis.


*


Mas novamente puxo-lhe a gravata

E não mais encontro Quintana,

Só o vaquo da mesa vazia,

O salão da adega em silencia

E o jornal à minha frente

Com a notícia repentina...



Quintana decola

Do aeroporto moinho de ventos

Rumo ao seu mundo de estrelas,

Onde pretende esquecer de tudo

E passar o resto da eternidade

Puxando perna de grilo

E beijando brunas lombardes.





*

4 - QUINTANA







Mário Quintana

Partiu

De Porto Alegre

Para Porto Feliz

E foi-se

Sem dizer adeus

Rumo ao Reino de Deus

Esquecido de nós

De vez

Sem mandar notícias

Jamais

Ou seria um deus-nos-acuda

Com tantas Babis, Babys

E Brunas Lombardes

Em êxtase.



*

ODE AO VERSO LIVRE







No princípio a poesia era uma canção regada a vinho

Ao som de harpas tocadas com carinhos e beijos de mulher amada

À sombra de uma palmeira frondosa

Onde o poeta-filósofo se deleitava com a vida sem fronteiras

E ela brincava solta pelos bosques entre duendes

Indiferente ao tempo acariciando a sua nudez

Coberta de inocência,



Depois, veio a escrita e de palavra em palavra

Foi vergando-a sob o rigor do verso

Moldando-a à disciplina da métrica

E aprisionando-a à liberdade

Que lhe permite esta margem de papel,



E agora ela atravessa as grades das gramáticas

Sobrevoa o muro das linguagens

E vem sondar-me

No ondular dos cabelos desta mulher que passa...

*

New Wave

Branco, festejar de cores.
Paz!
Uma nova vida,
Uma nova esperança
E, a herança de Deus entre a confraternização dos homens.
Valores de decência,
Virtudes,
Fé,
Esperança.
Respeito,
Crescem dia a dia nos livros dos escritores,
Mas, os verdadeiros autores,
Se misturam a "fé errônea" com a "Fé Verdadeira",
E descrêem em si próprios.
Hoje, uma vida se inicia,
A carência é grande,
Mas, encontrar amor por onde for.
Caminhos que irão muitas vezes apresentar obstáculos,
Mas, que ao chegarmos no final,
Veremos que Deus foi nosso guia,
Pois a todos derrubamos.

Manuscrita em 1 de janeiro de 1988 às 1h e 50min.
Na época ofertei para os amigos: Birú (in memoriam), José Geraldo de Oliveira, Wilson Roberto C dos Santos, Neide(grupo Esperança), Rita de Cássia Pereira, Maura Aparecida Cassiano, Eliton (4 anos - na época), João Marcos (meu irmão), Valdir José dos Santos Neves, Alexandre Capobianco.

Hoje ofereço a todos os leitores desse site.
E em esécial ao programa Chega Mais do dia 4 de Julho de 2024, programa
 TBT com a Super Nany


https://www.instagram.com/instituto_cris_poli/ 


https://www.sbt.com.br/ao-vivo


Para acessar copie e cole no site de busca para acessar o programa Chega Mais e o site da Super Nany


Se o Apocalipse já se tivesse cumprido, como alguns ensinam, então não começaria como que sendo uma profecia. No capítulo 1 diz, "Bem-Aventurado aquele que lê e Bem-Aventurados os que ouvem as palavras desta Profecia... Próximo está o tempo". Ele é totalmente Profecia. A base dessa Profecia é a segunda Vinda de Jesus Cristo. É dada está "Revelação" a Jesus Cristo por Deus. Jesus Cristo dá-a por meio do seu anjo a João, que a dá às sete igrejas da Ásia menor.

 

As Sete igrejas representam literalmente as igrejas daquele tempo, mas simbolicamente representam toda a história da igreja (igreja ao longo dos séculos, até ao século XXI. Depois de ver o trono de Deus, começa a Profecia, no capítulo 6. Todo ele é para o futuro. Isto é não teve o seu cumprimento.

 

Sendo assim encontramos a vinda de Jesus Cristo, que vem vencer uma Besta, (que não veio ainda, em tempo algum) mas que virá. Pois esta besta é um verdadeiro líder satânico, que governa o Mundo, em certo tempo. O governo do anticristo será de sete anos. Em algum tempo destes sete anos, dar-se- á a primeira ressurreição dos crentes, assim como um arrebatamento dos crentes vivos.

 

Depois vem Jesus Cristo, para destruir o reino do anticristo. Isto é o resumo do Apocalipse. Para um futuro, certamente muito próximo de nós. Sabemos isto, pelos sinais que já se veem.

Sei que com o passar dos anos,
cada vez estou mais velho
e vou envelhecer muito mais.
Sei também!
que na minha pele vão surgir rugas,
mas peço por tudo a Deus,
que não deixe o meu coração,
nunca ser indiferente ao amor,
e que eu jamais perca o dom!
de demonstrar fofura,
e ter um gesto de carinho ou de ternura...

Luzerna.13.11.2020, Joao Neves

Longe de ti minha terra,
penso-te a cada momento,
Jamais esqueci as tuas ruas apertadas,
naquele tempo que eram ruas mal iluminadas.
Longe de ti, chorei lágrimas amargas,
choradas em silêncio e desgosto.
Lembro tuas ruas enfeitadas no mês de Agosto,
com o passar da tua Procissão,
ainda hoje são imagens guardadas no meu coração.
De tenra idade, choraste a minha partida,
parti de ai a caminho de outra vida.
As ruas ficaram tristes, choraram por mim,
até as pedras da minha calçada mudaram de cor,
de tantas lágrimas, tristeza e dor.
Sou filho da terra, sou imigrante,
num outro país, país distante.
País que abriu os braços para me alojar.
A Deus rogo a cada instante,
pra minha mãe sempre cuidar,
pra que todos os anos a poça abraçar,
Passam anos, e ela na espera de me ver voltar,
mãe peça ao tempo, tempo e espere por mim,
tudo o que eu quero só Deus sabe,
Antes que a minha vida acabe.
e seu coração transborde amor
não importa que os seus cabelos mudem de cor,
quero-os com minhas mãos afagar,
e esse seu lindo rosto poder beijar...

Luzerna, 03.01.2017, João Neves





                                                                    ANJOS DE DEUS 






                                         Tantos anos passando pelo deserto,
                                         Tanto tempo horando a ti em segreto.
                                         No dia que o Senhor, me fez um conserto
                                         teus anjos me mostravam o céu aberto.

                                         Era uma visão de semblantes radiantes.
                                         Temia na presença do onipotente.
                                         Vi espadas quebrando correntes,
                                         anjos libertando gente que se arrepende.

                                         Eu que lutava entre lobos e feras 
                                         Nesta terra de homens de guerra,
                                         Quase vencido pela megera.

                                         Entre o fogo e carros de guerra,
                                         vi anjos vencendo as batalhas
                                         E eu, ganhando almas na terra.




                        autor Geraldo Magela Da Silva São João Del Rei mg  30/04/2020
       Assombrados que viviam os moradores do Batalhão com a estória da mulher que virava porca nas noites de lua cheia, contam que, quando as luzes da usina se apagavam, às dez horas da noite, uma visagem, uma assombração, alma penada, coisa do outro mundo, talvez, ficava vagando da estação ferroviária até o pontilhão do Clarindo.
       Era de jeito que ninguém mais saía de casa só de medo de dá de frente com aquela visagem. Diziam até que se tratava da besta-fera que, segundo as santas Escrituras, iria correr pelo mundo a fora sem descanso no final dos tempos, que tinha sido solta pelo “dito cujo”, lá das profundezas do inferno, para devorar os cristãos batizados.
      Naquele tempo, poucas eram casas da cidade que tinham um televisor COLORADO RQ - símbolo de riqueza, luxo e mordomia. Nosso tio Domingos Padeiro (que Deus já o levara do nosso meio) era um dos poucos homens ricos da cidade que abria as portas do seu bangalô para os desafeiçoados assistirem televisão e, por este motivo, todas as noites costumávamos nos deslocar de nosso humilde lar na Rua São Benedito até a residência dele na rua São José.
      Enquanto os adultos conversavam dentro da casa, lá fora, na rua, sob a lua cheia, brincávamos de roda, ciranda, cirandinha, balacondê, de pera-uva-maçã-salada mista, de boca-de forno e demavé de si e nem percebemos que as luzes da usina do Seu Cleofas haviam se apagado.
       De dentro da casa uma voz materna nos avisava de que já era chegada a hora de irmos embora. Descemos, então, pela Rua São José. Os grânulos de areia pareciam brilhantes refletindo a luz do plenilúnio devasso e sedutor que se debruçava sob o céu límpido e transparente numa orgia inefável e concupiscente.  As casas dormiam embaladas por uma canção etérea que a brisa tênue da noite cantarolava sob a regência do luar bêbedo e sonolento se espreguiçando nas nuvens.
       Todo esse cenário de encanto e magia foi, aos poucos, dando lugar a uma escuridão profunda e tenebrosa dos mangueirais que cobriam a residência daquela figura esquálida e nojenta do lobisomem que havia corrido atrás do Rocha.
       Finalmente, chegamos aos trilhos já com o coração saindo pela boca de tanto medo e para piorar ainda mais aquele quadro de terror, meu jesuscristinho, a mulher de branco, a alma penada, a coisa do outro mundo, a besta-fera. A mensageira do maldito descia pelos trilhos na direção do Clarindo.
       Por um bom tempo, ficamos parados e sem movimentos. Fizemos, várias vezes, o pelo sinal da santa cruz naquela devoção piegas e ingênua que costuma se manifestar sempre nas horas de angústia e medo, acompanhada dos rogos e das invocações ao nosso anjo da guarda, implorando que ele nos protegesse das garras aduncas e afiadas da besta do Apocalipse.
       De repente, Jorginho, menino traquinas (que se acha na glória do Pai), sem titubear, decidiu seguir o fantasma da mulher de branco.
       Acompanhei-o. À medida que íamos nos aproximando do pontilhão, ouvíamos arfados e gemidos que não eram de dor, mas de prazer. Devagarzinho, fomos encostando e em meio à luz fosca e sem brilho do luar macilento, alcoviteiro e conivente que cochilava entre as nuvens, pudemos avistar dois corpos que, avidamente, se lambuzavam feitos animais famintos e vorazes, rolando no cimento frio e cúpido do pontilhão.  
       Diante daquela cena sobrenatural, Jorginho não hesitou. Jogou o facho de luz da lanterna naquela coisa do outro mundo e que, ali, debaixo do pontilhão do Clarindo, se enroscava pelo chão que nem dois bichos no cio e, para a nossa surpresa (valha-nos Deus!), saltou, na nossa frente, uma muleca fogosa, aparentando de 13 para 14 anos de idade, nua como tinha vindo ao mundo, fungando que nem um bicho enfezado e deixando à amostra os grossos lábios de farta vulva que começava a se cobrir com uma espessa babugem de pelos e de onde dava pra ver escorrendo, entre as pernas, um líquido esbranquiçado e viscoso que se assemelhava a leite derramado.
       Após aquela noite, a mulher de branco nunca mais foi vista e houve até quem dissesse que foram graças às missas encomendadas e as orações feitas em intenção daquela pobre alma penada, condenada a vagar pelo mundo em remissão dos pecados cometidos em vida.
       Anos mais tarde, todo mundo ficou sabendo que a mulher de branco era uma muleca sapeca, moradora do bairro, vizinha nossa, morena, magra, voz díssona e estrídula, cheia de aleivosia e sensualidade e que costumava se encontrar todas as noites com um velho e conhecido magarefe dos Altos de João de Paiva e que tinha a fama de ser mulherengo e a pecha de  desencaminhador de donzelas desvalidas e que costumava atacar suas presas bem naquela horinha em que toda a sensibilidade e reinações da carne surgem à flor da pele, deixando as fêmeas inseguras, desprotegidas e sem defesa ao ataque e às investidas do macho sedutor.




              Milton, pé de forró e puxador de fole, percorria toda a vizinhança desde as Mangabeiras até às Barras do Gameleira tocando em festas e matinês. Sujeitinho do tipo franzino, canelas de seriema. 
       Era tal qual um sibito. A voz estrídula e desafinada se contrapunha a habilidade dos dedos finos e magricelas no acordeão de oito baixos que o pai lhe presenteara quando Milton ainda era criança tamanho fosse o talento do capetinha no manejo da sanfona.
      A fama de Milton logo se espalhou por toda a redondeza. Não demorou muito para correr o boato de que o sanfoneiro Milton tocava em duas festas ao mesmo tempo. Tal era a fama do Milton que curiosos de todos os cantos dos Altos de João de Paiva vinham para o São Joaquim só pra ver o Milton tocar o fole. Alarmados com o que viam e ouviam não tinham dúvida: tamanha habilidade no manejo do acordeão só podia mesmo ser coisa do cabrunco com quem o Milton, segundo as más línguas, tinha feito um pacto de sangue. 
       Certo dia, Venancim, caixeiro viajante e tomador de pinga, resolveu tirar essa história a limpo. De passagem pela Canabrava dos Delmiros e do São Pedro dos Fortes, se juntou aos colegas Ciço Badoso e Pedro Fortes e foram ao Jatobá ver o cumpade Milton que naquela noite tocava por lá.  
       Chegando ao local do adjunto, os três resolveram confirmar se era mesmo o 'cumpade' Milton quem estava animando a festa. Os três pés-de-valsa entraram no salão, cumprimentaram o tocador e até pediram pra Milton tocar o forró a ema gemeu no tronco do juremá e só depois disso resolveram descer lá pras bandas das Mangabeiras onde outro arrasta-pé rolava solto.
        Ao se aproximarem do lugarejo, de   longe, viram o terreiro apinhado de gente bebendo, fumando e conversando enquanto, lá dentro do barracão de palha, lotado de dançarinos, o fole gemia num soluço bem parecido com a tocada do 'cumpade' Milton. 
       Porquanto estranhassem bastante aquela batida e como já viviam cismados com a história do 'empautamento', resolveram tirar as provas dos noves. Entraram no salão e, quando viram que o Milton estava tocando, ficaram acabrunhados e os três pés-de-valsa, que costumavam chamar atenção de todos nos arrasta-pés da região e adjacências pela maleabilidade, malemolência, requebros e gingas corporais na arte da dança, naquela noite foram para casa se recomendar a Deus já que tinham visto e conversado com o capeta encarnado num dos tipos do sanfoneiro.
       Por muitos anos ficaram se perguntando qual daqueles entes era o Milton e qual deles era o dito cujo.
 
Comentários do autor:
      Este é um conto verossímil cujo enredo foi-me narrado pelo saudoso amigo Ciço Badoso que o conheci nas minhas andanças pelos rincões altoenses e com quem tive a grata satisfação de compartilhar saudáveis e pujantes laços de amizade. 
     Já o Pedro Fortes, latifundiário e morador da localidade São Pedro, foi um homem benquisto, conhecido, respeitado e admirado por todos os moradores do povoado São Pedro e das localidades vizinhas. Em sua residência costumava receber a todos com distinção, prestimosidade e gentileza. 

Cruzadas, Templários, Cavaleiros de Malta, Inquisição

Loucos foram os tempos e duros foram os anos

Ordens de fé costumes profanos que adulteram a religião

Em atos de crueldade de quem pode e causa danos.

Sagas da desgraça, que se mata por fé, por raça e por pavor

Por ordens cruéis, dadas por qualquer senhor da corte dos infernos

O ar queimado por gritos dos mártires, roucos de dor

Perfilam-se na agrura dos lares desfeitos por ódios paternos.

 

Instrumentos de tortura, grilhões partidos, foles ardidos

Em sinais de espera, dos cães de guerra dos mundos perdidos

No tempo das sombras, de rezas de bruxas, de padres e algozes

De nobres da corte, por vontade sua, travam na rua duelos ferozes

O tempo de caos, sacrificado e dolorido, amarga no desgosto

Em caras marcadas esgaces de horror, estampado no rosto

Peste nauseabunda em corpos frenéticos de transpiração

Das chagas da lepra, dos sorrisos imundos da decomposição

Fogueiras de corpos, gemendo gritando, para morrerem de pé

Caídos e erguidos, são queimados vivos, pelos falsos da fé.

 

Tempos que pariste homens perversos, loucos sem compaixão

Vingando na maldade e matando em nome da Santa Inquisição

E, no final, nem vencedores nem vencidos, nem honra nem glória

Apenas uma nódoa no passado, que marcou uma era da nossa história

Nascida no fanatismo da religião, que envergonhou o nome de Deus

Sinais dos tempos, que se encontrem reluzentes em alguns museus.

João Murty

O segredo da prece, verdade é
Deus condena quem
assina divisão da cruz às
costas.

Perdoa a quem dá
outrem a coça

pois que em cada qual é
sina, aprender por erro
experiência e fadiga

– vaga e extensa insolação.

Você, à volta com novena, ponha
fé na tabuada que lhe
consome, mal completa
jornada, irreal o real.

Peça nada ao santo; orçamento
de milagre, é faltar-lhe com
respeito.

Fica a cachaça ao balcão de
sonhos fins, e dos
pulmões tosse pigarro, presságio
ruim.

(você ainda à volta da tarde, noite
infinda, rouca de saudades de
menina, que é João).

Seja a sorte se não
for, nada a ver com lance
algum; crédito à mão
de vista grossa o
desjejum, benzido amor
pagão.

Há de oculto em toda prece
mentira que a gente nega.

Cicatriz da carne fraca, que
feliz guarda Araci, porque mulher
consorte de homem que
a maltrata, diz assim é
o macho

ela condiz.

Talvez passado
humano, de tempos
costume vassalo; em dia
de hoje sem
poder de prece

leão à cova ausente
a regurgitar
preceitos de bem querer:

Daniel:

– segredo da prece, não sei
decerto a alma conta;
sejam lágrimas do rosário, ou
reza de Francisca à mesa
posta

quando ainda é madrugada, e
filho quer café mais
palavra à entrevista

e hora já cadente,
deseja espaldar o
firmamento não, quer
estrelas pelo chão vir
semear.

Pressa antiga, prece nova
queira de mim seu duvidar.

Importa que
deidades mundanas ouçam
cantiga de língua morta?

Lendas que se confrontam
e desamor de quem um
dia fez-te mar?

Segredo e prece é
de avó; sequer o
Padre Nosso – cuja
grandeza é maior – se vasculha
aos cabelos seus; preceitos
quais piolhos da trama
esconde-esconde
mandinga, que a
terra parasita descorçoa

à prazo, à vista, que
diferença tem?

Quer anciã, escuta
atenta dos versos, nada
além.

Pois prece nenhuma recupera
gênio bom.

Prece perdida é
aquela feita, ingratidão.

Profanar deidades assentadas
à guisa de encosto, que de
Cafarnaum à Santa Sé
fez desgosto só

dessa fé trabalhadeira.

Pois que cuíca
de santos filha
ginga-gingante à ladeira
venha me condecorar
sorrindo.

Oremos, rezemos mundos
desdigamos enfim, anos
passados, porvir
Serafins.

Sejam preces de contas, de faz
de conta, de cor, de
sermão

bem-vindas serão todas

que segredo de prece
existe, às vezes não.

Afinal, Deus se fazer ouvir por
todas, quer saiba sua
religião, quer não

exista Deus, se desista em
vão do mistério – ateu (!)

O segredo da
prece, quem tiver o
traga à pele esfolada,
seja ou não Bartolomeu.

E prece será fé que
ditará, cantará
espanto assombro
devoção.

Da roseira, segredo
espinho que a
proteja contra
o que a per-rodeia
oração;

mistério que alma
traz consigo, e quer
batam os sinos,
direi sempre comigo

– não morreu.
Tem sido uma tarde cheia de alegria.

Orgulhosos da via do dia.

A história teve seu ponto alto,

O solstício será celebrado.


Atrás da cortina do tempo,

revisitada, cristal timbre,

guache ressecado de nós.

Faces coladas, uma mulher dança com o seu marido.

Pudera eu não ter vivido sem terem amado assim.

Fica a extensa brevidade e a cadência, 

Um amor e ódio total, irrestrito e intemporal.

Palavras soltas numa tarde de primavera, 

Invocação de uma época, lembranças da infância já selada.



1973: tempo de calar o ímpeto revolucionário na dor no peito de muitos,

1974: ansiedade de um povo antigo a resgatar a liberdade mais uma vez perdida.

Vejo o antes com uma nitidez que quase oculta o que há aqui.


Vejo lágrimas que escorrem livres pela cara de um pai.


Orgulhosa emoção que canta os heróis do mar, uma cidade que entoa liberdade.

Em plena guerra fria, no rescaldo do "orgulhosamente sós" 

Revoluçāo prof. Marcelo Caetano já superado

Antonio de Oliveira Salazar da ponte resgatado...


Fecha o Colégio João de Deus e um casal querido,

junto com outras personagens, toma uma decisão ousada.

Uma casa portuense é desbravada em Silva Tapada.

O verão é quente em setenta e cinco.

Há Portugal erguido ou foi tudo esquecido?


Uma trupe de amigos rodeia o Colégio, um brinco,
Correligionários e dissidentes,
Da esquerda radical à direita,
Anarquistas, centralistas,
Imperialistas e socialistas.
Um lote de séuios Humanistas


Famílias. Um progresso ainda não burilado.

Esforço, dedicação.

Debita-se educação como um ministério.


Um sonho foi sonhado.

Sonharam que as pessoas se aproximassem e não mais separassem.

Ousaram batalhar a realidade, oraram para que nascesse um dia.

Invocaram a luz.

O Júlio e a Maria!

Aconteceu um dia.


Esquadros do século vinte, gente que deixou a mordaça,

Portugal que avança, linha que o destino traça,

Nós mortais vamos à feira, declaramos amor à bandeira,

temos a missa das sete, e a pia batismal,

como se o caminho existisse claro

e o amanhã se levantasse para todos por igual.


Hoje é o amanhã de ontem.

Nada mais.

A guerra desenha linhas que se unem,

na convergência de todos os futuros possíveis.

Violência como fator agregador da história.

Ainda se louva a glória em combate!


Nada mais longe do motivo que nos trouxe aqui.

Celebramos os nossos filhos como altar das nossas preces.

Brisas de fraternidade enchem nossas velas,

húmidas de respeito e entreajuda.


Que o percurso das crianças seja ascendente,

que a ideia de uma grande família seja o espelho da nossa unidade.

Obrigado meus amigos  e professores que trazem competência e verdade.

Um abraço apertado a todos aos que bolinam na Nau, 

Nave de Teseus de cartas revisitada,

Que se votam todos os anos renovadas.


Olho por esta janela e vejo o sal da nossa terra,

o mastro que ainda navega neste mar encapelado,

Determinou nosso fado, senda bem definida.

Por nós todos sempre querida.


Aqui na quinta do mocho hoje nos recebeu,


A senhora diretora, a melhor que Deus nos deu,

Viverá para sempre na memória das crianças no recreio

Cantando a lembramos, o peito cheio,

Sem receio de errar, sem medo de amar.


Vamos confraternizar,

não esquecer de estudar

e nunca, nunca, olvidar o Colégio Ellen Key

que desde setenta e três

Fez sempre aquilo que fez.

Ofereceu cultura e postura.

E desde a mais tenra idade foi um portuense 

Bastião de respeito à liberdade.


Senhoras e senhores

Meninas e meninos

Ninguém duvida da força  

De porco no espeto bem bem assado.

Quem sabe o último aqui degolado, o coitado.

Bom apetite, agradecido, um sincero obrigado.


2013/palavras não proferidas/a editar





Sua técnica de guardar o coração tem algumas semelhanças com o uso atual da meditação.
Os Padres do Deserto, cristãos que se abrigaram nos desertos da Mesopotâmia, Egito, Síria e Palestina, entre os séculos III e VII, viviam como eremitas em cabanas, cavernas, árvores ou mesmo em cima de um pilar de pedra. Eles procuraram por uma vida de solidão, trabalho manual, contemplação e silêncio, com o objetivo de crescer espiritualmente. Convencidos da união íntima entre corpo, alma e espírito, os Padres do Deserto - que também poderíamos dizer que foram os primeiros terapeutas - desenvolveram recomendações para curar as “doenças da alma”. Entre essas recomendações estava a de controlar nossos pensamentos, alcançado graças a um método em particular: proteger o coração. Jean-Guilhem Xerri, um psicanalista e biólogo médico, desenvolveu esta prática , mostrando quão relevante ela é na sociedade atual.

Por que devemos controlar nossos pensamentos?
De acordo com os Padres do Deserto, pensamentos descontrolados são as origens de algumas das doenças da alma. Eles identificaram oito doenças não-psicológicas de origem espiritual, classificadas pelo monge Evagrius como: ganância de qualquer tipo, uma relação patológica com o sexo, uma relação patológica com o dinheiro, tristeza, agressividade, acedia (uma doença da alma expressa pela indiferença tédio, preguiça - precursora da indolência) vaidade e orgulho. Essas oito doenças genéricas têm uma fonte patológica: o narcisismo, que os Padres chamavam de    philautia , amor excessivo por si mesmo.

Uma das causas desses pensamentos, que eram considerados preocupantes, era a imaginação. Se uma imaginação é deixada descontrolada, ela evoca visões que às vezes sobrecarregam nossas mentes a ponto de assumir o controle. Com os piores cenários decorrentes de imagens pornográficas, elogios imerecidos ... “A imaginação nos leva a inventar histórias em nossas cabeças que nem sempre são corretas ou pacificadoras”, resume Xerri. Onde está em nosso poder controlá-los: “Se os pensamentos nos incomodam ou não, é algo além do que fazemos. Mas se eles habitam dentro de nós ou não, que eles provocam paixões ou não, é algo que está ao nosso alcance”, escreveu um dos Padres do Deserto, João Damasceno, em seu A Speech Useful for the Soul. Seremos sempre um teatro de sensações e pensamentos: a questão é: o que fazemos com isso? “Diante de tal pensamento”, lembra Xerri, “o homem tem várias possibilidades: consentir ou não, alimentá-lo ou resistir a ele”.

Para esses monges antigos, o objetivo de obter controle de seus pensamentos era alcançar o hesicasmo ; um estado caracterizado por paz, calma, descanso, silêncio e profunda solidão interior; necessário para a contemplação espiritual das coisas e seres, e a compreensão de Deus. Os Padres do Deserto prescreveram muitos métodos para conseguir isso: “guardar o coração”, sobriedade, hospitalidade e praticar meditação.

O que é "Guardando o Coração"?
Guardando o coração, na nepsis grega (vigilância), está atento a tudo que acontece em nosso coração. É um método espiritual que visa libertar o homem de pensamentos ruins ou passionais. Convida-nos a observar os pensamentos que penetram nossa alma e a discernir entre o bem e o mal. Evagrius disse: “Cuide-se, seja o guardião do seu coração e não deixe nenhum pensamento entrar sem questioná-lo.” Como Xerri aponta: “Os mais velhos notaram que os pensamentos sagrados levavam a um estado de paz, os outros a um estado conturbado. ”

O meio indispensável de guardar o coração é prestar muita atenção aos pensamentos e discernir entre aqueles que são bons e curadores, e aqueles que são uma fonte de distração ou obsessão. O objetivo é ganhar a liberdade e alcançar a indiferença, a capacidade de não ser dominado pelos nossos pensamentos.

Estava guardando o coração o antepassado da mediação?
Hoje, as ciências cognitivas estão de acordo com o diagnóstico estabelecido pelos Padres do Deserto a respeito das doenças da alma, que estão crescendo rapidamente hoje, junto com as terapias que já haviam recomendado há quase 2000 anos. É reconhecido que hoje todos nós estamos sofrendo de incontáveis ​​e contínuas demandas sem nossa atenção, e que essa tendência perturba nossa interioridade. Xerri enumera uma variedade de áreas nas quais somos muito estimulados, especialmente graças aos meios digitais: comida, bens materiais, sexo, lazer, auto-imagem, superficialidade, crítica…

Permanentemente em demanda e precisando estar disponível imediatamente, temos em média entre três ou quatro decisões a serem tomadas a cada segundo, de acordo com Xerri. Portanto, é fantasioso esperar ser capaz de controlar voluntariamente nossas decisões em toda a consciência, é simplesmente impossível. "Somos vítimas de um verdadeiro atraso em nossas habilidades de atenção", lamenta Xerri, "mas nossa atenção determina nossa relação com o mundo".

A tradição patrística e as neurociências concordam: retomar o controle de nossa atenção é um desafio fundamental para nossa saúde mental. Os Padres do Deserto recomendaram guardar o coração; a moda hoje é meditação consciente. Ambas as terapias praticam a observação do que está acontecendo ao nosso redor. A meditação, no sentido contemporâneo e não religioso, significa abrir-se à experiência presente, com atenção ao que estamos passando. Como guardar o coração, nos convida a mudar nosso modo de ser no mundo e a torná-lo um hábito a prestar atenção aos nossos pensamentos que se infiltram em nossa alma.

Uma pequena oração para ajudar a proteger seu coração
Em sua tentativa de encontrar o hesicasmo , os Padres do Deserto freqüentemente esvaziavam suas mentes e recitavam a muito simples Oração do Coração, ou Oração de Jesus . Então, se você quiser uma pequena ajuda de nossos antepassados ​​ortodoxos para poder controlar os pensamentos que atravessam nossas mentes, tente encontrar tempo na manhã para dizer esta oração antes que as exigências do dia realmente entrem em ação: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tenha misericórdia de mim, um pecador. ”(Embora“ pecador ”tenha sido adicionado ao longo dos anos.)

Traduzido do francês por Cerith Gardiner.

Ao fundo da gaveta fui buscar,
um simples pedaço de papel para recordar,
Mila, tu para mim eras um mundo,
meu amor por ti era profundo.
Os anos nunca deixaram de passar
e eu aqui, será que eu deixei de te amar?
Ainda recordo aquele beijo infantil,
naquele longínquo mas amoroso mês de abril,
tu tremeste eu tremi, ao sentir,
esse teu corpo pegadinho ao meu.
foi aí que senti que eramos um só, tu e eu
Meus olhos ao te ver, não paravam de cintilar,
eles brilhavam e transbordavam só ao pensar,
que no dia seguinte, teria que te dizer adeus.
Já em casa, entre lágrimas roguei por ti a Deus.
Chegou a hora da minha partida
não quis chorar na tua frente meu amor,
tenho-te no coração e no pensamento.
Tantos foram os dias e as noites que te chorei amargamente.
E os meses passavam lentamente,
mas com aquele Outono a chegar,
e as folhas a cair em todo o lugar,
Dezembro se estava a aproximar,
era o mês mais quente da minha vida,
aí estava eu, ansioso pra te ver e abraçar,
entre caricias os teus lábios beijar
e dizer-te meu amor te amo, nunca deixarei de te amar.

Luzerna, 18.05.2022 João Neves.

Ao fundo da gaveta fui buscar,
um simples pedaço de papel para recordar,
Mila, tu para mim eras um mundo,
meu amor por ti era profundo.
Os anos nunca deixaram de passar
e eu aqui, será que eu deixei de te amar?
Ainda recordo aquele beijo infantil,
naquele longínquo mas amoroso mês de abril,
tu tremeste eu tremi, ao sentir,
esse teu corpo pegadinho ao meu.
foi aí que senti que eramos um só, tu e eu
Meus olhos ao te ver, não paravam de cintilar,
eles brilhavam e transbordavam só ao pensar,
que no dia seguinte, teria que te dizer adeus.
Já em casa, entre lágrimas roguei por ti a Deus.
Chegou a hora da minha partida
não quis chorar na tua frente meu amor,
tenho-te no coração e no pensamento.
Tantos foram os dias e as noites que te chorei amargamente.
E os meses passavam lentamente,
mas com aquele Outono a chegar,
e as folhas a cair em todo o lugar,
Dezembro se estava a aproximar,
era o mês mais quente da minha vida,
aí estava eu, ansioso pra te ver e abraçar,
entre caricias os teus lábios beijar
e dizer-te um te amo, nunca deixarei de te amar.

Luzerna, 26.09.2024 João Neves.

Obrigada, Senhor

Senhor, só após 15 dias
É que encontro força
Para te agradecer a maior de Minhas Poesias,
A Luz há duas criaturas
Que desde do ventre,
Ofereci em Tuas Mãos.
E de coração estou feliz.
Estas duas criaturas, apagam tantas cicatrizes.
Que somente posso acreditar na Vida,
Em Ti.
Sei que muitas vezes não te agradeci
Mas, desta vez é diferente,
É algo que profundamente nos faz sentir contentes.
Por isso, Senhor, obrigada
Por tudo isso,
Pela Vida,
Por dois novos seres de luz.
Te agradeço, Cristo Jesus.


Eu e meus filhos.


Poesia manuscrita em 13 de janeiro de 1999.
Quinze dias após minha princesa Alexia Cristina e meu pequeno príncipe Gabriel nascerem.
Ofereço In memoriam a Gabriel Gonçalves ( 29 12 1998 - 05 11 2001), In memoriam a Ester Riveiro, Ramon, Dona Pura, e Francisco da Silva Mendes. Aos amigos e padrinhos das crianças: Francisco Campos e sua filha Célia Campos, Angela Maria Brasília Henriques e João Marcos Gonçalves Mendes, a Dra Mirlene Cernech, aos plantonistas do hospital Santa Joana, aos funcionários da Creche Maria Estéfano Maluf, a Isabel França, a todos meus familiares e amigos. E, meu ofertar em especial a Deus, pelos anos de aprendizagem.
SP 28 de julho de 2019.



"Mais um amanhecer, eu aqui e meus filhos ainda na UTI. Compensar o cansaço, ao qual todos os dias, eu e Edú, quando os visitamos, notamos a melhoria de cada um. Isto, me inspira às mais belas poesias, que é agradecer."
Frase manuscrita em 14 de Janeiro de 1999.
Ofereço a todos que trabalharam no Hospital Santa Joana. Paz e bem.

Deus obrigada por tudo.
São Paulo, 28 de julho de 2019.

Hoje esses textos foram transcritos para 3 sites de poesias.
Paz e bem para todos que me acompanham a cada dia.
Tereza Cristina Gonçalves Mendes Castro
Aos distintos metafísicos cabrões que tornam a vida
Mais complicada, como um permanente teste,
Aqui declaro estar a ouvir quatro mulheres
Como uma cota de malha de Teflon, que me veste,
E o seu escudo, os espíritos de África mãe,
O um, Oxalá Xangô, o vodu da Louisiane, a oração de S. Jorge Guerreiro,
O meu espírito inquebrável, 
Norah Jones, Katie Melua, Diana Krall, Melody Gardot,

A Vós vos invoco, em adição,Taylor Momsen, Maria Brink, Lzzi Hale,
Ergam suas vozes e ensurdeçam
Walt Whitman e James Joyce.
Que não quero que ouçam meus devaneios

O Rui Barbosa, Antero de Quental, Joâo de Deus poderia,
Whitman and Joyce despertam uma inquietude
Uma noção de Inferioridade de pretensa servitude,
Not Yeats or Les jeune Rimbaud et Verlaine,
Ni Mallarmé que j'ai eu le plaisir d'écouter
La simplicité de Simone Sophie Ernestine Marie Bertrand de Beauvoir
Son nom une cadence si belle...

Repito que estou em língua portuguesa,
Tal como recriei o que era atuação num filme pornô,
A imagem de que a educação que me deram,
Desci mesmo dela, pelas traseiras da casa,
Uma figura que o poeta usa no S. João dos outros, 

Eu derrubei o que a ética a moral o temor paternal reverencial,
O temor maternal,
Bem real e mensurável em colheres de pau e pratos atirados,
A minha inibição é agora só para mim uma teimosia
Pois eu posso dar-me nu sem dúvida nem culpa
Além da culpa de ter culpa que sempre nos consome.
Evolui, tornei-me algo bem humano e todavia atípico
Algo complicado e no mínimo criptico...ossos cansados.

Falo e ouço os que me querem convencer quando quero ou posso
Assisto a todas as lições quando há horizonte e
Essa linha imaginária que separa a terra e os oceanos
E lança no céu todos os enganos destes anos,
E agora, mal ou bem, tenho que fazer mal feito,
Ridícula incompetência, psicológica reverência,
Tudo o que deveria
Vou terminar um dia.
Se eles não desistem
Baixarei os braços cansados?
Como o Piano Concerto N°1, Op.23
The show must go on…. 

O sentido não é obtido por Dark or bright arts
E as grandes Mozzarella de Bufala, abençoadas,
Sei que começo a saber o que é fome.
Fome e dentes e dentes e mandíbulas

Onde os
Fascistas se
Encontram com
Os Marxistas
Todos cumprindo a sua história como forma de ser humano
Pescador não,
Predador inclemente,
Sino, repinar de silêncio
Mente nem.
Sempre demente.

Mostra a teu amor se o houver
Meses de cais sem vento nas Velas
Ou vento ou desalento
Vilões vestidos nos nossos roupões. 

PS
Versos duos, finais do Mar Português...

O que discordo como uma imagem truncada de algo que era temido e ora abrigo,
Como a Lua, onde espelhou a terra, um satélite único em propriedades,
E todavia morto e seco, frio, cratera desenhado, um campo desbaratado de milhões,
De crateras um dia feitas abrigos, quem diria, nossa casa um próximo dia...

Não há relação entre a fecundidade do mar e a beleza vazia e perigosa de uma película,
Que além da troposfera se dilui, que é a magnetosfera a protetora,
Que a ambígua dualidade é sempre uma verdade para os Protágoras do mundo,
Como esse poeta que é, e que hoje na minha admiração confundo
Com aquele amigo do Esteves sem metafísica, nem tanta sapiência da física.

Restam as musas, tágides, nunca saberei, de vossas vozes  e pessoas, isso sei.

Obrigado por tudo o que vos tomei.

Longe de ti minha terra,
penso-te a cada momento,
Jamais esqueci as tuas ruas apertadas,
naquele tempo que eram ruas mal iluminadas.
Longe de ti, chorei lágrimas amargas,
choradas em silêncio e desgosto.
Recordo de despertar com foguetes a estourar na aurora,
assinalava que era dia da Assunção da Nossa Senhora.
Lembro das ruas enfeitadas no mês de Agosto,
com o passar da Procissão,
ainda hoje são imagens guardadas no meu coração.
De tenra idade, choraste a minha partida,
parti de ai a caminho de outra vida.
As ruas ficaram tristes, choraram por mim,
até as pedras da minha calçada mudaram de cor,
de tantas lágrimas, tristeza e dor.
Sou filho da terra, sou imigrante,
num outro país, país distante.
País que abriu os braços para me alojar.
A Deus rogo a cada instante,
pra minha mãe sempre cuidar,
pra que todos os anos a possa abraçar,
Passam anos e ela na espera de me ver voltar,
mãe peça ao tempo, tempo e espere por mim,
tudo o que eu quero só Deus sabe,
Antes que a minha vida acabe.
espero que o seu coração transborde sempre amor,
e não importa que os seus cabelos mudem de cor,
quero-os com minhas mãos afagar,
e esse seu lindo rosto poder beijar.

Luzerna, 15.08.2025, Joao Neves

Estou a envelhecer

Sei que com o passar dos anos,
cada vez estou mais velho
e vou envelhecer ainda muito mais.
Sei também!
que na minha pele vão surgir rugas,
mas peço por tudo a Deus,
que não deixe o meu coração,
nunca ficar indiferente ao amor,
nem que jamais perca o dom da doçura 
e demonstrar um único ou simples gesto
de carinho ou de ternura...

Luzerna, 31.08.2025, Joao Neves

Com a temperatura a subir,
recordo aquele verão em que te conheci,
Passaram tantos anos,
e eu ainda não te esqueci,
tu vives cá bem dentro de mim.
Será que é por ti que vivo?
será que o meu coração
continua a bater por ti
Agora irei implorar a Deus,
que te apague do meu pensamento,
nem que seja por um só momento.

Luzern, 23.07.2020 João Neves.

Sei que com o passar dos anos,
cada vez estou mais velho
e vou envelhecer ainda muito mais.
Sei também!
que na minha pele vão surgir rugas,
mas peço por tudo a Deus,
que não deixe o meu coração,
nunca ficar indiferente ao amor,
nem que jamais perca o dom da doçura 
e demonstrar um único ou simples gesto
de carinho ou de ternura...

Luzerna, 31.08.2025, Joao Neves

Hoje é carnaval

De uma fantasia surgil a tradição

Todos dançando muito 

No carnaval de pernanbuco

 

Hoje é páscoa

Ele ressuscitou 

Vamos comemorar 

Porque ele nos salvou

 

Hoje é são joão 

Vamos acender a fogueira

A quadrilha vamos dançar

E no ceu ver as estrelas.

 

Hoje é natal

Jesus nasceu

E do ventre de maria

Nasceu o filho de Deus

 

Hoje é ano novo 

La vem um novo ano

Os foguetes vão gritar

Viva o ano que vai chegar.

 

Sei que com o passar dos anos,
cada vez estou mais velho
e vou envelhecer ainda muito mais.
Sei também!
que na minha pele vão surgir rugas,
mas peço por tudo a Deus,
que não deixe o meu coração,
nunca ficar indiferente ao amor,
nem que jamais perca o dom da doçura 
e demonstrar um único ou simples gesto
de carinho ou de ternura...

Luzerna, 31.08.2025, Joao Neves

Sei que com o passar dos anos,
cada vez estou mais velho
e vou envelhecer ainda mais.
Sei também!
que na minha pele vão surgir rugas,
mas peço por tudo a Deus
que não deixe o meu coração
nunca ficar indiferente ao amor
nem que jamais perca o dom da doçura 
e nunca deixe demonstrar um simples gesto
de amor, carinho ou de ternura...

Luzerna, 12.09.2025, Joao Neves

Minha terra não a nego,
num dia triste do mês de Abril,
parti da minha querida aldeia do Pego,
naquele longínquo mês,recordo baixei meu olhar,
estrada fora, não parava de chorar,
alagado em lágrimas disse-lhe adeus,
longe dela, pensava na minha terra adorada,
jamais esqueci as suas ruas apertadas,
naquele tempo eram mal iluminadas,
distante da minha terra, chorei lágrimas amargas,
choradas em silêncio e desgosto,
lembro das nossas ruas enfeitadas no mês de Agosto,
com o passar da nossa Procissão.
ainda hoje tenho essas imagens,
tatuadas na saudade do meu coração,
de tenra idade deixaste-me partir,
sei que também choraste a minha partida,
parti para o caminho, para outra vida,
as ruas ficaram mais tristes e brotaram pranto,
até as pedras da minha calçada mudaram de cor,
de tanta tristeza e dor,
Sou filho da terra, sou imigrante,
vivo noutro país, um país distante,
A Deus eu rogo a cada instante,
pra poder por muitos anos minha mãe abraçar,
Passam os anos e tu esperas o meu regresso,
pede ao tempo, tempo e espera por mim,
tudo o que eu quero só Deus sabe,
e antes que a minha vida acabe,
espero aí voltar a viver, para aí poder morrer...

Luzerna, 15-4-2013, Tsunamidesaudade63, João Neves